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Campinas, maio de 2001 - ANO XV - N. 162.........
     
   
 

..Come-se o que se planta
Alimento orgânico vem conquistando consumidor exigente, mas popularização esbarra no preço alto e baixa produtividade

MARIA ALICE DA CRUZ

uma terra “em que se plantando tudo dá” é preciso saber o que se planta, como se planta, o que se come. Os alimentos orgânicos vêm conquistando um mercado exigente, como reflexo dos impactos causados pela agricultura convencional – degradação do meio ambiente e a redução de mão-de-obra e de subsídios estatais.

Produtos ecologicamente corretos são o que o consumidor procura cada vez mais, constata Adalberto Azevedo, auxiliar técnico de pesquisa no Núcleo de Estudos da População (Nepo) da Unicamp, em seu estudo sobre as atividades agrícolas sustentáveis praticadas na Divisão Regional Agrícola de Campinas. Com financiamento do CNPq, ele investigou as recentes mudanças nos padrões de desenvolvimento tecnológico e seus efeitos ambientais e sociais.

O pesquisador afirma que os produtos da agricultura orgânica são os mais indicados para quem quer uma alimentação saudável, pois dispensam a utilização de agroquímicos. A fertilização do solo é feita com adubo natural, produzido a partir de leguminosas, como a crotalária, esterco de origem animal e micronutrientes orgânicos. A infestação de ervas invasoras, as daninhas, é controlada com a inserção de predadores naturais dessas ervas nas lavouras e manutenção do solo coberto com restos vegetais. Insetos, pragas e doenças são controlados com a aplicação de extratos naturais de plantas que atuam como inseticidas e fungicidas, entre outros meios inofensivos à natureza, ao consumidor e ao agricultor.

Pessoas em busca de uma dieta saudável, contudo, também precisam atentar para o fato de que é pequena diferença entre as técnicas utilizadas para garantir a higiene dos produtos hidropônicos e aquelas da agricultura convencional. Confundidas com alimentos orgânicos, as hortaliças hidropônicas têm necessariamente de receber fertilizantes químicos para se desenvolver, uma vez que são plantadas fora de seu ambiente natural, em tubos plásticos, por onde circula água continuamente. Esta água recebe ingredientes químicos para nutri-la, o que foge completamente do conceito de cultivo orgânico.

Preço alto – Mas não é somente a falta de informação que afasta grande parte da população do mercado de orgânicos. Segundo Azevedo, o consumidor esbarra em outro obstáculo a ser resolvido pelos pequenos produtores: o alto preço desses alimentos. Seus preços são, em média, 40% maiores que os dos produtos convencionais; o trigo chega a custar 200% acima, e o açúcar, 170%.

A produção em larga escala levaria à diminuição dos preços, mas ainda não se consegue atender à demanda. Em pesquisa realizada na região de Vargem Grande, Cotia e São Roque, no interior paulista, a professora Maria Alice Garcia, do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp, questiona a sustentabilidade da técnica orgânica, à medida que não atinge, até o momento, a população regional. A pesquisadora constatou que os produtos estão restritos a uma elite, além serem direcionados primordialmente para a rede de supermercados da cidade de São Paulo.
Entre os fatores que encarecem esses alimentos está a perda de capital sofrida pelo pequeno agricultor com o tempo de descontaminação do solo, uma exigência das agências certificadoras de Agricultura Natural de Campinas (ANC), visando à obtenção do certificado de garantia. O tempo de descontaminação é de 12 meses, o que faz com que o agricultor só recupere o investimento dois anos depois de introduzir seus produtos no mercado. “Torna-se difícil atender à demanda logo nos primeiros anos”, afirma Azevedo.

Mão-de-obra – Outra justificativa para o custo elevado é o suposto aumento de mão-de-obra. Para Maria Alice, porém, é um argumento que não procede. Em sua pesquisa de campo, ela observou que a agricultura orgânica não exige, necessariamente, mais trabalhadores que a convencional. Depende da cultura e do conhecimento que o agricultor utiliza para manejar seu sistema.“A aplicação de herbicidas nem sempre implica redução de mão-de-obra, especialmente em horticultura. O preço alto, na verdade, é fixado como um prêmio ao produtor por não estar usando agrotóxicos. E também porque a oferta ainda é menor que a demanda”, afirma.

Adalberto Azevedo, por seu lado, prevê uma mudança no perfil do consumidor, já que o mercado mostra um crescimento em nível mundial. Segundo dados que ele coletou na Coordenadoria de Assistência Técnica Integrada (Cati) de Campinas, a cidade de São Paulo, sozinha, tem um potencial de consumo de US$ 5 milhões anuais. Na década de 90, o mercado brasileiro de produtos orgânicos cresceu 50% ao ano. A área plantada é de 100 mil hectares, para uma receita de US$ 150 milhões. O consumo interno responde por US$ 20 milhões desse total; o restante é obtido com exportações para países como Alemanha, França e Japão. Pelo ranking da certificadora Farm Verified Organic (FVO), dos Estados Unidos, o Brasil é o 34º colocado na produção mundial de orgânicos e o segundo na América Latina.

O International Trade Center (ITC) aponta como maiores produtores de orgânicos os Estados Unidos, Europa e Japão. A taxa de crescimento anual das vendas no varejo, que há quatro anos era de apenas 1%, ultrapassou 10% em 2000. No continente europeu, esse aumento é de 25% ao ano, com uma área de cultivo 25 vezes maior que a do Brasil. Em escala mundial, a produção orgânica rende US$ 23 bilhões anuais e o mercado cresce em torno de 18% ao ano. A Europa é responsável por 23,6% da produção do planeta.

O Programa Brasil Empreendedor Rural, do Ministério da Agricultura e Abastecimento, prevê maior apoio do governo para a agricultura sustentável. O Banco do Brasil e o Banco do Nordeste disponibilizam linhas de crédito para o cultivo de orgânicos. Um convênio entre o Instituto Biodinâmico de Botucatu e a Associação de Agricultura Orgânica de São Paulo viabiliza o certificado de procedência exigido pelos bancos para concessão do crédito. Esses recursos destinam-se a custeio, investimento e comercialização da safra.

 

 

AUTONOMIA PARA O AGRICULTOR

Com a adoção da cultura orgânica ganha o agricultor, o empregado rural, o consumidor e a natureza. O lençol freático passa a ser poupado da contaminação por produtos químicos que escorrem na água utilizada para irrigação da lavoura convencional.

Qualidade ambiental significa diminuição do risco de doenças.A fixação da população no campo, por meio da geração de empregos, é outro efeito benéfico, segundo a pesquisa do administrador público Adalberto Azevedo. Na sua opinião, o emprego perdido com o avanço tecnológico pode ser reconquistado com a produção de orgânicos em maior escala.

O agricultor reconquista sua autonomia, pelo pleno conhecimento de seu trabalho e pela possibilidade de comercializar diretamente o produto. Azevedo afirma que 50% dos pequenos produtores que decidiram investir no cultivo orgânico negociam sua safra sem a presença de intermediários. Dele é o lucro, assim como a consciência sobre a hora certa para o plantio, controle biológico e colheita.

A professora Maria Alice Garcia defende a produção voltada para o público interno. Ela observa que grande parte dos orgânicos é comercializada na Grande São Paulo e hoje busca-se a exportação para a Europa. As fontes consultadas por Azevedo também revelaram crescimento da exportação brasileira, principalmente para a Argentina. Mas, nas expectativas do pesquisador, essa negociação é que pode estimular a oferta de trabalho, pela própria necessidade do aumento da produção, e possibilitar o atendimento da demanda regional. “Se queremos alimentar o mundo com produtos saudáveis, precisamos pensar em agricultura de larga escala, mesmo que sejam pequenos produtores”, finaliza Maria Alice

 


 
 
 

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