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Nova perspectiva de tratamento para o diabetes mellitus tipo 2

Pesquisadores revelam em artigo científico que ação da metformina se dá no intestino humano e não no fígado, como se acreditava

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São inéditos os achados da pesquisa publicada na revista norte-americana Proceedings of the National Academy of Sciences  (PNAS), em que um grupo de pesquisadores da Unicamp descreve o mecanismo de atuação do medicamento mais utilizado no mundo no tratamento do diabetes mellitus tipo 2 (DM2): a metformina.

A publicação sugere que a primeira e mais importante ação da droga acontece no intestino delgado e no intestino grosso, e não no fígado, como então acreditava a comunidade científica. O resultado abre nova perspectiva para o tratamento do DM2, reforçando a prescrição da metformina como a primeira escolha de droga no tratamento da doença.

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“Quando pensamos em condições fisiológicas, temos em mente o seguinte caminho: o indivíduo ingere uma carga de glicose (alimento), essa carga é absorvida pelas células do intestino, que a liberam para o fígado e outros tecidos. Observamos que a metformina atua, justamente, no caminho contrário a este fisiológico. Ela retira a glicose da circulação sanguínea e a traz para a célula intestinal, onde será metabolizada”, explica a biomédica do Hospital de Clínicas da Unicamp, Natália Tobar, autora da tese de doutorado que deu origem à publicação da PNAS.

Orientador da pesquisa desenvolvida por Natália ao longo de dez anos, o docente da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp Mario Saad explicou que a metformina é prescrita há mais de 60 anos no tratamento da DM2, e seu mecanismo de ação, descrito até então, era a redução da produção hepática de glicose. Ao observar que o uso da metformina proporciona maior captação reversa de glicose no intestino dos pacientes, eles descobriram que a droga estimulava, neste órgão, o reaparecimento do transportador de glicose denominado GLUT1.

“Durante o período fetal, o GLUT1 age na retirada da glicose da circulação sanguínea do cordão umbilical para o intestino do feto, garantindo a sobrevivência do bebê, sendo desativado após o nascimento. Compreendemos, a partir daí, que a principal ação da metformina, com o reaparecimento desse transportador no intestino humano adulto, seria a de aumentar a captação de glicose neste órgão. Em resumo, pensávamos, até então, que o fígado era o primeiro e principal órgão de atuação desta droga. Mas, agora, compreendemos que seus efeitos acontecem em uma etapa anterior, no intestino”, afirmou Saad.

Saad comenta, ainda, que além de desencadear o reaparecimento do GLUT1 no intestino dos pacientes, a metformina também ativa outro transportador de glicose, o GLUT2, regulando a atuação de ambos os transportadores, de acordo com os níveis de glicemia. “Se a glicemia do paciente está muito alta, quem age mais é o GLUT2. Do contrário, quem age é o GLUT1. Concluímos, assim, que ambos os transportadores atuam na redução da glicose na circulação sanguínea”, finaliza.

O biólogo do Laboratório de Investigação clínica em resistência à insulina, Guilherme Z. Rocha, que atuou na realização de diversos experimentos para o estudo, dá mais detalhes sobre o funcionamento da metformina no intestino humano. Ele conta que, uma vez retirada da circulação sanguínea, a glicose é metabolizada no intestino, transformando-se em lactato e acetato, que são transportados para o fígado através da veia mesentérica, contribuindo para a redução da produção hepática da glicose.

Imagem esquemática da atuação da metformina no intestino humano | Ilustração dos autores
Imagem esquemática da atuação da metformina no intestino humano | Ilustração dos autores

Infraestrutura de pesquisa

Mario Saad reconhece a importância da infraestrutura de pesquisa necessária para a obtenção desse conhecimento. Nesse contexto, destaca o financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e a participação de outros parceiros.

“Esse trabalho é resultado da interação de muitas instituições de ensino e pesquisa, que destaco através de professores universitários, pesquisadores, estudantes de pós-graduação, representados por Celso Dario Ramos (Medicina Nuclear, HC Unicamp), Marcelo Mori e Marco Vinolo (Instituto de Biologia, Unicamp), Kléber Franchini (Laboratório Nacional de Biociências – LNBio), associado ao Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), Cláudio Tormena (Instituto de Química, Unicamp), José Rocha Gontijo e Patrícia Boehr (FCM, Unicamp)."

O pesquisador destacou, também, a utilização do equipamento de PET-CT, instalado no Serviço de Medicina Nuclear do HC Unicamp e conquistado através do Projeto Fapesp Multiusuário, por intermédio dos professores Celso Dario Ramos e Cármino Antonio de Souza.

Além de Natália Tobar, Mario Saad e Guilherme Z. Rocha, a publicação na PNAS tem como autores: Andrey Santos; Dioze Guadagnini; Heloísa B. Assalin; Juliana A. Camargo; Any E. S. S. Gonçalves; Flávia R. Pallis; Alexandre G. Oliveira; Silvana A. Rocco; Raphael M. Neto; Irene Layanae de Sousa; Marcos R. Alborghetti; Maurício L. Sforça; Patrícia B. Rodrigues; Raíssa G. Ludwig; Emerielle C. Vanzela; Sérgio Q. Brunetto; Patrícia A. Boer; José A. Ro. Gontijo; Bruno Geloneze; Carla E. O. Carvalho; Patrícia O. Prada; Franco Folli; Rui Curi; Marcelo A. Mori; Marco A.R. Vinolo; Celso D. Ramos; Kleber G. Franchini, e Cláudio F. Tormena.

Matéria publicada originalmente no site da Faculdade de Ciências Médicas.

Imagem de capa JU-online
Profissional de saúde faz teste de glicemia em paciente; resultado do estudo abre nova perspectiva para o tratamento do DM2, reforçando a prescrição da metformina como a primeira escolha de droga no tratamento da doença

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