ReproduçãoDennys Cintra é nutricionista formado pela Universidade de Alfenas, mestre em Nutrição pela Universidade Federal de Viçosa e doutor e pós-doutor pela Unicamp. Jornalista científico pelo Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor) da Unicamp.

A Influência da Bauhaus na Ciência

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ReproduçãoNo ano em que se comemora o centenário de uma das primeiras e mais importantes escolas de design do mundo, avalia-se também quão ampla foi a inserção da Bauhaus nos conceitos contemporâneos de praticamente tudo. Criada em 1919, a Bauhaus foi fundada pelo arquiteto Walter Gropius, em Weimar, na Alemanha. Vários foram os conceitos desenvolvidos por Gropius, que valorizava a estética, mas colocava o funcionalismo acima de tudo. A influência de sua visão futurista trouxe os primeiros impactos às edificações. Casas e principalmente prédios ganharam design exclusivo. Alguns apresentavam detalhes ligeiramente arredondados, entretanto, a estética Bauhaus é fortemente marcada pelas linhas retas, simplificadas e assimétricas. A simplificação do design em nome da funcionalidade trouxe o primeiro importante conceito da escola, o visual “clean”. Nem sempre o caminho mais curto entre dois pontos é uma reta, e apesar da Bauhaus ter investido nos formatos geométricos e linhas retas, as curvas estavam presentes. Nitidamente, as curvas na Bauhaus apresentam imensa sutileza, e estão no sentido extremo oposto ao rococó, ou seja, com sinuosidade digna de aeromodelos.

Posteriormente a escola recebeu forte impulso pelas ideias inquietantes de outros dois arquitetos, Mies van der Rohe e Marcel Breuer. Pasme, mas Rohe era um entusiasta do estilo neoclássico. Ele não apenas abandonou esse estilo ao ser seduzido pela lógica Bauhaus, mas deu embalo à célebre frase “menos é mais”. A partir disso, desenvolve-se outro conceito pétreo da Bauhaus, o minimalismo. O conceito minimalista surge a fim de simplificar as coisas, de modo que pudesse haver barateamento estrutural e, consequentemente, acesso a todas as classes sociais. Sim, a Bauhaus tinha a ideologia socialista por trás, todavia, seus criadores não esperavam que seus conceitos fossem valorizados justamente pela classe aristocrata da época. Ainda sob o ponto de vista das edificações, as paredes se tornaram lisas, menores (em número), a ponto de muitas delas não terem sobrevivido. Essa característica marcante é vista atualmente no interior dos lofts modernos, onde os ambientes são conjugados e, portanto, com menos paredes. No Brasil, a obra que traz o impacto mais marcante da Bauhaus é o Museu de Arte de São Paulo (MASP), um dos maiores vãos livres do mundo, sustentado por quatro pilastras.

ReproduçãoA escola apostou forte na interdisciplinaridade, e os estudantes encontraram ali todas as artes interligadas, sem menosprezo nem mesmo das artes consideradas menores, como marcenaria, serralheria e cerâmica. O resultado dessa efervescência estaria prestes a revolucionar também o design moderno do cotidiano. Breuer era arquiteto, mas apostou sua criatividade no desenvolvimento de objetos. Um designer de objetos pode soar menos importante do que os edificadores, no entanto, pautados na ordem Bauhaus de que a funcionalidade é mais importante, Breuer dá novo fôlego à escola e se pergunta: “É possível que algo continue funcional, porém belo?”. Breuer investiu na produção de mobiliários, principalmente com a utilização de tubos de metal.

A partir de então, a escola espalha sua influência e conceitos pelo mundo afora, não sendo mais possível impor ou esperar limites na aplicação da ideia Bauhaus. Se até mesmo as fontes de letras, como a Times New Roman e a Arial, são herdeiras do conceito Bauhaus, provavelmente existem outras aplicações que podemos nos exercitar em observar.

ReproduçãoNa instrumentação científica não é diferente. Um dos impactos mais notórios se dá sobre os microscópios ópticos monoculares. O equipamento possui como pontos mais marcantes do conceito Bauhaus a envergadura de sua coluna e a cabeça arredondada para inserção do tubo ocular. Antes de pensarmos sobre a possibilidade de “pouca tecnologia disponível embutida”, o que justificaria o modelo simplista, à mesma época de sua criação haviam outros modelos de complexidade bem maior dentro da categoria. Assim, este é considerado um projeto minimalista legítimo.

ReproduçãoAs espátulas de laboratório para pesagem de reagentes apresentam estilo Bauhaus incutido. Diferentes das espátulas de pizzaiolos, ou das de aplicação de tinturas e massa corrida na construção civil, as espátulas de laboratório apresentam design próprio. Tão próprio, que seria inútil sua comparação com, por exemplo, uma colher de chá. O conceito Bauhaus aplicado é nítido com as linhas retas e alongadas em sua haste, finalizada com uma chapa ligeiramente larga e achatada numa extremidade, e abaulada e diminuta na outra.

O bico de Bunsen é um dos mais tradicionais equipamentos de um laboratório experimental. Produz aquecimento através de uma chama gerada em sua extremidade, a partir da condução de gás através de sua haste. Os curiosos conceitos observados neste instrumento se dá pela haste reta e lisa de inox, e também em sua base. Entre tais estruturas, certamente a base é a mais notada pelo design, em oposição à obviedade da haste reta. Curiosamente, existem marcas que até mesmo embutem o nome “Bauhaus” na descrição do equipamento.

ReproduçãoO suporte universal para tubos e balões é outro instrumento que chama atenção para observadores de design. Dotada de uma base larga e lisa, une-se perpendicularmente a uma haste vertical que oferece apoio para garras metálicas, que sustentam tubos e balões. Sejam as garras ou os apoios arredondados para balões, apresentam desenho alongado, reto e liso, até sua extremidade, que ganham contornos específicos para cada aplicação. Mas mesmo esses contornos podem ser enquadrados no conceito minimalista e futurista.

São diversos os equipamentos que podem ou poderiam ter recebido conceitos desenvolvidos pela Bauhaus. As estufas e os banho-marias com sua aparência quadrada e dura por fora, mas de cantos arredondados internamente são exemplos. Outros instrumentos ainda poderiam ser considerados criações a partir da ótica Bauhaus, apesar de terem surgido antes da própria escola. Por exemplo, o popular erlenmeyer, apresenta design digno da Bauhaus, apesar do seu criador, o também alemão Emil Erlenmeyer, ter morrido em 1909, dez anos antes do surgimento da escola.

ReproduçãoDentre os instrumentos que mais se encaixam nessas ideias, talvez o mais representativo seja o almofariz com pistilo. Um tipo de gral, como um pequeno vaso de cerâmica, utilizado em geral para tornar pó pequenas quantidades de sólidos, semelhante a um espremedor de alho. O almofariz apresenta design bojudo, liso por fora e áspero por dentro, mas sem emendas e sem detalhes. Da mesma forma, o pistilo, um bastão de cerâmica usado na fricção do produto no interior do almofariz, apresenta design alongado, em linhas retas, até sua extremidade, que ganha abaulamento. A inexistência de ranhuras ou vincos, alinhada ao projeto de design minimalista, torna este instrumento um representante digno do conceito Bauhaus.

​​ReproduçãoSaindo dos laboratórios de química, outros instrumentos científicos recebem fortemente a influência da Bauhaus. Sem dúvida, o globo terrestre é o mais aclamado. O arco de sustentação do globo é a principal marca do estilo impregnado no instrumento, mas sua base não é menos importante. Em geral, as bases são circulares, com superfícies lisas, e base de apoio para pequena haste também reta e lisa.

Outro instrumento geográfico de enorme importância para a humanidade, e com data de criação que remonta séculos atrás, o astrolábio ganhou em 1967 design exclusivo da própria escola Bauhaus. Mas a escola foi além e conseguiu acoplar dentro de um mesmo instrumental, o globo terrestre e o astrolábio. Trata-se de uma obra exclusiva e original, criado pela escola Bauhaus.

​​ReproduçãoPor fim, para que seja mantido o pensamento dessa forte influência alemã, que mudou conceitos por todo o mundo, segue o último instrumental apresentado, com visual moderno e que provavelmente alguns leitores estão utilizando neste exato momento, produtos Apple. Tanto os computadores, tablets e principalmente os telefones criados por Steve Jobs, foram concebidos e totalmente inspirados pela ótica Bauhaus. A própria marca da empresa, a maçã mordida, foi um projeto de design encomendado por Jobs, mas sob seu olhar altamente influenciado pela escola. O computador transparente, o iPod em plástico policarbonato branco e cromado reluzentes, os laptops em metais como titânio e alumínio, todos eles foram fundamentais nas misturas de forma e função. Ali, Jobs aplicou design e conceito a tudo, aos aparelhos, aos fios de energia, e até mesmo às embalagens. Agora, olhe para os lados e perceba até onde há influências diretas e indiretas da Bauhaus. E inspire-se!

 

 

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