| Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU |Edição 344 - 20 a 26 de novembro de 2006
Leia nesta edição
Capa
Opinião: 10 anos de Cemarx
Renda do brasileiro
Morfologia do trabalho
Retrato dos ex-alunos
'Unicamp Ventures'
Reencontro festivo
Adubo
Convivência em sala de aula
Espaço midiático
Maturação sexual
Coração
Saúde da Região Metropolitana
Painel da semana
Teses
Livro da semana
Longevidade empresarial
Vinho
 

3

Dados da Pnad de 2005 apontam para uma redução
histórica do número de miseráveis no país

Aumento da renda do brasileiro
surpreende mas também intriga

Banca no Mercado Municipal de Campinas: Pnad indica que parcela importante da população passou a assegurar renda para adquirir itens básicos da alimentação (Fotos: Antoninho Perri)Faltando dez dias para o primeiro turno das eleições de 2006, o Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas (FGV) anunciava que o período 2003-2005 registrou a maior queda do nível de pobreza no Brasil em dez anos. O estudo intitulado Miséria, desigualdade e estabilidade: O segundo Real foi baseado nos dados de 2005 da Pesquisa Nacional de Amostragem por Domicílio (Pnad) do IBGE. A notícia, repercutida pela mídia, virou destaque em vários sites de campanha política, como por exemplo, do Diretório Nacional do PT, do candidato a governador Olívio do Dutra e do candidato a deputado federal e ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci.

Professor não vê fatores para salto de 8,28% na renda total

De acordo com o estudo da FGV, a miséria, que atingia 28,2% da população brasileira em 2003, caiu de forma expressiva para 22,7% em 2005. O coordenador da pesquisa, Marcelo Néri, explicava esta redução da pobreza com fatores como o reajuste real do salário mínimo, a retomada da oferta de empregos, os programas de redistribuição de renda e a expansão dos gastos previdenciários. A comparação com o Plano Real, sugerida no título do estudo, deve-se ao fato de que, entre 1993 e 1995, o índice de miseráveis foi reduzido de 35,3% para 28,8%. Pelos cálculos de Néri, de 1993 para cá, o Brasil já atingiu a “meta do milênio” de reduzir a miséria à metade, o que estava previsto somente para 2015.

Waldir Quadros, do Cesit: pé atrás diante da festejada redução da misériaOs dados surpreendentes de 2005 levaram analistas a adotar o termo “Pnad chinesa”, em referência à potência emergente oriental onde 300 milhões de pessoas estão saindo da extrema pobreza. Contudo, embora esta Pnad efetivamente sustente tais análises, o professor Waldir José de Quadros, do Instituto de Economia (IE) da Unicamp, mantém um pé atrás. Aposentado como docente, mas em plena atividade como pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit), ele esperou a passagem das eleições para apontar alguns índices que considera intrigantes.

A pesquisa de 2005 mostra um salto espantoso de 8,28% na renda total captada pela Pnad, quando o PIB cresceu apenas 2,28%. Se puxarmos os números dos anos anteriores, veremos sempre uma certa relação da renda total com a variação do PIB – a exemplo de 2004, quando a renda da Pnad aumentou 4,57% e o produto interno bruto, 4,94%. De onde sai esta renda que vai para as pessoas, se não for do PIB? Para mim, este aumento da renda de mais de 8% é difícil de entender, ao contrário do que ocorre na China, onde o PIB tem crescido 10% ano”, compara o professor.

Na opinião do pesquisador do Cesit, o governo pode ter tributado e transferido muita renda no ano passado, mas não nesta magnitude. “O ano de 2005 apresentou alguns efeitos positivos que explicariam em parte esta elevação na renda total, como o reajuste do salário mínimo de 8,5% acima da inflação, os dissídios coletivos – que nas categorias mais fortes resultaram em aumentos reais nos salários de 1,5%, 2% e até 2,5% –, o certo crescimento do número de postos de trabalho no mercado formal, além da pequena mas positiva evolução do PIB. Mas, a meu ver, é muito complicado explicar a magnitude do aumento da renda total por este conjunto de fatores. Francamente, eu não consigo entender”, argumenta.

Da mesma forma, chama a atenção de Waldir Quadros que a renda média do conjunto dos declarantes tenha crescido 5,16% em 2005, uma taxa totalmente fora do padrão dos últimos anos: + 0,57% em 2001, – 3,15% em 2002, – 7,40% em 2003 e + 0,83% em 2004. “Ocorre então a mesma pergunta: de onde vem isso?”, questiona.

O pesquisador lembra que a Pnad repercute em inúmeras análises do cenário social e econômico e, por isso, teme a possibilidade de alguma inconsistência na metodologia da pesquisa, embora o IBGE negue que tenha promovido qualquer mudança nesse sentido (leia texto na página). “Estes dados e o cenário que apontam caem como uma luva para aqueles que argumentam que o país não precisa crescer para reduzir a desigualdade, ou seja, o contrário do que apregoamos”.

Escala social – Waldir Quadros é autor de uma metodologia que permitiu retratar com clareza, por exemplo, o grande tombo que a classe média levou na escada social nestes últimos anos – tema de matérias recentes do Jornal da Unicamp. Em seus estudos, o pesquisador do Cesit constata uma redução da proporção de miseráveis no país ainda mais expressiva do que a anunciada pela FGV, e maior não apenas em relação ao Plano Real, mas também ao Plano Cruzado de 1986, o que contextualiza seu espanto com o cenário de 2005 num período de duas décadas.

“Esses números da Pnad refletem uma melhora nunca vista em relação à população miserável, maior do que aconteceu no Cruzado, quando houve o congelamento, a queda abrupta da inflação e um aumento da renda devido também a um abono de 8% no salário mínimo. Naquele período, em 1986, a renda média que era de 700 reais [cruzados convertidos e deflacionados] explodiu a 1.250, embora seja verdade que tudo tenha vindo abaixo depois”, assinala Waldir Quadros.

É este comportamento totalmente atípico que leva o professor a estranhar quadro e a se dispor, agora, a dissecar os dados da Pnad transportando-os para sua metodologia. “Vamos fazer todo o mapeamento que a Pnad permite, mas não sei se vou ter explicações para esse fantástico aumento de renda em 2005. De qualquer forma, vamos nos preparar para analisar a Pnad de 2006, quando foi maior o reajuste do salário mínimo e a inflação ficou baixa”.

IBGE nega mudanças na metodologia

Não houve alterações na metodologia da Pesquisa Nacional de Amostragem por Domicílio (Pnad) de 2005, segundo a consultora Vanderli dos Santos Guerra, da Coordenação de Trabalho e Rendimento (Coren) – subordinada à Diretoria de Pesquisas do IBGE. Vanderli é uma das responsáveis pelo texto e pelas análises do documento sobre a Pnad disponibilizado no site do IBGE. Segundo o relatório, em 2005, o nível de inflação foi mais baixo do que no ano anterior e houve crescimento em segmentos importantes da economia, embora alguns fatores adversos tenham afetado o setor da agroindústria. Ainda de acordo com o documento, na distribuição das remunerações de trabalho, constatou-se crescimento real em todos os segmentos.

A Coren diz no relatório que um fator que influenciou positivamente na elevação dos rendimentos da faixa da metade inferior das distribuições dos rendimentos de todas as fontes de trabalho foi o aumento real de 9,9% no salário mínimo, segundo cálculo do órgão. O aumento um pouco maior nesta metade inferior provocou pequena queda na concentração das remunerações, contribuindo para a lenta tendência de declínio na concentração dos rendimentos. O documento atesta que embora a remuneração média real das pessoas com rendimento de trabalho, em 2005, tenha apresentado ganho real em relação à do anterior, ainda teve perda real de 15,1% em relação a esse rendimento de 1996, ano em que alcançou seu ponto máximo desde o início da década de 1990.

 


SALA DE IMPRENSA - © 1994-2006 Universidade Estadual de Campinas / Assessoria de Imprensa
E-mail: imprensa@unicamp.br - Cidade Universitária "Zeferino Vaz" Barão Geraldo - Campinas - SP