| Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Enquete | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 209 - 7 a 21 de abril de 2003
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No limiar de um novo paradigma

Álvaro Kassab

Octavio Ianni não tem dúvida: está em curso não só uma ruptura histórica, na qual a noção de tempo e espaço foi substancialmente abalada, mas também uma revolução cultural de grandes conseqüências, cujo resultado mais imediato seria o florescimento de um novo paradigma científico. Sociólogo, professor emérito da Unicamp e um dos mais renomados intelectuais do País, Ianni participou no último dia 28 do "Seminários Unicamp". No evento, cujo tema central foi a produção do conhecimento, Ianni fez uma releitura do livro "Duas Culturas", do físico e romancista inglês C.P. Snow.

Na entrevista que segue, Ianni explica por que considera fundamental o diálogo entre as diferentes áreas do conhecimento e aborda temas nos quais se debruça ultimamente com especial atenção, entre eles a globalização, a guerra no Iraque, a atuação da mídia, os rumos da ciência e a importância das linguagens derivadas das manifestações artísticas. Retoma também a discussão sobre o papel da universidade num mundo, segundo ele, dominado pela visão sistêmica. "É um péssimo sinal que o exercício do pensamento crítico esteja sendo considerado como irreverente ou desnecessário".


JU -
O que levou o senhor a fazer uma releitura do livro "Duas Culturas", de C. P. Snow?

Ianni - O livro do Snow, publicado em 1959, tornou-se notável. Alguns dizem que se trata de um clássico. Na verdade, é uma obra importante que coloca o problema do diálogo entre as ciências em geral, em especial entre literatura e ciências sociais de um lado - que ele classificaria de humanidades - , e ciências, simplesmente, de outro, que seriam as ciências físico-naturais. Só que ele não aprofundou a análise. Ele levanta o problema, até com coragem, porque fala na importância do uso das ciências, das artes e das humanidades para diminuir as diferenças entre os pobres e os ricos etc, mas faltou uma abordagem no nível, digamos, propriamente lógico.

JU - E a que conclusões o senhor chegou?

Ianni - Relendo o livro e lendo outras coisas, acho perfeitamente válido dizer que não são duas culturas, mas, a rigor, três. Uma é a cultura das ciências naturais, apesar das diferenças entre elas - física, química, astronomia etc. Não há dúvida de que são ciências que têm um modo de narrar muito específico, inclusive uma preocupação com formalização, com previsões e com a possibilidade de testar as hipóteses. Neste sentido, as ciências naturais têm uma narrativa muito articulada e com um certo conjunto de procedimentos lógicos - indução, dedução, hipótese, teste etc.

JU - Muito diferente da narrativa das ciências sociais...

Ianni - Nas ciências sociais, das quais ele trata muito pouco, só de passagem, a narrativa é outra. Elas estão preocupadas principalmente em compreender as ações, as relações, os comportamentos, as instituições. Dá para dizer que a narrativa nas ciências sociais lida muito mais com a compreensão, ao passo que a narrativa nas ciências naturais empenha-se em explicar, principalmente, em termos de causa e efeito. Nas ciências sociais, a compreensão é a do sentido das ações das pessoas. É a análise do comportamento de um indivíduo, seja um anônimo ou de uma figura conhecida. Ela sempre revela vários significados nas ações dos indivíduos.

JU - O senhor poderia dar um exemplo de como essa narrativa dá-se em outros níveis?

Ianni - O caso de George W. Bush é emblemático. Alguns dizem que ele está querendo completar a obra iniciada pelo pai. Do ponto de vista da psicanálise, dá para dizer que ele está querendo consumar o assassinato do pai, porque superar o pai é um desafio que a psicanálise sempre levanta. Um desafio que ocorre nas relações filhos-pais e pais-filhos. Caso vença a guerra, ele vai sentir-se como quem conseguiu superar o pai, ou, metaforicamente, conseguiu matá-lo. Só que, em outro nível, podemos dizer que os significados das ações do presidente norte-americano e de sua equipe têm a ver com o petróleo, têm a ver com a afirmação da supremacia. Os fatos sociais são sempre carregados de vários significados. Nesse sentido, a narrativa nas ciências sociais está empenhada em captar o sentido ou os sentidos das ações, das relações, das tensões, dos conflitos sociais.

JU - Em que contexto as artes desempenham um papel relevante no campo dos significados e da compreensão dos fenômenos sociais?

Ianni - Dá para dizer que compreensão é uma forma de conhecimento. É uma forma de discernimento do que é a realidade. Mas dá para distinguir o que seria uma terceira forma, que poderíamos classificar de uma terceira cultura. A rigor, uso a expressão terceiro estilo de pensamento, que é aquele que por exemplo aparece nas artes - na literatura, na dramaturgia, na música, assim como na pintura e em várias outras linguagens artísticas. Descobrimos que o artista às vezes está metaforicamente trabalhando um dilema que todos os outros estão sentindo em outros termos, em outra linguagem.

JU - O senhor acha que o artista tem a capacidade de antever ou de retratar com mais fidelidade os momentos de convulsão e de ruptura?

Ianni - Sim. O caso mais ou menos evidente é Guernica, de Picasso. Quando a república espanhola o convidou para fazer um mural, para uma grande exposição, ele estava tateando, não sabia o que fazer. Estava começando a guerra do fascista Franco contra a república espanhola. Como os alemães, já aliados de Franco, estavam exercitando bombardeio aéreo, Picasso de repente teve um estalo. Produziu um painel de grande impacto ao revelar a brutalidade que é a guerra. Guernica passou para a história como se fosse uma ilustração de todas as guerras.

JU - No "Seminários Unicamp", o senhor citou exemplos de contemporaneidade entre linguagens e áreas diferentes. O senhor poderia dar um exemplo?

Ianni - Isso é interessante. Na passagem do século 18 para o século 19, Goethe, Beethoven e Hegel estavam de certo modo inquietos com uma realidade mundial que desafiava todo o mundo. Eles responderam a esses desafios e inquietações cada qual por meio de sua linguagem. É curioso notar que em todos eles havia uma preocupação de desvendar o que estava acontecendo. Hegel, especialmente na Fenomenologia do Espírito, queria desvendar qual é o momento mais avançado do desenvolvimento do pensamento da razão humana. Em Fausto, Goethe, que está no mesmo contexto, coloca algumas interrogações nas falas de Mefistófeles sobre as possibilidades de a razão conseguir um pleno discernimento. Já Beethoven, especialmente na 9ª Sinfonia, aproveitando o poema do Schiller, que corresponde à última parte da obra, canta um hino de glória ao novo mundo, a um novo período, à nova época da história. A despeito de ele usar a linguagem musical, estava também entusiasmado com o fato de haver, naquele momento, naquela época, uma ruptura, uma transição, uma transformação que estava abrindo horizontes excepcionais.

JU - O senhor refere-se à participação popular em diferentes instâncias?

Ianni - Além do que acontece com a razão, com a ciência, com a filosofia e com as próprias artes, estava acontecendo uma coisa que inaugurava o mundo contemporâneo, o mundo no qual estamos até hoje: o povo passou a fazer parte da história de uma maneira nova. Há uma frase de Napoleão, numa conversa com Goethe, em que ele teria dito que o papel que o destino desempenhava na tragédia grega no mundo moderno passaria a ser desempenhado pela política. Isso evidentemente está em Hegel e em Goethe. De certo modo a Ode à Alegria, que Beethoven aproveita de Schiller, é um hino ao novo período em que o povo entrou na história de uma maneira surpreendente.

JU - O senhor acha então que as revoluções filosóficas, científicas e estéticas ocorrem em períodos de crise ou de grandes transformações?

Ianni - Sem dúvida. Nessa mesma época, para falar do período da Revolução Francesa, do Iluminismo etc, há um conjunto de inquietações que fertilizam a criatividade de filósofos - Diderot, Kant, Hegel - , de cientistas - Lavoiser etc - e de artistas. Aqui se coloca um problema também fascinante, que é o de como as chamadas revoluções científicas podem ser vistas como acontecimentos que são contemporâneos de revoluções culturais, filosóficas e políticas. Daí por que estou convencido de que nessa época da história, no fim do século 20 e no começo do século 21, nós estamos metidos numa grande ruptura histórica.

JU - Daria para especular sobre a dimensão dessa ruptura?

Ianni - O declínio do mundo socialista, a transformação das nações socialistas em fronteiras de expansão do mundo capitalista e a tentativa dos EUA em se transformarem na única potência mundial e de instituírem uma espécie de administração mundial das várias nacionalidades e nações, isso está sendo uma transformação muito séria, muito profunda, que está abalando muitas convicções, muitas noções. Isso implicará um novo florescimento da filosofia, das ciências e das artes. Aliás, já há produções nas ciências sociais e algumas produções nas artes que demonstram que os seus autores estão interessados em compreender os novos horizontes.

JU - Quais seriam?

Ianni - Há uma parte grande da obra de autores como Samir Amin já traduzida na área das ciências sociais. São escritos que desembocam em novos conceitos, novas noções. Seus livros expressam isso. No cinema, temos filmes em que você não sabe qual é o país em que se passa a história. Isso significa que já há uma arte transnacional, cujos temas são de significação mundial e cujos personagens não precisam ser identificados como sendo deste ou daquele país. No passado, inclusive, houve produções que já prenunciavam uma arte cosmopolita. Os escritos de Borges, por exemplo, são de um tremendo cosmopolitismo. Ele estava dialogando com várias culturas, vários pensamentos.

JU - Qual é hoje, em sua opinião, o papel da mídia?

Ianni - A mídia hoje não é mais nacional. Se você procurar nos jornais que você lê, se procurar qual agência noticiosa que está informando sobre os acontecimentos, você não encontra. Às vezes, o jornal, com muita parcimônia, registra a fonte lá no cantinho de uma página. E eles nunca tornam transparente a forma como eles "cozinham" as matérias na redação. E as matérias, às vezes, vêm totalmente preparadas por agências de alcance mundial. Todo jornal hoje tem um quê de CNN.

JU - Quais são os efeitos dessa manipulação?

Ianni - Muitas notícias importantes são registradas de uma única forma, porque há uma agência que está, por assim dizer, monopolizando. As fotografias da guerra, por exemplo, são as mesmas em vários jornais. Nós não temos acesso às fotos e aos noticiários dos árabes; estamos condenados a ver e nos informarmos de uma maneira única e extremamente limitada. A globalização da mídia e das mensagens, a multiplicação de técnicas eletrônicas na área da mídia são também uma expressão desse quadro de mundialização.

JU - Como combater esse estado de coisas?

Ianni - Há muita gente na filosofia, na arte, na ciência e no próprio jornalismo que não está contente com esse quadro. Essas pessoas estão pensando criticamente os acontecimentos. Então se abrem outros horizontes.

JU - Mas até que ponto o mercado já não canibalizou essas tentativas de resistência?

Ianni - Não há dúvida que existe uma mercantilização da cultura. Mas o jornalista, o cientista social e o romancista não se ajustam sempre e exclusivamente a essas injunções.

JU - O senhor acha que as reações à guerra no Iraque se enquadram nesse contexto?

Ianni - Vamos voltar. Hoje o mundo é mais sistêmico do que nunca. A própria guerra é uma operação sistêmica. Ela foi planejada em detalhes, só que não está dando certo. É aquilo que aconteceu com o Garrincha na copa de 58...Os americanos esqueceram de explicar aos iraquianos que eles tinham que se comportar do jeito que o Pentágono queria. A visão sistêmica é burra, porque supõe que o outro vai se ajustar aos comportamentos que são previstos por aqueles que estão tomando decisões. Na verdade, não aconteceu isso, assim como na Guerra do Vietnã. Apesar de predominante, a visão sistêmica está sendo questionada porque as pessoas - apesar da força e da agressividade dessas estruturas - estão ligadas à vida, ao trabalho, estão trocando informações. Acontece que o movimento pacificista em escala mundial é um movimento contra a guerra, é um movimento antiamericano, é um movimento que prega outras formas de ver o mundo. E isso está fertilizando o pensamento de cientistas, de jornalistas, de pesquisadores e de artistas. Nós teremos seguramente um florescimento. Nos Estados Unidos, artistas de música popular estão protestando contra a guerra, afora outras categorias.

JU - O senhor acredita que a resistência e o poder de organização crescem na mesma medida da mundialização?

Ianni - Sem dúvida. Temos sempre as exceções. Alguns jornalistas, por exemplo, são muito vivos. Começaram a entrevistar os velhos generais da ativa e reformados dos Estados Unidos, colocando a nu as velhas divergências militares sobre a guerra do Iraque. Acho isso uma operação fascinante. Quer dizer, o jornalismo agindo com objetividade, mas indo a fontes de informações que ponham em causa a doutrina da guerra preventiva que Bush levou às últimas conseqüências. Nesse sentido, é que o mundo sistêmico, que está presente na universidade, na mídia, nas corporações, que predomina e domina o mundo de uma maneira avassaladora, não consegue monopolizar integralmente essa realidade. As inquietações de diferentes categorias sociais, de diferentes partes do mundo, estão rompendo com essas estruturas rígidas, apesar de os americanos agirem de acordo com o esquema ultranacional. O Pentágono pensou que a guerra ia durar uma semana, que tudo ia dar certo. Na verdade, as pessoas no Iraque, no mundo árabe, e as pessoas na sociedade americana, na sociedade inglesa, nas várias sociedades, estão protestando. O que nós temos é uma revolta da realidade social, do mundo social, contra modelos que são asfixiantes e inspirados numa visão sistêmica.

JU - Qual o papel da ciência e da tecnologia nesse universo?

Ianni - A ciência e a técnica estão, por enquanto, sendo administradas e monopolizadas pelas estruturas de poder, pertencentes às elites e às classes dominantes em escala nacional e mundial. Você sabe que a reforma do sistema de ensino do primeiro, segundo e terceiro graus que está sendo feita no mundo é uma reforma preconizada e imposta pelo Banco Mundial, que é uma organização sistêmica? A realidade é a seguinte: a ciência e a técnica que, em abstrato, por hipótese, são inocentes, têm sido usadas em escala crescente, como técnicas de poder.

JU - No caso da guerra, isso fica patente. Como o senhor vê o uso indiscriminado de equipamentos militares de última geração sob o pretexto de se poupar vidas de civis?

Ianni - A guerra que estão fazendo contra o Iraque é uma guerra na qual se mobilizam os conhecimentos científicos e tecnológicos os mais sofisticados para esmagar e destruir uma nação. Destruir aparentemente um governo, mas na verdade dilapidar os recursos naturais e materiais, destruir e provocar uma mortandade em grande escala naquele país. A solução é humanizar o uso da ciência e da técnica. Acontece que a sociedade burguesa faz parte de uma estrutura poderosa de poder das classes dominantes.

JU - Qual seria a saída?

Ianni - A única solução possível é a socialização dos meios de produção, é a transformação radical das estruturas da sociedade, para que, então, a ciência, a técnica, a cultura e as artes estejam à disposição da maioria da população e que os usos que se possam fazer desses recursos científicos e tecnológicos, artísticos etc, sejam os mais democráticos possíveis. Sem transformar a sociedade, não há ciência e técnica a serviço do humanismo.

JU - Como democratizar o acesso à tecnologia?

Ianni - Em alguns setores é claro que há uma certa difusão, mas você nota que no mundo contemporâneo o desemprego é avassalador, as doenças são sérias, a fome grassa. E, no entanto, o mundo hoje é muito rico, mas a distribuição dessa riqueza é muito desigual. Então, no limite, de fato na sociedade burguesa e democrática é possível alcançar alguns objetivos limitados de democratização da ciência. Mas a real e plena democratização da ciência e da técnica só será possível numa sociedade socialista. Imagine os Estados Unidos sendo uma sociedade socialista, bastante desenvolvida, com recursos científicos e técnicos que poderiam colocar tudo isso a serviço da população. É claro que isso resultaria numa democratização ampla não só dos recursos científicos e tecnológicos, mas numa real democratização política e social.

JU - O senhor acredita na reversão de modelos secularmente arraigados?

Ianni - É isso que vai acontecer futuramente. Seria ilusório imaginarmos que o mundo vai ser sempre capitalista, injusto é bárbaro. Eu acho que é perfeitamente factível que, na sucessão dos acontecimentos, das tensões, das lutas sociais, nós vamos ter um processo de socialização. Pode ser uma socialização lenta, pacífica, paulatina, atingindo diferentes setores. Dependendo do país e do continente, pode ser uma socialização resultante de conflitos mais drásticos. Mas não há nenhum argumento sustentável que consiga defender a tese de que o capitalismo é o único e definitivo modo de produção que se instalou no mundo. O feudalismo decaiu, o escravismo decaiu e o capitalismo está vivendo uma crise muito séria. Na minha utopia, se houver - como provavelmente haverá - um processo de socialização culminará na democratização social e política. Por que não imaginar que isso é possível? Trata-se de sonho de toda a história do mundo moderno. Desde o Renascimento isso é um grande sonho.

JU - O senhor consegue enxergar, nesse cenário, sinais de que as coisas estejam tomando outro rumo?

Ianni - Pode ser que isso se transforme em realidade. Uma condição importante para que isso aconteça é o declínio da supremacia norte-americana. Ele já começou e virá acompanhado de muitas convulsões em escala mundial. E essas convulsões, que serão penosas, danosas, vão fertilizar o mundo para novas perspectivas.

JU - Como, a seu ver, a universidade tem se comportado nesse cenário convulsionado?

Ianni - O uso crescente da tecnologia e sua respectiva industrialização produzem uma adoção crescente da razão técnica-instrumental no âmbito da universidade, o que em si não é nem ruim nem bom. É uma realidade, tudo bem. Só que está havendo um predomínio exclusivo do pensamento tecnocrático. Estão reduzindo, senão marginalizando, continuamente, o pensamento crítico. O pensamento instrumental está invadindo crescentemente a universidade. O argumento é bonito: nós temos que fazer pesquisa para resolver problemas sociais. Eu pergunto: problemas sociais de quem? Na verdade, muitas das conquistas técnicas que a universidade tem produzido são usadas pela empresa privada. E o desemprego é crescente. Na verdade, o uso das conquistas científicas e tecnológicas para a maioria da população ainda está muito restrito. E o problema, grave, é que a universidade está sendo invadida por interesses tecnocráticos não só alheios a ela. Setores internos acreditam que fazer pesquisas de acordo com certos projetos de corporações é um trabalho válido para a sociedade.

JU - O senhor acha essa visão equivocada?

Ianni - Depende. Se o resultado vai ser distribuído para toda a sociedade é muito bom. Mas, se os resultados vão servir para certas corporações aperfeiçoarem as inovações, não entendo, porque quem se beneficia dos lucros e das vantagens que se obtêm são essas empresas e corporações. Então, está havendo esse fenônemo que eu chamo de uma reversão. A universidade nasce comprometida com a ciência, que é uma forma de praticar o pensamento crítico, mas o pensamento tecnológico está aumentando sua presença no meio universitário e isto é muito evidente. Há setores, inclusive - e falo das ciências sociais - , em que o exercício do pensamento crítico é malvisto. É provável que haja algo semelhante nas ciências físico-naturais, mas é um péssimo sinal que o exercício do pensamento crítico, independente, como uma forma de levantar novas hipóteses, novas perpectivas, esteja sendo considerado como irreverente ou como desnecessário.

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