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Beleza clonada

Formação de embriões somáticos no ápice de um segmento foliar de Oncidium flexuosum Sims cultivado in vitro (Foto: Divulgação)Verdes, amarelas, rosas, brancas, roxas, vermelhas. As orquídeas não passam despercebidas, nem aos olhos menos atentos. Além de serem muito procuradas por sua beleza, elas também são muito empregadas hoje como plantas de vaso e como flores de corte. A espécime em si é perene – a cada ano emite novos brotos. Combina tanto com a decoração de uma casa quanto de uma festa e é tão durável que é capaz de acompanhar, em longevidade, os seus colecionadores no decorrer de suas vidas. A bióloga Juliana Mayer soma no quintal de sua casa cerca de 200 espécies. Foi justamente ali que juntou experiência para lidar com as diferenças de cada uma, sempre ficando estimulada quando novas plantas são conquistadas. O hobby é compartilhado com o marido. Ela lembra que são 24,5 mil espécies de orquídeas no mundo, distribuídas em cerca de 850 gêneros.

Nas horas vagas, orquidófila; e, nas horas de trabalho, pesquisadora da Unicamp. Nem assim Juliana Mayer perde de vista as orquídeas. No doutorado – recém-defendido no Instituto de Biologia (IB) da Unicamp – estudou-as sob o prisma da propagação vegetativa, mediante a clonagem. Por outro lado, também foi seu foco analisar a reprodução sexuada da espécie Oncidium flexuosum Sims (Orchidaceae), chamada “chuva de ouro”. Uma das contribuições da bió­loga foi estabelecer um protocolo de micropropagação a partir do segmento da folha de Oncidium flexuosum Sims, para a formação de embriões ou PLBs (protocorm like body), a fim de auxiliar no atendimento da demanda e nos programas de melhoramento.

Plantas clonadas mantidas in vitro em meio de cultura desenvolvendo folhas e raízes (Foto: Divulgação)A clonagem, feita a partir de folhas, não é um procedimento corriqueiro no Brasil para as orquídeas, mas comum para outras plantas. A sua vantagem, destaca Mayer, é que ela permite ter um método não-destrutivo, pois em geral a clonagem de orquídeas é efetuada através de meristema – com a planta já adulta. Existem poucos estudos na área e o que distingue o de Mayer dos outros é que o gênero Oncidium tem sido bastante pesquisado nos últimos anos, porém com mais ênfase para a seleção de cultivares. Na última década, espécies do gênero estão sendo muito empregadas como flor de corte. Mas, para “obter” este produto o ano inteiro, seria necessário “ter” plantas que florescessem o ano inteiro.

Pesquisadores brasileiros, relata Mayer, estudam dois cultivares domesticados conhecidos como O. flexuosum: um que floresce na primavera, em torno de novembro e dezembro, e outro que inicia floração no outono, entre abril e agosto. Devido à demanda de flores de corte, está se realizando o cruzamento dessas plantas com o objetivo de produzir cultivares que floresçam entre esses períodos. “O protocolo que desenvolvemos poderá ser utilizado para a clonagem de plantas selecionadas e permitir a produção de plantas que floresçam o ano todo”, revela.

O trabalho in vitro de Mayer foi desenvolvido em parceria com o pesquisador Giulio Stancato, do Centro de Horticultura do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), e os estudos anatômicos foram realizados no Laboratório de Anatomia Vegetal da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (Esalq) da Universidade de São Paulo (USP). A tese de doutorado teve orientação da professora da USP Beatriz Appezzato-da-Glória.

Experimentos

Origem dos embriões somáticos de Oncidium flexuosum Sims a partir de intensas divisões celulares (Foto: Divulgação)Como Mayer pretendia trabalhar em laboratório com as Oncidium, seu primeiro passo foi desenvolver estas plantas in vitro, por meio da inoculação das sementes em meio de cultura, promovendo a limpeza de seus frutos com hipoclorito de sódio. “É curioso que estas sementes equivalem, em tamanho, a minúsculos grãos de areia, atingindo micrômetros. E, neste particular, nas orquídeas não somente as flores são diferentes. A planta toda possui estruturas características”, descreve. O fruto produz muitas sementes e a dispersão delas, explica, é feita pelo vento.

No primeiro capítulo da tese, Mayer desenvolveu o protocolo de micropropagação. Ela colocou as sementes para germinarem e se desenvolverem, a fim de obter as plantas. Delas foram retirados segmentos de folhas, de aproximadamente 0,5 cm de comprimento, os quais foram introduzidos em outro meio de cultura, desta vez incrementado com diferentes hormônios em várias concentrações – objetivando a obtenção de embriões somáticos, denominados protocormoides, ou PLBs.

Aspecto geral da inflorescência de Oncidium flexuosum Sims (Foto: Divulgação)Cada planta requer condições específicas para o desenvolvimento de embriões somáticos in vitro e a intenção da pesquisadora foi encontrar a melhor concentração e combinação de hormônios no meio de cultura para a formação desses embriões.

Para entender como ocorre a formação e o desenvolvimento desses embriões, Mayer lançou mão de estudos anatômicos e morfológicos, abordados no capítulo dois da sua tese. “Analisamos o desenvolvimento desses embriões formados a partir das folhas e comparamos com o dos embriões zigóticos, que são obtidos a partir da reprodução sexuada e que estão contidos no interior das sementes.”

Já no capítulo três, com a colaboração da professora Sandra Carmello-Guerreiro, do Departamento de Botânica do IB da Unicamp, Mayer acompanhou todas as etapas do desenvolvimento das sementes e dos frutos: desde a polinização à formação do fruto até a sua deiscência, quando acontece a liberação das sementes. Nessa espécie, conforme a bióloga, o desenvolvimento do fruto é muito ágil – em três meses são obtidas as sementes. Normalmente, para a maioria das espécies de orquídeas, como as Cattleya – ou catleias –, leva-se até um ano para ocorrer a deiscência do fruto. Esse também foi um dos motivos da escolha de espécie do gênero Oncidium, por se desenvolver com maior rapidez.

Desenvolvimento dos embriões somáticos globulares formados a partir de segmentos foliares de Oncidium flexuosum Sims mantidos in vitro (Foto: Divulgação)Mayer concluiu que foi possível produzir embriões a partir de folha. “Desenvolvemos um protocolo simples e eficiente para regeneração de embriões dos ápices foliares, uma vez que 80% regeneraram cerca de 30 embriões por explante (segmento de folha ou qualquer parte da planta que é inoculada in vitro). Posteriormente, esses embriões se desenvolveram em plantas. Algumas delas já foram retiradas do ambiente in vitro e aclimatizadas (adaptadas ao ambiente externo). “A aclimatização é feita em um ambiente mais úmido, permitindo a posteriori plantá-las em vasos individuais definitivos, onde crescerão”, conta.

Por meio das análises anatômicas, a pesquisadora observou que as células das camadas epidérmica e subepidérmica da face adaxial (face voltada para cima) passam a se dividir com rapidez e formam diretamente os embriões. “No nosso caso, não ocorreu a formação de uma fase intermediária denominada calo. Foi uma regeneração direta. O nosso interesse era descobrir a origem e se a regeneração era direta ou indireta. Concluímos que era direta”, esclarece a pesquisadora.

Cuidados

A bióloga Juliana Mayer, autora da tese: estabelecendo um protocolo de micropropagação a partir do segmento de folha (Foto: Antoninho Perri)O primeiro contato de Mayer com as orquídeas foi trivial, já adulta, cursando Biologia na Universidade Federal do Paraná (UFPR), em Curitiba, onde residia. Como participou de diversos trabalhos de campo, que tinham como objetivo tornar a formação dos alunos mais próxima da realidade, a pesquisadora passou a estudar o tema em profundidade e a obter para si espécies tanto brasileiras como exóticas. E a coleção ia aumentando mais. Muito comuns de serem encontradas nas Centrais de Abastecimento de Campinas (Ceasa), as orquídeas são a causa de muitos passeios ao local, onde os visitantes ganham acesso aos produtores, os quais vendem as plantas envasadas. Para a bióloga, há anos este tem sido um “programão” de sábado.

Mayer montou um telado no quintal de sua casa e, como a planta é rústica, logo percebeu que ela não precisava de demasiados cuidados. Necessário mesmo, atesta ela, é que seja colocada em locais onde receba luz indireta e seja mantida debaixo de um sombrite (com 50% a 70% de proteção). A irrigação, com pouca água, é recomendada apenas quando não chove por mais de uma semana. “É aconselhável deixar em nebulização com os aspersores por cerca de 10 minutos, pela manhã. Umidade excessiva pode ser prejudicial, pois as raízes são atacadas por fungos ou por caramujos. Os vasos também não devem ser mantidos em cima de pratos. A água precisa escoar, para uma boa drenagem e ventilação”, ensina. Salienta que tais medidas são suficientes, embora reconhecendo que algumas plantas exigem cuidados especiais.

 

De casa ao laboratório

Para as plantas, a clonagem é algo que ocorre naturalmente, mas este processo pode ser induzido pelo homem. Uma das técnicas utilizadas é a propagação in vitro, na qual a produção de mudas é obtida a partir de partes da planta (folha, raiz ou gema) ou mesmo de um pequeno conjunto de células. As plantas a serem clonadas são escolhidas entre as melhores exemplares dentro da espécie que contenham as características de interesse, como época de floração, tamanho, cor e forma da flor, resistência a doenças, etc.

Uma pessoa que possui uma planta medicinal ou ornamental em casa, por exemplo, e que deseja oferecer uma muda para sua vizinha, poderá simplesmente arrancar um ramo, colocando-o para enraizar. Em geral, pode pegar um potinho com água, como no caso de uma violeta, da qual é tirada uma folha, colocando-a no recipiente. “Após enraizar, a estaca é plantada e surge uma nova planta”, informa. “Isso é clonagem, pois a nova planta é geneticamente idêntica à planta que cedeu o ramo.”

A clonagem mais elaborada é feita em laboratório. “Nos nossos experimentos, ao invés de ser retirada uma estaca para enraizar, utiliza-se um segmento de folha e o coloca no meio de cultura in vitro, com hormônio, para induzir a formação de embriões. Trata-se de um simples pedaço de 0,5 cm. Desta forma não se promove a perda das características das plantas. Muito pelo contrário. A ideia é justamente manter estas características iguais”, revela a bióloga.

O interesse na produção de orquídeas in vitro de modo geral, tanto a partir da clonagem como a partir da germinação de sementes, é conseguir colocá-las no mercado a um preço acessível e com boa qualidade. Assim, evita-se a sua retirada da mata e a venda de plantas na beira da estrada, além de propiciar a sua disseminação, enfatiza Mayer.

 

Artigos:
MAYER, Juliana Lischka Sampaio; CARDOSO-GUSTAVSON, Poliana; APPEZZATO-DA-GLÓRIA, B. Colleters in monocots: new record for Orchidaceae”. Trabalho com aceite na Flora Elsevier, vol. 206 (3), 2011.
MAYER, Juliana Lischka Sampaio; STANCATO, Giulio Cesare; APPEZZATO-DA-GLÓRIA, B. Direct regeneration of Protocorm-Like Bodies (PLBs) in leaf apex of Oncidium flexuosum Sims (Orchidaceae)”. Fase de correções na Plant Cell, Tissue and Organ Culture.

Publicação: Tese de doutorado “Diferentes abordagens do processo de propagação de Oncidium flexuosum Sims (Orchidaceae)”

Autora: Juliana Lischka Sampaio Mayer

Orientadores: Beatriz Appezzato-da-Glória e Giulio Cesare Stancato

Unidade: Instituto de Biologia (IB)

Financiamento: CNPq

 

 
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