Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 277 - 14 a 27 de fevereiro de 2005
Leia nessa edição
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Ciência nas férias
Sucessão de Brito Cruz
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Identificação de microtoxina
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Valor nutricional dos cogumelos
Arquitetura goiana
 

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Estudo revela que as três espécies analisadas
têm alto teor de proteínas e fibras alimentares


Pesquisa determina valor
nutricional de cogumelos

CARMO GALLO NETTO

A pesquisadora Regina Prado Zanes Furlani, com as espécies estudadas: desenvolvimento de metodologias apropriadas (Foto: Antoninho Perri)É crescente o interesse do consumidor por fontes naturais de vitaminas, fato que pode ser confirmado pelo grande número de matérias publicadas em jornais e revistas. Os cogumelos comestíveis estão lá, embora muito pouco se saiba a respeito do valor nutricional daqueles cultivados no Brasil. Constatações que levaram Regina Prado Zanes Furlani, sob orientação da professora Helena Teixeira Godoy, a desenvolver a tese de doutorado "Valor nutricional de cogumelos cultivados no Brasil" estudo financiado pela Fapesp e realizado no Laboratório de Análise de Alimentos, do Departamento de Ciências de Alimentos da Faculdade de Engenharia de Alimentos da Unicamp (FEA). A pesquisadora concluiu que champignons, shiitakes e shimejis, que foram as três espécies analisadas, revelaram-se excelentes alimentos pelo alto teor de proteínas e fibras alimentares e baixo teor de lipídeos.

Composição varia conforme origem da espécie

Regina esclarece que existem poucos dados, mesmo na literatura internacional, a respeito da presença de vitaminas do complexo B, de folatos e também sobre a composição centesimal de proteínas, carboidratos, gorduras e fibras nos cogumelos. Muitas das referências não mencionam as quantidades e, quando o fazem, não especificam se o produto está in natura ou desidratado. Atribui o fato à ausência de metodologias analíticas adequadas.

Esse quadro sugeriu-lhe a necessidade de um estudo sistemático e o desenvolvimento de metodologias apropriadas. Sabe-se, ainda, que a composição dos alimentos varia de acordo com a origem, solo, clima e condições de cultivo, razão mais que suficiente para a determinação da composição alimentar dos cogumelos aqui cultivados.

O trabalho baseou-se em três espécies de cogumelos cultivados e comercializados no Brasil: a Agaricus bisporus – o conhecido champignon de Paris; a Lentinula edodes – o shiitake; e a Pleorotus ostreatus – o shimeji. A preocupação inicial da pesquisadora foi determinar, na composição das três espécies, as porcentagens de água, carboidratos, proteínas, fibras alimentares e lipídeos. Na segunda etapa do estudo, e que lhe consumiu maior tempo e trabalho, avaliou metodologias para determinação simultânea de vitaminas do complexo B (B1, B2, B6, B12, H e PP) e desenvolveu e validou metodologia analítica para a determinação das vitaminas B1 e B2, alem da determinação da vitamina C e folatos e das quantidades de fósforo, já que as informações preliminares consideravam os cogumelos como fonte desses nutrientes. O trabalho objetivava também e simultaneamente contribuir para a Tabela de Composição de Alimentos, desenvolvida na Unicamp e recentemente divulgada em sua primeira versão, mas suscetível de constantes acréscimos e ampliações.

Dos antigos aos modernos

Regina Furlani lembra que a relação do homem com os cogumelos é muito antiga e fascinante. Os egípcios acreditavam que eram um presente do deus Osíris e os faraós os utilizavam como presente especial. Os antigos romanos os chamavam de “alimento dos deuses” e por isso deviam ser servidos apenas em ocasiões especiais. Acreditavam que chegaram à Terra através de raios jogados por Júpiter durante uma tempestade.

Na Grécia antiga, os guerreiros acreditavam que os provinham de força e coragem.Os chineses os consideravam “elixir da vida”. Os índios mexicanos os utilizavam com propósitos terapêuticos e como alucinógenos em rituais religiosos e de feitiçarias. As civilizações orientais consagraram os cogumelos há milênios como alimento funcional, usando-os na gastronomia e na atividade medicinal.

No mundo ocidental sua disseminação é mais recente, mas já envolve um apreciável número de espécies além do popular champignon. Em 1993, a produção mundial foi de 1,95 milhões de toneladas, que saltou para 3,19 milhões de toneladas em 2003. O Brasil não possui dados oficiais sobre a produção de cogumelos, mas seu maior centro produtor localiza-se no Alto Tietê, em São Paulo, na região de Mogi das Cruzes.

Vários fatores contribuem para o aumento da produção. Os cogumelos são cultivados em substratos, genericamente chamados de compostos. Para cada espécie existe um tipo de composto mais adequado, como por exemplo, palha de cana, bagaço de cana, folha de bananeira, serragem, troncos de árvores. O cogumelo, um fungo, é inoculado nesse substrato. Portanto, economicamente constitui uma cultura que permite a reciclagem de diversos resíduos agrícolas e agroindustriais. Do ponto de vista nutricional, devido ao alto valor protéico, o cultivo dos cogumelos tem sido apontado como uma alternativa para a oferta de proteínas nos países com altos índices de desnutrição. Regina Furlani acredita que em um futuro próximo a queda dos custos de produção permita a popularização do consumo

Mesma espécie apresenta
composições diferentes

Segundo Regina, a análise estatística das determinações experimentais mostrou diferenças significativas na composição centesimal de cogumelos da mesma espécie provenientes de diferentes lotes, embora água, carboidratos e proteínas mantenham-se como os principais constituintes. De acordo com a pesquisadora, os cogumelos apresentam “considerável quantidade de fósforo, mas os teores de vitamina C não permitem considerá-los fonte dessa vitamina. Constituem rica fonte de folatos e a contribuição na dieta para o aporte dessas vitaminas é significativa”.

Mas a pesquisadora revela uma surpresa: “Embora presentes, as vitaminas B1 e B2 não aparecem com teores significativos e, por isso, não podem ser considerados fontes dessas vitaminas e sua contribuição na dieta não é expressiva. As metodologias desenvolvidas não permitiram detectar a presença das demais vitaminas do complexo B, o que não quer dizer que não possam estar presentes, por exemplo, as vitaminas B6 e B12.

Segundo as normas, para ser considerado fonte de uma determinada vitamina, o alimento precisa ter 15% do valor correspondente ao previsto na Tabela de Ingestão Diária Recomendada (IDR) e divulgada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). No caso da vitamina B1, a IDR é de 1,2 mg e o maior valor encontrado foi de 0,08 mg em 100g de cogumelo, que correspondem a apenas 6,6%. Para a vitamina B2, o maior valor encontrado foi de 0,30 mg em 100g de cogumelo, que correspondem a 23,1% das necessidades diárias. Regina esclarece que para ser considerado de alto teor vitamínico esse índice deveria ser de pelo menos 30%. Para ela, esses resultados “foram meio decepcionantes, já que se falava em altos teores de vitaminas do complexo B”.

A IDR para folatos é de 400 µg (micro gramas) e a pesquisadora encontrou teores que variaram de 551 µg a 1431 µg em 100 gramas de cogumelo, dependendo do lote e da espécie: “É um alto teor e sem dúvida os cogumelos constituem uma excelente fonte de folatos”. O Valor Diário de Referência (VDR) para fibras é de 25g e os cogumelos analisados fornecem, em 100g, de 6,0 a 15,6 do VDR. Apresentam uma quantidade considerável de fósforo, quantidade razoável de proteínas e menos de 5% de gorduras: “Sem dúvida, trata-se de um alimento saudável”.

Regina faz questão de deixar claro que suas pesquisas não permitem atribuir valores medicinais aos cogumelos: “Existem outros grupos de pesquisa que estudam suas propriedades medicinais”.




Preços impedem popularização

Os trabalhos desenvolvidos permitem a Regina Furlani algumas constatações. Os cogumelos não fazem parte da cozinha brasileira por causa do preço e da falta de conhecimento. Ainda custam mais que a carne. Em Campinas só estão disponíveis em supermercados e sacolões de regiões mais favorecidas economicamente. Vegetarianos procuram os cogumelos como fonte de proteínas. “Como sou carnívora, continuo preferindo as da carne”, brinca.

Apresentam baixo teor de gorduras e alto teor de fibras. Embora os teores de vitaminas B1 e B2 não sejam pronunciados, não deixam de contribuir com elas. Constituem uma rica fonte de folatos. Lembra que, a partir de l8 de junho DE 2004, resolução (RDC no. 344, de 13 de dezembro de 2002), obriga a fortificação das farinhas de trigo e de milho com ferro e ácido fólico. Estudos mostram que os folatos evitam a má formação do feto e más formações congênitas, previnem certos males cardíacos e doenças cardiovasculares, desordens mentais, câncer, mal de Alzheimer e reduzem o risco de patologias do tubo neural e da mielomeningocele.

Os cogumelos têm valor reconhecido na gastronomia mais sofisticada por causa do sabor e aroma. Entusiasta, recomenda “o uso de cogumelos em saladas ou para realçar ou acrescentar sabor aos pratos”.


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