Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 309 - 14 a 27 de novembro de 2005
Leia nesta edição
Capa
Prêmio Jovem Cientista
Novos paradigmas
Universidade latino-americana
Paulo Bobbio
Nas bancas
Pobreza rural
Painel da Semana
Teses
Livro da semana
Portal Unicamp
30 anos Proálcool
Gestão nas escolas do Estado
 

 

5

 

Outorga do título póstumo de professor emérito ocorrerá
em cerimônia a ser realizada dia 16 no Consu

O pioneiro Paulo Bobbio,
um entusiasta da pesquisa


MANUEL ALVES FILHO




N a seqüência, Paulo Bobbio na formatura do ginásio (1942), graduado na USP (1947), no mestrado nos EUA (1952) e em congresso (1996) (Foto: Acervo familiar)Em 1968, quando a Unicamp ainda começava a tomar forma, o engenheiro agrônomo André Tosello, então diretor da Faculdade de Tecnologia de Alimentos, um dos pilares do projeto do reitor Zeferino Vaz, convidou o químico Paulo Anna Bobbio para compor o quadro de docentes daquela unidade de ensino, hoje Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA). A escolha não poderia ter sido mais acertada. Durante cerca de 30 anos, Bobbio não economizou esforços e nem talento para ajudar a cumprir o objetivo dos pioneiros da Universidade, o de transformá-la numa instituição com alto grau de excelência. Em 2001, já aposentando, mas ainda atuando como professor voluntário, Bobbio adoeceu e morreu. Passados quatro anos, seu trabalho, que sempre foi considerado de alta qualidade, será definitivamente reconhecido por meio da outorga do título póstumo de professor emérito, em cerimônia marcada para o próximo dia 16 de novembro, na sala do Conselho Universitário.

Químico ingressou em 1968 na Unicamp

Paulistano, graduado pela USP, Bobbio cumpriu uma brilhante carreira acadêmica. Antes de aportar em Campinas, fez seus estudos de pós-graduação nas universidades de Ohio e Indiana, ambas nos Estados Unidos, sempre acompanhado da mulher, Florinda Bobbio, também química e atual professora voluntária da FEA. “Nós éramos da mesma turma na USP. Nós nos graduamos no mesmo dia. Também obtivemos o título de mestre na mesma data, ele pela manhã e eu à tarde. Estivemos sempre juntos. Ele veio para a Unicamp em 1968 e, um ano depois, eu também vim para cá”, conta a docente. De acordo com ela, o marido sempre foi um entusiasta da pesquisa.

A professora Florinda Bobbio: "Internado, com a saúde debilitada, Paulo ainda encontrou forças para receber uma aluna de pós-graduação" (Foto: Antoninho Perri)Na FEA, Bobbio implantou o Departamento de Ciência de Alimentos (DCA) e exerceu diversos cargos na Faculdade, como os de diretor associado e diretor interino. Também respondeu por diversas ocasiões pela presidência da Câmara Curricular e pela Comissão Central de Graduação. Durante nove anos, representou a FEA junto à Câmara Curricular. Foi, ainda, o idealizador de diversas disciplinas na área da Química. “Evidentemente que sou suspeita para falar do meu marido, mas ele de fato foi um excelente professor e pesquisador. Penso que a FEA e a Unicamp devem muito ao seu trabalho”, afirma a professora Florinda.

Conhecido por ser um professor extremamente exigente, Bobbio às vezes angariava a antipatia de alguns alunos, como reconhece a professora Florinda. Mas essa animosidade não durava muito tempo. “Esses mesmos estudantes tornavam-se, com o passar do tempo, amigos dele”. A dedicação de Bobbio ao ensino e à pesquisa pode ser entendida por um episódio ocorrido pouco antes de sua morte. Internado, com a saúde debilitada, ele ainda encontrou forças para receber uma aluna de pós-graduação que queria esclarecer algumas dúvidas. “Infelizmente, ele morreu antes da tese ser defendida. Eu assumi a orientação dessa aluna, que se saiu muito bem no trabalho”, recorda.

De acordo com o professor José Luiz Pereira, ex-aluno e amigo de Bobbio, autor da sugestão para que o antigo mestre recebesse o título póstumo de professor emérito, a demora para a conclusão do processo deveu-se a uma lamentável falha. “Eu fiz a proposta na mesma semana do falecimento do professor Bobbio. A sugestão foi posteriormente acatada pela Congregação da FEA, mas infelizmente não teve seqüência. Apenas recentemente descobri o problema, e assim os trâmites puderam seguir normalmente”, explica, acrescentando que a homenagem é mais do que merecida pelo conjunto da obra de Bobbio.

 

Um ícone da engenharia de alimentos

José Luiz Pereira


O professor Bobbio, como gostava de ser chamado, sem sombra de dúvidas, sempre foi um ícone na área de engenharia de alimentos no país. Formado em Química pela Universidade de São Paulo, iniciou sua carreira nos idos de 1954, como docente de Química da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz – USP. Em 1968 inicia suas atividades na então Faculdade de Tecnologia de Alimentos, hoje Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA), da qual foi um dos membros fundadores juntamente com André Tosello, Fumio Yokoya, Waldomiro Sgarbieri, Rute dos Santos Garruti, Ottilio Guernelli, entre outros.

Exerceu o cargo de diretor e diretor associado da Faculdade de Engenharia de Alimentos inúmeras vezes nos impedimentos dos representantes legais. Implantou o curso de pós-graduação da FEA, quando nomeado coordenador da pós-graduação. Por várias vezes foi chefe do Departamento de Ciência de Alimentos. Foi presidente da então Câmara Curricular, atual Comissão Central de Graduação, de 1972 a 1976 e até 1980 foi o representante da FEA junto à referida Câmara. Criou e idealizou várias disciplinas da área de Química nesta Faculdade.

Foi autor dos livros ”Química de Alimentos”, juntamente com sua esposa, professora Florinda, tidos hoje como referências a todos os cursos de Engenharia e Ciência de Alimentos no país e até mesmo no exterior. Isto é um resumo sucinto do que este professor realizou pela nossa Faculdade e pelo ensino na Unicamp. E por todos aqueles que por ele passaram, quer seja como alunos, colegas e amigos.

O professor Bobbio, sem dúvida, jamais será esquecido no meio científico e acadêmico, quer seja pelo conhecimento e experiência, quer seja pelo caráter peculiar; severo, exigente, justo e acima de tudo correto e honesto. Um amigo leal, seguidor incansável de princípios éticos e morais tão escassos nos dias atuais. Muitas vezes foi incompreendido, injustiçado e até mesmo perseguido por estas peculiaridades. Mas, se assim procedia com os outros, muito mais rigoroso era consigo mesmo.

Sinto-me à vontade e orgulhoso por estar aqui, escrevendo sobre o professor Bobbio. Saudoso pela ausência do mestre e amigo, pois tive o privilégio de compartilhar da amizade e da intimidade familiar com sua esposa, minha querida Flora, e sua filha Mônica, que infelizmente já não mais se encontra entre nós e, portanto, não pode desfrutar desta homenagem. Por estes momentos, pude constatar o quão especial foi o professor Bobbio. Um ser humano sensível, dedicado à arte da pintura (da qual sempre me proibiu de falar) e do cultivo de seus já famosos bonsais, sem falar de seus dotes de bom “gourmet”. Assim, atrás da aparência austera e séria estava um homem de caráter firme, sensível, emotivo, carinhoso e sempre disposto a atender um chamado, viesse de onde fosse.

Ao meu amigo Bobbio, como me pediu para chamá-lo fora da universidade, agradeço por tudo quanto me ensinou, não somente química, mas princípios éticos, respeito, honestidade e integridade, além do apoio em muitas situações difíceis de minha vida, pois foi através de suas mãos e conselhos que iniciei minha carreira na administração da FEA. Quando fui consultado pelo meu mestre, que também falava em nome de outros professores aos quais muito devo e respeito, para que incluísse o meu nome como postulante aos diversos cargos que muito me honraram, como chefe de Departamento, Coordenador da Comissão de Ensino de Graduação e diretor de Unidade, não pude recusar frente a tal desafio. Assim, sempre procurei seguir seus conselhos e ensinamentos, como exemplo de homem e professor, que para mim será sempre um paradigma de comportamento do ser humano.

José Luiz Pereira é professor da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp