| Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 332 - 7 a 13 de agosto de 2006
Leia nesta edição
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Artigo: Diagnóstico das patentes
Cartas
40 anos em Parati
Talento
Almeida Prado
Mandarim 35
Faltam tomadas
Fraturas por estresse
Pão de forma
Vinagre brasileiro
Chuvas e relevo
Painel da semana
Teses
Livro
Destaques do portal
Kyatera
Biodisel no IQ
Musicalização do corpo
 

9a

Pesquisadoras da FEA atestam a má qualidade do chamado
‘agrin’, que nada tem de alimento funcional

Vinagre brasileiro ainda
está distante
do padrão de
qualidade internacional

A orientada Márcia Zilioli Bellini e a professora Gabriela Alves Macedo, no laboratório da FEA: criando uma metodologia rápida e barata para determinar qualidade e origem dos vinagres(Foto: Antoninho Perri)O vinagre (vinho azedo) é conhecido e utilizado pelos povos desde tempos imemoriais. Os antigos romanos o tomavam entre as batalhas, misturado com água, para mitigar a sede. Segundo a Bíblia, os soldados romanos levaram à boca do Cristo na cruz uma esponja embebida em vinagre. Na Europa e na Ásia consagrou-se seu uso como condimento e alimento funcional, realizando-se estudos detalhados sobre a composição dos vários tipos de vinagre e seus efeitos benéficos à saúde. Embora as propriedades funcionais do vinagre não estejam totalmente esclarecidas, propalam-se seu efeito positivo no controle da pressão arterial e do pH do estômago para combater a gastrite, o efeito bactericida, a ação antioxidante nas células e o ataque aos radicais livres, evitando a manifestação de certos tipos de cânceres.

Vinagre advém do vinho e de frutas

As propriedades funcionais são atribuídas a determinadas substâncias presentes nos vinagres tradicionais, como os do vinho. Mas essas substâncias estariam também nos vinagres produzidos no Brasil? A professora Gabriela Alves Macedo, do Departamento de Ciências de Alimentos, e sua orientada, a bióloga Márcia Zilioli Bellini, respondem a esta indagação em dissertação de mestrado sobre a caracterização bioquímica dos vinagres brasileiros. A pesquisa, realizada Laboratório de Bioquímica da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA), apresenta constatações surpreendentes: os vinagres das marcas nacionais mais comuns nos supermercados brasileiros não têm semelhança alguma com os produtos tradicionais e em geral não cumprem o que está no rótulo – muitas vezes, os ditos de vinho não utilizam a bebida como matéria-prima, assim como os de maça não advêm da fruta.

Em geral os vinagres brasileiros são produzidos a partir do álcool (etanol) e constituem solução de ácido acético a 4%, concentração ácida mínima exigida pela legislação, com a adição de um antioxidante que atua como estabilizante. Composição tão pobre compromete o aroma e o sabor. “Não raramente, o consumidor tempera as saladas com limão, preferível para quem não tem acesso a um vinagre autêntico”, afirma Gabriela Macedo. A legislação de 2001 determina que os produtos não obtidos a partir do etanol devem apresentar 90% de vinagre de álcool e 10% de vinagre de vinho tinto ou branco; precisam estar identificados como vinagre de álcool, ou agrin, termo que a grande maioria dos consumidores desconhece. Crítica, a professora da FEA considera esse produto bom para limpeza de sofás, pisos e outros fins caseiros, mas pobre para fins culinários.

O autêntico – Gabriela Macedo explica que o vinagre autêntico produzido a partir do vinho e de algumas frutas mantém características inerentes à matéria-prima, tais como a presença de sais minerais, compostos fenólicos e vários ácidos monocarboxílicos, além do acido acético, tais como os ácidos tartárico, succínico, málico e láctico, todos eles responsáveis pela acidez. “O sabor e o aroma resultam da mistura das substâncias que o constituem. Os vinagres originários de frutas apresentam uma gama ainda maior de ácidos, ao passo que os vinagres produzidos a partir do álcool etílico só contêm acido acético”, afirma.

Nesse ponto está uma das principais conclusões do trabalho: através da caracterização dos ácidos carboxílicos (identificação e proporção) e de informações sobre a matéria-prima utilizada, é possível atestar com segurança se o vinagre tem a origem declarada no rótulo. “Desenvolvemos um método e criamos um processo que permite determinar como foi obtido o vinagre de forma simples e barata. O trabalho também permitiu concluir que os vinagres de composição mais rica são os de maior capacidade antioxidante e de seqüestrar radicais livres. Se o vinagre tem uma fonte nobre, como uva ou outras frutas, e é obtido por um processo de fermentação, certamente se constituirá em alimento importante para a saúde”, diz Gabriela Macedo.

As pesquisadoras da FEA enfatizam que não existia até agora uma metodologia rápida e barata para atestar a qualidade e a origem do produto, o que foi conseguido nas análises que não demoram mais de 15 minutos. Em sua pesquisa, Márcia Bellini constatou que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) não dispõe de métodos para análises de controle do vinagre, nem mantém fiscalização sobre as empresas produtoras pulverizadas pelo Brasil, muitas vezes sequer legalizadas. Tal situação leva à degradação dos preços e desestimula os fabricantes que desejariam produzir um produto de qualidade. Como agravantes existem a desinformação do consumidor e a não valorização desse condimento no país, por falta de tradição: “Na verdade, o consumidor desinformado sempre procura o vinagre mais barato nas prateleiras. É uma questão que só se resolve com a ação dos órgãos governamentais de fiscalização”, observa.

Kuroshu – O vinagre pode ser produzido a partir de uma série de matérias-primas, como frutas (maça, laranja, pêra, kiwi, melão, pêssego, cereja, framboesa), bebidas alcoólicas (vinho, uísque, cerveja), e cereais (milho, arroz). “O que nos motivou na pesquisa foi a possibilidade de aproveitar a grande variedade de matérias-primas no país para chegar a um vinagre que trouxesse benefícios para a saúde, a exemplo do ‘Kuroshu’ produzido a partir do arroz integral, muito utilizado no Japão e de decantadas propriedades funcionais”, acrescenta Gabriela Macedo.

Outra constatação é que a maioria dos vinagres nacionais provém da oxidação do álcool etílico a acido acético realizada em dornas de aço inoxidável, e não de madeira – onde o produto incorpora compostos polifenólicos oriundos da Lignina. Como a legislação prevê a substituição futura das dornas de madeira pelas de aço, por questões de saúde pública, as pesquisadoras passaram a estudar uma forma de realizar a fermentação em aparas de madeira, com sucesso. O vinagre incorporou quantidade significativa de polifenois e mostrou-se eficiente como antioxidante e no seqüestro de radicais livres. “Trata-se de uma solução tecnológica viável e nobre e de fácil execução. Foi outra conclusão importante a que chegamos”, finaliza Márcia Bellini.

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