Edição nº 651

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 04 de abril de 2016 a 10 de abril de 2016 – ANO 2016 – Nº 651

Telescópio


Anatomia
do zika vírus

Pesquisadores dos Estados Unidos apresentam, na edição mais recente da revista Science, uma análise da estrutura do zika vírus, observada na escala de angstroms, ou décimos de nanômetro.

O estudo mostra que o zika é bastante semelhante a outros flavavírus – nome dado à família que inclui os vírus da dengue e da febre amarela, entre outros, além do próprio zika – exceto por um conjunto de dez aminoácidos localizado em sua carapaça, numa área possivelmente envolvida na ligação entre o vírus e a célula hospedeira.

As observações descritas no periódico foram feitas com o uso de criomicroscopia eletrônica, técnica em que o microscópio eletrônico é aplicado a amostras mantidas em temperaturas extremamente baixas, sem necessidade do uso de contrastes ou fixadores.

A escolha
do passarinho

Quando um pássaro adulto leva comida para os filhotes no ninho, ele precisa decidir quem terá prioridade para receber a refeição. Diversos estudos mostram que essa decisão atende ou a sinais de necessidade (são alimentados, preferencialmente, os filhotes que fazem mais algazarra, que pedem mais) ou de qualidade (a preferência é dada aos filhotes maiores e mais fortes). A questão sobre como os pais decidem entre um critério ou outro é analisada em artigo publicado no periódico Nature Communications.

Os autores, de instituições da Inglaterra e da Holanda, realizaram uma revisão da literatura e concluíram que, em mais de uma centena de espécies estudadas, os pais tendem a dar preferência aos filhotes mais necessitados quando o ambiente ao redor é favorável, e aos mais fortes quando o ambiente é incerto ou hostil. “No geral, esses resultados mostram como variações ecológicas podem levar a diferentes sistemas de sinalização, que são estáveis em diferentes espécies”.

Genoma
do gorila

Avanços na construção do genoma do gorila (Gorilla gorilla gorilla) são descritos na revista Science. O primeiro sequenciamento do genoma dessa espécie foi publicado em 2012, mas trazia diversas lacunas, além de incertezas na localização de certas sequências específicas dentro da estrutura maior. Os autores do novo trabalho, vinculados a instituições dos Estados Unidos, afirmam ter resolvido 96% das dúvidas em relação à posição correta de sequências curtas dentro do genoma, e fechado 94% das lacunas existentes.

Larvas
cicatrizantes

Larvas de uma espécie de mosca (Lucilia sericata) foram geneticamente modificadas para secretar um fator de crescimento humano em feridas, acelerando a cicatrização. A descrição e caracterização das larvas transgênicas aparecem no periódico de livre acesso online BMCBiology.

O uso de larvas de L. sericata como parte do processo de limpeza de certas feridas, com a remoção dos tecidos mortos, já é aprovado pelo FDA, o órgão de controle de medicamentos dos Estados Unidos. Os criadores da versão transgênica esperam que o tratamento possa, a partir de agora, tornar a recuperação dos pacientes mais rápida. Os animais modificados foram criados por uma equipe da Universidade Estadual da Carolina do Norte (EUA).

Dia e noite
em superplaneta

Pesquisadores americanos e europeus apresentam, na revista Nature, a descrição do contraste entre dia e noite na temperatura da atmosfera de uma “Super Terra”, categoria que inclui mundos com até dez massas terrestres. O planeta estudado foi 55 Cancri e, que orbita sua estrela a uma distância de menos de 2% da que separa a Terra do Sol. A estrela, 55 Cancri A, é semelhante ao Sol.

Os autores do artigo na Nature determinaram que a temperatura no lado noturno do planeta, que tem menos de duas vezes o raio da Terra, é de 1.107º C, e a do lado diurno, 2.427º C. O estudo detectou ainda um ponto de temperatura extrema afastado do equador, o que sugere a presença de mecanismos de transporte de energia no planeta, como ventos fortes ou fluxos de lava.

Navegação
atrofiada

O uso crescente de sistemas de navegação por satélite está atrofiando a capacidade humana de coordenar visão e memória para determinar localizações no espaço, diz artigo de opinião publicado na revista Nature.

O autor do artigo, Roger McKinlay, foi um dos responsáveis pelo desenvolvimento da moderna tecnologia de navegação por satélites, mas hoje adverte para os riscos da crescente dependência dessa tecnologia, principalmente por parte do grande público.

Ele cita simulações mostrando que motoristas que seguem cegamente instruções de GPS têm menos noção de onde estão do que os que seguem mapas, e argumenta que, além de tornar os sistemas automáticos de navegação mais precisos e confiáveis, os governos deveriam investir no ensino de perícias de navegação, como leitura de mapas e orientação pelas estrelas. “O uso de calculadoras e computadores não eliminou a necessidade de entender os números”, compara.

Epidemias
em metrópoles

Diferenças de densidade populacional e de condições ambientais entre áreas de uma mesma metrópole afetam a forma como epidemias se espalham pela mancha urbana em resposta a variações climáticas, diz estudo publicado no periódico PNAS. O artigo, de autoria de pesquisadores dos Estados Unidos e Bangladesh, analisou mais de 20 anos de dados sobre a disseminação do rotavírus na metrópole bengali de Dhaka, levando em conta a sazonalidade das chuvas de monção.

“Demonstramos que a consideração de diferentes partes da cidade, centro e periferia, é fundamental para revelar importantes diferenças nas epidemias sazonais e nos efeitos da monção”, escrevem os autores. “Doenças infecciosas que não são tipicamente tidas como sensíveis ao clima podem passar a sê-lo, em áreas sob as condições demográficas e ambientais dos grandes centros urbanos do mundo em desenvolvimento”.

Vida
mínima

Em sua penúltima edição de março, a revista Science traz artigo em que pesquisadores dos Estados Unidos descrevem a construção de um “genoma mínimo” de 473 genes, contendo apenas o essencial para sustentar uma forma de vida extremamente simples. A equipe responsável foi a mesma que, em 2010, havia anunciado a criação de “vida sintética”, com a construção de um genoma de bactéria em laboratório, e que depois foi implantado numa célula.

O novo trabalho teve como base a mesma bactéria usada em 2010, a Mycoplasma mycoides. Por um processo de tentativa e erro, os autores “refinaram” o DNA do organismo até chegar ao menor genoma viável, classificado com o código JCVI-syn3.0. “JCVI-syn3.0 retém praticamente todos os genes envolvidos na síntese e no processamento de macromoléculas”, escrevem os pesquisadores. “Inesperadamente, ele também contém 149 genes com função biológica desconhecida”.

Gravidade
mínima

Um dispositivo portátil minúsculo, capaz de detectar variações mínimas na aceleração gravitacional local, como as causadas pela presença de um túnel subterrâneo, é descrito na revista Nature. Esse gravímetro de apenas 25 miligramas e 15 milímetros quadrados foi desenvolvido, com tecnologia derivada dos acelerômetros presentes nos telefones celulares, por pesquisadores da Universidade de Glasgow.

Fungos e bactérias
na cozinha

Micro-organismos sempre tiveram um papel fundamental na preparação de alimentos humanos, do fermento do pão à levedura da cerveja, passando pelas bactérias do queijo. Artigo de opinião na edição mais recente do periódico Nature Microbiology aponta uma nova fronteira para o uso culinário dessas minúsculas formas de vida.

“Uma nova apreciação de velhas técnicas e uma reinterpretação de seus usos está transformando a relação humano/micro-organismo/substrato numa nova ferramenta da cozinha, tão essencial quanto a faca e a frigideira”, escreve a autora, a pesquisadora Arielle  Johnson, que trabalha no restaurante dinamarquês noma.

Ela lembra que, tradicionalmente, a produção de sabor acontece na fazenda, e que a função do cozinheiro é preservar, acentuar ou misturar esses sabores. Já a contaminação dos alimentos por micro-organismos na cozinha costuma ser vista como uma forma de degradação. “Fermentar para gerar sabor não é uma área de interesse tradicional para cozinheiros”, escreve. “Mas acrescentar transformações microbianas ao repertório da cozinha pode gerar uma nova dimensão de controle sobre os sabores e abrir novos caminhos para expressar o potencial dos ingredientes”. A autora diz que essa tendência, que segundo ela vem crescendo na última década, representa uma evolução da “gastronomia molecular” dos anos 90, e abre novos caminhos de colaboração criativa entre ciência e culinária.