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Imagens que valem ouro
 

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Paisagens da Patagônia: objeto de trabalhos prévios em geologia e grande potencial mineralógico (Fotos: Fernando Diego Ducart)

Imagens que valem ouro

MANUEL ALVES FILHO

O professor Álvaro Crosta, coordenador do projeto: procedimentos complexos (Foto: Antoninho Perri)Num passado não muito distante, quando o geólogo saía em busca de uma jazida mineral, sua única alternativa era ir a campo e gastar muita sola de botina para encontrar elementos que lhe dessem alguma indicação de que poderia existir, por exemplo, reservas de ouro ou de cobre no subsolo de um dado local. Graças ao sensoriamento remoto, porém, esse esforço tende a ser gradativamente menor. Pesquisadores da Unicamp vêm desenvolvendo tecnologias de uso de imagens de satélite para identificar locais onde há maior probabilidade da ocorrência de depósitos desses e de outros minerais. Atualmente, os cientistas estão aplicando a tecnologia para mapear áreas localizadas na Cordilheira dos Andes e na Patagônia Argentina, com resultados muito satisfatórios. O projeto de pesquisa, que caminha para a sua fase final, servirá para validar a metodologia desenvolvida pelos especialistas da Universidade, que mais tarde serão aplicadas também na busca de jazidas minerais em partes do território brasileiro.

Financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), o projeto é conduzido por uma equipe do Instituto de Geociências (IG) da Unicamp, coordenada pelo professor Álvaro Penteado Crósta e composta também pelo professor Carlos Roberto de Souza Filho e pelo estudante de pós-graduação Diego Fernando Ducart. De maneira bastante simplificada, os pesquisadores procuram extrair o máximo possível das imagens geradas por satélite, de modo a facilitar a busca por jazidas minerais, que vão de metais, como ouro e cobre, ao petróleo. Explicado dessa forma, o trabalho parece corriqueiro. Na prática, entretanto, ele envolve uma série de procedimentos extremamente complexos. Uma ferramenta fundamental para alcançar os objetivos traçados pelos cientistas é, obviamente, a imagem de satélite.

O sensoriamento remoto não aponta a ocorrência de uma jazida, mas oferece evidências de sua existênciaA equipe da Unicamp vem usando imagens geradas pelo satélite Terra, lançado pela Nasa, a Agência Espacial Americana, em 1999. O equipamento é dotado de um sensor denominado ASTER (sigla de Advanced Spacerborne Thermal Emission Reflection Radiometer), que possui 14 bandas espectrais, distribuídas entre as faixas visíveis ao olho humano e as invisíveis, que pertencem ao infravermelho. Algumas dessas bandas têm capacidade de identificar os espectros dos minerais presentes no solo terrestre, a partir da reflexão da radiação solar. Classificados tecnicamente como minerais de alteração hidrotermal, eles recebem esse nome porque foram formados, há milhares ou até mesmo milhões de anos, pela ação das águas que brotavam do interior do planeta a altíssimas temperaturas, em decorrência de processos vulcânicos.

Essas águas quentes, explica o professor Álvaro Crósta, circula entre as rochas do subsolo, dissolvendo e transportando vários metais. Em zonas mais próximas à superfície, essas soluções de alta temperatura reagem com as rochas existentes e produzem novos minerais, chamados então de minerais de alteração hidrotermal. Nesses mesmos locais são geralmente depositados, de forma concentrada, os metais que se encontravam em solução. Ou seja, a presença dos minerais de alteração num determinado local oferece uma boa pista de que ali pode haver uma jazida metálica, muitas vezes com possibilidade de aproveitamento comercial.

Pois bem, ao identificar as faixas de luz invisíveis ao olho humano, os pesquisadores do IG transformam esses espectros em imagens digitais coloridas, que são posteriormente sobrepostas a imagens em preto e branco, feitas pelo mesmo satélite. Assim, são gerados mapas que identificam, por meio de diferentes cores, a localização exata de cada mineral de alteração. Este documento serve para orientar a decisão das mineradoras sobre prosseguir ou não com trabalhos mais detalhados de exploração.

De posse desse mapa, esclarece o professor do IG, as empresas podem enviar seus técnicos a campo para coletar amostras de rochas nos lugares indicados pelo sensoriamento remoto. O objetivo é verificar, por meio de análises geoquímicas, se elas contêm o metal desejado, numa proporção que justifique o investimento na sua extração. “Anteriormente, a avaliação que precede esta etapa era muito restrita, em vista dos altos custos envolvidos em percorrer grandes distâncias e cobrir regiões inteiras. Além disso, muitos dos locais com possibilidade de ocorrência de jazidas são remotos e de difícil acesso. Com o uso do sensoriamento remoto, essas dificuldades são bastante minimizadas”, afirma o professor do IG.

O professor Álvaro Crósta esclarece que os pesquisadores optaram por desenvolver os estudos na Patagônia e no Peru porque estas áreas foram objeto de estudos anteriores de seu grupo de pesquisa, havendo portanto uma base de conhecimentos acumulada. Ademais, existia a disposição de empresas locais de colaborar com o projeto, fornecendo infraestrutura e auxílio nos trabalhos de campo. Por último, as duas regiões escolhidas para a investigação estão relacionadas à Cordilheira dos Andes, que apresenta grande potencial mineral. “São áreas cujas condições reais oferecem um cenário muito próximo do ideal para que a metodologia seja testada e validada”, acrescenta. Na Patagônia e no Peru, o interesse do setor produtivo recai sobre o ouro e o cobre, respectivamente.

O professor Álvaro Crósta adverte que o sensoriamento remoto, embora seja valioso para orientar a exploração mineral, não aponta diretamente a ocorrência de uma jazida, mas oferece evidências de locais onde ela possa existir. Essa metodologia desenvolvida pela Unicamp para a Cordilheira dos Andes também não tem condições de ser aplicada, por exemplo, em regiões com vasta vegetação, como é o caso da Amazônia. Isso porque a floresta impediria que o sensor remoto, a bordo de um satélite, registrasse a “assinatura” espectral dos minerais de alteração hidrotermal.

“Na Amazônia, as imagens de sensoriamento remoto podem ser usadas na busca de jazidas minerais, mas com outras abordagens metodológicas e sempre combinadas com outros tipos de informações, como os dados aerogeofísicos”, diz o pesquisador, mencionando ainda que essa é outra das áreas de pesquisa de seu grupo na Universidade. “Mas em áreas em que a vegetação é esparsa e sobre as quais temos pouco conhecimento geológico, como partes das regiões Centro-Oeste e Nordeste do Brasil, o mapeamento de minerais de alteração hidrotermal por sensoriamento remoto pode ser empregado sem dificuldades. Tanto é assim que nosso grupo já está iniciando um projeto no Nordeste, mais especificamente no Rio Grande do Norte”, revela.

Segundo ele, o sensoriamento remoto ainda poder servir para procurar evidências indiretas da existência de outros tipos de jazidas minerais, como petróleo e gás natural. Embora essas substâncias não sejam encontradas na superfície, a ferramenta tem como identificar minerais presentes no solo que foram alterados por causa do contato com o gás ou o petróleo que estão no subsolo. Além disso, as imagens do satélite também conseguem detectar áreas de vegetação que foram igualmente alteradas pela ação desses compostos orgânicos.

Os estudos que estão sendo desenvolvidos pelos pesquisadores do IG, afirma o professor Álvaro Crósta, estão no mesmo nível dos realizados em países como Canadá, Estados Unidos e Austrália, considerados os mais avançados nesse setor. “Graças à excelência da pesquisa nessa área, o Instituto tem formado profissionais de altíssima qualidade, que têm sido aproveitados por grandes empresas brasileiras, como a Vale do Rio Doce e a Petrobrás, além de empresas estrangeiras de mineração”, diz. O grupo já publicou dois artigos com os resultados dessa pesquisa em revistas internacionais e outros dois devem ser publicados brevemente.

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