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SEGURANÇA

 

Os novos atores da violência
Organizações criminosas querem sentar-se à mesa de negociação
e policiais usam suas armas para ocupar quartéis

Para o desespero de quem julgava que a crise de segurança pública no Brasil já tinha atingindo um ponto de saturação, a sociedade e as autoridades passaram a enfrentar, recentemente, desafios qualitativamente superiores àqueles que a criminalidade convencional vinha impondo. Ainda sem fôlego para reagir ao narcotráfico, ao forte esquema de roubos de cargas, à onda de seqüestros e mesmo aos episódios mais “rasteiros” da violência, que pipocam nas esquinas de nossas casas, nos vemos às voltas com organizações que, fomentadas pelo descontrole das condições prisionais, mutaram para algo próximo à condição de atores políticos, mobilizados e poderosos a ponto de exigirem sentar-se à mesa de negociações do establishment e lançar suas reivindicações. E, estarrecidos, assistimos a greves de policiais, armados e capazes de ocupar quartéis, num movimento com todas as características de motim.

Essa análise, com conteúdo de alerta, foi feita pelo cientista político Eliezer Rizzo de Oliveira, do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) e do Núcleo de Estudos Estratégicos da Unicamp, que abriu o módulo de debates sobre segurança na Cientec 2001. Lembrando que a segurança pública “pode ser considerada um sistema, no qual os indivíduos e as estruturas se interrelacionam, como atores políticos”, o especialista frisou que tal complexidade é descredenciadora da abordagem simplista dos problemas no setor como uma mera guerra entre “mocinhos e bandidos”.

Esta multiplicidade – tanto dos focos como dos alvos das demandas – leva estudos mais avançados, como nos Estados Unidos, por exemplo, a conceituar o Estado como “muito mais do que simplesmente o governo”. Rizzo de Oliveira não esconde sua preocupação com “a forma imprevidente” pela qual o governo FHC está tendendo a equacionar a crise deflagrada por associações de policiais – no caso, outro grupo de “atores políticos”, em sua concepção. “Em que pese todos os acertos desse governo, é temerário o fato de estar cedendo a pressões que, em última análise, podem representar o risco de colocar novamente em ação a Justiça Militar, décadas após o País ter superado o período de exceção”, lamenta.

O cientista se refere à medida provisória que atribui poder de polícia ao Exército, ante a deflagração de movimentos grevistas por parte das corporações legalmente constituídas para esse fim. “Nos casos extremos, onde seriam detidos e presos os policiais rebeldes? Quem os julgaria?”, questiona o pesquisador. E faz uma observação inquientante: “Ao contrário da situação conjuntural que desembocou na ditadura dos anos 60/70, dessa vez o risco da militarização dos instrumentos de segurança pública não passa pela imposição dos setores militares em si, mas de um governo democraticamente eleito”.

Embora enfoque os novos desafios da segurança numa esfera mais macro, é nas cada vez mais consolidadas regiões metropolitanas que o cientista vislumbra algumas saídas viáveis: “Esse tipo de organização administrativa e social também exerce o papel de ator político e, em suas demandas, traduz propostas bem aceitáveis, tais como a coordenação e cooperação dos gestores e instrumentos de segurança; a cooperação também no plano das organizações da sociedade civil, e – não poderia faltar – no plano dos direitos humanos”.

Rizzo de Oliveira destaca, por fim, outra instância importante de discussão e equacionamento conjunto dos problemas: as universidades. Estas tomam muitas iniciativas mas também devem ser pressionadas a acolher a temática da segurança pública: “Pressionem, que a consciência já existe”, apela, ao concluir.

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Pelo apaziguamento efetivo

Os debates sobre segurança envolveram diversas outras figuras públicas ligadas à questão. O secretário municipal de Cooperação nos Assuntos de Segurança Pública, Péricles Caramaschi, deixou claro que o apaziguamento efetivo da violência em Campinas só se dará em níveis satisfatórios com a adoção e continuidade de políticas sociais.

Para o diretor do Fórum de Campinas, o juiz José Henrique Rodrigues Torres, quando se clama contra a “impunidade” como um fator de recrudescimento da criminalidade, os cidadãos devem se conscientizar que, “bem mais do que jurídicas, as chamadas brechas na legislação são de ordem política, distorção que precisa ser eliminada”.

Enza Mattar, do Centro Regional de Atenção aos Maus-tratos na Infância (Crami), defendeu a criação de programas sociais voltados para a prevenção e combate à desestruturação familiar. As raízes sociais da violência urbana também deram o tom dos pronunciamentos da presidente do Conselho Municipal de Direitos da Criança e do Adolescente, Maria Helena Novaes Rodriguez, e do presidente do Conselho de Segurança (Conseg) da Vila Industrial, Cláudio Ferrari.

O comandante regional da PM, coronel Reynaldo Pinheiro Silva, e o delegado-assistente da Deinter-2, Wilson Lavorenti, expuseram os programas que visam modernizar e otimizar o policiamento preventivo e as técnicas de apuração de crimes. Também debateram políticos, como o deputado estadual Carlos Sampaio e a vereadora (e delegada licenciada) Teresinha de Carvalho Alberich, ambos do PSDB.

 

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Unicamp tem presença
ativa no Conselho de Segurança

No caso de Campinas, pelo menos, a inclusão da comunidade acadêmica na formulação de políticas para a segurança pública já é uma realidade. A Unicamp tem participação ativa no Conselho Municipal de Segurança, dentro de um formato que, por decisão do próprio prefeito Antônio da Costa Santos (PT), confere o aspecto decisório às representações dos diversos setores da comunidade, reservando aos poderes Executivo e Legislativo locais muito mais o papel de “aconselhados”, literalmente.

Juiz aposentado e ex-secretário em Campinas de Negócios Jurídicos e de Administração em diferentes gestões, Roberto Telles Sampaio foi um dos principais formuladores do programa de segurança do atual governo municipal. Ele diz reconhecer que, com a estrutura adotada para o CMS, “a cidade ganhou, pelo fato de contar com um organismo dotado de independência para fazer exigências”. No entanto, não deixa de ressalvar que considera “paradoxal” esse afastamento da Prefeitura e da Câmara de Vereadores do centro de decisões.

 

 


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