Jornal da Unicamp 184 - 5 a 11 de agosto de 2002
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O endocrinologista Bruno Geloneze: testes com obesos mórbidos e com pacientes de peso normal
A grelina
e os paradoxos
da obesidade


Estudo da Unicamp desmistifica a substância e derruba a tese de que ela seria uma das causas da obesidade

ISABEL GARDENAL

Substância que engorda, faz crescer e cuja falta tira o apetite. Não se trata de uma charada, mas estas pistas ilustram um mesmo caso: a descoberta da grelina por pesquisadores japoneses, em 1999, que vem a ser o pivô para o conhecimento da etiologia da obesidade – acúmulo de tecido adiposo (gordura), levando a um aumento de peso superior a 25% do considerado normal.

No ano passado, essa substância, produzida pelos neurônios e principalmente pelo estômago, foi revelada por cientistas britânicos como o fator que estimula o apetite.

Com as novas descobertas, o Grupo de Cirurgia de Obesidade da Unicamp adiantou-se em analisar o assunto, que ainda persistia com a dúvida: se a substância induz à fome, o obeso produz muita grelina? A Unicamp provou que não. A hipótese foi testada com obesos mórbidos, comparados a pacientes de peso normal.

“Surpreendeu-nos que pacientes de peso normal tenham grelina alta e obesos mórbidos, grelina baixa, derrubando a hipótese de que a causa da obesidade seria o excesso da substância”, afirma Bruno Geloneze, endocrinologista que integra o Grupo. “O obeso demonstra ser mais sensível à ação da grelina e tem um mecanismo que reduz sua produção a partir do ganho de peso.”

Somado ao fato de o obeso produzir pouca grelina, admite-se que, quando ele emagrece, passa a ter um aumento na grelina. “Mas, em nosso estudo, paradoxalmente, ela permaneceu baixa. Concluímos daí que a pessoa já carregava geneticamente o quanto iria produzir de grelina ou que a exclusão do estômago do trânsito alimentar levaria à diminuição do hormônio”, explica o endocrinologista.

Segundo Geloneze, um estudo apurado dos hormônios da obesidade traduz as conseqüências hormonais, metabólicas, causais e comportamentais da alimentação. No cérebro, o receptor responsável pelo estímulo à secreção de hormônio de crescimento, conhecido como receptor-órfão, por até então se desconhecer seu ligante (estimulador) natural, já existia. Era a grelina. Descobriu-se que, além de favorecer o aumento da ingestão alimentar e do peso em animais, a sua injeção aumenta a secreção ácida pelo estômago e prepara o organismo para o consumo, digestão e acúmulo de energia. “É um orexígeno (provoca fome) natural.”

Cirurgias – A grelina parece ser a chave para perder quilos, conforme estudos do Veteran Affairs Puget Sound, da Califórnia, e da Universidade de Washington, que comparam a eficácia das dietas e das cirurgias que reduzem o estômago.

Um paciente que se submete à cirurgia, sofre modificação no posicionamento do seu estômago, que recebe menos alimentos. Mais do que o emagrecimento que provoca, diminui a produção de grelina. Por isso, o obeso emagrece e passa a sentir menos fome. Esta afirmação é mostrada em estudo da publicação The New England Journal of Medicine.

O pesquisador David Cummings, no mesmo periódico, enfatiza que as células de grelina “dormem”, quando privadas do contato com nutrientes ingeridos. “Esta descoberta ajudará a desenvolver drogas mais eficazes”, conta.

A Unicamp atualmente realiza dois tipos de cirurgia antiobesidade: de derivação gastrojejunal, que reduz o tamanho do estômago e faz conexão deste com as porções mais distantes do intestino delgado; e a de Scopinaro, que diminui um pouco o estômago, mas provoca uma significativa redução na absorção de alimentos, em especial da gordura.