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Investigações sobre causas e conseqüências da
doença envolvem cerca de 40 pesquisadores da FCM

A hipertensão arterial sob pressão

RAQUEL DO CARMO SANTOS

A pesquisadora Silvana Rocco, que sintetizou fármaco: testes iniciais demonstraram potencial para uso terapêutico  (Fotos: Antoninho Perri) Pelo menos 40 pesquisadores da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp (FCM) estão envolvidos em um grande esforço de pesquisa acerca da hipertensão arterial. Trata-se de um problema de saúde cuja importância pode ser dimensionada por sua alta prevalência – aproximadamente 25% da população brasileira – e pela gravidade de suas complicações mais recorrentes, entre as quais a insuficiência renal, a insuficiência cardíaca e o derrame cerebral. Os estudos vão desde a busca de marcadores genéticos, passam por investigações sobre modelos comportamentais e de hábitos, e chegam até o desenvolvimento de drogas capazes de atenuar os efeitos da doença.

As atividades, coordenadas pelo professor Kleber Franchini, estão se desenvolvendo de maneira integrada em diversas unidades da instituição, entre as quais o Ambulatório de Hipertensão Arterial do Hospital das Clínicas (HC), e laboratórios de pesquisa dos departamentos de Clínica Médica, Enfermagem e Patologia Clínica da FCM. Integram também o grupo os professores Wilson Nadruz Júnior, Maria Cecília Gallani, Roberta Colombo e Célia Garlip, todos da FCM.

“A hipertensão arterial é uma doença multifatorial que aparece em conseqüência do agrupamento, no portador, de fatores herdados e comportamentais, como o estresse, sedentarismo, dieta com excesso de sal, alcoolismo, entre outras. É ‘democrática’. Não respeita classe social, gênero ou raça, além de ter pouco ou nenhum sintoma”, diz Franchini, que coordena o Laboratório de Fisiopatologia Cardiovascular.

Doença atinge 25% da população brasileira


O médico Kleber Franchini, docente da FCM e coordenador das pesquisas: "A hipertensão não respeita classe social, gênero ou raça" Segundo o especialista, por estar sujeito a complicações graves e por necessitar de tratamento medicamentoso permanente em conjunto com modificação do comportamento e de hábitos de vida, o paciente hipertenso precisa de atendimento de equipe multi-profissional. “A atuação conjunta de profissionais de diferentes áreas favorece o ensino e a pesquisa em suas diversas modalidades”, enfatiza o docente.

“Os três pilares das atividades profissionais da universidade pública – o ensino, a assistência e a pesquisa – são exercidos no trabalho desenvolvido pelo grupo”, destaca Franchini. Segundo ele, este é um dos aspectos que pautam a qualidade do grupo. No ensino, as atividades abrangem a formação de alunos de graduação, residentes, pós-graduandos e estagiários, além de orientação e treinamento de profissionais da rede pública de saúde.

No campo da pesquisa, o especialista atesta o reconhecimento da comunidade científica nacional e internacional na contribuição do grupo para o entendimento de mecanismos fundamentais envolvidos nas alterações das células cardíacas durante o desenvolvimento da insuficiência cardíaca causada pela hipertensão arterial. Franchini observa que o grupo descreveu, em uma série de trabalhos, publicados entre os anos de 2000 e 2006, a dinâmica da enzima quinase de adesão focal no coração, cuja atividade acelera o quadro de hipertrofia e também pode contribuir para a evolução da insuficiência cardíaca.

Nutricionista durante experimento no Laboratório de  Fisiopatologia Cardiovascular: esforço de pesquisaO especialista explica que, na hipertensão arterial, as células do coração são sobrecarregadas pelo aumento da pressão e, em resposta, transformam-se, aumentando de tamanho, em processo conhecido como hipertrofia. “A hipertrofia é a semente para a insuficiência cardíaca. Verificamos que a enzima quinase de adesão focal é um dos principais mediadores do processo de hipertrofia decorrente do excesso de carga mecânica, bem como os mecanismos intermediários pelos quais a hiperatividade desta enzima regula a expressão de genes nas células cardíacas”, explica.

De acordo com Franchini, a compreensão dos mecanismos moleculares acionados pelo excesso de carga mecânica nas células cardíacas pode resultar no desenvolvimento de novos medicamentos direcionados para o tratamento de indivíduos com hipertensão arterial e insuficiência cardíaca.

Não por acaso, no Laboratório de Fisiopatologia Cardiovascular, são conduzidos atualmente estudos de desenvolvimento de fármacos. Eles são destinados, entre outros fins, ao tratamento da insuficiência cardíaca, uma das principais complicações da hipertensão arterial. Os fármacos em questão, cujos testes iniciais demonstraram potencial para uso terapêutico, foram planejados e sintetizados pela pesquisadora Silvana Rocco, associada ao grupo. O pedido de patente já foi registrado.

O médico Wilson Nadruz Júnior, docente da FCM e coordenador do Laboratório de Biologia Cardiovascular: "Os dados da pesquisa experimental foram essenciais"Os cientistas estão trabalhando, no momento, em estudos de toxicologia para avaliar a possibilidade de utilização em seres humanos. Todo o processo conta com o financiamento de uma indústria farmacêutica com a qual foi firmado convênio de desenvolvimento.

Assistência – Transpor os resultados da pesquisa para o atendimento ao paciente hipertenso é um dos objetivos da equipe. Nesse contexto, observa Franchini, as pesquisas de cunho mais básico têm um processo de maturação mais longo. Outras, como aquelas relacionadas ao estudo de fatores que influenciam no comportamento e nos hábitos de vida da população, que é o foco da atividade de pesquisa coordenada pela professora Maria Cecília Gallani, ou às relacionadas aos fatores hereditários, como é o caso dos estudos conduzidos pelo professor Wilson Nadruz Júnior, têm o potencial de serem aplicadas mais prontamente.

Ainda neste contexto, observa Franchini, a aplicação do conhecimento gerado pelo grupo tem o potencial de melhorar os resultados do tratamento dos pacientes hipertensos. A identificação nos estudos coordenados pela professora Maria Cecília Gallani, por exemplo, de que os temperos industrializados são os principais determinantes do excesso de sal na dieta dos pacientes, determinou modificação na orientação da dieta preconizada. “Estamos avaliando os efeitos desta nova orientação”.

Em busca dos marcadores genéticos

A médica Maria Lílian Sales,  autora da primeira pesquisa sobre marcadores genéticos feita com pacientes: resultados publicados em revista internacionalAs pesquisas realizadas no Laboratório de Biologia Cardiovascular e no Ambulatório de Hipertensão perseguem um único objetivo: identificar marcadores genéticos que predispõem o indivíduo a desenvolver lesões em órgãos do corpo, uma das principais causas de morte nos pacientes hipertensos.

“Ninguém morre de pressão arterial alta. A mortalidade é decorrente das lesões conseqüentes do aumento crônico de pressão sobre as artérias, os rins e o coração. Elas levam às insuficiências cardíaca e renal, ao infarto do miocárdio e ao acidente vascular cerebral (AVC). Se conseguirmos identificar as variantes ou polimorfismos gênicos associados ao maior desenvolvimento destas complicações, aumentam sensivelmente as chances de atuar no sentido preventivo dessas lesões e frear as complicações”, destaca o médico Wilson Nadruz Júnior, docente da FCM e coordenador do Laboratório de Biologia Cardiovascular. Números mostram que a hipertensão arterial é a causa de até 50% das mortes por infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral e insuficiência cardíaca.

O organismo humano possui milhões de genes, sendo que em cada um deles podem ocorrer centenas de variações. Por isso, o trabalho desenvolvido pela equipe não é tarefa das mais fáceis. Todo o conhecimento científico gerado ao longo de nove anos, com os experimentos em animais, permite que as pesquisas avancem para os estudos em humanos. “Os dados da pesquisa experimental foram essenciais, pois no estudo com pacientes partimos de informações obtidas por meio de estudos com ratos, camundongos e cultura de célula”, explica o médico.

A primeira pesquisa sobre marcadores genéticos envolvendo pacientes do Ambulatório de Hipertensão foi desenvolvida pela médica Maria Lílian Sales, orientada pelo próprio Nadruz, com 200 pacientes hipertensos e 70 normotensos do HC. O artigo será publicado em uma revista científica na área de hipertensão, o Journal of Human Hipertension.

Maria Lílian investigou um polimorfismo do gene que codifica a proteína P22-PHOX, a qual nas observações em animais revelou relação direta com o aumento da produção de radicais livres de oxigênio e também com um quadro de hipertrofia cardíaca. Este polimorfismo, conhecido como -930A/G, está associado à maior expressão de P22-PHOX e à maior produção de radicais livres em hipertensos. Com isso, a questão que os pesquisadores queriam responder era se a presença desta variante gênica também estaria relacionada com maior prevalência de lesões em órgão-alvo.

Como em ciência nem tudo é trivial ou se mostra lógico, os resultados da pesquisa foram negativos. As suspeitas de se conseguir identificar uma das variações dos genes ou polimorfismo propícios para o desenvolvimento de lesões não se consolidaram. Mesmo assim, o estudo trouxe outras perspectivas, pois se consegue eliminar uma das possibilidades e oferece informações novas. “Este fator é fundamental, pois se estamos perseguindo uma pista, eliminar as suposições é um avanço significativo. Na questão terapêutica, por exemplo, permite propor tratamentos mais ou menos agressivos e influencia a necessidade de exames mais específicos”, explica Maria Lílian.

O estudo inédito realizado com a P22 trouxe o ganho da padronização e metodologias específicas para se trabalhar com experimentos em humanos. Os exames realizados nos pacientes para análise são exatamente aqueles de rotina. Por isso, não há necessidade de expor o indivíduo a avaliações mais complexas. Um equipamento, adquirido por meio de financiamento da Fapesp, o ecocardiógrafo, possibilitou analisar a estrutura e funções do coração de forma mais específica.

O próximo passo será ampliar o espectro de pacientes estudados e o número de variantes dos genes. Maria Lílian prossegue analisando as variantes genéticas que codificam uma proteína denominada quinase de adesão focal.

Segundo Wilson Nadruz, as pesquisas em humanos de variantes genéticas da quinase de adesão focal estão totalmente em aberto. Vem daí a expectativa da equipe. Segundo o médico, a análise exigirá uma população mínima de mais de 500 pacientes hipertensos.

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