Edição nº 532

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 02 de julho de 2012 a 29 de julho de 2012 – ANO 2012 – Nº 532

Estratégia diminui
resistência ao tratamento da
insuficiência cardíaca

Baixa adesão a terapias está entre os
fatores de altas taxas de mortalidade

 Uma estratégia adaptada de maneira inovadora pela enfermeira Izabel Cristina Ribeiro da Silva Saccomann mostrou-se eficaz para minimizar as resistências dos pacientes ao tratamento da insuficiência cardíaca. Após um estudo clínico, o grupo de enfermos pesquisados apresentou mais disposição para aderir à terapia. Houve também melhora na qualidade de vida dos pacientes que participaram da pesquisa. Izabel Saccomann desenvolveu o estudo para a sua tese de doutorado, defendida junto ao Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp.

Considerada uma síndrome complexa e com altas taxas de mortalidade, a insuficiência cardíaca representa um dos principais problemas de saúde pública, com prevalência entre 1% e 2% na população mundial. No Brasil, a síndrome é umas das causas preponderantes para as internações hospitalares no Sistema Único de Saúde (SUS). A enfermidade consome cerca de 3% do total dos recursos do país utilizados para atender as readmissões realizadas no SUS, conforme dados de 2009 da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC).

Nos últimos anos, o desenvolvimento de medicamentos avançados para a insuficiência cardíaca trouxe mais sobrevida aos pacientes, reconhece a pesquisadora da Unicamp. Apesar disso, as readmissões hospitalares e as taxas de mortalidade continuam altas, objeta Izabel Saccomann. “Isso acontece porque a insuficiência cardíaca atinge a população idosa, raramente manifesta-se de forma isolada e envolve um tratamento complexo, tanto com medicamentos quanto com a mudança de hábitos físicos e alimentares. Isso requer uma mudança no estilo de vida bastante radical. Todos estes fatores acabam levando a não adesão ao tratamento, que se constitui no principal fator de risco para as internações e complicações”, confirma a estudiosa.

 Ela foi orientada pela docente Fernanda Aparecida Cintra, do Departamento de Enfermagem da FCM, que coordena a linha de pesquisa “Processo de cuidar em saúde e enfermagem”. Também da FCM, a professora Maria Cecília Bueno Jayme Gallani coorientou a pesquisa. “O estudo é relevante pelos resultados obtidos a partir da intervenção junto a portadores de insuficiência cardíaca. Dentre os achados mais importantes, a pesquisa mostrou que a educação em saúde a estes pacientes levou a mudança de comportamento. A relevância desta mudança justifica-se pela prevenção dos sinais e sintomas da insuficiência cardíaca e, consequentemente, pela redução das readmissões hospitalares”, avaliou a orientadora Fernanda Cintra.

Izabel Saccomann realizou um estudo experimental com 99 pacientes do Conjunto Hospitalar de Sorocaba (SP), utilizando uma estratégia conhecida como Jogo de Papéis, do termo inglês Role-playing. Fundada na simulação de uma situação próxima da vida real, esta estratégia é amplamente conhecida como RPG (Role-playing game) ou jogo de interpretação de personagens. O método permitiu, na pesquisa clínica, que os pacientes reconhecessem os benefícios do tratamento a partir de suas experiências prévias e dos saberes compartilhados, explicou a enfermeira. “O Jogo de Papéis é essencial como ferramenta colaborativa, na qual os participantes encontram suas próprias soluções”, dimensiona a pesquisadora, que é docente da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP) com campus em Sorocaba.

A enfermeira desenvolveu o estudo clínico com pacientes que necessitam do uso de diuréticos e também com aqueles que precisam controlar o peso, principais fatores que desencadeiam a síndrome. “Estudos que fizemos previamente identificaram que o principal medicamento que leva o paciente a não aderir ao tratamento é o diurético. Este medicamento causa um desconforto importante aos pacientes, que é o aumento da frequência do ato de urinar. Há, também, a questão do controle de peso e verificação do edema. Quando o paciente não toma o diurético ele pode apresentar aumento de peso e do edema em tornozelo e pés. Essas foram as principais dificuldades ao tratamento que identificamos na literatura e na prática clínica”, justifica.

A pesquisa clínica, intitulada Programa de Educação em Saúde, foi realizada em quatro fases, sendo que 50 pacientes fizeram parte do grupo de controle e 49 do grupo de intervenção. Os pacientes do grupo de controle receberam somente as orientações médicas efetuadas na consulta. Já os pertencentes ao grupo de invenção participaram, efetivamente, do Programa de Educação em Saúde. Após o término do Programa, que durou cerca de três meses, os dois grupos foram comparados. “Foram observadas mudanças positivas e significativas dos pacientes do grupo de intervenção, tanto em relação a uma maior adesão ao tratamento diurético, como na automonitorização de peso e edema e na qualidade de vida”, relata.

Comportamento

Além da estratégia do Jogo de Papéis para mudar o comportamento dos pacientes, a enfermeira Isabel Saccomann baseou seu estudo no modelo teórico de Crença à Saúde. Este fundamento foi desenvolvido na década de 1950 por um grupo de psicólogos sociais do Serviço de Saúde Pública dos Estados Unidos. Na época, eles buscavam compreender o fracasso na participação de pacientes nos programas de prevenção de doenças.

Conforme a pesquisadora, este modelo preconiza que o paciente só vai mudar o comportamento se acreditar que as barreiras do tratamento serão superadas pelos benefícios. “Neste Programa, eu trabalhei, portanto, com os benefícios e barreiras percebidas com relação ao diurético e ao controle de peso e edemas. Com estas estratégias, conseguimos modificar algumas crenças negativas que os pacientes tinham com relação à terapia. No final dos encontros fazíamos um pacto com todos; e eles propunham tomar os medicamentos na dose e horários certos e controlar melhor o peso e o inchaço”, detalha. “O conhecimento dos pacientes sobre a importância da monitorização diária do peso, restrição de líquidos, diminuição do sódio na dieta e tomada de medicamentos constitui aspecto relevante para a mudança de comportamento e, consequentemente, do seu estilo de vida”, completa.

Neste ponto, a pesquisadora defende o papel dos profissionais de enfermagem na implantação de estratégias para mudança do comportamento dos pacientes. “O envolvimento de uma equipe multiprofissional também é muito importante para a avaliação, educação, planejamento do cuidado e implementação de estratégias para a adesão ao tratamento dos pacientes”, acrescenta.

 

Publicação

Tese: “Educação em saúde na adesão ao tratamento e na qualidade de vida em portadores de insuficiência cardíaca”
Autora: Izabel Cristina Ribeiro da Silva Saccomann
Orientadora: Fernanda Aparecida Cintra
Coorientadora: Maria Cecília Bueno Jayme Gallani
Unidade: Faculdade de Ciências Médicas (FCM)