Edição nº 667

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 29 de agosto de 2016 a 11 de setembro de 2016 – ANO 2016 – Nº 667

A alternativa biocêntrica é discutida
por especialistas do Brasil e exterior

Mesas-redondas reúnem intelectuais no
âmbito série Perspectivas Unicamp 50 Anos

Pesquisadores do Brasil, Áustria, França e Inglaterra apresentaram dia 24 seus estudos sobre “Alternativa Biocêntrica”, dentro da série Perspectivas Unicamp 50 Anos, no auditório da Adunicamp. Os especialistas em antropologia social, ciências sociais, estudos de gênero, produção cultural e meio ambiente foram reunidos em duas mesas-redondas: “Crises Ambientais e Decrescimento”, discutindo os debates vigentes nas ciências humanas quanto à alternativa biocêntrica face ao colapso ambiental, com ênfase para o decrescimento e a simetria política entre as espécies; e “Cidadania Ampliada”, analisando um novo pacto entre as espécies sob o enfoque da alternativa biocêntrica.

A mesa da manhã foi coordenada pelo professor Mauro William Barbosa de Almeida, do Departamento de Antropologia da Unicamp, que atua em pesquisas sobre a Amazônia, reservas extrativistas, diversidade social e teoria antropológica. “Vamos discutir o conceito de decrescimento como alternativa para a crise ambiental”, adiantou. É uma ideia que tomou corpo por volta dos anos 1970, quando começaram a aparecer trabalhos de biólogos e economistas principalmente, e de outros estudiosos, apontando para o esgotamento próximo dos recursos naturais associado ao crescimento industrial e da população – e com isso uma perda da qualidade de vida na Terra.”

Mauro Almeida explica que a alternativa biocêntrica se baseia em conceitos vindos de ciências como ecologia, agronomia, física e economia, gerando um debate sobre o que fazer diante desta percepção de uma crise de recursos naturais e perda das espécies de vida. “Uma das alternativas vem dos que dizem que a tecnologia vai resolver tudo, incluindo problemas como de suprimento de energia, com abundância e progresso técnico. É o pensamento otimista de que o mundo deve continuar na mesma rota. A outra corrente aponta para a necessidade de uma contenção da expansão, sendo menos difundida no Brasil, por ser um país que ainda está nessa rota, querendo crescer.”

Segundo o professor do IFCH, a corrente pela contenção é mais forte na Europa, onde certos países estão em fase de estabilidade e até de declínio da população. “Há uma preocupação de reorientar as atividades humanas para a qualidade de vida, com uma estabilidade e não com uma expansão infinita. Esta corrente não é forte em nosso país, mas está presente, por exemplo, na construção de megausinas como a de Belo Monte: temos aqueles que acham que há alternativas menos impactantes e de pequena escala para abastecimento energético futuro, e outra visão antecipando uma demanda muito ampliada de energia para fins industriais, mineração, etc. A alternativa biocêntrica é um movimento que vai crescer neste século em escala mundial.”

O convidado internacional da primeira mesa foi o professor Marc Brightman, diretor do Centro de Antropologia e Sustentabilidade da University College London (UCL), que tem várias publicações sobre governança global da floresta, conservação e cosmopolíticas. “Abordo, dentre várias coisas, da pesquisa que faço com os estudantes sobre o tema da sustentabilidade e, a partir dela, sobre o que podemos entender como alternativa biocêntrica, a começar por alguns aspectos da crise ecológica mundial. Uma pergunta é se as medidas adotadas por organizações internacionais para proteger populações tradicionais e os lugares onde moram, são elas mesmas sustentáveis, preservando não só a natureza, mas também a convivência com outras espécies.”

A coordenação da mesa da tarde coube à professora Nádia Farage, do Departamento de História da Unicamp e autora de diversos artigos sobre naturismo, animalidade e biopolítica no Brasil moderno. “Vamos tratar, basicamente, sobre a contribuição das ciências humanas e da filosofia, bem como da crítica literária, para repensar a condição animal. É um tema que se articula com o da manhã, pois não há como pensar o crescimento sem repensar a carnificina sobre a qual a produção capitalista se baseia. Se é para haver uma mudança de fato em nossa maneira de estar na vida, ela começa na maneira como nos relacionamos com as outras espécies.”

A mesa da manhã também contou com a presença do professor Luiz Cesar Marques Filho, do Departamento de História da Unicamp e autor de “Capitalismo e Colapso Ambiental”. Do debate da tarde também participaram: Claudia Leitner, da Universität Wien (Áustria), cujas áreas de interesse são literatura, estudos da mídia, de gênero, pesquisa histórica sobre as mulheres, literatura, bioética e ciências da vida, bem como estudos em animais; Fahim Amir, da Kunstuniversitaet (Áustria), autor de artigos sobre produção industrial de animais, trabalho animal e zoopolíticas;  e Hicham-Stéphane Afeissa, da Université de Franche-Comté (França), que depois de vários anos estudando a fenomenologia de Husserl e a filosofia Kantiana, voltou seu interesse para a filosofia ambiental.