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Alunos do IA encenam ópera de Purcell
Espetáculo dirigido e regido pelo maestro Luís
Otávio dos Santos envolveu cerca de 80 pessoas

MARIA ALICE DA CRUZ

Cenas do último ensaio de Dido e Enéas, cuja apresentação ocorreu no último dia 25 no teatro do Culto à Ciência: experiência rara para os alunos (Fotos: Antoninho Perri)Ela, Dido, mulher amargurada, que lamenta do início ao fim a impossibilidade de viver plenamente o amor de Enéas, personagem da mitologia greco-romana a quem os deuses designaram a fundação de Roma. Casado e com filhos, ele tenta contrariar os deuses ao se apaixonar por Dido, mas o espírito de um feiticeiro o comunica que terá de abrir mão deste amor para cumprir sua missão. A história desses personagens mitológicos é contada musicalmente por Henry Purcell (1659-1695), compositor inglês do período barroco que consegue, por meio de notas e ornamentos, descrevê-los fielmente na ópera Dido e Enéas, gravada em DVD por alunos e profissionais do Instituto de Artes da Unicamp (IA), como resultado das atividades propostas pelo maestro Luís Otávio dos Santos no âmbito do Programa Artista-Residente da Unicamp, coordenado pela Assessoria para Assuntos Culturais da Reitoria. A produção, que foi apresentada no último dia 25 no teatro do Colégio Culto à Ciência, em Campinas, envolveu mais de 80 pessoas, segundo o produtor da montagem, Fernando Vasconcellos, da Coordenadoria de Desenvolvimento da Unicamp (CDC). A direção geral é do próprio artista-residente, que contou com a parceria dos professores da Unicamp Verônica Fabrini, na direção cênica, Eduardo Paiva, na direção de imagem, Helô Cardoso, na cenografia, e Ângela Nolf e Daniella Gatti, na direção de coreografia. A proposta do projeto desenvolvido por Santos foi feita pelo professor Esdras Rodrigues, chefe do Departamento de Música do IA.

A ópera, um clássico da literatura musical inglesa, foi um presente para o elenco formado por estudantes da Unicamp (oito solistas, 17 no coro, 12 no corpo de balé e 16 na orquestra), que tiveram a rara oportunidade de ser um dos personagens de Purcell. O resultado foi bem-sucedido, segundo os alunos, pela dedicação de Santos, especialista em interpretação de instrumentos antigos e referência em música barroca, que trouxe para a Unicamp toda a bagagem de projetos desenvolvidos na Inglaterra. “O projeto na Unicamp representa a oportunidade de poder trazer para o universo didático o trabalho que realizo há 15 anos na Europa. Eu me especializei na interpretação histórica de instrumentos antigos, e este é um movimento que está crescendo no Brasil. E nada melhor que materializar este tipo de experiência através de uma ópera barroca. A gente sabe que a ópera é uma invenção da época barroca. As grandes obras primas do período barroco estão concentradas nas óperas, e uma delas é Dido e Enéas, da literatura musical inglesa, cujo libreto inspirado no poema Eneida, de Virgílio, foi escrito pelo poeta inglês Nahum Tate [1652-1715]”, explicou.

Cenas do último ensaio de Dido e Enéas, cuja apresentação ocorreu no último dia 25 no teatro do Culto à Ciência: experiência rara para os alunos (Fotos: Antoninho Perri)De acordo com o maestro, a produção tem uma vantagem pedagógica que é o fato de ser uma ópera bastante executável, pois elas normalmente são muito longas.

“Mas esta tem duração menor, então conseguimos preparar o evento em poucos meses. É um projeto de grande envergadura, multidisciplinar”, esclarece. Para o cantor Jorge Trabanco, aluno que interpreta Enéas, Purcell consegue transmitir em menos de uma hora a essência dos personagens. Outros compositores de ópera, segundoTrabanco, não conseguiram isso em três ou quatro horas. “Ele foi muito feliz e sucinto nas composições que demonstram bem o caráter de cada personagem. Por exemplo, não existe uma ária alegre para o Enéas. A ópera não passa a sensação de um homem feliz. É uma coisa de impacto e ao mesmo tempo reflexiva. O Enéas e a Dido retratam bem isso. Tem uma coisa forte que é quando o espírito do feiticeiro avisa o Enéas que ele tem de largar mão da Dido para seguir seu caminho, que é a parte alta do Enéas na ópera, é um recitativo muito pesado e tenso que temos de cantar com o coração, vivendo aquela cena na hora para sair bom, senão é simplesmente uma música sem sentido”, explica Trabanco.

Envolvimento
Para o maestro, o alto nível dos estudantes de arte foi mais que suficiente para preencher “logo de cara” todas as vagas: papeis dramáticos, coro, orquestra. “Foi um crescendo, um trabalho que tentamos planejar de forma mais gradual possível por envolver conscientização bem profunda de todos os alunos, desde a peça, as notas, partitura. O que mais vale para esse tipo de trabalho é fazer o aluno olhar para si próprio, pensar o que quer, o que representa. É o tipo de envolvimento musical que faz o músico reconsiderar a própria musicalidade”. As atividades iniciaram-se com palestras sobre ornamentação barroca, realização de seminários mais acadêmicos, reunindo literatura, artes plásticas, de forma a englobar a ópera em todas as áreas do IA.

Santos acredita que a produção de uma ópera do período barroco é um marco para o IA. “O foco do trabalho foi a interpretação historicamente informada. Então, não se trata de mais uma produção de uma ópera. Tem um olhar que faz os alunos todos reconsiderarem muitas coisas em nível de interpretação, postura, de musicalidade”, acrescenta. Dido e Enéas não é nenhuma descoberta, segundo o maestro. Justamente por ser uma obra primorosa, está no repertório especializado. Mesmo não sendo executada constantemente em salas de concerto, pois uma ópera barroca requer instrumentário específico, cravos, orquestra de tamanho reduzido, técnica adaptada para estilo vocal, a ópera de Purcell é reconhecida pela qualidade. “Materializar em DVD esta produção tem grande valor porque eterniza o trabalho. Serve de exemplo para outras produções que virão pela frente”, diz o maestro.

Eduardo Paiva, diretor da Rádio e Televisão Unicamp: “Recorte acadêmico e educacional” (Fotos: Antoninho Perri)Viver a melancolia de Dido, presente tanto no texto quanto na música de Purcell, pode não ser uma tarefa muito fácil, mas é enriquecedor para a formação e a carreira profissional da mezzo-soprano Gilzane Castellan. “Sempre ouvimos falar de Dido e Enéas, mas viver a personagem me fez aprofundar meus conhecimentos sobre a ópera e o trabalho de Purcell”, declara. O grande desafio, além do canto, é transparecer cenicamente o psicológico de Dido, uma mulher amargurada, que vive reclamando do próprio destino e acaba a ópera de forma trágica. “Mas Purcell é perfeito, é genial, porque a própria música já tem componentes que induzem o cantor e as pessoas que ouvem essa tristeza. Esse lamento já está dentro da música. O desafio é interpretar o que ele propõe”, acrescenta Gilzane. Para ela, foi um presente trabalhar com Santos. “O conheci no projeto e tenho certeza que está sendo um aprendizado enorme. Ele é um especialista em barroco. E isso é importante para nossa formação”, reforça.

Para Jorge Trabanco, que vive o personagem Enéas, a atuação do maestro Santos foi muito importante para que a ópera não se constituísse apenas num conjunto de notas e técnicas. “Luís Otávio foi muito importante nisso para dar esses toques. Sem ele, o trabalho ficaria apenas uma sequência de notas musicais. Ele deu esse sentido de interpretação. Ele traduziu da partitura o Purcell que ele queria ouvir. E isso foi muito importante para nós”, diz Trabanco.

Belinda, dama de companhia de Dido, é o avesso da patroa. É quem dá ritmo à ópera, na opinião de Érika Andrade, aluna do segundo ano de canto lírico no Instituto de Artes da Unicamp. Viver essa mulher alegre, que tenta amenizar o sofrimento de Dido, é um presente para uma aluna de graduação, na sua opinião. “Fiquei feliz com a seleção. A gente precisa sempre buscar mais. É uma grande oportunidade, logo tão cedo, já poder participar de óperas como essa e a Flauta Mágica, no ano passado. E sempre com incentivo de nossos professores”, diz Érika, que vive um momento especial por participar de duas óperas ao mesmo tempo. “Interpreto também Bastienne, na ópera de Mozart Bastien e Bastienne, que será encenada terça e quarta-feira, às 20 horas, no Centro de Convivência de Campinas. São duas personagens diferentes: a Belinda, que é criação de um compositor barroco, e Bastienne, de Mozart, um representante do classicismo. Uma é alegre; a outra romântica. Mas está sendo um momento especial experimentar duas personagens diferentes”, acrescenta.

Uma vocação descoberta na infância fez com que Ana Carolina Marchi conquistasse vários solos também na Universidade, desde que ingressou no curso de canto, mas a primeira personagem operística, a Second Woman (Segunda Mulher), é abraçada com carinho e dedicação pela soprano.

“É uma oportunidade rara ter uma ópera rica como Dido e Eneas sendo apresentada e gravada em Campinas. A emoção dos personagens – bruxas, espírito, coro, e o elenco de primeiros solistas – acaba inserindo as pessoas no mundo da ópera”, diz a soprano Marina Lobato, que interpreta a primeira bruxa.

A gravação do DVD, segundo o diretor da Rádio e Televisão Unicamp, Eduardo Paiva, envolveu uma equipe de profissionais e estudantes da área de audiovisual. “É muito bom poder participar disso. Isso é importante para novas discussões de linguagem, envolvendo alunos e estagiários. A participação da TV tem um recorte bastante educacional e acadêmico. Não é simplesmente o registro de uma ópera, é a produção de um DVD, na qual temos de estudar como se transporta uma cena para a televisão; como deve ser o registro de uma ópera; como produzir um making off . É um projeto que tem seu encanto”, acrescenta Paiva.


 
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