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Do êxodo rural à indústria cultural

ÁLVARO KASSAB

É sabido que a globalização jogou por terra paradigmas colados ao estado nacional. Mas quais seriam os impactos e os efeitos dessa guinada na cultura popular, mais especificamente na música caipira? Qual é o rito de passagem entre os intelectuais do começo do século 20, comprometidos com o ideário do nacional-popular, e os compositores que buscam novamente as raízes da música brasileira? Respostas a estas e a outras questões estão na análise feita, na entrevista que segue, pelo professor José Roberto Zan. O docente, que assume dia 7 a direção do Intituto de Artes, traça conexões complexas – êxodo rural e indústria cultural, por exemplo – e vai buscar, em estudiosos de diferentes áreas, material para consubstanciar suas teses. Embora ainda considerado “marginal” no meio acadêmico, o tema merece uma investigação profunda e pode revelar a multiplicidade de sentidos presente na diversidade cultural brasileira.

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JU – A que o senhor atribui a retomada da pesquisa e o interesse sobre a chamada música caipira de raiz?
Zan – Se olharmos para a história da música popular brasileira, da música popular produzida industrialmente e voltada para o mercado fonográfico, vamos notar que em diferentes momentos ocorreram retomadas desse tipo, mas com sentidos distintos.
JU – No que eles diferem?
Zan – Inicialmente, é importante lembrar que esse estilo de música popular, identificado como sertanejo ou caipira, nos remete a um determinado modo de vida ou a um tipo de sociedade que, na atualidade, praticamente desapareceu. O desenvolvimento do capitalismo no Brasil, acompanhado pela industrialização e pela urbanização da sociedade brasileira, especialmente ao longo do século 20, provocou o rompimento do “equilíbrio ecológico e social” desse modo de vida. Mas, apesar da sua desintegração, aspectos dessa cultura ainda sobrevivem na memória de boa parcela da população brasileira.

JU – O senhor poderia exemplificar?
Zan – Estou me referindo ao mundo de pequenos sitiantes, de parceiros e de agregados, que ocupou por muito tempo as regiões de população rarefeita do centro-sul do país, mais precisamente no Estado de São Paulo, sul de Minas Gerais, sul de Goiás e sudeste do Mato Grosso do Sul. Esse tipo humano, que denominamos caipira, estava ligado a um modo de vida muito particular. Ocupava uma pequena área de terra, desenvolvia uma agricultura diversificada, voltada para o consumo próprio, criava alguns animais, complementava sua dieta alimentar através da caça e da pesca, e praticava artesanato doméstico. Eventualmente, o pequeno excedente gerado pela economia caipira era comercializado no mercado mais próximo. Essa relação de troca ainda precária com a vila ou com a cidade não era suficiente para romper o equilíbrio daquela forma de organização social que Antonio Candido denominou de sociedade de “mínimos vitais”. Esses sitiantes compunham habitat disperso em que se configuravam unidades sociais caracterizadas por relações de parentesco e de solidariedade vicinal denominadas bairros rurais. Uma complexa ritualística associada a práticas festivas e religiosas, em geral vinculadas ao universo do chamado “catolicismo rústico”, garantia a reprodução da sociabilidade dos bairros. E a música era um dos elementos fundamentais desse universo.

JU – O senhor está se referindo a que época?
Zan – Essa população se fixou pelo interior da capitania de São Vicente já no século 18, após o declínio do bandeirantismo. No século 19, com a expansão de grandes fazendas de cana, gado e café esses pequenos produtores se converteram em sitiantes, agregados, posseiros, parceiros, sobrevivendo nas fímbrias da sociedade escravista brasileira, formando um segmento social que a professora Maria Sylvia [de Carvalho Franco] chamou de “trabalhadores livres da ordem escravocrata”. O pequeno sitiante caipira estava à margem da grande monocultura, voltada para a exportação, na qual predominava o trabalho escravo. A música caipira à qual nos referimos, era parte integrante da cultura desse segmento social.

JU – Que tipo de música era executada?
Zan – A toada, o toque de viola que acompanha as danças catira e cururu, a música das folias de Reis e do Divino, a moda-de-viola, etc. Eram músicas que não se dissociavam das práticas lúdico-religiosas da cultura caipira.

JU – Qual a origem desses ritmos?
Zan – De acordo com estudos realizados por folcloristas, historiadores e etnomusicólogos, muitos dos elementos que compõem essas manifestações musicais são de origem européia e se mesclaram com aspectos da cultura indígena. A viola, por exemplo, pode ser uma derivação do instrumento português chamado viola de arame ou viola braguesa (possivelmente por ser originária de Braga), introduzido no Brasil pelos jesuítas. A moda, poesia cantada com acompanhamento de viola e/ou violão, mantém algumas características herdadas das cantigas de gesta e do romanceiro tradicional ibérico. Narrativa de fundo dramático, a moda normalmente conta um caso extraordinário, sensacional, ou descreve um fenômeno relevante do cotidiano caipira. É bastante semelhante ao que os nordestinos chamam de romance. O canto em duas vozes, em intervalo de terça, característico das duplas caipiras, é outra herança européia. Mas é provável que as vozes agudas dos cantores tenha raízes ameríndias, assim como as danças catira (ou cateretê) e cururu. Possivelmente, os jesuítas preservaram essas danças e as integraram às festas católicas como estratégia da prática catequética.

JU – Como os músicos já consagrados e integrados ao mercado se apropriam desses elementos?
Zan – Essa cultura é identificada como uma espécie de reserva de tradição. Aí estão as “raízes” da chamada música sertaneja. Em determinados momentos, compositores, intérpretes e produtores vão buscar nessa reserva de tradição elementos que vão dar “autenticidade” àquela música produzida modernamente.

JU – Como se situam, nesse contexto, os compositores que já foram radicados no mundo rural e insistem em levar à sua produção elementos tidos como autênticos?
Zan – É provável que algumas duplas sertanejas mantiveram “raízes” musicais caipiras em seus repertórios espontaneamente, em função das suas origens. Duplas e compositores que se integraram ao mercado fonográfico a partir dos anos 30, como Teddy Vieira, Vieira e Vieirinha, Tonico e Tinoco, Alvarenga e Ranchinho, e mais recentemente Pena Branca e Xavantinho, são alguns exemplos. Numa entrevista concedida ao Programa Ensaio, da TV Cultura [produção de Fernando Faro], Tonico e Tinoco revelam que quando moravam na fazendo tocavam romance.

Eram histórias tão longas que, segundo eles, havia pausa para o “povo” tomar café. [O termo romance que aparece na entrevista revela a memória do romanceiro tradicional ibérico presente nessa manifestação cultural]. Mas quando se transformaram em artistas urbanos não puderam gravar as mesmas músicas que cantavam na fazenda. O próprio disco de 78 rpm impunha uma limitação de tempo à música, pois comportava aproximadamente 3 minutos de gravação em cada lado. Mas a percepção de Tonico e Tinoco das diferenças entre os mundos rural e urbano revela-se mais aguda quando afirmam que “hoje, o povo da cidade não tem mais paciência para ouvir romances longos como aqueles. Temos que fazer composições mais curtas”. Mesmo assim, composições de artistas dessa época ainda guardam traços da música caipira tradicional. Por exemplo, a conhecida composição de Teddy Vieira e Luisinho, O Menino da Porteira, de 1955, apresenta características bastante evidentes da moda de viola ou do romance sertanejo.

JU - Quando a música caipira migrou para o disco?
Zan – Em 1910, o jornalista, escritor e produtor Cornélio Pires, paulista de Tietê, apresentou na Universidade Mackenzie, em São Paulo, um espetáculo que reuniu catireiros, cururueiros, e duplas de cantadores do interior. Nos anos seguintes, realizou shows com duplas caipiras em várias cidades do estado. Em 1929, pagou com recursos próprios a gravação do primeiro disco contendo músicas, anedotas e poesias caipiras na Byington & Company, representante da gravadora Colúmbia no Brasil. O sucesso dessa primeira experiência levou Cornélio Pires a gravar outras séries e despertou o interesse das gravadoras para explorar esse novo segmento fonográfico. A partir de então, surgiram inúmeros compositores e duplas como Raul Torres, Teddy Vieira, João Pacífico, Alvarenga e Ranchinho, Tonico e Tinoco, Tião Carreiro e Pardinho, que produziram um vasto repertório considerado atualmente como a música sertaneja de “raiz”.

JU – Como o senhor vê a atuação de compositores como RenatoAndrade, Ivan Vilela, Paulo Freire, etc., cujas produções não pode ser dissociada do embasamento teórico decorrente da pesquisa?
Zan – São compositores pesquisadores e não, necessariamente, de origem rural. Em geral, são originários da classe média urbana, intelectualizados, que se encantam com cultura e com a música caipira. Porém, aqui cabe uma verificação empírica mais cuidadosa, inclusive levando em conta as características de cada compositor. Mas eu arriscaria dizer que eles olham para a tradição de uma outra forma, até mesmo como objeto de pesquisa. E aí reside um problema complexo, um importante objeto de investigação para as ciências humanas.

JU – Por quê?
Zan – A necessidade de compreendermos o sentido que determinados sujeitos sociais atribuem à tradição. A tradição não pode ser vista como algo estático, naturalizado. Ela é redefinida, construída, reconstruída permanentemente, no presente. Vale lembrar o já clássico texto de Eric Hobsbawm e Terence Ranger, sobre a “invenção das tradições”. Pode-se dizer que a tradição é uma invenção moderna. É o homem do presente que olha para o passado e elege ou escolhe determinados aspectos que vão compor o que ele define ou reconhece como tradição.

JU – O que orienta essa escolha?
Zan – São os valores dos sujeitos. Não me refiro ao homem do presente como categoria abstrata, mas a sujeitos concretos, inseridos em teias de relações sociais marcadas por tensões e conflitos. Conflitos e lutas que são da própria natureza da sociedade moderna, de base capitalista, e que se expressam ou se manifestam no plano da cultura. São sujeitos dotados de valores, interesses, projetos específicos e que através deles olham para o passado e inventam ou reinventam tradições. Poderíamos dizer então que no presente convivem, de forma conflituosa, múltiplas tradições.

JU – Pode-se dizer que os compositores pesquisados buscam as raízes da música brasileira. Quais seriam os antecedentes históricos dessa noção de autenticidade da cultura popular?
Zan – Em primeiro a perspectiva romântica – que está presente na obra de muitos intelectuais brasileiros do início do século 20 – através da qual buscava-se identificar na cultura do povo elementos da identidade cultural brasileira. Acreditava-se que tais elementos estavam presentes na cultura do homem de campo. Por se tratar de um tipo humano originário de contextos sociais pré-capitalistas o homem do campo ainda não havia sido corrompido pela modernização, pelo mundo urbano, pela sociedade industrial. Era bom, puro e dócil. Já nas cidades, com o processo de industrialização que se acelera a partir das primeiras décadas do século 20, começa a emergir uma nova categoria ou uma nova classe social, o proletariado urbano. E juntamente com ela um novo tipo de conflito social até certo ponto ameaçador para as elites brasileiras, a luta de classes. O proletariado urbano nascente era, de certo modo, identificado como componente das chamadas “classes perigosas”. Em segundo lugar, o dilema compartilhado por grupos sociais dominantes, da construção do estado nacional. A necessidade de construção e consolidação da nacionalidade orientava a escolha dos elementos culturais populares constitutivos da identidade cultural brasileira. Desse modo, e aqui estou sendo muito sintético, configura-se o ideário “nacional-popular”.O modernista Mário de Andrade, por exemplo, buscava nas culturas populares regionais e rurais os elementos de uma autêntica música brasileira ou, posto de outra forma, as bases do nacionalismo musical.

JU – Villa-Lobos e Camargo Guarnieri, por exemplo, chegaram a introduzir alguns elementos da chamada música caipira de raiz em sua obra.
Zan – Não só caipira, mas de culturas rurais ou sertanejas de outras regiões do país. São músicos que realizaram o que poderíamos chamar de apropriação culta da música popular rural.

JU – Qual seria o elo de ligação entre os compositores nacionalistas eruditos e os novos músicos que buscam o resgate da música de raiz?
Zan –De certo modo, o sentido da produção dos novos compositores pesquisadores a que nos referíamos guarda alguma afinidade com a dos compositores nacionalistas dos anos 30 e 40. Porém, é preciso destacar que esses novos artistas vivem num momento histórico distinto. Atualmente, não se coloca mais a questão da nacionalidade como se colocava na primeira metade do século XX. Esses novos compositores vivem num contexto histórico marcado pela inserção do país numa conjuntura internacional em que se verifica o aprofundamento da internacionalização do capitalismo e da mundialização da cultura. São processos definidos por alguns cientistas sociais como globalização, acompanhados pelo fortalecimento das tendências de desenraizamento e mercantilização da cultura. Nesse quadro, abre-se uma nova crise nas configurações dos estados nacionais. Como diz Stuart Hall, a globalização provoca um “afrouxamento” da noção de cultura nacional e cria brechas para processos de identificação “acima” e “abaixo” dos contornos do estado-nação.

Verifica-se, portanto, o que alguns sociólogos, dentre eles os brasileiros Octavio Ianni e Renato Ortiz, definem como a dialética da globalização, ou seja, a relação contraditória entre o global e o local, ou entre as tendências de homogeneização global e a busca da alteridade, do autêntico, da diferença. Ainda destacando a necessidade de se buscar evidências empíricas mais consistentes, e reconhecendo as particularidades das produções desses compositores, eu ousaria afirmar que o que orienta as ações desses artistas e até mesmo a identificação do público com esse repertório são as novas demandas por “autenticidade” e alteridade que se reforçam frente à padronização global.

JU – E as duplas que produzem para um público de massa como Chitãozinho e Xororó, Zezé de Camargo e Luciano, Jean e Giovani ?
Zan – Essas duplas produzem um novo estilo de música sertaneja que se consolidou no mercado fonográfico a partir dos anos 80. O repertório produzido por elas é definido por críticos musicais e pesquisadores como “sertanejo pop”, “sertanejo romântico” ou “neo-sertanejo”. São duplas mais suscetíveis às novas influências estilísticas. São artistas populares que vão produzir para um público de massa também suscetível às mudanças, à “modernização” da música sertaneja. Produtores, diretores artísticos e profissionais de marketing fonográfico que atuam em gravadoras conhecem o público e indicam as inovações para garantir a vendagem dos discos. A antiga imagem estereotipada do caipira mal vestido, banguela, com chapéu de palha foi superada. As novas duplas usam roupas de grife, cabelo bem-cortado, têm os dentes tratados, etc. As mudanças estilísticas também têm apelo comercial destinado a um público ávido por novidades. A viola foi substituída por instrumentos eletrônicos como guitarra, o contra-baixo elétrico e teclados, além de bateria e, eventualmente, bancada e instrumentos de percussão. Tanto as composições como os arranjos apresentam elementos da música urbana de massa, especialmente das baladas românticas da Jovem Guarda. Portanto, da música caipira de fato restam poucos aspectos. Talvez, as vozes agudas dos cantores e, os duetos em terça, porém empregados de modo mais econômico.

JU – Em última análise, não estariam muito preocupados com essa noção de pureza e de autenticidade...
Zan – Não do mesmo modo que os compositores pesquisadores. Mas é interessante observar que algumas duplas inserem em seus CDs pelo menos uma música do chamado repertório de “raiz”, com arranjos tidos como “modernos”. Provavelmente isso representa uma estratégia de legitimação do disco e visa a garantir identidade da produção com um público mais amplo.

JU – Qual o papel desempenhado pela indústria cultural nesse contexto?
Zan – A partir do final dos anos 60, verifica-se uma grande expansão dos meios de comunicação de massa e da indústria cultural no Brasil. Essa expansão atingiu diversos ramos da indústria cultural como a produção editorial, as redes de televisão, a indústria fonográfica, cujas empresas passam a reorganizar seus processos de produção com base em novos padrões empresariais, na incorporação de novas tecnologias e na adoção de estratégias de marketing eficazes. É um momento que Renato Ortiz, autor de a Moderna Tradição Brasileira, chama de consolidação do mercado de bens simbólicos no Brasil.

Essa nova música sertaneja começa a ser produzida nesse momento. Aí se destaca a atuação de Sérgio Reis, um dos intérpretes que inauguram essa fase. Em 1973, marginalizado no mercado devido ao fim da Jovem Guarda, teve a iniciativa de gravar uma composição do repertório sertanejo quando presenciou uma multidão cantar durante um show na praça de uma cidade do interior mineiro, a música Menino da Porteira. De volta a São Paulo, entrou em contato com Tony Campelo, então produtor da RCA, que lhe garantiu a gravação da famosa composição de Teddy Vieira. Sérgio Reis deu um novo tratamento à música, com arranjo mais “moderno”, incluindo instrumentos eletrônicos, economizou nos duetos e cantou com pronúncia “urbana”. Foi um sucesso enorme de vendagem que lhe garantiu a realização de um filme com a temática da música. No mesmo período, destacaram-se novas duplas como Milionário e José Rico, Léo Canhoto e Robertinho, que também marcaram o início dessa nova fase da música sertaneja.

JU– Esse é o momento da virada da música sertaneja?
Zan – Sem dúvida. Essas novas duplas que aparecem de 70 vão produzir um repertório que se confunde com o segmento, também em expansão naquele momento, chamado de brega. Isso tudo acontece num momento em que, na sociedade brasileira, aprofunda-se a chamada modernização conservadora com impacto enorme sobre o mundo rural.

JU – Por quê?
Zan – A modernização que ocorre no campo a partir dessa época não modificou a estrutura fundiária até então vigente no país. A concentração da propriedade foi reforçada, latifúndios transformaram-se em empresas rurais, ampliou-se a mecanização da produção. O impacto desses processos sobre as relações de produção no campo foi muito grande. Vão desaparecendo as figuras do parceiro, do meeiro, do agregado nas áreas da tradicional cultura caipira. Ao mesmo intensificam-se, por um lado, o êxodo rural e a canalização de enormes contingentes de ex-trabalhadores rurais para as grandes cidades, ampliando o proletariado urbano. Por outro, cresce o assalariamento rural e a emergência da figura do bóia-fria. Ocorre um verdadeiro esvaziamento do campo no Brasil e o inchaço das grandes cidades. Ao mesmo tempo, a emergência de um novo empresariado rural. Pode-se dizer que começa a se configurar no país uma “nova ruralidade”.

JU - Nesse contexto, aquela figura tradicional do caipira é redefinida?
Zan - Aquela imagem do caipira indolente de Monteiro Lobato vai ser substituída pela do novo empreendedor rural. Nesse contexto, novos elementos simbólicos vão compor o que poderíamos chamar, provisoriamente, de uma nova “estética” ruralista.

JU – Onde vão buscar esses elementos simbólicos?
Zan – Parte deles no mundo rural norte-americano. Essa música sertaneja começa a se mesclar com os elementos da música country. Não é por acaso que duplas sertanejas desse novo momento vão gravar em Nashville, que é a Meca da música caipira mundial. De certa forma, esse repertório está traduzindo as mudanças que ocorreram na sociedade rural brasileira nas últimas décadas. Lembrando o diagnóstico de Stuart Hall citado anteriormente, poderíamos dizer que estamos diante de um exemplo do processo de identificação que ocorre “acima” dos contornos do estado-nação. Os elementos simbólicos que vão compor uma possível identidade ruralista são, em grande parte, originários de tradições situadas além das fronteiras nacionais.

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BIBLIOGRAFIA

MELLO E SOUZA, Antonio Candido. Os parceiros do Rio Bonito. RJ, Livraria José Olympio, 1964.

FRANCO, Maria Sylvia de Carvalho. Homens livres da ordem escravocrata. SP, IEB/USP, 1969.
nHOBSBAWM, Eric & RANGER, Terence. A invenção das tradições. RJ, Paz e Terra, 1984.

HALL, Stuart. Identidade cultural na pós-modernidade. RJ, DP&A, 1999.
nORTIZ, Renato. A moderna tradição brasileira: cultura brasileira e indústria cultural. SP, Brasiliense, 1988.

 

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