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Engenheiro analisa a segurança
e a saúde do trabalhador do lixo
Autor de tese sugere medidas que podem
ser implantadas em empresas e municípios

CARMO GALLO NETTO

Os problemas oriundos do acúmulo de lixo nas sociedades modernas têm sensibilizado cada vez mais as comunidades preocupadas com sua coleta, aproveitamento e descarte. O despertar da consciência social para a importância dessa atividade começa a suscitar também interesse pela situação dos trabalhadores envolvidos no ciclo do lixo. O filme Lixo Extraordinário, que concorreu ao Oscar na categoria de documentário, resgata aspectos humanos dessas pessoas. Adotando outra vertente, o engenheiro civil Luiz Carlos Alves da Luz, baseado em estudo de casos, analisou a segurança e a saúde dos trabalhadores dos serviços de limpeza urbana. Rea­lizado com base em dados colhidos principalmente na cidade de Campo Grande (MS), e Penápolis (SP), o trabalho originou tese de doutorado orientada pela professora Eglé Novaes Teixeira, da área de concentração em saneamento e ambiente da Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC) da Unicamp.

Graduado pela Unesp de Ilha Solteira, natural de Sud Mennucci, interior do estado, o pesquisador, que residia em Andradina já no doutorado, se envolveu tanto com o tema que, selecionado, em concurso passou a trabalhar na área de gestão de resíduo sólido na prefeitura municipal de Mirassol. Em 2007, já mais adiantado na pesquisa, foi aprovado em concurso do Ministério Público da União, tendo sido lotado no Ministério Público do Trabalho, em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, onde atua como perito na área de engenharia de segurança do trabalho

A pesquisa avalia a segurança e a saúde dos trabalhadores da limpeza urbana envolvidos com serviços de varrição de vias e logradouros, coleta, tratamento e disposição final de resíduos sólidos de origem residencial, comercial e de atividades relacionadas à área da saúde. O estudo das condições de trabalho nos dois municípios selecionados foi realizado em duas empresas privadas e uma empresa pública desses segmentos, além de uma cooperativa de trabalhadores onde são realizados serviços de segregação e venda de materiais recicláveis. Além do acompanhamento dos serviços foram entrevistados 230 empregados. Um questionário também foi encaminhado às empresas nas quais foram ainda levantadas notificações de acidentes de trabalho. O pesquisador valeu-se também de dados sobre acidentes e condições de trabalho obtidos junto a instituições ligadas à proteção da segurança e saúde do trabalhador, no caso Ministério Público do Trabalho e Ministério do Trabalho e Emprego.

As entrevistas visaram verificar as doenças e acidentes mais frequentes, levantar o perfil dos trabalhadores e estabelecer um mapa de conforto corporal que permite determinar, ao final de uma jornada de trabalho, as partes do corpo mais vulneráveis e suscetíveis a desconfortos e dores.

A obtenção dos dados referentes à limpeza urbana e respectivos trabalhadores demandaram acompanhamento dos serviços de varrição; das coletas de resíduos sólidos de origem residencial, comercial e de atividades de saúde; da triagem e venda de material reciclável; do trabalho em unidades de tratamento de resíduos decorrentes das atividades de saúde (autoclavagem); das atividades nas unidades de disposição final de resíduo solido de origem residencial, comercial e de serviços de saúde (aterro sanitário e aterro controlado); entrevistas com os trabalhadores de limpeza urbana; e elaboração de mapas de conforto corporal.

Cruzando os dados obtidos e com base nos problemas identificados em trabalho de campo, o autor relaciona em um substancial conjunto de tabelas e gráficos os principais problemas identificados nos serviços de limpeza urbana e apresenta sugestões que podem vir a ser implementadas por municípios e empresas com vista à adoção de sistemas de trabalho que garantam melhores condições de segurança e saúde desses trabalhadores para, inclusive, auxiliar o Ministério Público do Trabalho.

Luz diz que na verdade pretendeu avaliar as condições de trabalho dos envolvidos nos serviços de limpeza urbana, identificando agravantes em termos de segurança e saúde, principalmente em relação à coleta de lixo, varrição de ruas, operação de aterros sanitário e controlado. Propôs-se ainda a examinar os dispositivos legais, normas e legislações existentes que se aplicam à proteção desses trabalhadores e verificar suas suficiências e obediências.

Sistemática
Os dados relativos a acidentes, doenças e conforto corporal foram dispostos em gráficos e tabelas organizadas por setor de atividade que, relacionadas às demais informações disponíveis, permitiram ao autor concluir que fatores relacionados às atividades geram efeitos indesejáveis.

Como exemplo, Luz lembra que na coleta do lixo a maior parte dos acidentes é causada por objetos cortantes ou perfurantes, como cacos de vidro, o que revela o mau acondicionamento de resíduos por uma população não suficientemente esclarecida. Para ele, a maior parte dos problemas encontrados não envolve apenas responsabilidade dos trabalhadores quanto à obediência aos padrões de segurança impostos pelas empresas ou condições oferecidas por elas. Além da falta de conscientização da população, os acidentes estão ligados também a questões de responsabilidade da municipalidade: ruas esburacadas ou sem pavimentação, ou mesmo sem guias ou sarjetas, que interferem danosamente nas condições de trabalho.

No caso dos varredores, ele constatou que o formato da pá utilizada, o comprimento do seu cabo, a altura do carrinho que recebe o resíduo, a falta de tampa que leva o trabalhador a respirar as emanações provenientes do lixo, e rodas de plástico que aumentam o ruído, são fatores que causam desconforto e afetam a saúde do trabalhador.

Na coleta de lixo hospitalar, ele identificou falta de cuidados dos geradores em relação ao abrigo externo do resíduo destinado à coleta, que muitas vezes não obedece à legislação quanto aos revestimentos de piso e paredes e demais condições de higienização, além de excesso de volume armazenado, fatores que dificultam ou impedem a coleta mecânica ou obrigam o trabalhador a contato direto com os materiais descartados em situações não satisfatórias de higiene ou de acondicionamento.

Em condomínios, ele localizou abrigos inadequados ao processo de recolhimento, situação agravada pelo mau acondicionamento do lixo e até com sacos com peso incompatível. Para Luz, esses problemas, além de revelar despreparo das comunidades, são agravados pela falta de fiscalização das prefeituras: “Existem normas que não são cumpridas e nem fiscalizadas e algumas outras se mostraram de adoção necessária”.

Constatações
O autor da tese constatou que os trabalhadores da limpeza urbana, principalmente varredores, não dispõem na maior parte das vezes de sanitários e locais para refeição. Propõe que ao longo dos trechos de varrição sanitários químicos e unidades compactas fixas (destinadas à higienização de mãos e braços e realização das refeições) sejam instaladas pelas empresas para uso exclusivo deles. Outra proposta é a utilização de unidades móveis – caso de ônibus com sanitários e providos de sistemas de cobertura retrátil sob as quais pudessem ser dispostas mesas e cadeiras para as refeições.

Em aterros sanitários e aterros controlados, verificou que as frentes de serviços ficam em geral muito distantes das áreas de vivência onde se encontram sanitários e locais para refeições. Nesses casos, propõe a instalação de sanitários nos aterros.

O pesquisador lembra que um dos objetivos do trabalho foi o de verificar a suficiência dos dispositivos legais existentes na proteção adequada dos trabalhadores envolvidos com situações de risco. “Chegamos à conclusão que eles de fato são suficientes, embora revestidos de caráter geral. Acredito que a elaboração de uma norma regulamentadora específica para a questão de saneamento envolvendo resíduos sólidos acarretaria o estabelecimento de condições melhores para os trabalhadores em termos de segurança e saúde”.

Ele enfatiza que a coleta e a industrialização de resíduos sólidos não correspondem a uma atividade normal e são consideradas insalubres em grau máximo pelo Ministério do Trabalho e Emprego. Os serviços de limpeza urbana estão sujeitos à regra da continuidade, não podem parar e precisam ser realizados com qualquer tempo, pois tem implicações com a saúde pública. Ele considera que estes fatos “justificam” a criação de uma norma específica para o trabalho com resíduos sólidos, pois as normas gerais que já existem acabam tendo sua aplicabilidade comprometida. Para ele, essa atividade precisa ser mais valorizada inclusive do ponto de vista da legislação, pois envolve pessoas submetidas diariamente a situações muito particulares e constantes intempéries.

Conclusões
Entre as inúmeras conclusões que alinhava ao final do trabalho ele enfatiza que as contribuições para possíveis alterações nos atuais instrumentos reguladores visam a diminuir o número de acidentes e doenças do trabalho nos serviços de limpeza urbana.
No que tange às características ou condições dos ambientes de trabalho, afirma que nas atividades de coleta domiciliar e de varrição de vias e de logradouros públicos algumas potencializam riscos de acidentes ou doenças. Entre elas destaca tráfego urbano, pavimentação e conservação de vias públicas e grau de conscientização da população para a questão de resíduos sólidos.

Na coleta domiciliar, considera que a quantidade e características de suportes destinados à disposição temporária do resíduo, além do estado de conservação dos abrigos externos de resíduo, contribuem para a ocorrência de acidentes e doenças do trabalho.

Com relação a alguns riscos de acidentes com coletores de resíduo sólido e varredores, o pesquisador entende que algumas ações preventivas devem envolver a administração pública e a população em geral, principalmente no que se refere a condições das vias de acesso e abrigo externo de resíduo, suportes para disposição de resíduo e suas formas de acondicionamento.

Para ele, coletores de resíduo sólido e varredores são os mais sujeitos às intempéries, enquanto o trabalho de varredores é dificultado pela falta de lixeiras em locais com grande circulação de pedestres e agravado pelo seu inadequado estado de conservação.

Na coleta de resíduo sólido de serviços de saúde ele aponta diversos fatores que potencializam os riscos de acidentes e doenças com os coletores, tais como desinteresse dos geradores com relação à construção e à manutenção do abrigo externo em conformidade com a legislação pertinente; falta de manutenção de equipamentos como contêineres; acondicionamento inadequado do resíduo em função de suas características.

Por fim, Luiz da Luz alinhava os principais riscos nas diversas atividades dos serviços de limpeza urbana. Entre os físicos menciona calor, ruídos e vibrações a que são submetidos principalmente os operadores de máquinas; nos químicos, destaca produtos contidos no resíduo e poeiras minerais; aos biológicos atribui a presença de microorganismos no resíduo; entre os ergonômicos situa posturas inadequadas devidas à utilização de máquinas, equipamentos e mobiliários; e considera dentre os riscos de acidentes a existência de material perfurante ou cortante no resíduo sólido, além de quedas de alturas e de estribos de veículos.

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Publicação
Tese de doutorado:
“Segurança e saúde do trabalhador em serviços de limpeza pública: estudo de casos”.
Autor: Luiz Carlos Alves da Luz
Orientadora: Eglé Novaes Teixeira
Unidade: Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC)
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