| Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição Temática 402 - 14 de julho a 2 de agosto de 2008
Leia nesta edição
Capa
Opinião
A receita do equilíbrio
Palha e bagaço
Uma meta a cumprir
Produtividade com baixo impacto
Terapia em construção
Adensar para manter o verde
Cientista não é biopirata
Muito além do ativismo
O futuro humano
Uma equação que não fecha
A corda e a caçamba
A chave do tamanho
Percepção pública da ciência
Amplo painel
Novas leituras do consumo
O espaço do indeterminado
O estranho íntimo
 


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Sobre a percepção pública da ciência

CLAYTON LEVY

O professor Carlos Vogt, coordenador do Labjor e secretário estadual de Ensino Superior: "Indicadores representam um aparato para a tomada de decisões públicas" (Fotos: Antoninho Perri)Os moradores do Estado de São Paulo se interessam mais por Ciência e Tecnologia do que por outros temas de destaque abordados pelos veículos de comunicação de massa, como Política e Economia. A conclusão faz parte de pesquisa inédita realizada pelo Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor), da Unicamp, em 33 municípios, incluindo a capital. O estudo, intitulado Percepção pública da ciência e tecnologia: uma abordagem metodológica para São Paulo, constituirá um dos capítulos da próxima edição de Indicadores de C,T&I em São Paulo, a ser publicada ainda este ano pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

Conduzido pelo secretário estadual de Ensino Superior e coordenador do Labjor, Carlos Vogt, com a participação dos pesquisadores Marcelo Knobel, Yurij Castelfranchi, Simone Pallone, Rafael de Almeida Evangelista, Sabine Righetti e Giovana Martineli, o estudo integra levantamento organizado pela Rede Ibero-Americana de Indicadores de Ciência e Tecnologia (RICYT) e pela Organização dos Estados Ibero-Americanos (OEI), realizado a partir de 2007 para avaliar o consumo e interesse por informação científica em grandes cidades de sete países: São Paulo (Brasil), Bogotá (Colômbia), Buenos Aires (Argentina), Caracas (Venezuela), Madrid (Espanha), Panamá (Panamá) e Santiago (Chile). Segundo Vogt, a decisão de ampliar a pesquisa para outras cidades teve como objetivo aprofundar o conhecimento sobre o tema.

* produção de ciência e tecnologia tem influência significativa sobre diversas dimensões da comunidade, o que impõe a necessidade de indicadores que, de alguma maneira, meçam os impactos dessa produção na sociedade”, explica Vogt, que abordará o tema no dia 17 durante a 60ª Reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), em Campinas. “Hoje, sabe-se que conhecer e entender a opinião dos cidadãos sobre a ciência e tecnologia constitui-se em um instrumento de suma importância para uma sociedade que se pretenda democrática”, completa.

Estudantes no Museu Exploratório de Ciências da Unicamp: para Vogt, "a produção de ciência e tecnologia tem influência significativa sobre diversas dimensões da comunidade" (Fotos: Antoninho Perri)A pesquisa levantou dados em municípios que não necessariamente possuem uma tradição científica e tecnológica. Alguns não contam, por exemplo, com universidades, institutos de pesquisa e museus de ciência. No trabalho em conjunto com os outros países, foi utilizado um questionário-base comum desenvolvido a partir de metodologias consolidadas, como da National Science Foundation (NSF), dos Estados Unidos, e do Eurobarômetro, em um exercício pioneiro de desenvolvimento de um trabalho de percepção pública da ciência na Iberoamérica. “A iniciativa reflete o esforço para se alcançar uma padronização das diretrizes e dos instrumentos de análise metodologicamente integrados, que inclua comparações em nível nacional e internacional”, explica Vogt.

O estudo focalizou quatro eixos: interesse e informação em C&T; valorações e atitudes sobre C&T; apropriação individual e social de C&T e cidadania e políticas de C&T. No item interesse e informação, os 1.825 entrevistados tiveram de responder se eram muito interessados ou interessados em relação a dez temas apresentados pelos pesquisadores. Ante o tema Ciência e Tecnologia, 16,3% se declararam muito interessados e 47,1% se disseram interessados. Somando-se as duas opções, o tema alcançou um índice geral de interesse de 63,4% , à frente de Política (21,1%), Economia e Empresas (43,3%) e Cinema, Arte e Cultura (58,7%).

À frente de Ciência e Tecnologia, no índice geral, estão Alimentação e Consumo (83,3%), Medicina e Saúde (80,9%), Meio Ambiente e Ecologia (76%) e Esportes (65,4%). O estudo destaca, porém, que as três primeiras são áreas claramente correlatas à C&T. “Grande parte do interesse do público por esses temas está diretamente ligado ou, ao menos, resvala por questões sobre ciência e tecnologia, seja na busca por mais informações a respeito apenas para ampliação do conhecimento, seja para a resolução de problemas relacionados a eles. Esses temas são quase indissociáveis, eles até se confundem com C&T”, pondera o texto a ser publicado. O levantamento mostra ainda uma alta rejeição declarada a temas como Política; Astrologia e esoterismo; e Curiosidades sobre a vida de pessoas famosas. Exceto Política, os outros dois temas são considerados “fúteis”

Áreas correlatas – Outra questão que se enquadra no mesmo eixo de análise é a que trata do nível de informação sobre esses mesmos temas. Nesse caso, o entrevistado tinha que fazer uma auto-valoração sobre o quanto é informado a respeito de determinados temas. Para as áreas consideradas correlatas à C&T o nível de informação é razoavelmente alto: Alimentação e consumo (72,1%); Medicina e saúde (63,6%); Meio ambiente e ecologia (61,4%). Segundo os autores do levantamento, os dados mostram que esses temas não apenas despertam o interesse, mas levam as pessoas a consumirem informações a respeito deles, na busca de aumentar seu conhecimento e também na tentativa de encontrar respostas para problemas a eles relacionados.

No entanto, quando se trata de C&T exclusivamente, o que se observa é um nível baixo de adesões para a resposta Muito informado: 105 pessoas, ou 5,8% dos respondentes, consideraram-se muito informados sobre o tema. Um número maior, de 722 pessoas, ou 39,6%, é observado para a resposta Informado em C&T. “O fato sugere que, apesar do interesse, nem sempre as pessoas têm um nível de informação compatível”, ponderam os autores do trabalho.

No estudo realizado pela RICYT e OEI, focalizando grandes cidades de seis países ibero-americanos, os dados também revelam o interesse público por temas relacionados à C&T. No item muito interessado, Bogotá alcançou o maior índice, com 47%, seguida por Caracas (38%), Buenos Aires (20%), Madri (18%), São Paulo (17%) e Santiago (17%). No item interessado, São Paulo, com 48%, aparece à frente de Bogotá e Santiago. Somando-se as sete cidades, apenas 3,5% dos entrevistados citaram Ciência como um dos três temas que mais despertam interesse na leitura de jornais. Foram ouvidas 1,1 mil pessoas por cidade, na faixa etária entre 16 e 65 anos. No trabalho final, os dados do Panamá ainda serão incluídos.

De acordo com Vogt, os estudos revelam que a percepção pública de C&T está vinculada à cultura geral do indivíduo e aos estímulos que recebe dos meios de comunicação. Para ele, a inserção dos temas de C&T na sociedade configura um processo mais amplo, de ordem cultural, e não apenas de alfabetização científica, caracterizado pela simples transmissão de informações ao público leigo. Por isso, o coordenador do Labjor prefere o termo cultura científica para designar o processo que leva à percepção pública da ciência.

“Melhor do que alfabetização científica, popularização da ciência ou percepção pública da ciência, a expressão cultura científica tem a vantagem de englobar tudo isso e ainda conter a idéia de que o processo que envolve o desenvolvimento científico é um processo cultural, seja ele considerado do ponto de vista de sua produção, de sua difusão entre pares ou na dinâmica social do ensino e da educação, seja de sua divulgação na sociedade, para o estabelecimento das relações críticas necessárias entre o cidadão e os valores culturais de seu tempo e de sua história”, explica.

Para fundamentar sua proposta, Vogt apresenta um modelo representado na forma de uma espiral, por onde o conhecimento científico circula até chegar à fase de divulgação, a partir da qual ressoa na sociedade. Seu ponto de partida é a produção e difusão da ciência entre os pares, função que envolve pesquisadores e o aparelho institucional de fomento e produção do conhecimento; se amplia para o ensino da ciência e formação de cientistas, envolvendo cientistas, professores e estudantes, desde o ensino fundamental até a pós-graduação; avança na direção do ensino para a ciência, que tem como atores desde professores e diretores de museus até jovens estudantes, e completa um círculo com a divulgação científica, quando o conhecimento produzido reverbera para a sociedade como um todo, antes de reiniciar o ciclo, cada vez mais estendido.

O levantamento feito pelo Labjor com apoio da Fapesp aprofunda e amplia o banco de dados sobre o tema no país, ao mesmo tempo em que oferece subsídios para formulação de políticas públicas em várias áreas. “Esses indicadores representam um aparato para a tomada de decisões públicas, no sentido tanto de incentivar a comunicação da ciência, quanto de desenvolver sistemas para a participação de diferentes atores em questões que envolvem temas ligados à C&T”, conclui Vogt.

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