Foto: Antoninho PerriRoberto Romano da Silva é professor titular aposentado do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp. Autor de vários livros, entre eles “Brasil, Igreja contra Estado” (Editora Kayrós, 1979), “Conservadorismo romântico” (Editora da Unesp), “Silêncio e Ruído, a sátira e Denis Diderot” (Editora da Unicamp), “Razão de Estado e outros estados da razão” (Editora Perspectiva). 

"Scientia vinces"

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Agradeço a honra de falar aos funcionários, estudantes, colegas da Universidade Federal de Roraima. Recordarei, em momento de perigo para as ciências e a vida humana, aspectos de nosso passado desde que existem pessoas e instituições ligadas ao pensamento, cuja etimologia liga-se à balança: pensar vem do ato de pesar. Quem não pesa vocábulos, conceitos, métodos, tomba na charlatanice e na violência. O pensamento universitário é crítico ou reunião de certezas a soldo de poderes obscurantistas na tarefa de semear a morte.

A universidade começa nas Academias gregas, sobretudo as de Pitágoras, Platão, Aristóteles, Estoicos, Epicuristas. Ali o pensamento adquire os traços éticos que reconhecemos no labor científico, técnico, humanístico. As pesquisas da Grécia clássica abarcam o universo espiritual e físico, sempre armadas pela matemática. É célebre o dito na Academia platônica: οὐδείς ἀγεωμέτρητος εἰσίτω (quem não conhece geometria, não entre). A busca amiga do saber –Φιλοσοφία – abarca a existência sem limites ou regras que limitem a pesquisa. Ela se opõe ao ódio pelo pensamento, μισολογία, termo inventado por Platão para designar a mente obscurantista e violenta.

Na guerra entre a busca do saber e a misologia, ocorre a luta da curiosidade malsã versus a procura do que é. Plutarco indica os dois caminhos: o da ciência e o da nefasta curiosidade. Os olhos reúnem duas formas de atenção: a pesquisa (zetesis) e a curiosidade, “polupragmosine”. O zetetés, investigador, usa os olhos para captar o que é e atinge um conhecimento dificilmente comunicável. O curioso caça informações sobre tudo e todos, coisas e atos sem relevância para o Bem. A cura do curioso seria a pesquisa, tratamento que consiste em “transferir a curiosidade, transformando-a em gosto por assuntos honestos e agradáveis: seja curioso do que se passa no céu e na terra, nos ares e no mar, os segredos da natureza, pois esta não se enraivece quando eles são roubados…” (De Curiositate, 5). Nas Academias gregas é praticada a pesquisa (Zetesis). O fato recebe atestação do apóstolo Paulo. Em contraste com os judeus que exigem sinais, os helenos pesquisam: ἐπειδὴ καὶ ἰουδαῖοι σημεῖα αἰτοῦσιν καὶ ἕλληνες σοφίαν ζητοῦσιν: Quoniam et Judæi signa petunt, et Græci sapientiam quærunt. Pois, enquanto judeus pedem sinal, os gregos buscam sabedoria (II Corintios, 1, 22). O Renascimento retoma as Academias. Elas dão alento para as universidades já presas nas malhas do controle régio ou papal.

Vejamos as universidades. Valho-me de Jacques Le Goff. O que é o intelectual? Pessoa “que faz do pensar seu ofício e, dele, o mister do ensino”. Eles surgem no século 12 e se espalham pela Europa. Bolonha reúne intelectuais, mas é sustentada pela corporação dos advogados, daí a sua autonomia diante dos poderes feudais, da Igreja, dos reis. Ela mantém as marcas das corporações de ofício, fechadas aos não membros. As outras universidades no século 12 são corporações abertas. Começam a se despovoar os feudos, clericais ou laicos, com a fuga dos camponeses. Os membros da jovem universidade são na maioria imigrantes que fogem dos feudos rumo às cidades. O comércio retoma estradas do Império Romano com a troca de mercadorias e ideias. As rotas são retomadas para algo que não pode ser recusado pelos senhores feudais: a peregrinação. Surgem templos dedicados à Virgem Maria, as catedrais góticas. Os arquitetos que as erguem seguem modelos matemáticos gregos como em Chartres, onde se usa o plano geométrico de Platão no diálogo Timeu. A vastidão dos novos edifícios religiosos, sua transparência com vitrais reluzentes, tudo depende de cálculo e perícia. Para atender tal necessidade surgem as reuniões universitárias. Estas últimas, segundo Le Goff se afirmam como “oficinas de onde são exportadas as ideias como se fossem mercadorias”. Elas se organizam como corporações que acolhem os fugitivos do feudo.

Aos milhares e milhares os jovens falam as mais diversas línguas. O latim os une. Professores e estudantes debatem com liberdade. Todos apresentam questões, saber e perícia na análise lógica são mais relevantes do que os títulos de mestre ou doutor.

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O ensino da Teologia é seguido pela Medicina e Direito. A Igreja e o novo aparelho estatal precisam de intelectuais para aplicar saberes administrativos (os primeiro germes da burocracia); regular as relações econômicas com o direito; curar as mazelas da população na luta contra epidemias geradas no inédito aglomerado urbano. Documentos mostram ofertas de reis e papas aos pesquisadores competentes, acenam com melhores salários, condições de vida adequadas, autonomia no estudo e no debate.

Com o fortalecimento das máquinas estatais e eclesiástica, suas burocracias estabelecidas, fraqueja a liberdade universitária, brotam regras rígidas de estudo e ação. A liberdade cede passo às ordens emanadas das instituições externas que financiam a ordem universitária. Os campi se transformam em conjuntos submetidos a hierarquias rígidas. O saber universitário torna-se o serviçal dos poderes. Quem paga a conta manda na forma e conteúdo dos estudos. O reitor Gerson diz com brutalidade: pouco importa o debate sobre a justiça “desde que os donos das galinhas durmam em paz”. O mundo universitário é polícia da propriedade privada e do mando estatal ou religioso. Censor das ideias e práticas científicas ou humanísticas e unido ao Rei e à Inquisição ele aparece, no enunciado de Jacques Le Goff, como a “corporação dos queimadores de livros”. Relevantes intelectuais, do século 17 em diante, são tratados como seus inimigos. Pesquisas e pensamentos se desenvolvem fora e contra a universidade. Assim é com Descartes, Pascal, Leibniz, Spinoza e outros. O campus se define como fábrica de técnicos de governo – expressão de Imanuel Kant –, polícia das ideias e da ciência, saber encastelado.

No século 18 Denis Diderot, campeão da campanha em prol do saber popular contra as tiranias estatais e religiosas, indica ser a universidade de seu tempo um fantasma gótico. Estranha à vida moderna em termos arquiteturais – até hoje resiste a arquitetura gótica em universidades europeias e norte-americanas – ela o é também na ordem dos saberes. Em projeto para uma nova universidade, a ele solicitado por Catarina 2 da Rússia, Diderot retoma o programa de Francis Bacon para o ensino a ser construído. Bacon –como Descartes – é contra a aristocracia “natural” do saber. Ele confia no método científico que democratizaria a cultura. Para traçar um círculo perfeito é preciso enorme perícia. Poucos conseguem tal façanha. Com o compasso todos o podem traçar. O método iguala forças intelectuais. Bacon usou a profecia bíblica – no livro de Daniel, 12:4 – para justificar a expansão máxima da ciência pela humanidade. “E tu Daniel, encerra estas palavras e sela este livro até o fim do tempo; muitos correrão de uma parte para outra, e o conhecimento se multiplicará”.

Marca expansiva do saber

Dois elementos encontram-se na leitura de Daniel feita por Bacon. Primeiro, a marca expansiva do saber. É impossível fechá-lo em muros inexpugnáveis dentro dos quais apenas alguns usufruem a ciência e a técnica. Um saber verdade, por excelência, pode e deve ser comunicado ao maior número de seres humanos. Segundo: a imagem espacial importa muito na expansão da ciência, no ensino. Para adquirir conhecimentos os

estudantes medievais que inauguram as universidades viajam, seguem para localidades ignoradas nas quais são recebidos como perigosos imigrantes. Enquanto a universidade medieval é viva e livre, ela é o lugar de passagem de indivíduos e grupos de todas as origens. A universidade reúne imigrantes. A maioria deles é pobre, sem recursos próprios, depende de auxílio e bolsas concedidas pela Igreja ou pelos governos. Professores italianos ensinam na Alemanha, alemães na França, Inglaterra, Holanda. Ao longo dos séculos, até os nossos dias, nenhuma universidade é composta apenas de nativos, de cidadãos nascidos nas fronteiras dos países. A circulação de pesquisadores, estudantes e mesmo de funcionários integra o próprio sentido da universidade. Sem estrangeiros, sem imigrantes, nenhuma universidade é viável. As universidades chinesas, hoje na ponta das pesquisas científicas e técnicas, acolheram investigadores de todos os países, e ainda os acolhe.

Tal fato, o deslocamento constante de cientistas e professores, alunos, funcionários, é essencial à universidade. Um campus puramente nacional vai contra a universidade que, pelo próprio nome, abarca todos os países, culturas, línguas, costumes. Daí o crime duplo dos fascismos europeus, todos nacionalistas, ao expurgarem estrangeiros de seus quadros. Eles praticam um atentado contra a humanidade e matam a fonte que nutre a ciência em seu próprio país. A produção científica alemã durante o nazismo foi muito enfraquecida, salvo em pequenos departamentos ligados à guerra. E mesmo em tais setores a Alemanha se enfraqueceu com a expulsão dos oponentes e estrangeiros. “Os nazistas aplicam verbas apenas nos setores que servem aos seus desígnios, reduzem o nível superior de ensino à propaganda ou censura. Cientistas deixam a Alemanha por não aceitar o regime. Sete ganhadores do prêmio Nobel saem dos campi a partir de 1933. Anna-Maria Sigmund resume a situação germânica: “O abandono pelo Estado nazista do potencial econômico e intelectual (...) assim como a atitude retrógrada do IIIº Reich diante da pesquisa e da ciência arrastou em prazo espantosamente curto consequência tremendas. Enquanto os nazistas no poder obstaculizavam os trabalhos de cientistas sérios (...) nutrindo entusiasmo por teorias obscuras (...) os físicos que eles expulsaram preparavam a guerra atômica” (Roberto Romano, “Brasil, o Assassinato do Espírito”, palestra inaugural no Encontro de Reitores (Andifes) em 2020, reproduzida no Jornal da Unicamp).

A reforma universitária proposta por Bacon foi recusada e combatida por Oxford e Cambridge, as quais resistem até a barbárie neoliberal da Baronesa Margareth Thatcher. Entre as medidas da primeira-ministra, vêm os obstáculos à contratação de quadros estrangeiros, salvo os que colaborassem para a economia de mercado. Mas então não se trata de uma reforma democratizante do saber, mas da sua redução a mercadoria quantificável, submetida às avaliações de “produtividade” para lucro privado.

Ao lado da ampla democratização do conhecimento trazida pelo método Diderot, no Plano de Uma Universidade para a Rússia exige a democracia no ingresso aos campi. Uma universidade, diz ele, deve ser dirigida aos setores pobres. Os ricos têm condições de comprar conhecimentos. Usando o cálculo ele diz ser mais provável encontrar gênios em muitos casebres do que em poucos palácios. É recomendável a retomada daquele projeto agora, quando o Estado e as igrejas buscam privatizar as universidades em favor das classes abastadas e jogam as desprovidas de recurso nas margens da vida.

Contra a tendência democrática das Luzes, os poderes nacionais instalam universidades para dominar povos pelo controle do direito, da medicina, da teologia. Imanuel Kant em O Conflito das Faculdades denuncia a subserviência das chamadas escolas superiores (Direito, Teologia, Medicina) frente aos governos. Durante a Revolução francesa as universidades pouco fazem para o movimento democrático. Como resposta a Revolução suprime 22 universidades (1793). Com a Reação ressurgem as universidades dominadas pelo Estado. Elas optam pelo ensino técnico e profissionalizante. Hegel diz que na invasão napoleônica da Itália as universidades são tratadas como bordéis.

No século 20 o pior exemplo universitário vem da Alemanha. Não que os campi norte-americanos, franceses, italianos sejam modelo de correção científica ou ética. A Eugenia brota dos Estados Unidos, exportada para a Europa, acolhida pelo nazismo. O elo entre as escolas superiores alemãs e o regime nazista vai além do que se pode imaginar. Desculpas surgem para o comportamento de professores e estudantes. Entre elas, a penúria financeira trazida pela Primeira Guerra e a crise de 1929. Os cofres vazios, não há como nomear novos professores e conseguir meios para a pesquisa. A maior parte da universidade tomba no ódio racista, xenófobo, avesso à ciência. Cientistas judeus e estrangeiros são banidos, presos, mortos. Poucos professores protestam. A vergonha máxima dá-se na eleição de Martin Heidegger para a reitoria, quando ele entra para o Partido nazista e jura fidelidade ao Líder. Admoestado por seu colega Jaspers que lhe pergunta “como pode um homem tão sem cultura como Hitler governar a Alemanha?” ele replica: “Olhai apenas as suas mãos maravilhosas!”. Jarpers medita: nas adesões docentes e discentes ao nazismo “estava em jogo a liberdade de ensino, destruída nas raízes quando se permite que os docentes sejam investigados devido às suas opiniões”.

Planos decepados no Brasil

Na história colonial brasileira, com a violência do Estado português e sua rapina de nossas riquezas, a censura proíbe a edição de livros e produções industriais. Os levantes ocorridos contra El Rey reivindicam o direito de impressão, leitura, indústria. Os revoltosos têm ligações com o pensamento inglês, francês, norte-americano. Suas bibliotecas estão lotadas por volumes das Luzes. Basta consultar o livro de Eduardo Frieiro, O Diabo na Livraria do Cônego. Um historiador da Inconfidência Mineira indica: entre os planos da possível república está a instalação de uma fábrica e uma universidade.

Tais planos são decepados como o corpo do Tiradentes. Apenas nos anos 40 do século 20, após a criação do Ministério da Educação e Saúde, chegamos a um arremedo de sistema universitário. Passos importantes são dados para a política científica em 1951, com o CNPq e a Capes. Sem eles as universidades ainda estariam no berço. Em São Paulo a Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa) ajuda a USP, Unicamp e Unesp a resistir aos ataques de governos do regime ditatorial como Paulo Salim Maluf.

Com o golpe de 1964 foi bruta a guerra contra as universidades públicas. Professores, alunos, funcionários cassados, presos, mortos. O cotidiano dos campi é de medo e terror. Reitorias colaboram com órgãos repressivos como o SNI. No acordo MEC/Usaid o aparelho universitário brasileiro é posto em papel secundário. O governo civil/militar violenta as universidades, mas possui interesses em alguns campos de pesquisa. É o caso da física experimental, quando surgem os planos de energia nuclear com a Alemanha. Mas a escolha dos reitores segue a prática oligárquica: membros das elites regionais, fortes pelos tratos com poderosos em Brasília, recebem verbas, docentes, bolsas de pesquisa e de ensino. Os demais permanecem com o pires sem moedas.

A Carta de 1988 proclama o princípio, ainda não regulamentado, da autonomia universitária. Se estabelece mesmo assim, de susto em susto, um sistema universitário e de pós-graduação. Matéria veiculada no Jornal da Fapesp, anos atrás, demonstra que o referido sistema pode emular o italiano, o francês, o inglês e outros. Após a perseguição da ditadura e com auxílio do CNPq, Capes, Fapesp e similares em outros Estados, laboratórios, bibliotecas, salas de aula brasileiras produzem pesquisas das humanidades às ciências e técnicas avançadas. Mesmo assim, mazelas da administração pública e da política trazem obstáculos, diminuem recursos financeiros e humanos. O Brain Drain suga nossos pesquisadores que se dirigem aos países que incentivam a ciência. É melancólico verificar que, na atual pandemia, nomes brasileiros lideram pesquisas internacionais. Não tiveram aqui os apoios requeridos para continuar seu labor. Nos governos Collor e FHC chega a tentativa de privatizar as universidades, seguindo a lógica do neoliberalismo. Nos governos Luís Inácio da Silva e Dilma Roussef diminui a perseguição. Mas nos derradeiros momentos de Roussef verbas de pesquisa sofrem cortes consideráveis.

Chegamos ao descalabro de hoje, na política federal diante das universidades públicas. Não comento os atentados cometidos pelo presidente da república por intermédio de pretensos ministros da educação. A calúnia, a mentira, a propaganda para desmoralizar a ciência e as humanidades retomam momentos dramáticos vividos pela universidade alemã sob o nazismo e pelos campi norte-americanos sob o macartismo. Os cortes dos recursos são inéditos, a grosseria contra o saber idem. A Universidade Federal de Santa Catarina é invadida por supostos defensores da moral pública que, ao arrepio da autonomia universitária e das leis comuns do país prendem sem provas o Magnífico Reitor Luiz Carlos Cancelier de Olivo, humilhando-o até o suicídio. A Universidade Federal de Minas Gerais, uma das mais nobres e dignas de respeito científico e também ético, foi violentada pela polícia com humilhações, ataques sórdidos ao corpo docente e autoridades universitárias. Ensaios de totalitarismo são renovados pelo governo e instituições como o Ministério Público, além da Polícia Judiciária, que deveriam zelar pelos direitos cidadãos e institucionais.

Em plena pandemia o governo federal labuta contra as vidas humanas, menospreza o perigo coletivo, pratica charlatanismo científico, persegue pesquisadores competentes. Os campi continuam a gerar saberes úteis aos brasileiros e à Humanidade. Neles reside a esperança de sobrevivência. É contra eles que mira o ódio contra a ciência. Sem as universidades e o conhecimento nelas gerados com certeza a mortandade seria pior. Institutos como o Butantã são caluniados pelo poder máximo da república. Este último boicota sua produção de vacinas em nome de uma pequenez ideológica absurda. E também de um racismo explícito contra chineses, que nos fornecem meios para lutar pela vida. Os ataques aos campi retomam, com os herdeiros da ditadura de 1964, perseguições que desgraçaram o mundo no século 20. Resistiremos até quando? Haverá ciência no futuro Brasil? Alceu Amoroso Lima, nos alvores do regime imposto em 1964 falou em “terrorismo cultural”. O mesmo terrorismo ataca hoje, não apenas pelas vias oficiais como o próprio Ministério da Educação, mas pela internet. É como se tivéssemos as técnicas de Goebbels potenciadas milhões de vezes. Ministérios são controlados por criacionistas contrários à ciência, donos de uma pauta fanática e sem rubor de apoiar governantes que elogiam a ditadura, a tortura, a morte dos adversários. Na tentativa de invasão, pelo Exército, das dependências universitárias no Rio de Janeiro, o reitor Calmon diz a um jovem oficial: “meu filho, aqui só se entra com vestibular”. Infelizmente muitos reitores de hoje não seguem o exemplo. E o método atual de nomear reitores, pela presidência da república, tende a acrescer o número dos que discordam do respeitável Pedro Calmon.

Com a Internet – à semelhança do que ocorre no uso da imprensa por Gutenberg – as informações se multiplicam sem análise crítica, sem pesquisa, sem prudência. Está formado o campo de onde brotam, em meios avançados da comunicação os mais baixos sentidos da curiosidade, da kakourgia, da misologia. Tal onda penetra fímbrias importantes da universidade. Existem doutores que aderem aos fascismos, aos procedimentos do charlatanismo científico. As supostas redes sociais aprofundam os defeitos acadêmicos como a inveja, a concorrência sem regras contra os pares, os murmúrios dos corredores. Mas a malha constituída pelas universidades, apesar de tudo, irradia saber e esperança. Em todo o planeta, se há universidade existe pesquisa e saber, esperança.

Colegas, estudantes e funcionários da Universidade Federal de Roraima: coragem! Cabe-nos valorizar a busca do conhecimento como nas Academias gregas e da Renascença, nas escolas cujo labor serve à Humanidade, não às seitas e governos tirânicos. Scientia vinces: com a ciência vencerás. Este é o dístico no brasão de uma universidade que mais sofreu com a ditadura de 1964, a USP. Ele continuará válido após o fim de governos inimigos do saber. Bom ano de estudos, boas práticas e misericórdia. É disso que precisamos. Obrigado.

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