Edição nº 634

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 24 de agosto de 2015 a 30 de agosto de 2015 – ANO 2015 – Nº 634

Telescópio


Predador 
insustentável

As atividades de caça e pesca promovidas pelo homem têm características e impactos ecológicos bem diversos das praticadas por outras espécies predadoras, mostra artigo publicado na revista Science. Ao contrário de outros predadores da natureza, o ser humano visa principalmente animais adultos, no auge de sua capacidade reprodutiva, e tende a predar mais outros carnívoros do que herbívoros.

Caçadores e pescadores humanos matam presas adultas até 14 vezes mais que outros predadores, o que afeta a capacidade das espécies visadas de repor suas populações, informa a equipe canadense responsável pelo estudo. No caso de carnívoros, eles são abatidos por seres humanos a uma taxa até nove vezes maior do que outras espécies. 

A situação é especialmente grave na pesca: “pescadores exploram populações adultas de sua presa numa taxa superior à de qualquer outro predador do planeta”, diz o artigo, que vê um efeito especialmente acentuado no Oceano Atlântico. 

Em nota, o pesquisador Chris Darimont, da Universidade de Victoria, diz: “Nossa tecnologia de matança, perversamente eficaz, os sistemas da economia global e um gerenciamento de recursos que prioriza benefícios de curto prazo criaram o superpredador humano. Nosso impacto é radical”.

 

Saturno, com a sombra dos anéis projetada em sua atmosfera; o planeta pode ter crescido a partir de uma minúscula sementeDe pedrinhas 
a planetas

Os planetas gigantes gasosos do Sistema Solar podem ter nascido de uma acumulação inicial de “pedrinhas” com diâmetros de um centímetro a um metro – e não de colisões entre planetesimais, enormes rochedos de mais de 100 quilômetros. Um modelo que simula, com sucesso, a formação de planetas gigantes a partir de pedrinhas aparece na edição mais recente da revista Nature.

Tanto Júpiter quanto Saturno são, em essência, gigantescas bolas de gás, mas cientistas acreditam que esses mundos devem ter nascido em torno de núcleos sólidos, com dez vezes a massa terrestre. O processo de formação desses núcleos – e a razão pela qual eles dão origem a gigantes gasosos, e não a mais planetas como a Terra ou Marte – é alvo de debate.

O modelo apresentado na Nature, que simula uma lenta acumulação de pedrinhas que vão, por sua vez, originar os planetesimais, leva à formação de um a quatro gigantes gasosos, a uma distância de 5 a 15 Unidades Astronômicas (UA) do Sol. A zona dos gigantes gasosos no Sistema Solar começa a 5 UA.

 

Furacões no EUA e fogo
na Amazônia: causa comum?

As mesmas condições oceânicas que estimulam a formação de furacões violentos no Caribe, como o Katrina que atingiu os EUA em 2005, produzindo um dos maiores desastres naturais da história daquele país, geram o fluxo de ar seco em direção à Amazônia que torna a floresta mais vulnerável a incêndios, diz estudo conjunto da Nasa e da Universidade da Califórnia, publicado no periódico Geophysical Research Letters.

O trabalho aponta uma influência do Atlântico Norte no risco de fogo na bacia do Rio Amazonas. De acordo com nota divulgada pela Universidade da Califórnia, as mesmas águas quentes que dão energia para a formação de furacões puxam as chuvas tropicais mais para o norte, “sugando” a umidade que poderia proteger a floresta. A mecânica, de acordo com os autores, é direta: se a temperatura das águas na superfície do Atlântico Norte se eleva acima do normal, menos chuva cai na Floresta Amazônica.

 

Erosão 
dos cometas

Quebras e rachaduras fotografadas na superfície do cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko podem ter sido causadas pelo estresse térmico sofrido pelo astro à medida que se aproxima e se afasta do Sol ao longo de sua órbita, diz artigo publicado no periódico Geophysical Research Letters por pesquisadores que trabalharam com dados levantados pela sonda Rosetta, da Agência Espacial Europeia (ESA).

“Fraturas são onipresentes na superfície do núcleo”, escrevem os autores. “Aparecem em cenários variados e mostram diferentes topologias (...) No entanto, concluímos que a erosão térmica por radiação solar é responsável por criar a maioria das fraturas observadas”.

O cenário mais comum, diz nota divulgada pela ESA, são redes de fraturas estreitas com até 250 metros de extensão, que se espalham por superfícies planas. “Em algumas localidades”, diz a nota, “as fraturas parecem se cruzar em padrões poligonais, e ângulos retos – na Terra e em Marte, isto frequentemente representa sinal de que o gelo se contraiu abaixo da superfície”.

 

Massacre 
neolítico

Uma vala coletiva de cerca de 7.000 anos atrás, contendo os restos de pelo menos 25 corpos humanos, com sinais de violência, foi descoberta na Alemanha. Os achados são descritos no periódico PNAS.  O sítio arqueológico pertence à chamada Cultura LBK da Europa Central, cujos padrões de violência são alvo de discussão entre cientistas. 

“O desaparecimento da LBK da cena neolítica tem sido retratado, com frequência, como resultado de conflito e convulsão social, culminando num pesadelo apocalíptico de guerra e canibalismo”, escrevem os autores, vinculados a instituições europeias e sul-africanas. “Embora esse cenário possa parecer exagerado, a ‘crise’ proposta ao final da LBK tem atraído muita atenção, especulação e debate”.

O novo local de massacre se soma a outros três vinculados à LBK, encontrados na Alemanha e na Áustria. Ele se destaca dos demais pela presença frequente de ossos quebrados nas pernas das vítimas, o que sugere o uso sistemático de tortura. Vistas em conjunto com descobertas anteriores, essas evidências “indicam que o massacre de comunidades inteiras não era uma ocorrência isolada, mas um evento frequente na fase final da LBK”.

 

Impacto na 
origem da vida

Experimentos realizados por uma equipe japonesa sugerem que o impacto de meteoritos nos oceanos da Terra primitiva pode ter dado origem às unidades químicas fundamentais da vida, como aminoácidos – os blocos que formam as proteínas – e as bases hidrogenadas que compõem o DNA.

A equipe liderada por Yoshihiro Furukawa, da Universidade Tohoku, simulou, em laboratório, o impacto de materiais comumente encontrados em meteoritos contra uma mistura de água, bicarbonato de amônio e nitrogênio, os ingredientes supostos dos oceanos e da atmosfera da Terra antes do surgimento da vida.

Como resultado, foram extraídas as bases citosina e uracila, que aparecem no DNA e no RNA, e uma série de aminoácidos, como glicina e alanina. O experimento é descrito no periódico Earth and Planetary Science Letters.

 

A mão 
mais antiga

A descoberta do mais antigo osso fossilizado de mão semelhante aos que existem nas mãos dos seres humanos atuais é descrita no periódico online Nature Communications, do grupo Nature. O osso, uma falange, foi encontrado num sítio de 1,8 milhão de anos na Tanzânia. Esse osso difere tanto das falanges de australopitecos quando das do Homo habilis. De acordo com os autores do artigo, vinculados a instituições da Espanha, Estados Unidos, África do Sul e Tanzânia, a descoberta sugere que homininos de anatomia mais próxima da moderna coexistiram com o Homo habilis na região. 

 

Fraude 
na revisão

No início da última semana, a editora internacional de periódicos científicos Springer – que em maio se fundiu à Macmillan Science and Education, responsável pela Nature – anunciou a retratação de 64 artigos publicados em dez diferentes revistas, por conta de fraude no processo de revisão pelos pares. A maioria das retratações envolve trabalhos de autores asiáticos, publicados em periódicos das áreas de biologia e medicina.

“O processo de revisão é uma das pedras fundamentais da qualidade, integridade e reprodutibilidade da pesquisa, e encaramos seriamente nossas responsabilidades como seus guardiões”, diz nota divulgada pela empresa. “Estamos revendo nossos processos editoriais para evitar novas manipulações desse tipo no futuro”.

De acordo com o blog Retraction Watch, com essa nova onda de retratações da Springer já são mais de 250 os artigos invalidados por conta da descoberta de que os dados de contato dos revisores, indicados pelos autores ou pelo órgão de fomento, eram falsos – muitas vezes, endereços de e-mails fraudados, que enviavam os textos de volta para os autores, que então “revisavam” e recomendavam a publicação de seus próprios trabalhos. 

Desta vez, no entanto, parece que os autores também foram vítimas: os falsos revisores seriam agentes de consultorias de formatação e de pré-edição de texto contratadas, em boa-fé, pelos cientistas. Os pesquisadores que forem inocentados na investigação em curso deverão ser convidados a submeter novamente seus artigos.