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Número de cotistas aumenta 91% em cinco anos na Unicamp

A lei das cotas étnico-raciais alterou drasticamente o perfil demográfico da população acadêmica na Unicamp

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A lei das cotas étnico-raciais (Lei 12.711/12) – que deverá passar por revisão no Congresso no segundo semestre deste ano – alterou drasticamente o perfil demográfico da população acadêmica na Unicamp. De acordo com dados da Diretoria Acadêmica, o número de estudantes pretos, pardos e indígenas cresceu 91% nos últimos cinco anos na Universidade.

Em 2017, quando a lei foi implementada pelo Conselho Universitário (Consu), a Unicamp registrou a matrícula de 30.264 alunos nos cursos de Graduação e Pós-Graduação. Destes, 4.484 se autodeclararam pretos, pardos e indígenas – o equivalente a 14,8% do total de matriculados. Em 2022, esse grupo conta com 8.575 estudantes  – ou 26,5% do total de matriculados.

 

Em 2017, a Unicamp aprovou os mecanismos que flexibilizaram o ingresso nos seus cursos de graduação, adotando sistema de cotas étnico-raciais e a criação do Vestibular Indígena
Em 2017, a Unicamp aprovou os mecanismos que flexibilizaram o ingresso nos seus cursos de graduação, adotando sistema de cotas étnico-raciais e a criação do Vestibular Indígena 

Já os alunos indígenas compunham 0,22% do total de matriculados na Unicamp em 2017. Este ano esse grupo representa 1,2% dos alunos. Os autodeclarados pretos passaram de 2,84% há cinco anos para 5,84% agora.

 

Candidatos chegam para provas do Vestibular Indígena 2022
Candidatos chegam para provas do Vestibular Indígena 2022

Se forem computadas apenas as matrículas na Graduação, em 2017, esse grupo ocupava 17% do total das vagas. Hoje, o grupo representa 29,3% do total.

A população de alunos autodeclarados pardos cresceu 76% nos cinco anos. Saiu de 3.560 pessoas em 2017, e agora já soma 6.301. Hoje, essa parcela de estudantes é 19,49% do total. Há cinco anos era 11,76%.

O número de alunos que aparecem entre os não declarados – que não informaram cor – diminuiu de forma significativa nos últimos cinco anos. Foram de 7.149 em 2017 para 3.396 agora.

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“A política de cotas implementada pela Unicamp é dinâmica, pois permite que, no vestibular, um candidato concorra tanto às vagas de cotas quanto às de ampla concorrência. Ela tem se mostrado um mecanismo muito importante para inclusão de jovens negros na universidade, em especial aqueles oriundos de escolas públicas”, avalia o professor Rafael Maia, coordenador de pesquisa da Comissão para os Vestibulares Unicamp (Comvest). “Entre 2016 e 2018, anos que antecedem a implementação da política, ingressaram por ano cerca de 22% de jovens autodeclarados pretos ou pardos. Nos anos seguintes, entre 2019 e 2022, essa porcentagem ficou acima de 28%, sendo que em 2019 alcançou a marca de 35% dos ingressantes”, diz ele.

 

A política de cotas tem se mostrado um mecanismo muito importante para inclusão de jovens negros na universidade, em especial aqueles oriundos de escolas públicas. Na foto alunos ingressantes do curso de Matemática da Unicamp no último vestibular
A política de cotas tem se mostrado um mecanismo muito importante para inclusão de jovens negros na universidade, em especial aqueles oriundos de escolas públicas. Na foto alunos ingressantes do curso de Matemática da Unicamp no último vestibular

Permanência – Para o pró-reitor de graduação, professor Ivan Toro, o processo de inclusão adotado pela Unicamp tem sido muito positivo. Entretanto, segundo ele, não adianta incluir os alunos sem uma política forte de permanência. “A inclusão só acontece se conseguirmos manter o aluno aqui. Imagine como pode ser ruim se ele se vê obrigado a abandonar o curso um ou dois anos depois”, questiona. Ele lembra que a Universidade oferece moradia, bolsa moradia; bolsas sociais, bolsa alimentação (ou subsídio à alimentação), transporte, trabalho e, em alguns casos, computadores ou tablets para os alunos mais vulneráveis do ponto de vista econômico. Os alunos da Unicamp também têm acesso a serviços de saúde e de atendimento psicológico via SAPPE (Serviço de Assistência Psicológica e Psiquiátrica ao Estudante). Ainda segundo o pró-reitor, em 2022, a Unicamp prevê investimentos de R$ 101 milhões em políticas de inclusão.

A Lei de Cotas foi sancionada em agosto de 2012. Ela garante a reserva de 50% das matrículas por curso e turno nas universidades federais e nos institutos federais de educação, ciência e tecnologia a alunos oriundos integralmente do ensino médio público, em cursos regulares ou da educação de jovens e adultos. “A política de cotas é um sucesso”, avalia o senador Paulo Paim (PT-RS), autor do projeto que deu origem à Lei e um dos poucos senadores negros no país atualmente. Ele lembra que, segundo dados do Censo do Ensino Superior, em 1997, apenas 1,8% dos jovens pretos e pardos frequentavam algum curso superior no País.  “Entre 2010 e 2019, o número de alunos negros no ensino superior cresceu quase 400%. Do total de matriculados, 38,15% são negros”, afirma ele. “Mas ainda é um índice baixo para a população negra, que corresponde a 56% da população brasileira, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística)”, adverte o senador.

Sancionada em 2012, Lei de Cotas vai passar por revisão esse ano no Congresso Nacional
Sancionada em 2012, Lei de Cotas vai passar por revisão esse ano no Congresso Nacional

Este ano a Lei das Cotas deverá passar por sua primeira avaliação e ao menos 35 projetos sobre o tema tramitam no Congresso (Câmara e Senado). Uma das propostas prevê adiar a revisão por mais dez anos. Outro projeto defende a reavaliação do texto apenas em 50 anos. Há propostas tanto de ampliação quanto de redução do alcance da política, mas há também um projeto que prevê a extinção pura e simples do sistema.

Paim também é autor de um projeto de lei que organiza a revisão da Lei das Cotas. Nele a avaliação deve acontecer a cada dez anos e, se a proporção de pretos, pardos e indígenas na universidade for inferior à proporção verificada na população do Estado onde é implementada, a política de cotas é mantida até a próxima avaliação. Caso a proporção esteja de acordo com o perfil étnico-racial do Estado, a política pode ser suspensa depois de cinco anos.

Se a Lei não for revista este ano, ela não perde a vigência. No entanto, Paim faz um alerta: “Diante do cenário político de retrocesso que vivemos no Brasil, indico retardar qualquer tipo de debate que possibilite a alteração da legislação”, diz ele.

Aprimoramentos - Para o senador, apesar de consolidada, a lei precisa de aprimoramentos. Por conta disso, ele apresentou um projeto que trata da permanência estudantil prevendo assistência a estudantes em situação de vulnerabilidade socioeconômica e, em vista disso, define regras para moradia, alimentação, transporte, atenção à saúde e apoio pedagógico. O projeto disciplina ainda a participação e aprendizagem de estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento ou os de altas habilidades e superdotação. No momento, a proposta está na Comissão de Educação, Cultura e Esportes do Senado.

Festival das cotas - A União Estadual de Estudantes (UEE) de São Paulo planeja uma série de atividades a partir de agosto – no retorno do recesso de meio de ano – em defesa da manutenção da Lei de Cotas. No dia 13 de agosto acontece o “Festival das Cotas” – com uma série de debates sobre o sistema. A ideia do festival é que, além de participar das discussões, os alunos cotistas possam expor trabalhos, divulgar pesquisas, apresentar projetos desenvolvidos. “Queremos mostrar o trabalho desses alunos, tanto dos universitários, quanto dos alunos das escolas técnicas”, diz a diretora de comunicação da UEE, Vick Matos.

A programação também inclui apresentações de artistas e bandas. O Festival deverá acontecer provavelmente na Universidade Zumbi dos Palmares, em São Paulo, mas a UEE garante que haverá mobilização em favor das cotas em várias outras universidades paulistas – entre elas, a Unicamp.

Imagem de capa JU-online
Audiodescrição: Em uma praça ao anoitecer, imagem frontal e à curta distância de 2 pessoas sentadas em banco de concreto, sendo um homem, à esquerda da imagem, que mantém os braços apoiados sobre as pernas, com mãos unidas à frente, e uma mulher com as pernas cruzadas sobre o banco, e braços apoiados sobre as pernas, com mãos unidas à frente. Atrás deles há outros bancos e mesas de concreto com pessoas sentadas. Ambos usam máscara de proteção respiratória e camiseta regata. Imagem 1 de 1.

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