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A segunda geração

A música eletroacústica toma seu lugar no cenário musical brasileiro do século 21. Jovens compositores começam a buscar nesse gênero aplicação para os conhecimentos desenvolvidos na graduação ou em outros ambientes de ensino de música. Mas o palco onde esses musicistas atuam hoje vinha sendo preparado desde o início da década de 1990 por uma geração anterior que, estimulada pela abertura política à importação de equipamentos eletrônicos de tecnologia avançada no período, começou a utilizar recursos computacionais em suas produções eletroacústicas. O trabalho de 12 desses musicistas atuantes desde essa época se torna mais conhecido por meio da dissertação “Música eletroacústica no Estado de São Paulo: segunda geração (1981-2009)”, desenvolvida por Clayton Rosa Mamedes no Instituto de Artes da Unicamp (IA). Além da análise rigorosa da obra desses “mestres”, Mamedes, orientado pela professora do IA Denise Garcia, enriquece a dissertação com uma historiografia da música eletroacústica que contextualiza o momento em que sua produção passou a contar com recursos computacionais.

A abertura política tornou os equipamentos economicamente acessíveis, na opinião de Mamedes e, além disso, o desenvolvimento tecnológico possibilitou ao computador concentrar recursos cada vez mais abrangentes, que foram explorados também na área de música.

Se a geração anterior conseguiu trazer a eletroacústica para o ambiente acadêmico, as mais jovens experimentam a ousadia de levá-la a espaços de arte e centros culturais, motivada por mestres como Denise, por exemplo, que desenvolve trabalhos com o grupo de teatro Lume da Unicamp. O gênero, segundo Clayton, permite essa interação com outras áreas. Ele explica que. apesar de envolver excelentes compositores que nunca realizaram formação musical, a maioria dos compositores estudados está ou esteve na academia.

Em São Paulo, foco da dissertação, a produção de música eletroacústica apresenta exemplos das principais correntes estilísticas do gênero, segundo Mamedes. Os compositores da década de 1990, embora utilizem ferramentas de suporte à composição, se valem de recursos diversos que levam a características estilísticas plurais. Os profissionais paulistas, segundo o autor, têm individualidade quanto às propostas poéticas e ao desenvolvimento de conceitos teóricos.

A geração contemplada na dissertação foi a primeira a desenvolver trabalhos utilizando recursos computacionais como ferramenta de suporte à composição. Segundo o autor, gravadores magnéticos deram início às experiências eletroacústicas de musicistas como José Augusto Mannis e Lelo Nazário, que depois migraram para o computador. Já Ignacio de Campos e Fernando Iazzetta têm toda a produção associada a recursos computacionais. No período anterior a eles (décadas de 1950 a 1980), porém, a música eletroacústica brasileira, em suas primeiras experiências, se desenvolveu em grupos pequenos e foi marcada por uma produção inconstante e de caráter experimental.

De acordo com Mamedes, esta realidade estava associada à situação sócio-política manifestada pela dificuldade envolvida na importação de bens tecnológicos, que inibiu a formação de estúdios – tanto públicos quanto privados – e implicou no desenvolvimento de obras realizadas com poucos recursos. Compositores destas primeiras gerações buscaram formação especializada no exterior; apenas após seus respectivos retornos começaram a se estabelecer no Brasil grupos com produção constante.

Além da abertura econômica, Mamedes destaca o investimento na formação em música eletroacústica no período estudado. Antes disso, o gênero contou com algumas iniciativas no Estado de São Paulo, como o Música Nova, na década de 1960, mas que não desenvolveram atividades de ensino. As atividades do grupo são encerradas em 1977, e a música eletroacústica só volta a acontecer em 1983, quando Conrado Silva implanta o primeiro estúdio do Estado na Unesp, ao ser convidado para realizar atividades de docência. Mas a aceitação de Conrado para lecionar na Universidade de Brasília (UnB), em 1983, interrompe novamente as atividades em eletroacústica no Estado de São Paulo. A lacuna só volta a ser preenchida na década de 1990, quando Flo Menezes começa a dirigir o Studio PANaroma, vinculado à Unesp e à Faculdade Santa Marcelina (Fasm).

Mamedes distribui os compositores em três grupos distintos. Os que trabalham com suporte fixo produzem obras para CD, áudio e vídeo, mas sempre fixadas em suporte. Segundo o autor, esses compositores conseguem reproduzir e controlar o som na sala de concerto durante a performance. Neste perfil, ele coloca José Augusto Mannis (Unicamp), Flo Menezes (Unesp), Edson Zampronha (que iniciou na Unesp e agora está na Espanha), Denise Garcia (Unicamp), referência em paisagem sonora, na opinião do pesquisador, Rodolfo Coelho de Souza (USP), Lívio Tragtenberg, que foi professor da Unicamp, mas abandonou a academia para dedicar-se ao desenvolvimento de projetos, e Nazário, que nunca esteve na academia, mas aos 17 anos começou a tocar com Hermeto Pascoal. As obras dele, segundo Mamedes, estão perfeitamente dentro daquele padrão que se produzia no exterior.

Nascido na década de 1950, sua produção se estende desde 1981 a 2000. Ao padrão europeu de música eletroacústica, Nazário vai inserir progressivamente elementos de música popular até que na última obra dele, analisada por Mamedes, ele desenvolve nada mais que uma batida repetida sobre a qual se desenvolvem linhas melódicas instrumentais por cima. “Ele atualmente usa os recursos da eletroacústica para fazer música popular. Tratenberg também tem essa característica de fazer música eletroacústica utilizando seus recursos, mas pensando como música popular”, explica.

Em uma segunda categoria, de acordo com sua classificação, ele inclui os compositores que trabalham com obras eletrônicas em tempo real, ou seja, a parte eletrônica é criada durante a apresentação. O que mais se destaca nesta categoria, segundo o autor, é a flexibilidade, e não a programação. Neste perfil se encontram Fernando Iazeta (USP), Silvio Ferraz (Unicamp), Inácio de Campos (Faculdade Santa Marcelina), falecido em 2009, e Wilson Sukorski.

Na terceira categoria de eletroacústica, estão profissionais como Jônatas Manzoli, que realizam programações computacionais exatamente para dar base ao processo criativo. “Eles criam as ferramentas, softwares que vão gerenciar as performances, exatamente para dar base ao processo”, acrescenta Mamedes.

Uma das conclusões a que a pesquisa levou é a de que, apesar de os compositores estudados utilizarem o mesmo conjunto de softwares e procedimentos técnicos, a música eletroacústica teve uma produção diversa. Enquanto alguns músicos vinculam-se a teorias semióticas e desenvolvem abstrações, teorias composicionais sobre como realizar o processo criativo com base nessas teorias, outros são vinculados à paisagem sonora, que significa a apresentação de materiais com referência maior da fonte. Há ainda um terceiro grupo que opta pela utilização de sons processados e um quarto, que trabalha com arte radiofônica. Segundo Mamedes, o conjunto de características encontradas no aspecto teórico da obra de cada um, que nada tem a ver com a realização dos recursos que utilizam, também faz com que essa produção seja muito diversa. “Isso também tornou difícil a classificação por categorias”.

Sons os mais diversos, entre eles os sintetizados, gravados, processados, ruídos, barulho de diferentes objetos, imagens, performances ajudam a compor a música eletroacústica, que, ao contrário do que se imagina, não é domínio dos DJs, mas também de compositores com formação em música tradicional. Para sanar a curiosidade dos leigos, Mamedes costuma fazer uma analogia: “Imagine a música dos DJs que se ouve na noite. Depois, imagine uma música para concerto com sons de DJs. Isso é a música eletroacústica.”

A performance, característica forte em algumas categorias, faz parte da arte visual que envolve a música eletroacústica, mas é um dos elementos que vêm da década romântica e está associada à questão do artista gênio. “Nós temos Liszt com aqueles malabarismos todos ao piano. E temos também os músicos da corte francesa”, explica.

Mamedes se diz otimista em relação à aceitação da música eletroacústica por um público amplo, pois tem encontrado cada vez mais instalações que utilizam o gênero. “Querendo ou não, a música eletroacústica, por utilizar sons processados, sons que o ouvinte está pouco habituado a escutar, tende a dar um caráter de moderno muito forte. Também a possibilidade de utilizar recursos gravados auxilia na questão de fazer referências às fontes, surgindo com força vinculada a instalações, a performances eletrônicas e tem muitos centros culturais estimulando essa produção. A produção é crescente”, afirma.

Hoje, na sua opinião, o campo de atuação é amplo e promissor. “Tenho colegas que desenvolvem instrumentos musicais a partir de brinquedos, rádios que eles mesmos montam. Outros trabalham na área de música acusmática, mais conservadora, e também com performances, instalações, programações, composição de música algorítima. A eletroacústica é ainda mais diversa que a geração estudada na dissertação”, acredita.


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Publicações
MAMEDES, Clayton Rosa. Composição, programação e performance mediatizada nas obras de Jônatas Manzolli. Em: Anais do XX Congresso da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Música (ANPPOM), Florianópolis, agosto de 2010.
MAMEDES, Clayton Rosa. José Ignacio de Campos Júnior: interação tímbrica na música eletroacústica. Em: Anais do XX Congresso da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Música (ANPPOM), Florianópolis, agosto de 2010.

Dissertação “Música eletroacústica no Estado de São Paulo: segunda geração (1981-2009)

Autor: Clayton Rosa Mamedes

Orientadora: Denise Garcia

Unidade: Instituto de Artes (IA)

Financiamento: Fapesp

Prêmio XVIII Bienal de Música Brasileira Contemporânea 2009 – Funarte

Composição premiada: Paisagem bucólica ou jogo das longas variações
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