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QUALIDADE E RELEVÂNCIA DA PESQUISA

Toda pesquisa científica busca atingir, de forma subjacente, dois objetivos: qualidade e relevância. A qualidade refere-se ao âmbito interno da área na qual a pesquisa se desenvolve. Trata-se de sua profundidade, abrangência, da medida em que lança luz sobre diferentes assuntos, resolve problemas e desafios históricos. Via de regra, os que opinam sobre qualidade são os especialistas da mesma área de pesquisa, através do conhecido “juízo dos pares”. A relevância se relaciona com a aplicabilidade a áreas externas à do desenvolvimento da pesquisa e com sua importância para a sociedade.

Os cientistas costumam ter os olhos postos essencialmente na qualidade, embora apelem para a relevância quando buscam ser contemplados por algumas linhas especificas de financiamento. Tanto a qualidade quanto a relevância são medidas de maneira imperfeita, e não poderia ser de outro modo, pois não existe uma maneira exata para se medir uma ou a outra. Portanto, toda medida é aproximada e podemos apenas indicar parâmetros que, de acordo com o bom senso, parecem bastante correlacionados com uma ou outra.

Existem exemplos espetaculares de erros cometidos pelo sistema atual de avaliação tanto relativamente à qualidade como à relevância. É necessário ter presente esta incerteza essencial da avaliação, pois agir com base em certezas absolutas, quando tais certezas inexistem, conduz a erros trágicos. A avaliação da qualidade se dá essencialmente através do julgamento de pares, quando o resultado da pesquisa é submetido para publicação. Este sistema tem uma dinâmica própria: é imperfeito, está sujeito a oportunismos, a semi-fraudes, a troca de favores e a diversos tipos de manipulação. Entretanto, ainda não foi encontrado nada melhor. De fato, pode-se dizer, com uma dose de ironia, que os incontáveis defeitos que possui são, se bem apreciados, virtudes, pois permitem que cientistas que não são bem sucedidos desqualifiquem o sistema de avaliação pelos seus óbvios defeitos, às vezes com razão. Obtêm, assim, o estímulo para continuar trabalhando apesar dos fracassos, estímulo que não teriam se tivessem sido rejeitados por um sistema perfeito.

Não é possível prescindir da avaliação da qualidade, pois o risco seria cair em avaliações muito piores. Na sua versão mais simplista, a avaliação que se faz hoje consiste na contagem de publicações e citações. A outra face da moeda é a “relevância”. Com isto nos referimos aos critérios que vêm de fora da área, já que uma relevância “interna” confundir-se-ia com o que denominamos “qualidade”. A correlação entre qualidade e relevância existe, mas não deve ser superestimada. Quase tudo o que tem muita qualidade acaba sendo relevante e, provavelmente, nada que não tenha qualidade terá alguma relevância. Mas existem notáveis exceções. O fato é que a relevância se julga a partir de um ponto de vista externo à área. Quando se julga relevância, o resultado é, via de regra, o financiamento, assim como o julgamento de qualidade tem por resultado a publicação, o prêmio, ou a citação elogiosa.

Quando a universidade distribui recursos internamente, estimula áreas de pesquisa, monta laboratórios ou contrata, ela se envolve inevitavelmente com julgamentos de qualidade e relevância. Hoje, assistimos a uma mudança da política nacional de financiamento, cujo critério dominante parece deixar de ser a qualidade para passar a ser a relevância. Entretanto, assim como o julgamento da qualidade, o julgamento da relevância está sujeito a erros terríveis, talvez ainda maiores. É de fundamental importância que o conjunto das ações e programas de apoio seja balanceado, não inviabilizando os programas de fomento tradicionais, que não são condicionados a critérios de relevância direta e imediata – perigo embutido no novo modelo.

Em vista da impotência para julgar de maneira equânime, as receitas para errar o menos possível devem manter o equilíbrio entre critérios de qualidade e relevância e ter como ingredientes mecanismos formais democráticos, imparciais (julgamentos sempre externos) e eticamente irrepreensíveis. Tratando-se de errar, é melhor errar imbuído de boas intenções.


 
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