Edição nº 585

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 02 de dezembro de 2013 a 08 de dezembro de 2013 – ANO 2013 – Nº 585

Telescópio


Reação instintiva prevê felicidade no casamento

Você pode não ser capaz de prever, conscientemente, se o futuro de seu casamento vai ser feliz ou miserável, mas seus instintos mais profundos são, sugere estudo publicado na revista Science da semana passada. Um grupo de psicólogos de três universidades americanas acompanhou 135 casais – todos recém-casados no início da pesquisa – por quatro anos, pedindo, a cada seis meses, que avaliassem conscientemente o relacionamento e, também, submetendo-os a testes criados para determinar qual a visão automática, instintiva, que tinham do parceiro.

A pesquisa revelou que não havia correlação alguma entre a avaliação consciente, feita por meio de questionários, e a instintiva, e que a atitude consciente inicial não permitiu prever como os casais estariam ao final dos quatro anos do estudo. No entanto, a avaliação instintiva permitiu fazer essa previsão: os cônjuges que mostraram atitudes instintivas positivas no início do casamento também foram os que se mostraram mais felizes ao final da pesquisa.

Para determinar a atitude instintiva, os pesquisadores avaliaram o tempo de reação dos participantes a palavras positivas ou negativas, após uma breve exposição a uma foto do cônjuge. Os voluntários tinham de indicar, o mais rápido possível, se palavras como “maravilhoso” ou “horrível” eram positivas ou negativas, depois de serem expostos, por 300 milissegundos, a uma foto do cônjuge. Pesquisas anteriores já haviam mostrado que pessoas com atitude automática positiva respondem mais rapidamente a palavras positivas do que a negativas.

De acordo com nota distribuída pela revista, “os autores reconhecem que é difícil saber se as pessoas estavam realmente inconscientes de suas atitudes instintivas, ou se estavam sem vontade de informar seus sentimentos reais”, mas que “os resultados sugerem que pensamentos automáticos que frequentemente ocorrem fora da consciência podem moldar resultados futuros”.

 

28 neutrinos de fora do sistema solar

O laboratório IceCube, localizado no Polo Sul,  capturou 28 neutrinos altamente energéticos, que provavelmente tiveram origem fora do sistema solar, diz artigo publicado na edição de 22 de novembro da revista Science. Esta é a primeira vez, desde 1987, que partículas desse tipo, originadas no espaço além do sistema solar, são identificadas na Terra.

É extremamente difícil detectar neutrinos, já que são partículas desprovidas de carga elétrica e interagem muito pouco com a matéria. Além disso, a atmosfera terrestre é constantemente banhada por neutrinos produzidos no Sol, o que torna a detecção dos neutrinos gerados por outras fontes ainda mais complicada, já que é preciso separá-los da variedade local.

As mesmas características que tornam os neutrinos tão difíceis de achar também fazem com que sejam valiosos para a astronomia: eles são capazes de atravessar obstáculos, como nuvens de poeira e campos magnéticos, que detêm ou desviam outros tipos de partícula, como prótons ou mesmo luz. O desenvolvimento de uma “astronomia de neutrinos”, em que essas partículas desempenhem um papel semelhante ao que a luz, as ondas de rádio e outras formas de radiação têm na astronomia atual, é um sonho antigo.

Os 28 neutrinos extrassolares detectados pelo IceCube, entre 2010 e 2012, são os primeiros identificados na Terra desde que a explosão de uma supernova, em 1987, enviou uma chuva de partículas em nossa direção. No entanto, de acordo com os pesquisadores da colaboração responsável pelo detector no Polo Sul – que envolve 11 países – as partículas captadas agora são milhões de vezes mais energéticas que as geradas pela supernova do século passado.

 

Supermemória também pode ser manipulada

Mesmo os possuidores de memórias superprecisas podem ter suas lembranças corrompidas por truques psicológicos, mostra estudo publicado no periódico PNAS. Há tempos que psicólogos sabem que a memória humana pode ser distorcida, seja por acaso ou de modo deliberado – há até experimentos em que voluntários são induzidos a “lembrar-se”, vividamente, de eventos que na verdade nunca ocorreram: memórias não são gravações fiéis de fatos vividos, mas reconstruções produzidas pelo cérebro cada vez que buscamos nos lembrar de alguma coisa, num processo aberto a falhas e distorções. 

No entanto, algumas pessoas com hipertimesia, ou Síndrome da Supermemória, são capazes de recordar datas e eventos com altíssima precisão, lembrando-se de detalhes verificáveis de eventos ocorridos décadas atrás com precisão de até 97%. Essas pessoas têm lembranças de dez anos que são mais vívidas do que as lembranças de um mês atrás de uma pessoa comum. 

Mas uma pesquisa realizada por cientistas da Universidade da Califórnia, Irvine, mostrou que a supermemória não protege contra as distorções produzidas por manipulação. Os cientistas conseguiram até mesmo fazer com que portadores de hipertimesia “se lembrassem” de assistir ao vídeo de um acidente que, na verdade, não havia sido filmado.

“As descobertas sugerem que os mecanismos de reconstrução da memória que produzem distorções são fundamentais e disseminados nos seres humanos, e é improvável que alguém seja imune”, concluem os autores.

 

Europa prepara sonda para mapear a galáxia

A Agência Espacial Europeia (ESA) deve lançar, no fim de dezembro, a sonda Gaia, equipada com uma gigantesca câmera que irá fotografar mais de um bilhão de estrelas, com o objetivo de produzir um mapa 3D de altíssima precisão de nossa galáxia, a Via-Láctea. A missão é fruto de um investimento de 2 bilhões de libras (cerca de R$ 8 bilhões). 

Pesquisadores britânicos ouvidos pelo jornal The Observer esperam que os dados levantados pela sonda ajudem a entender como a Via-Láctea se formou, e a prever os rumos de sua evolução pelos próximos bilhões de anos.

“Vamos reescrever todos os mapas estelares e todos os livros de astronomia”, disse ao jornal inglês o principal assessor científico da ESA, Mark McCaughrean. A sonda também está capacitada para detectar asteroides dentro do sistema solar. “Ela nos dará um sistema de alerta para asteroides em rota de colisão com a Terra”, acrescentou.

A varredura completa da galáxia pela sonda levará cinco anos, período no qual ela registrará a posição, o brilho e a temperatura de todos os corpos celestes que entrarem em seu campo visual.

 

A evolução do conto ‘Chapeuzinho Vermelho’

Em artigo publicado no periódico online PLoS ONE, o pesquisador Jamshid Tehrani, da Universidade Durham, no Reino Unido, apresenta o resultado da aplicação de técnicas, adaptadas das normalmente usadas por biólogos na reconstituição das relações de parentesco entre diferentes espécies, para tentar traçar a evolução do conto infantil Chapeuzinho Vermelho

“De acordo com a escola ‘histórico-geográfica’, é possível classificar contos semelhantes em tipos internacionais, e rastreá-los de volta aos arquétipos originais”, escreve Tehrani em seu trabalho. Ele nota, no entanto, que essa abordagem é alvo de críticas por parte de estudiosos que consideram o folclore fluido demais para suportar esse tipo de classificação, e também dos que veem risco de etnocentrismo na empreitada. Tehrani se propôs a usar os mecanismos emprestados da biologia para testar a validade da classificação de contos populares em “tipos” aparentados entre si, que seriam análogos aos dos ramos da árvore da evolução das espécies.

No lugar das características físicas e genéticas usadas pelos biólogos, o pesquisador se valeu de 72 variáveis de enredo de 58 histórias normalmente classificadas como variantes de Chapeuzinho Vermelho ou de outro conto muito semelhante, conhecido como O Lobo e as Crianças. Entre as variáveis estudadas estiveram características de protagonista (criança sozinha ou grupo de crianças; menino ou menina), características do vilão (lobo, ogro, tigre, etc.), truques do vilão (disfarce do corpo, da voz) e desfecho (se a vítima escapa, é devorada, é resgatada por terceiros).

O resultado, diz o autor, prova que é possível confirmar a hipótese de que Chapeuzinho Vermelho e O Lobo e as Crianças são de fato tipos de histórias diferentes. Além disso, o trabalho conclui que a maioria das versões africanas analisadas deriva da família de O Lobo e as Crianças, enquanto que as versões asiáticas parecem ser híbridos dos dois contos-base.