Das doenças
negligenciadas
para uma
saúde
valorizada

17/08/2012 - 15:20

/
Stobbaerts, da DNDi: sucessos no Brasil

Stobbaerts, da DNDi: sucessos no Brasil

Meyer: a indústria em políticas públicas

Meyer: a indústria em políticas públicas

Gastão Wagner: “O Brasil está até bem”

Gastão Wagner: “O Brasil está até bem”

“O desafio de fármacos para doenças negligenciadas” foi o tema de mais um Fórum Permanente de Esporte e Saúde, que reuniu representantes da academia, organizações sem fins lucrativos, instâncias do governo e indústria farmacêutica nesta sexta-feira (17), no Centro de Convenções. A proposta é estimular e compartilhar o conhecimento científico e a expertise produzidos na universidade e fomentar futuras parcerias entre esses diferentes setores. Os Fóruns Permanentes são realizados pela Coordenadoria Geral da Universidade (CGU), sendo que este evento teve a organização da Pró-Reitoria de Extensão e Assuntos Comunitários (Preac).

As doenças negligenciadas são assim chamadas porque tendem a ser endêmicas em populações de baixa renda e não despertam o interesse da indústria farmacêutica para a produção de medicamentos e vacinas, havendo ainda carência de recursos para pesquisa e execução de políticas públicas visando o seu combate. O termo é utilizado para doenças como dengue, doença de Chagas, leishmaniose, malária, esquistossomose, hanseníase e tuberculose – causadas por agentes infecciosos e parasitários (vírus, bactérias, protozoários e helmintos).

O professor João Frederico da Costa Azevedo Meyer, pró-reitor de Extensão e Assuntos Comunitários, disse que o fórum é uma forma de disponibilizar o conhecimento da Universidade e de reunir órgãos governamentais e a indústria de medicamentos para “se chegar a uma sociedade não das doenças negligenciadas, mas da saúde valorizada". “A minha impressão, como leigo, é de que produzimos muito mais pomadas antirruga e silicone do que remédios para leishmaniose ou mal de Chagas. Como Campinas é um centro tecnológico na produção de fármacos, a ideia foi colocar instâncias do governo e a ciência básica em contato com a indústria, que também pode trabalhar em termos de políticas públicas para o atendimento desses doentes.”

A palestra de abertura foi concedida por Eric Stobbaerts, diretor para a América Latina da DNDi (Drugs for Neglected Diseases initiative), organização internacional sem fins lucrativos que já conta com aproximadamente 500 parceiros no mundo para pesquisar, desenvolver e disponibilizar novos e melhores medicamentos a pacientes que sofrem com doenças negligenciadas. “Vou falar dos vários modelos de parceria desenvolvidos pela DNDi, em particular do modelo para o Brasil. E também sobre o papel específico que a Unicamp e o polo industrial da região de Campinas poderiam cumprir como aliados engajados na questão da saúde dos mais pobres.”

Segundo Stobbaerts, o foco da DNDi no Brasil está na doença de Chagas, malária e leishmaniose nas formas visceral e cutânea. “Nosso trabalho já soma dois sucessos: um novo medicamento contra a malária desenvolvido com a Farmanguinhos [da Fiocruz] e uma formulação pediátrica para doença de Chagas juntamente com o Laboratório Farmacêutico de Pernambuco. A meta institucional da DNDi é consolidar ainda mais o portfólio de atividades para conseguir de oito a treze novos medicamentos até 2018 – e sabemos que esta região pode contribuir muito para isso.”

O médico sanitarista Gastão Wagner de Souza Campos, docente da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp, mediou a mesa-redonda da manhã, sobre “Impacto e desigualdade das doenças negligenciadas: necessidades e busca de soluções inovadoras de transformação social”. Em sua opinião, o Brasil possui políticas públicas de saúde “razoáveis”, comparado com outros países da América Latina e da África. “Temos forte tradição nesta área, desde o início do século 20, quando criamos o Emílio Ribas e a Fundação Oswaldo Cruz, e depois com o Sistema Único de Saúde. Conseguimos enfrentar, por exemplo, a epidemia de Aids, que não é uma doença negligenciada, mas muitas populações são negligenciadas no tratamento, como na África – e nós não negligenciamos esses doentes.”

Em relação às doenças negligenciadas, o docente da Unicamp considera que o país vem enfrentando a epidemia de dengue e a doença de Chagas com dificuldades, o que atribui ao fato de que o sucesso no combate a estas doenças depende de uma ação global. “Esta ação deve ser coordenada pela Organização Mundial da Saúde, que possui baixa capacidade de articulação junto aos governos. Mas eu consideraria que o Brasil está até bem, precisando apenas reorientar os investimentos públicos, discutindo a  lista de doenças negligenciadas e priorizando alguns programas.”

Gastão Wagner acrescenta que, diante da falta de interesse da indústria em produzir medicamentos para tais enfermidades, a estratégia brasileira foi de providenciá-los através das políticas públicas. “Quando o mercado não atende, os laboratórios públicos atuam, como no caso da poliomielite, vacinas, soros, uma boa parte dos medicamentos de tuberculose e vários de verminoses. Se o Estado não produz, ele encomenda e compra, induzindo economicamente a indústria a produzir. O Brasil possui um dos sistemas públicos em que o acesso a medicamentos é dos melhores.”