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Estudo aponta limites do crédito rural

Segundo pesquisa do IE, problemas enfrentados por agricultores familiares e não familiares exigem políticas públicas mais amplas

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O crédito rural é uma importante ferramenta para a promoção do desenvolvimento econômico dos estabelecimentos agropecuários brasileiros, tanto os de produção familiar quanto não familiar. Ocorre que, sozinho, o financiamento não é capaz de dar conta de todos os problemas do campo, o que exige a adoção de políticas públicas complementares. A análise faz parte tese de doutorado defendida recentemente pela economista Gabriela dos Santos Eusébio no Instituto de Economia (IE) da Unicamp. O trabalho foi orientado pelo professor Rodrigo Lanna Franco da Silveira e coorientado pelo professor Alexandre Gori Maia.

No estudo, Gabriela usou como fonte principal o último Censo Agropecuário, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2006. A pesquisadora se valeu especialmente dos microdados gerados pelo levantamento. O trabalho dividiu os produtores rurais em dois segmentos, os familiares e os não familiares. Em cada caso, a economista aplicou um modelo estatístico para aferir o reflexo do crédito rural no desempenho econômico dos estabelecimentos. Foram consideradas variáveis referentes às características do agricultor, da propriedade e da produção. “De modo geral, o estudo apurou que o financiamento impactou positivamente a produção agropecuária nos dois segmentos, mas de maneiras distintas”, aponta.

A diferença no desempenho entre produtores familiares e não familiares, explica a economista, tem origem na discrepância existente entre os dois grupos. O mesmo ocorre entre agricultores dentro de cada grupo. “Um aspecto que influencia nessa assimetria é a região onde os estabelecimentos estão localizados. Algumas são mais dinâmicas que outras, oferecendo melhores recursos para a produção, que vão além do crédito. Um exemplo é a região que oferece maior inserção no mercado consumidor de determinados produtos”, detalha Gabriela.

Foto: Reprodução
A economista Gabriela dos Santos Eusébio, autora da tese: “O crédito rural é uma importante ferramenta de incremento da agricultura familiar e não familiar, mas que ele não tem condições de superar todos os obstáculos enfrentados pelo produtor”

Em relação ao agricultor familiar, que também pode ser considerado como pequeno produtor, a principal linha de crédito disponível é o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf). Segundo a pesquisa, o impacto positivo desse financiamento foi de aproximadamente 21% sobre o valor de produção dos estabelecimentos em geral. “Esse dado comprova a importância do crédito para o campo, mas também revela que essa ferramenta não consegue, sozinha, dar conta dos problemas do setor. Tanto é assim que os recursos do Pronaf trouxeram impactos mais significativos para os agricultores com maiores condições produtivas. Aqueles que dependem de orientação técnica, por exemplo, apresentaram um desempenho inferior à média aferida”, informa.

A diferença de resultados, continua a autora da tese, aponta para a necessidade da adoção de políticas públicas complementares à oferta de financiamento, de modo a fortalecer certos grupos dentro da agricultura familiar. Gabriela lembra que esses pequenos produtores, que somam 4,1 milhões de pessoas, são responsáveis pela geração de boa parte dos alimentos que chegam à mesa dos brasileiros. A agricultura familiar responde por 90% da produção de mandioca, 80% da de feijão, 60% da de arroz, entre 50% e 60% da de milho e 15% da de soja

Quanto aos agricultores não familiares, que podem ser considerados médios e grandes produtores, o acesso ao crédito rural (tanto privado quanto público) elevou o desempenho econômico dos estabelecimentos entre 63% e 213%, conforme apurou a tese. “Esse segmento, em geral, apresenta melhores condições produtivas. Normalmente, a produção está aliada ao agronegócio”, pondera a economista. A despeito desse maior dinamismo, observa Gabriela, o estudo também identificou discrepância no desempenho dos agricultores não familiares, provocada principalmente, como já dito, por causa da localização dos estabelecimentos. “O impacto do crédito foi positivo em todas as regiões analisadas, mas no Sul a performance foi superior a todas as outras, alcançando 245%. Já no Nordeste, esse índice ficou em 31%. Além da localização, as características técnicas da produção, como o uso de máquinas e equipamentos, contribuem para o surgimento desse tipo de discrepância”, analisa a autora da tese.

Na opinião de Gabriela, tomar conhecimento dessas diferenças é importante para o tomador de decisões, principalmente quando este está elaborando políticas públicas para o setor. “No caso, fica claro que o crédito rural é uma importante ferramenta de incremento da agricultura familiar e não familiar, mas que ele não tem condições de superar todos os obstáculos enfrentados pelo produtor. Isso exige políticas públicas coordenadas e sistêmicas”, reforça a economista, que contou com bolsa de estudo concedida pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

 

 

Imagem de capa JU-online
Características do agricultor, da propriedade e da produção foram levadas em consideração no estudo

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