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Vinte anos de – mais que – Várias Histórias

Coleção Várias Histórias, produzida pelo Cecult e publicada pela Editora da Unicamp, completa duas décadas de sucesso editorial

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Coleção Várias Histórias têm 46 títulos publicados e o quadragésimo sétimo já está sendo preparado 

Há vinte anos, um projeto iniciado pelo Centro de Pesquisa em História Social da Cultura (Cecult) em conjunto com a Editora da Unicamp viria a se tornar uma referência historiográfica e de coleção editorial. Nascia a coleção Várias Histórias.

“Alguns anos depois de criado o Cecult, quando os primeiros resultados dos projetos coletivos começaram a aparecer, sentimos necessidade de criar um canal de divulgação para as dissertações e teses que estavam sendo feitas no âmbito destes projetos”, explica Silvia Lara, professora do departamento de História da Unicamp e uma das idealizadoras do projeto.

Como quase todo projeto desta natureza, enfrentou seus desafios iniciais e particulares, tais como trâmites com a editora, a questão de recursos financeiros para sua viabilização, além da realização de concurso com banca externa e apoio para produção das obras, o que fez com que os livros publicados passassem por um rigoroso processo de seleção, que aliado a assessores da Fapesp (que financiou parte da coleção), resultou em um material de ótima qualidade.

O sucesso e relevância da coleção se justificam pelo seu projeto editorial, que visa a publicação de temáticas que são de extrema relevância para entender a História do Brasil. “São temas que tratam dos movimentos sociais, da história do trabalho, da escravidão, da história do racismo do Brasil. Então, a coleção trata de temas com pautas específicas da História Social”, diz o atual coordenador da coleção, Rodrigo Camargo de Godoi, também professor do departamento de História.

Nesses vinte anos, a Várias Histórias alcançou números expressivos que atestam sua relevância na historiografia brasileira, assim como a alta qualidade da produção do Cecult. Já foram publicados 46 títulos e o quadragésimo sétimo já está sendo preparado. Destes 46, nove são coletâneas e os demais são títulos autorais.

Um dos principais trunfos da longevidade da coleção é a atualidade dos temas abordados, por mais que alguns dos títulos já tenham sido publicados há duas décadas. Isto a torna uma coleção importante não apenas na universidade, mas também para além dos seus muros. “Por tratar desses temas (da História Social), ela dialoga muito com a sociedade civil, com os movimentos sociais, com as religiosidades. A coleção consegue esse espaço uma interlocução com um público bem mais amplo”, pontua Godoi.

Impacto da coleção e seu público

Não é tão simples medir o sucesso e impacto historiográfico de uma coleção como a Várias Histórias. Porém, alguns números podem dar uma ideia da dimensão alcançada pela coleção. 

O coordenador Rodrigo de Camargo de Godoi: Coleção é considerada um feito no mercado editorial brasileiro de Ciências Humanas
O coordenador Rodrigo de Camargo de Godoi: Coleção é considerada um feito no mercado editorial brasileiro de Ciências Humanas

“Temos vários indicativos da importância da Várias Histórias e de ela, de certa forma, ser considerada um feito no mercado editorial brasileiro de Ciências Humanas. Além da longevidade e do número de coletâneas, o número de resenhas é um indicativo. Em números absolutos, são 112 resenhas distribuídas tanto em jornais da grande imprensa quanto em revistas acadêmicas, especializadas e muito importantes tanto no Brasil quanto no exterior”, avalia o coordenador da coleção.

Outro indicativo da qualidade da coleção é sua adoção como leitura em cursos de graduação e pós-graduação de outras áreas do conhecimento, além, obviamente, da História. Muitos títulos, entre eles, Direitos e Justiças no Brasil: ensaios de História Social (org. de Joseli Maria Mendonça e Silvia Lara), se tornaram bibliografia em faculdades de Direito, por exemplo.

A coleção se destaca também por não ser destinada apenas para acadêmicos, uma vez que as obras são pensadas para que sejam lidas por um público diverso. “Uma pessoa não especializada, mas que gosta de livros e se interessa por temas importantes, como por exemplo a história da justiça do trabalho no Brasil, das lutas dos trabalhadores, da religiosidade, do racismo, da imprensa no Brasil. Então ela dialoga com temas importantes e que são candentes na sociedade brasileira hoje, em um momento em que vemos um ataque sistemático aos direitos que os trabalhadores conquistaram nas últimas décadas”, explica Godoi.

Entre muitos temas apresentados, recentemente foi inaugurada na coleção a temática sobre História Social da África com a obra Médicas-sacerdotisas: religiosidades ancestrais e contestação ao sul de Moçambique, de Jacimara Souza Santana, quadragésima sexta obra a compor a Várias Histórias. A quadragésima sétima, já em fase de produção, dá continuidade a esta temática com o título Margens e Oceanos: capítulos de história social da África, organizado pela professora Lucilene Reginaldo, do departamento de História da Unicamp, e pelo professor Roquinaldo Ferreira, da Universidade da Pensilvânia (EUA). A coletânea faz um balanço da produção historiográfica sobre a África produzida no Brasil, que tem um impacto muito grande neste campo de estudos.

Desafios em um país anticientífico

O Brasil, mas não apenas (é preciso ressaltar!), passa por um momento delicado no que se refere ao conhecimento científico. Negacionismo de dados científicos, de métodos, cortes nos orçamentos destinados às pesquisas, além de ataques difamatórios são alguns dos atuais inimigos da produção científica. E, neste contexto, as Humanidades são as áreas do conhecimento mais atacadas, uma vez que são as responsáveis por pensar a sociedade de forma crítica.

Soma-se a este cenário uma crise pela qual atravessa o mercado editorial. Neste cenário, quais os desafios que a Várias Histórias enfrenta?

Silvia Lara chama a atenção, com receio, para o panorama pelo qual passa o Brasil. “Neste ano, tudo isso foi agravado pelos ataques à ciência e à produção científica, promovidos por gente com projetos ideológicos autoritários, que hoje ocupa os postos de poder. E o desafio se tornou ainda mais candente. Os espaços institucionais estão sendo restringidos e as atividades acadêmicas mais corriqueiras estão cada vez mais sob forte risco de serem paralisadas; a censura ao livre pensamento (essencial para as Humanidades) está se disseminando por diversas instâncias, praticamente na mesma intensidade e ao mesmo tempo em que a crença em afirmações estapafúrdias são tomadas como verdades”.

Pelo contexto apresentado, a Várias História enfrenta um desafio que não se restringe somente a si, mas que é uma situação estendida para todo o conhecimento científico produzido no Brasil. “É o desafio da universidade brasileira, da produção de conhecimento histórico no Brasil, da continuidade da produção de Ciência no Brasil. A divulgação científica não fará sentido se não houver produção de Ciência. Neste momento, este não é o desafio apenas da Várias Histórias, mas é de todos nós”, completa Godoi.

Em meio a este horizonte de incertezas, a produção de conhecimento do Cecult continua enriquecendo a historiografia brasileira. Produzir Ciência, neste momento, é um ato de resistência.

É possível encontrar a Várias Histórias nas principais livrarias do Brasil e também no site da Editora da Unicamp.

Imagem de capa JU-online
Vinte anos de – mais que – Várias Histórias

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