| Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 344 -20 a 26 de novembro de 2006
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Centro de Engenharia Biomédica apresenta
versão compacta, barata e sem similares nacionais

Equipamento mede cálcio no coração

CARMO GALLO NETTO

Diogo Soriano com o equipamento no Laboratório de Pesquisa Cardiovascular (Foto: Antoninho Perri)Um equipamento que permite determinar a concentração de cálcio nas células do músculo cardíaco foi desenvolvido por pesquisadores do Laboratório de Pesquisa Cardiovascular do Centro de Engenharia Biomédica (CEB) da Unicamp. O transporte de cálcio é fundamental para o funcionamento do coração. O equipamento é o segundo de uma linha em desenvolvimento pela equipe, que é pioneira no país, e pode ser utilizado para medir a variação da concentração de cálcio em outros tipos de células em que este íon desempenha papel primordial nas suas funções.

Dispositivo possibilita avaliar
o íon em outras
células

O cálcio, na forma iônica (Ca2+), participa do controle de uma série de processos fisiológicos do organismo, como divisão celular, liberação de neurotransmissores e hormônios, secreção, transcrição genética, morte celular programada e até respiração celular, entre outras. No coração, este íon é essencial, desde a geração e modulação da atividade elétrica, até o disparo do processo de contração que permite o bombeamento de sangue para a circulação. A excitação elétrica atua como gatilho para a contração, e o aumento da concentração intracelular de Ca2+ constitui o elo entre os dois fenômenos.

Detalhe do dispositivo que permite determinar a concentração de cálcio nas células do músculo cardíaco (Foto: Antoninho Perri)No entanto, é importante que o balanço seja adequado, pois a baixa concentração de Ca2+ prejudica a atividade contrátil do coração, enquanto que a sobrecarga pode levar à morte celular. A cada batimento, a concentração do íon no citoplasma da célula aumenta cerca de 10 vezes (o que dispara a contração e bombeamento do sangue) e, a seguir, cai para seu nível de repouso (o que permite que o músculo cardíaco relaxe e o coração seja preenchido com sangue que será bombeado no próximo batimento).

Esta variação da concentração citoplasmática do íon é conhecida como transiente de Ca2+. O transiente ocorre pela atuação de proteínas, que não só transportam parte do cálcio para dentro e fora das células, mas também entre compartimentos intracelulares. Assim, o transiente de Ca2+ controla o ciclo da contração, determinando tanto a força desenvolvida pelo músculo cardíaco, como a duração da contração.

O projeto – No Laboratório de Pesquisa Cardiovascular (LPCv), os professores José Wilson Magalhães Bassani, do Departamento de Engenharia Biomédica da Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (FEEC), e Rosana Almada Bassani, pesquisadora do CEB, têm desenvolvido métodos e técnicas para estudar o transporte de cálcio e sua relação com a contração em células cardíacas isoladas, bem como projetado e desenvolvido equipamentos e dispositivos que permitam essas medições. José Wilson Bassini tem formação em Ciência da Computação, fez mestrado e doutorado na Engenharia Elétrica e sempre trabalhou com Engenharia Biomédica. Rosana é bióloga, mestre em Ciências Biológicas e doutora em Ciências pela USP.

Orientado pelos dois professores, o mestrando Diogo Coutinho Soriano, engenheiro eletricista pela FEEC, desenvolveu um instrumento simplificado de microfluorimetria que permite quantificar de forma simultânea, em células cardíacas isoladas, o curso temporal da concentração de cálcio e o encurtamento celular (isto é, a contração da célula). Para tanto, ele utilizou um indicador de Ca2+ que, uma vez no interior da célula e sob excitação luminosa adequada, emite luz cuja intensidade está relacionada com a concentração do íon nas células.

Existem vários indicadores de Ca2+. Diogo Soriano utilizou o Fluo-3, um tipo de molécula que entra nas células isoladas do coração. Essas moléculas são excitadas por uma fonte luminosa (LED) e emitem a luz cuja intensidade é tanto maior quanto maior for a concentração do íon interagindo com o indicador. A diferença entre o comprimento de onda da luz incidente e o da luz emitida permite a medição com baixo ruído e também a quantificação da concentração dos íons Ca2+ no interior das células.

“Este dispositivo serve a todo pesquisador que precise de uma ferramenta para medir o transiente de cálcio em qualquer célula na qual haja variação da concentração intracelular do íon, e não apenas células cardíacas”, diz o professor Bassani. Segundo ele, o equipamento promete ser de grande utilidade para os estudiosos da fisiologia celular, já que muitos deles, por falta de recursos, não se detêm no papel do cálcio e poderiam passar a fazê-lo. O CEB desenvolveu o dispositivo a um custo cerca de dez vezes menor do que o importado, quando não existem similares nacionais. O pesquisador acredita que empresas brasileiras também podem fabricá-lo a um preço razoável, embora não tenham ainda detectado o potencial do mercado.

O equipamento – “Montamos um microscópio invertido simplificado, preservando algumas de suas características funcionais, e acoplamos a ele uma fonte de luz muito mais barata, utilizando um LED emissor de azul. A iluminação escolhida e o modo de construção do microscópio tornam o equipamento compacto e de baixo preço”, reitera Bassani. O professor ressalta outra vantagem, nem sempre encontrada nos equipamentos importados. “É a possibilidade de se medir simultaneamente o encurtamento da célula, que pode ser observada ao mesmo tempo em um monitor, e sem interferência na medição do Ca2+. Nos equipamentos importados, esta simultaneidade só é conseguida com acessórios de custo elevado”.

O desenvolvimento do dispositivo exigiu do mestrando Diogo Soriano o aprendizado de processos fisicoquímicos, biofísicos e fisiológicos. Ele próprio realizou todos os experimentos com as células e, com o uso de conceitos das ciências exatas, como óptica, mecânica, eletrônica e computação, conseguiu chegar a um protótipo funcional e devidamente testado. O trabalho recebeu apoio da Fapesp e do CNPq, e de um total de 180 pesquisas, foi um dos cinco selecionados como finalistas ao prêmio Cândido Pinto de Melo pela Comissão Cientifica do Congresso Brasileiro de Engenharia Biomédica (CBEB), que ocorreu em outubro passado na cidade de São Pedro (SP).

O coração como alvo

O professor José Wilson Bassani (Foto: Antoninho Perri)Vários métodos criados por pesquisadores do Laboratório de Pesquisa Cardiovascular do CEB começam a ser aplicados para o entendimento de patologias sérias do coração e, embora não seja o foco, também para o desenvolvimento de medicamentos. “No momento em que nos deparamos com a necessidade de resolver um problema, nós da engenharia biomédica, que já adquirimos background relacionado ao entendimento da função celular, vamos a campo em busca de um instrumento que ajude a resolvê-lo. No caso do equipamento desenvolvido por Diogo Soriano, nosso interesse estava no processo de regulação do Ca2+ no coração. Construímos uma ferramenta para continuidade e melhoria da capacidade de pesquisa nesta área”, explica o professor José Wilson Magalhães Bassani.

Resultados obtidos pela equipe do LPCv têm sido publicados em importantes revistas científicas, como American Journal of Physiology, Biophysical Journal e Journal of Physiology (London). Dados publicados este ano pela American Heart Association mostram que, em 2003, as doenças cardíacas foram responsáveis por aproximadamente 37% das mortes ocorridas nos Estados Unidos, e que elas estão matando cada vez mais precocemente. Na opinião de Bassani, se essas doenças representam um sério problema de saúde pública nos países desenvolvidos, não há razão para acreditar que o quadro no Brasil seja diferente, visto que também somos submetidos a fatores que agravam e predispõem aos males cardíacos, como estresse, sedentarismo, obesidade e fumo, sem falar nas precárias condições de vida da maioria da população.

Esse contexto torna fundamentais um melhor entendimento do sistema cardiovascular e o dimensionamento dos parâmetros de normalidade, com o objetivo de viabilizar tratamentos cada vez mais eficientes na prática clínica. José Wilson Bassani afirma que, a partir do desenvolvimento de métodos para estudar a fisiologia, se tem conseguido desenvolver estratégias, medicamentos e procedimentos que assegurem boas condições de vida aos portadores de doenças cardíacas, fazendo com que estas se tornem menos ameaçadoras.

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