Untitled Document
PORTAL UNICAMP
4
AGENDA UNICAMP
3
VERSÃO PDF
2
EDIÇÕES ANTERIORES
1
 
Untitled Document
 


Tese revela discrepâncias da EJA

Levantamento feito em 24 municípios mineiros
revela incongruência na destinação de recursos

Cerca de quarenta e cinco mil reais. Este foi o valor destinado pelo poder público a cada aluno na Educação de Jovens e Adultos (EJA) em um determinado município de Minas Gerais, em 2005. No mesmo ano, em outra cidade mineira, o gasto foi zero. Os números constam do Relatório Finanças do Brasil, da Secretaria do Tesouro Nacional, vinculada ao Ministério da Fazenda, e constituem apenas um dos exemplos da discrepância entre os gastos municipais com a EJA apontados em levantamento feito em 24 cidades mineiras selecionadas segundo critérios socioeconômicos e educacionais. A pedagoga Geruza Cristina Meirelles Volpe debruçou-se durante quatro anos sobre planilhas e cálculos e ainda assim não conseguiu chegar a uma definição de quanto é o gasto regular com a modalidade na rede pública de Minas Gerais.

Os números são discrepantes e, em sua opinião, não permitem verificar um padrão de evolução, dada a grande oscilação nos valores, quer dos municípios comparados entre si, quer comparados com eles próprios, ano a ano. “Há divergências de percentual de despesas; nem mesmo os órgãos públicos chegam a um acordo do quanto foi gasto”, desabafa a pedagoga, que defendeu tese de doutorado na Faculdade de Educação (FE) sobre o assunto.

Sua análise, orientada pela professora Sonia Giubilei, se concentrou nos anos de 1996 a 2006, justamente o período em que vigorou o Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério), que, segundo Geruza, foi a “cajadada final” no financiamento para a EJA. O Fundo vetou a possibilidade de que alunos inscritos na modalidade em cursos regulares pudessem ser contabilizados para recebimento da verba. “A sequência de eventos ocorridos após a LDB 9.394/96 jogou um balde de água fria na EJA e o Fundef excluiu definitivamente os alunos da captação de verba para a educação básica”, lamenta.

Para compreender os números do gasto municipal, a pedagoga lançou mão das ferramentas de direito tributário. Estudou o arcabouço jurídico e econômico e partiu de um cenário macro, que envolveu as esferas federal e estadual. No âmbito federal, levantou dados sobre os programas Planfor, Alfasol, Pronera, Recomeço e Fazendo Escola, Brasil Alfabetizado e Projovem. De 1998 a 2000, os gastos com EJA somaram em torno de R$ 25 milhões, sendo que no triênio seguinte (2001 a 2002) sobe para mais de R$ 500 milhões. “É um salto gigantesco quando se observa os números brutos. Mas se comparados a outras modalidades, os valores representam menos de 1% de gastos com educação. É muito pouco”, declara.

Ressalta-se, nesse contexto, que os valores investidos não são gastos necessariamente com o professor em sala de aula. Infraestrutura, gerenciamento, produção de material e outros itens integram a lista de necessidades para manter o funcionamento do programa em níveis aceitáveis em uma escola. Geruza lembra que, em uma estimativa mais otimista, considerando como analfabetos funcionais apenas aqueles com menos de quatro anos completos, seriam quase 37 milhões de pessoas. Mas quando se coloca na conta aqueles que não concluíram a educação básica (fundamental e médio), o número é muito maior.

“Como ignorar tanta gente que não domina alguns pilares básicos da educação – leitura, escrita e aritmética?”, indaga. “Estes programas atendem muito pouco em relação ao que existe de demanda”, defende. No estudo, ela traz como principal argumento para justificar políticas públicas claras e inclusivas, a carga tributária imbuída nos produtos e serviços por meio dos quais, todos os brasileiros pagam independentemente da renda. Para ela, é justamente a este trabalhador a quem se tem negado o direito à educação.

Ainda com relação às iniciativas federais, analisa Geruza Volpe, observa-se na década de 1990 uma clara opção pela focalização no ensino fundamental na faixa dos sete aos 14 anos. Isto significa que não se considera a trajetória irregular muitas vezes delineada pelo aluno. “Imagina-se que o aluno passa pelo ensino fundamental, depois o médio e, na sequência, ingressa no superior. Isso não é verdade. Podem ocorrer sucessivas reprovações, saídas e entradas em um mesmo ano e há uma defasagem idade-série”, argumenta.

Na esfera estadual, a pesquisa toma como base Minas Gerais, justamente por conta de os estudos anteriores realizados por Geruza terem sido feitos no Estado. Aliás, a própria questão central da tese – o financiamento da Educação de Jovens e Adultos – surgiu a partir dos estudos realizados para obtenção do título de mestre na Faculdade de Educação da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Já na época havia pontos obscuros com relação a como se financiava a EJA.

Além das dificuldades técnicas em lidar com o conhecimento tributário, a pesquisadora encontrou ainda um agravante no financiamento estadual: dados de dois organismos governamentais responsáveis por finanças não são os mesmos. Enquanto a Coordenação-Geral das Relações e Análise Financeira de Estados e Municípios (Corem) aponta para um gasto de 1,2% em relação ao total das despesas da Educação, em 2006, o Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Educação (Siope) confere o gasto de 0,84%.

Em 2007 e 2008, os dados da Coordenação resultam em uma porcentagem de 1,19% e 1,92% em relação ao total das despesas da Educação, respectivamente, enquanto o cálculo do Siope foi de 0,61% e 0,18%, respectivamente. “Certamente, podemos considerar a diversidade de metodologias empregadas, mas ainda assim não se justifica uma variação tão grande e fora de uma margem de erro. Enfim, nem mesmos os órgãos públicos chegam a um acordo de quanto foi gasto”, avalia Geruza, lembrando que este é o cálculo percentual, pois em termos de valores brutos a diferença é de milhões. Para a pedagoga, os números, certamente subestimados ou superestimados, são referenciais que reiteram sua face política.

Sobre os municípios, a autora partiu da elaboração de uma planilha gigantesca contendo a evolução de matrícula de 1996 a 2006 dos 853 cidades de Minas Gerais. As informações sobre matrículas, segundo ela, já apontavam um possível desarranjo nas contas públicas. Muitos municípios pesquisados sequer informavam alunos regulares por vários anos. Geruza então selecionou as cidades com maior regularidade nos dados, organizando-as em suas respectivas macro e microrregiões de Planejamento de Minas. A partir da seleção, a pesquisadora começou a verificar os valores despendidos em EJA por estes municípios e constatou as primeiras contradições. Alguns municípios que não mantinham sequer um aluno de EJA declaravam gastos exorbitantes com a modalidade.

Para a avaliação, foram selecionados 24 municípios, que correspondem ao maior e menor gasto em EJA de cada uma das 12 macrorregiões de Planejamento. O estudo avaliou diversas categorias. As condições de oferta da rede municipal de ensino, a capacidade financeira, o gasto público com a EJA e também em comparação com outras modalidades e a arrecadação própria do município, ou seja, o que ele consegue gerar em termos de impostos municipais. “É preciso considerar a realidade desses municípios que, em alguns casos, sobrevivem de verbas transferidas e não de arrecadação própria para que não se atirem pedras injustamente”, explica.

A discrepância (veja quadro nesta página) foi grande e Geruza não chegou a uma conclusão definitiva. Ela observa que há valores muito baixos ou muito altos nos quais, provavelmente, há problemas escusos envolvidos. O cálculo da mediana revela um gasto com aluno EJA de R$ 291,12, R$ 254,40, R$ 152,33 e R$ 53,72, respectivamente, em 2005, 2006, 2007 e 2008. “Os números são discrepantes, pois caem a cada ano e são muito baixos, em relação à média para outros níveis; o fundamental, por exemplo, em torno de R$ 700,00, considerado baixo pelos especialistas para manter um estudante no ensino regular”, argumenta a pesquisadora.

A pergunta que se faz diante de tantas informações contraditórias seria: o financiamento à EJA de 1996 a 2006 foi interpretado na perspectiva do direito? A resposta, segundo Geruza, é não. “Precisaríamos de uma política de fato e de um financiamento concreto superior a percentuais tão irrisórios em relação a outros níveis e modalidades. Levantamos a bandeira da educação continuada, mas temos questões anteriores e elementares de educação inicial”, defende.

Diante de todos os números e análises, a professora Geruza Volpe conclui que a modalidade goza apenas dos “farelos de migalhas, dos sobejos dos níveis regulares de ensino – recursos financeiros, administrativos e humanos –, da ociosidade de salas, mera complementação de cargas horárias de professores e toda sorte de profissionais sem formação específica”.

Nesta perspectiva, e pelos escassos estudos sobre EJA no Brasil, a pesquisa continua em uma próxima etapa de análise sobre os “(des) caminhos” do financiamento da EJA no dia a dia, principalmente naquelas cidades que apresentaram excepcionalidade nos dados. Agora num contexto do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), que supriu a principal lacuna de seu antecessor, Fundef.

 

Simpósio debate políticas públicas

O Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação de Jovens e Adultos (Gepeja) da Faculdade de Educação da Unicamp (FE) organiza no dia 4 de dezembro a terceira edição do simpósio bianual, cujo tema será “A Educação de jovens e adultos e as exigências educativas do mundo contemporâneo”. O evento acontece no campus de Itatiba da Universidade São Francisco e são esperados cerca de 650 professores e especialistas ligados à questão da EJA no Estado de São Paulo.

Segundo a professora Sonia Giubilei, coordenadora do Gepeja, a troca de experiências entre os profissionais que atuam na área é a principal contribuição do encontro. “Será um espaço de discussões e debates sobre políticas públicas e também de socialização das ações realizadas por aqueles que se interessam pelo tema”, destaca.

Serão realizados minicursos, palestras e serão apresentados de alfabetizadores e educadores realizados no escopo da EJA. O III Simpósio Gepeja conta com a promoção da Secretaria Municipal de Educação de Itatiba e da Universidade São Francisco. Também tem o apoio do Sindicato de Especialistas de Educação do Magistério Oficial do Estado de São Paulo e União dos Dirigentes Municipais de Educação. Outras informações: (19) 3521-7976 ou gepeja@unicamp.br, www.fe.unicamp.br/simpeja.

 

................................................
Publicação
Tese “O financiamento da educação de jovens e adultos no período de 1996 a 2006: farelos de migalhas ”
Autor: Geruza Cristina Meirelles Volpe
Orientador: Sônia Giubilei
Unidade: Faculdade de Educação (FE)
................................................

 



 
Untitled Document
 
Untitled Document
Jornal da Unicamp - Universidade Estadual de Campinas / ASCOM - Assessoria de Comunicação e Imprensa
e-mail: imprensa@unicamp.br - Cidade Universitária "Zeferino Vaz" Barão Geraldo - Campinas - SP