Ciro Gomes critica culto à personalidade na política em conferência sobre “A Crise Brasileira”

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O ex-ministro Ciro Gomes fez uma análise sobre a crise política durante conferência proferida nesta sexta-feira (22) dentro do ciclo “A Crise Brasileira”, organizado pelo Instituto de Estudos Avançados (IdEA), no Centro de Convenções da Unicamp (assista a íntegra da palestra no link abaixo). Ex-governador do Ceará (1991-1994) e ex-ministro da Fazenda (1994) e da Integração Nacional (2003-2006), ele atraiu um grande contingente de pessoas, que lotaram o auditório para ouvir sua exposição sobre as razões que levaram à polarização exacerbada no cenário brasileiro e suas propostas para superar a crise institucionalizada.

Terceiro colocado na última eleição para a Presidência da República, Ciro Gomes, com seu estilo enérgico e direto de se expressar, fez um histórico sobre a situação do país desde a Nova República e apresentou um diagnóstico que mostrou como os problemas políticos e econômicos culminaram na atual conjuntura de ascensão da extrema direita. Ele centrou suas críticas na tendência de culto à personalidade que tem dominado o debate nos extremos do espectro político e citou caso da Bolívia e do golpe que tirou do poder o presidente Evo Morales em meio à acusação de fraude eleitoral ao tentar um novo mandato.

Reitor Marcelo Knobel abriu o evento "A Crise na Política", organizado pelo Instituto de Estudos Avançados da Unicamp (Idea)
Reitor Marcelo Knobel abriu o evento "A Crise na Política", organizado pelo Instituto de Estudos Avançados da Unicamp (Idea)

“Não é o problema de trocar Chico, Maria ou José por Rita, Pedro ou Antônio. É vão o culto à personalidade. Não existe São Ciro, não existe São Bolsonaro e, infelizmente, não existe São Lula. Não existe isso. Qualquer país do mundo que empate suas energias nessa crença vai dar com os burros n’água. Quem não entendeu isso pela sociologia, pela política e pela história, dá uma olhada no experimento boliviano”, declarou Ciro, lembrando que, diferentemente do Brasil, o país crescia 6,5% ao ano e estava agregando valor à sua base de produtos tradicionais, além de ter nacionalizado o lítio. Mesmo assim, afirma, não resistiu à tentação do culto à personalidade e do messianismo.

Sem poupar críticas ao Partido dos Trabalhadores e ao conservadorismo representado pelo presidente Jair Bolsonaro, Ciro se apresentou como uma terceira via no cenário eleitoral brasileiro. Para ele, após a redemocratização, houve a necessidade de criação de um novo modelo, que a sociedade brasileira ainda não conseguiu encontrar. “As duas livres forças que operaram no pacto Constituinte de 1988 resolveram, pela questão específica de São Paulo, rivalizar agressivamente entre si e não cooperar: PT e PSDB. Resultado prático: o velho Brasil corrupto, fisiológico e patrimonialista é a única coisa que não sai do poder. É uma coisa caricata.”

Em sua análise, ele diferenciou três camadas para a crise política brasileira. A primeira é externa, chamada por ele como a “crise agônica da democracia representativa”, decorrente da adesão do pensamento progressista ao modelo neoliberal, a partir dos anos 1980 e 1990, e que levou à desmoralização da política. Para o ex-ministro, o segundo componente é brasileiro, pois o país está em um “vácuo constitucional” em que o poder constituído está promovendo a revogação do pacto de 1988 de maneira ilegítima, como no caso do teto de gastos públicos, que impede o atendimento das necessidades básicas da população estabelecidas na carta magna.

Público lotou o Auditório no Centro de Convenções para a conferência do ex-ministro
Público lotou o Auditório no Centro de Convenções para a conferência do ex-ministro e ex-governador

O terceiro aspecto refere-se às consequências que a crise econômica traz para o cenário, com 13 milhões de desempregados, 38,8 milhões de trabalhadores na informalidade, 63,7 milhões de brasileiros endividados e com restrições ao crédito, 5,5 milhões de microempresas inadimplentes, entre outros fatores. “A política é a causa de tudo isso, porque isso não aconteceu como acidente, e é a única saída que nós temos. Portanto, é uma tragédia e uma oportunidade aquela que nós temos hoje no Brasil.”

Apesar da complexidade do cenário, Ciro Gomes propõe uma discussão profunda sobre o tema do financiamento público das campanhas eleitorais, que poderia permitir uma maior transparência nas relações entre poder e capital, apesar de ainda ser alvo de muitas críticas. “É um debate complexo que vai na contramão da moral dominante”, pondera.

Além disso, sugere uma mudança no calendário eleitoral, inspirado no modelo da França, com eleições nacionais em três datas: um primeiro e segundo turnos para os cargos do Executivo, e um terceiro escrutínio, um mês depois da segunda votação presidencial, para o Legislativo. “Qual é o efeito disso? O Parlamento será eleito já à luz do voto que foi dado hegemonicamente para o Executivo. Isso tende a diminuir muito a lógica de impasse, por exemplo, entre um presidente reformista, que queira mudar as estruturas do país, e um Parlamento que tende a ser conservador porque cercado e asfixiado pelo lobby do status quo, do conservadorismo.”

Natural de Pindamonhangaba (SP) e formado em Direito pela Universidade Federal do Ceará (UFCE), Ciro Gomes ocupou também o cargo de deputado federal (2007-2011), além de ter disputado a Presidência nas campanhas de 1998, 2002 e 2018. Foi professor da Universidade Vale do Acaraú (UVA), em Sobral, e da Universidade de Fortaleza (Unifor) na década de 1980, além de ter sido pesquisador visitante na Harvard Law School (1995-1996).

A mesa de abertura da conferência contou com a participação do reitor da Unicamp, Marcelo Knobel, da coordenadora geral da Unicamp, Teresa Atvars, do presidente do Conselho Científico e Cultural do IdEA, Carlos Vogt, e do jornalista Paulo Markun, responsável pela mediação do evento.

“A Crise Brasileira” está trazendo nomes importantes de distintas áreas do conhecimento para a Unicamp como forma de estimular a discussão sobre temas atuais em busca de diagnósticos e soluções para as diversas crises que afligem a vida do país. Entre setembro e novembro, o evento recebeu conferências do economista Luiz Gonzaga Belluzzo (Economia), do filósofo João Carlos Salles (Universidade), do educador Mozart Neves Ramos (Educação) e do diplomata Rubens Ricupero (Relações Internacionais).

Assista a palestra na íntegra :

 

Ouça entrevista concedida à Rádio Unicamp. 

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Ciro Gomes participou da série de conferências sobre "A Crise Brasileira"

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