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Estudo investiga escritos da primeira fase de Machado de Assis

Pesquisa esmiúça relação de escritor com
colaboradores e leitores de revista dirigida ao público feminino

MANUEL ALVES FILHO

Daniela Magalhães da Silveira, autora da dissertação de mestrado: abertos, contos permitiam mais que uma integração (Foto: Antoninho Perri)Pouco estudada pela academia e praticamente desconhecida do grande público, a primeira fase da obra do escritor Machado de Assis, constituída em grande parte por contos escritos para o Jornal das Famílias, publicação feminina que circulou entre 1863 e 1878, foi investigada a fundo na dissertação de mestrado de Daniela Magalhães da Silveira, defendida recentemente no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp. No trabalho, a autora procurou compreender a relação do literato com os demais colaboradores da revista carioca, como ele interagia com os leitores e qual seria o perfil destes últimos. "Ao longo da pesquisa, foi possível identificar que Machado tinha posicionamentos que o diferenciavam dos seus colegas, embora muitas vezes tratasse de temas semelhantes. Graças à criação de alguns personagens e à indicação de romances em seus contos, também foi possível deduzir que o público do Jornal das Famílias não era composto apenas por mulheres ou por integrantes das classes mais abastadas, como seria de se supor inicialmente", relata Daniela.

Publicação circulou entre 1863 e 1878

Machado de Assis: política e coisas do cotidiano (Reprodução)Machado de Assis começou a escrever para o Jornal das Famílias, cuja circulação era mensal, aos 25 anos. De acordo com a pesquisadora, ele transformou-se no colaborador mais freqüente da revista, que contava com seções fixas como romances e novelas, moda, artesanato e medicina popular. Para desenvolver o estudo, Daniela dividiu a dissertação em três capítulos. No primeiro, ela analisou as personagens femininas dos contos. "As viúvas sempre foram muito recorrentes nos textos de Machado. Como a revista circulou por 15 anos, essas personagens foram mudando com o passar do tempo. No início, elas se mostravam mais preocupadas com a escolha do parceiro para o segundo casamento, para que este fosse feliz. Depois, já manifestavam outros interesses, como a ascensão financeira, bem como se mostravam mais infiéis", explica.

No entender de Daniela, essas transformações representam, de algum modo, uma resposta ao retorno que o escritor tinha de seus leitores. Conforme a autora da dissertação, Machado de Assis tinha uma postura diferente da de seus companheiros de redação. A pesquisadora tomou para comparação duas colaboradoras da revista, Victória Colonna e Paulina Philadelphia. Não se sabe, porém, se estes eram pseudônimos e nem mesmo se eram de fato mulheres. De toda forma, a primeira se ocupava predominantemente de assuntos de cunho moral. Falava sobre a melhor idade para o casamento e como escolher um bom marido. A segunda, também de posição conservadora, escrevia na seção de anedotas e acerca de culinária.

Segundo Daniela, ao tratar de assuntos como o casamento, Machado de Assis mostrava-se mais maleável do que as duas colegas. "Num de seus contos, que foi publicado em três partes, ele falava do casamento, mas não citava a questão moral nos dois primeiros textos. Ele só fez isso no terceiro, e ainda assim no final do último parágrafo. Essa estratégia fazia com que sua participação na revista fosse diferenciada", afirma a pesquisadora. No segundo capítulo da dissertação, a autora esmiuçou a questão política, também presente nos contos do escritor. O tema foi abordado mais freqüentemente ao longo da década de 70. O literato não tratou somente da política imperial, mas também da política cotidiana dos dependentes, como questões que envolviam as acirradas disputas por heranças.

A pesquisadora ressalta que alguns dos assuntos levados às páginas da revista eram os mesmos discutidos na rua do Ouvidor. Isso significa que os temas por ele tratados eram de interesse bastante amplo, não se restringindo apenas às mulheres. "Da mesma formam que abordava a questão política, ele escrevia sobre as artes da dissimulação, questão que seria mais bem entendida pelas mulheres, conforme compreensão da época". No último capítulo, Daniela aborda justamente esta relação entre o escritor e seus leitores, aspecto que permitiu à autora da dissertação traçar o perfil destes últimos. De acordo com ela, Machado de Assis escrevia de forma a ler com seus leitores. Os contos, diz, eram abertos para que permitissem mais de uma interpretação. Ao valer-se de leitores que também eram personagens, ele mencionava pessoas que liam em público ou que tomavam a revista emprestada. Ou seja, dava a crer que a publicação não era lida apenas pela classe mais abastada, que a comprava, mas também por pessoas de menor poder aquisitivo.

Essa tese é reforçada pela forma como o Jornal das Famílias falava de moda e artesanato. Várias matérias ensinavam os leitores a confeccionar peças. "Muitas mulheres pobres que tinham acesso à revista se sustentavam graças à venda de roupas e mosaicos feitos a partir dos esquemas publicados", arrisca Daniela. Toda a pesquisa sobre a primeira fase da obra de Machado de Assis foi feita no Arquivo Edgard Leuenroth (AEL), da Unicamp, que tem cópias da coleção completa de Machado de Assis, cujos originais estão na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. O estudo, que durou dois anos e foi orientado pelo professor Sidney Chalhoub, recebeu financiamento do CNPq.

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