Edição nº 570

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 12 de agosto de 2013 a 18 de agosto de 2013 – ANO 2013 – Nº 570

TELESCÓPIO


Evolução parece  premiar quem coopera

Traição e perfídia são estratégias condenadas ao fracasso – no longo prazo. A conclusão, que pode produzir alguns suspiros de alívio (ao menos em quem não for cínico o bastante para se lembrar da frase de John Maynard Keynes, “no longo prazo estaremos todos mortos”), aparece não num trabalho de filosofia, mas de biologia evolutiva, publicado em 1° de agosto no periódico online Nature Communications, do grupo Nature. Os autores, da Universidade Estadual de Michigan, debruçaram-se sobre um surpreendente resultado da Teoria dos Jogos, divulgado em 2012. O teorema apresentado ano passado demonstrava a existência de uma família de estratégias bem-sucedidas, baseadas em traição e extorsão, para o jogo conhecido como Dilema do Prisioneiro.

Esse Dilema é usado como modelo simplificado para o estudo de diversos tipos de interação, seja entre pessoas ou, até, espécies em ecossistemas. O problema costuma ser formulado em termos de “cooperação” e “deserção”. Se um dos parceiros coopera e o outro deserta, o desertor recebe um grande prêmio e o cooperador fica sem nada. Se ambos cooperam, os dois recebem uma recompensa modesta. Se ambos desertam, ninguém leva nada. Durante décadas, acreditou-se que, se o jogo é jogado consecutivamente, um grande número de vezes, a cooperação mútua caba sendo a melhor solução.

No ano passado, no entanto, os físicos Freeman Dyson e William H. Press apresentaram uma prova de que existem inúmeras outras soluções – conhecidas pelo nome coletivo de “Estratégias de Determinante Zero” – que permitem que um dos participantes domine o jogo, sonegando ou extorquindo parte do prêmio do outro, sem que o jogador prejudicado possa reagir: em termos de premiação, para a vítima não ceder à estratégia de Determinante Zero é ainda pior do que submeter-se a ela.

Agora, porém, Christoph Adami e Arend Hintze escrevem que essas estratégias são insustentáveis num cenário regido pela evolução biológica. “Descobrimos que a evolução vai castigá-lo, se você for egoísta e mesquinho”, disse Adami, em nota divulgada por sua universidade.

A chave para o fracasso, no longo prazo, das estratégias de Determinante Zero é a existência de uma população diversificada de jogadores, a possibilidade de comunicação entre eles – o que permite identificar, e evitar, trapaceiros – e os mecanismos naturais de mutação e seleção. Estratégias extorsivas “não são estáveis numa população capaz de se adaptar”, escrevem os autores.

Empresa produz etanol de lixo nos EUA

A relação entre biocombustíveis, meio ambiente e alimentação é complexa, com vários órgãos internacionais advertindo que, na África e em países do Oriente, as lavouras plantadas para produzir combustível estão causando perda de segurança alimentar ou avançando sobre áreas de mata nativa que deveriam ser preservadas. Uma possível solução para o problema seria a produção de etanol celulósico, gerado a partir de partes das plantas que não são consumidas como alimento.

O processo de converter “lixo vegetal” – aparas de madeira ou palha de milho, por exemplo – em álcool é tecnologicamente mais sofisticado que a produção de álcool a partir das partes da planta ricas em amido ou açúcar, e que são exatamente as usadas na alimentação humana. Dar escala comercial a esse tipo de operação tem se mostrado um desafio. No início de agosto, no entanto, o jornal The New York Times noticiou que a subsidiária americana de uma companhia europeia, a INEOS Bio, conseguiu, pela primeira vez, produzir uma quantidade comercial de etanol de madeira, e que o produto começa a ser distribuído ainda neste mês.

O objetivo da INEOS Bio é também passar a usar lixo urbano como matéria-prima para produzir combustível.

Nem todas as formas de felicidade valem a pena

A busca do prazer é o caminho da felicidade, dizia o filósofo grego Epicuro, que por causa disso ganhou má fama entre as pessoas que não se davam ao trabalho de perguntar o que, exatamente, ele queria dizer com “prazer”, que para ele tinha mais a ver com serenidade de espírito do que com vinho e festa. E “felicidade” também é um conceito vago: costuma-se falar em felicidade eudemônica, que surge quando se encontra um sentido na vida, quando a pessoa se sente produtiva e útil, e felicidade hedônica, que vem da gratificação dos desejos pessoais mais imediatos. Pesquisas mostram que os dois tipos de felicidade estão correlacionados, tanto que, em termos de bem-estar psicológico, é difícil definir qual o “melhor”.

Mas um estudo recente, realizado por pesquisadores da Universidade da Carolina do Norte e da UCLA, publicado no periódico PNAS, indica que, ao menos para as células do corpo humano, a felicidade eudemônica é a que vale. Envolvendo 80 voluntários, que responderam a questionários sobre bem-estar e cederam amostras de sangue, a pesquisa descobriu que as pessoas com alta felicidade eudemônica e baixa felicidade hedônica têm um sistema imunológico mais saudável que as que se encontram no polo oposto. Na verdade, as pessoas com alto nível de felicidade hedônica e baixa felicidade eudemônica apresentaram alguns sinais levemente preocupantes, como maior predisposição a inflamações.

Então, formas de felicidade menos egoístas fazem bem para a saúde, e prazeres egoístas fazem mal? O estudo tem limitações intrínsecas – do tamanho da amostra à metodologia – e, como diz artigo sobre o assunto publicado no blog Babbage, da revista The Economist, mesmo que o resultado reflita a realidade, na maioria das pessoas os dois efeitos se cancelam: o benefício do prazer eudemônico neutraliza o malefício do hedônico. E também é possível que a relação de causa e efeito corra no sentido oposto: talvez pessoas mais saudáveis tenham mais disposição para ajudar o próximo.

Vacina contra malária obtém sucesso em teste inicial

Uma vacina intravenosa – que precisa ser injetada diretamente no sangue do paciente – mostrou-se segura e eficaz contra a malária na primeira fase de um teste clínico, informam pesquisadores americanos em artigo publicado na edição de 8 de agosto da revista Science. O teste envolveu 57 adultos, dos quais 40 receberam doses da vacina, feita com esporozoítos do parasita Plasmodium falciparum durante um ano. Os demais atuaram como controles.

A vacina é feita de esporozoítos – células que, normalmente, se desenvolvem no parasita adulto – enfraquecidos, e preservados por congelamento. Parte dos voluntários recebeu quatro doses da vacina e outra parte, cinco. Os controles não foram vacinados, e todos os grupos sofreram uma infecção controlada por malária. Dos pacientes com cinco doses, nenhum desenvolveu a doença; dos com quatro doses, 30% contraíram malária e, dos controles, 80%. Exames mostraram que a reação do sistema imunológico, entre os vacinados, foi proporcional à dose aplicada. Os pacientes toleraram bem a vacina, afirmam os autores.

Mais estudos ainda precisam ser realizados para, entre outras coisas, determinar a duração da imunização, e em busca de uma forma de aplicação mais amigável que a injeção intravenosa.

Estudo vê risco de ‘efeito manada’ em redes sociais

Instrumentos online que permitem agregar a opinião de um grande número de pessoas – como o botão “curtir” do Facebook, ou os rankings de estrelas em livrarias e outros tipos de comércio na internet – muitas vezes são saudados como ferramentas que extraem informação útil e relevante da chamada “sabedoria das multidões”, mas um artigo publicado na edição de 8 de agosto da revista Science sugere que esses resultados podem ser facilmente manipulados, destruindo o “saber coletivo” que poderiam transmitir.

“Usamos avaliações feitas por outros para tomar decisões sobre quais hotéis, livros, filmes, políticos, notícias, comentários e narrativas merecem nossa atenção ”, escrevem os autores – Lev Muchnik, Sinan Aral e Sean Taylor, respectivamente, da Universidade Hebraica de Jerusalém, do MIT e da Universidade de Nova York.

Eles usaram um site agregador de notícias como laboratório. O serviço oferece, aos leitores, a possibilidade de dar uma nota positiva ou negativa aos comentários publicados pelos demais. No experimento, um conjunto de mais de 100 mil comentários foi dividido, aleatoriamente, em três grupos. Num deles, todos receberam um ponto positivo, independentemente de sua qualidade intrínseca; em outro, um ponto negativo. O terceiro grupo foi mantido intocado, como controle.

A análise da evolução dos comentários mostrou que os que receberam o ponto positivo aleatório chegaram, ao fim de cinco meses, a um escore médio 25% superior aos do grupo de controle. Curiosamente, os que receberam o ponto negativo aleatório tiveram o efeito deletério neutralizado: os usuários do site corrigiram, com seus votos, a manipulação negativa, enquanto que a positiva foi, não corrigida, mas amplificada.

“Nossos resultados demonstram que, enquanto a influência social positiva se acumula, criando uma tendência de bolhas nos rankings, a influência social negativa é neutralizada pela correção das multidões”, concluem os autores.