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ESPAÇO - CENÁRIO E PAISAGENS

 

Nascentes degenerosidade
Maquete da Cati mostra os benefícios
de se utilizar as águas de forma associativa

Duas nascentes correm no mesmo sentido até se encontrarem quilômetros adiante, dando origem a um rio com generosa quantidade de água. Essa microbacia vai irrigar a vida de pelo menos 60 famílias distribuídas por uma gleba de terra de aproximadamente 3000 hectares. Se as famílias pensarem a água como um bem comum e a utilizarem de forma associativa, visando conservar o recurso para seus herdeiros, estarão agindo de acordo com o conceito do Programa Estadual de Microbacias Hidrográficas (PEMH), desenvolvido e executado pela Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (Cati), órgão da Secretaria de Agricultura do Estado de São Paulo.

O programa é o mais refinado recurso tecnológico aplicado no Brasil com intuito de oferecer a famílias rurais soluções adequadas para problemas sociais, ambientais e econômicos. A palavra-chave para se alcançar esse objetivo, porém, é a integração das famílias e o seu desejo de participação. “Os conflitos entre famílias vizinhas são um entrave. Para isso, o agrônomo extensionista tem de cumprir até o papel de padre se quiser contorná-los”, conta o engenheiro agrônomo José Azevedo Soares, apontando para a maquete instalada na área externa do Ginásio de Esportes durante a Cientec 2001.

A própria maquete, retratando fielmente uma microbacia, é um exemplo de integração. Foi construída em três semanas por meio de um mutirão que envolveu as 11 instituições que participaram da Cientec. Soares, entusiasta e executor da idéia, não parecia cansado de repetir os conceitos, durante um dia inteiro, para as caravanas de visitantes que o abordavam. “Nós estamos demonstrando em pequena escala o que se prevê no programa estadual de microbacias hidrográficas. A exploração racional no meio rural, onde se conserva o solo e se preserva os rios, a natureza em primeiro lugar, de tal forma que tenhamos melhores colheitas”.

A idéia é simples e parece repetir o que faziam os ancestrais dos lavradores atuais. Quando não havia cercas e as divisas eram os rios e as matas. Soares se dirige para um grupo de dezenas de adolescentes e repete a lição. “Através do uso racional do solo, através do uso das glebas conforme sua capacidade, a terra é infinita. Como estabelecemos uma microbacia? O técnico vai aos campos e estuda muito bem as propriedades – eu digo propriedades porque nesse contexto não se prevê as divisas existentes, mas as divisas naturais, que a natureza dita – para fazer um trabalho integrado. Com isso há possibilidade de fazer esse bom trabalho; e há necessidade desses agricultores se integrarem. Só assim pode haver microbacias.”

O programa prevê que o agrotóxico seja racionalmente aplicado e que a embalagem tenha uma destinação correta. Uma lei determina agora que a embalagem seja devolvida ao fabricante. “Faço a tríplice lavagem. Tampo a embalagem direitinho e levo para um determinado ponto da cidade, onde ela será recolhida”, ensina. As microbacias têm predominância de pequenas e médias propriedades, porque, de acordo com o agrônomo, a reforma agrária paulista foi feita na cama. “As propriedades foram sendo picadas na mesma proporção em que as famílias iam crescendo e passando pelos herdeiros”.

Na maquete exposta na Cientec, não faltou nem mesmo os silos aéreos que podem ser usados por associações de produtores. Mas a alta tecnologia também prevê o armazenamento subterrâneo, considerado mais eficiente que os aéreos. Para isso, um detalhe curioso: a silagem subterrânea, estudada e aprovada pelo Ital (Instituto de Tecnologia de Alimentos) perde a eficiência quando há tatus na propriedade. “Eles cavoucam a terra e colocam tudo a perder”.

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Serafim morreu

O Serafim morreu. Sua nascente, nas imediações da Estação Ferroviária de Campinas, está seca há anos. A água suja que escorre por seu velho leito na Avenida Orosimbo Maia é fruto de descarte doméstico e de galerias pluviais. “A vida e morte do Serafim” é um dos focos do Projeto Ciência na Escola, executado em parceria entre o Leia (Laboratório de Educação e Informática Aplicada) da Faculdade de Educação da Unicamp e duas escolas públicas de primeiro e segundo graus, a EEPSG Anibal de Freitas e o CAIC da Vila União.

Os resultados iniciais do projeto foram apresentados durante a Cientec, mostrando como anda a distribuição da água no município de Campinas. “A meta é saber como a água está distribuída na bacia hidrográfica, qual é a sua disponibilidade e como a consumimos”, explica Alda Maria Soares, professora de geografia do Aníbal de Freitas. “Já dá para saber que desperdiçamos quase o mesmo tanto que consumimos, e a água está ficando escassa”, alerta.

Segundo a professora, o trabalho é conduzido por alunos da quinta série e do segundo ano do ensino médio, tendo a participação de mais sete escolas municipais. O tema é o meio ambiente, com enfoque na água e no lixo, este último item pesquisado pelos alunos do Caic. “O que a gente pode concluir é que a água potável está cada vez mais escassa, há desperdício na distribuição e aumento do consumo médio por cabeça. E, além disso, estamos na bacia hidrográfica mais poluída da América do Sul, porque sua mancha urbana é muito grande”.

Na verdade, diz a professora, o estudo está centrado na Bacia do Piracicaba, à qual pertence o Córrego do Serafim, que anonimamente atravessa a Orosimbo Maia e hoje não passa de um corredor de esgoto, pois sua nascente já está morta. O projeto terá quatro anos de duração e tem financiamento da Fapesp.

Na questão do lixo urbano, os alunos do Caic estão pesquisando o seu destino e as formas de reciclagem. A professora Valdirene de Jesus, uma das responsáveis, informa que o trabalho é feito por estudantes de primeiro grau. “Eles já descobriram várias facetas. Por exemplo: o aterro sanitário é um método que impede a contaminação da terra, diferentemente de um lixão. Mas a meta é ensinar que não adianta aterro, pois ele vai degradar uma área. Então, as crianças trabalham para não produzir lixo e reciclá-lo, usando compostagem e fazendo artesanato com sucata”.

Como fruto desse trabalho, o Caic exibiu na Ciente uma série de objetos produzidos a partir de lixo reciclado, como porta-retratos, tamborim, pandeiro, jogo de dama e peças de decoração. “Despertou a criatividade da criançada”, resume. Pelo menos 20 mil alunos de outras escolas (400 ônibus) passaram pelo estande do projeto, instalado na área externa do Ginásio de Esportes da Unicamp.

>> A produção de ouro negro

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O desprezo para com os sem-casa

As políticas públicas na área da habitação não contemplam a parcela mais carente da população brasileira, formada por aproximadamente 50 milhões de pessoas. Os projetos nessa área normalmente desprezam estudos sociológicos e de saúde, o que normalmente os levam à falência. A análise é da socióloga Doraci Alves Lopes, da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas), que discutiu o tema habitação, dentro do Fórum de Debates da Cientec. Foi o que aconteceu, segundo ela, com as moradias financiadas pelo extinto Banco Nacional de Habitação (BNH) e o que continua ocorrendo com os atuais programas habitacionais.

Em outras palavras, os poderes públicos simplesmente desconhecem o seu público alvo. Não raro, explicou a socióloga, os mutuários ficam inadimplentes e são forçados a migrar para as favelas, ocupações e cortiços. Isso cria um novo problema de ordem social. “AA cada despejo, a cada perda de moradia, há uma desestruturação familiar. Os jovens, por exemplo, interrompem freqüentemente suas relações institucionais básicas, nos campos da educação, saúde, religião e da amizade”. Isso sem falar no desperdício do dinheiro público, aplicado num projeto sem qualquer sustentabilidade, conforme Doraci.

De acordo com a professora, há uma mistificação em torno das ocupações que acontecem nos grandes centros urbanos. As pesquisas realizadas pela docente, que serviram de base para o seu mestrado e doutorado, indicam que a maioria dos chamados invasores não assume esta condição pensando em assegurar um pedaço de terra. “Eles simplesmente não podem mais pagar um aluguel”, esclarece. Eduardo Trani, superintendente de planejamento da Companhia de Desenvolvimento Habitacional Urbano (CDHU), afirmou que o fenômeno apontado pela socióloga faz parte de um processo mais amplo, denominado por ele de “ciclo de transferência da pobreza”.

Trani afirmou que a CDHU investiu, nos últimos dez anos, cerca de R$ 2 bilhões em programas habitacionais. Ele reconheceu, porém, que os recursos não seguiram um planejamento adequado e que o nível do retorno financeiro ficou em torno de 50%. Uma alternativa aos projetos convencionais adotados até aqui, afirmou, poderia ser o aluguel social. Ou seja, os governos estaduais e municipais construiriam casas e apartamentos e os alugariam a preços acessíveis à população de baixa renda. Esse modelo foi adotado com sucesso em alguns países da Europa. Mas Trani reconhece que a ideologia formada em torno do sonho da casa própria pode ser um grande obstáculo a essa alternativa.

 

 

 


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