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Campinas, maio de 2001 - ANO XV - N. 162.........
     
   
 

O coral de cinco notas

Um grupo de pessoas vítimas de câncer de laringe no Rio de Janeiro vem fazendo do árduo processo de reabilitação vocal também uma lição de arte e de vida. Há oito anos elas formam um coral composto apenas por pacientes que sofreram laringectomia total, ou seja, tiveram toda a laringe extraída devido à doença. O projeto foi idealizado e é até hoje conduzido pela fonoaudióloga Célia Schwarz Seif, há 29 anos integrante do Centro de Reabilitação Fonoaudiológica do Instituto Nacional do Câncer (Inca).

O objetivo central do coral é oferecer aos pacientes uma oportunidade de desenvolverem a voz esofágica – emitida por meio do esôfago – e, ao mesmo tempo, criar um ambiente de integração social útil ao processo de recuperação psicológica que procede a operação. “Não é um coral artístico, mas sim científico”, explica Célia, também professora de pós-graduação em Voz e Fonoaudiologia Hospitalar da Universidade Estácio de Sá. “Fazemos tudo isso para tentarmos devolver a qualidade de vida dos pacientes”, completa.

O grupo se reúne semanalmente e é composto por cerca de 15 pessoas, número que varia de acordo com o processo de recuperação dos indivíduos. No entanto, a grande maioria é de homens. “As mulheres têm uma certa timidez em expor a voz esofágica, que no início é um tanto frágil”, diz Célia. Isso porque com a remoção da laringe é perdido o fluxo de ar dos pulmões até a boca. A voz precisa então ser adaptada à corrente digestiva, um processo muitas vezes traumatizante, como explica a coordenadora do projeto.

Célia garante, porém, que a dedicação dos pacientes a projetos como o do coral, além de positiva para a recuperação pós-operatória, é sobretudo gratificante. “Vemos que os encontros e as atividades do coral acabam valorizando muito a vida deles. O resultado tem sido positivo em todos os sentidos”, sublinha.

Limitações - No repertório estão canções como “Cidade maravilhosa” e a inevitável “Parabéns a você”, já que as apresentações externas são feitas geralmente em festas de aniversário, a partir de convites. Contudo, o rol de peças ensaiadas pelo grupo não pode ser muito extenso devido às próprias limitações da voz esofágica. “Os pacientes só alcançam cinco notas, de dó a sol. A sexta nota (lá) às vezes sai e às vezes não”, explica Célia. “Temos que escolher nosso repertório sempre em função disso”. Essa situação chegou inclusive a impedir que um regente, especialista em música, passasse a reger o coral no lugar da fonoaudióloga. “O maestro levantava as mãos esperando que os cantores subissem o tom da voz. Eu não tenho pretensões de ser maestrina, mas acabei ficando porque sei exatamente as limitações vocais do grupo”, conta.

Atualmente, a equipe está tentando introduzir uma menção ao projeto no Guiness Book, o livro dos recordes inglês. Seria o primeiro coral de laringectomizados do Brasil, pelo menos. “Não posso dizer que foi o primeiro coral deste tipo no mundo, mas até hoje também não fiquei sabendo de nenhum outro”, aponta Célia. Há cerca de dois anos a idéia de formar um grupo como o do Inca chegou a ser cogitada pela Associação de Laringectomizados de Leon, na Espanha. Na ocasião, a entidade solicitou a orientação de Célia para a criação do coral. O contato, porém, não evoluiu.

Reabilitação – No Rio de Janeiro, o coral dos pacientes do Inca é, na verdade, parte de um projeto maior, dividido em sucessivas fases para reabilitação vocal de pacientes com câncer e que necessitam ter a laringe removida. “O mais importante em qualquer etapa desse processo é vermos a pessoa como um todo, considerando sua parte corporal mas também o seu relacionamento com a família e tudo mais que seja importante para ela”, explica Célia.

Ela diz que o trabalho para a recuperação da auto-estima dessas pessoas deve começar ainda antes da operação. “É muito importante que haja uma integração entre as equipes de oncologistas (médicos especialistas em câncer) e de fonoaudiólogos, a fim de que o paciente seja ouvido e preparado para saber o que vai acontecer com a sua voz”, diz. Para Célia, isso se tornaria ainda mais importante em países como o Brasil, onde a população dispõe de uma educação média incapaz de garantir o conhecimento dos processos médicos e dos métodos empregados para a recuperação da saúde. “Recebemos pessoas que muitas vezes não sabem o que é a laringe ou como funciona o mecanismo da voz”, conta. “Precisamos usar o discurso do paciente para saber o que ele está e não está preparado para saber.”

É após a cirurgia para retirada da laringe que o paciente passa a ter uma integração ainda mais efetiva com o Centro de Reabilitação Fonoaudiológica, para realmente começar a reabilitar sua voz. “Primeiro realizamos atendimentos individuais, dando exercícios para que a pessoa comece a manejar a voz esofágica, com uma, duas sílabas”, explica Célia. Segundo ela, a duração desse estágio inicial de reabilitação é bastante variável. “Tem paciente que na primeira vez já consegue emitir som”, cita. Nesse processo, aos poucos, a pessoa vai tendo oportunidades de falar em público e interagir com outros pacientes. A integração ao coral é o ponto alto da reabilitação. “Em todos esses momentos vamos estar visando o bem-estar do paciente”, ressalta a coordenadora do grupo. “A voz segue sempre um comando. E este comando tem que estar bem para que o resto funcione.”

 

 


A voz como instrumento de trabalho

Problemas com o uso da voz são uma constante na vida de
Minervina Gil Freitas. Professora de geografia de um colégio
estadual em Campinas, ela já perdeu a conta de quantas vezes ficou rouca após forçar a voz em sala de aula. O exame que fez durante a Semana Nacional da Voz, na sede da Apeoesp, no último dia da campanha, garantiu que, apesar do desgaste e da inevitável disfonia, sua laringe não tinha nenhum problema mais grave.

Mas sua situação, assim como a de milhares de professores da rede de ensino no país, não deixa de ser preocupante. Para eles, a orientação principal dos fonoaudiólogos é que se evite falar em meio ao barulho ou por um longo tempo seguido. Minervina, porém, lamenta. “Isso foge completamente da nossa realidade”, diz, citando o ambiente explosivo de uma sala de aula e a sobrecarga a que muitas vezes se sujeitam os professores para garantirem um salário satisfatório.

“De cada dez alunos, nove vão à escola só para bagunçar. E a gente chega a trabalhar nos três períodos, de manhã, à tarde e à noite. Não há a mínima condição para um professor manter cuidado com a voz”, afirma, taxativa.O otorrinolaringologista Luís Miguel Chiriboga reconhece o transtorno. “Já vivi a experiência de atender professores que não tinham mais qualquer condição de dar aulas, estavam completamente impedidos de exercer a profissão”, conta. E o problema, segundo ele, não pode ser considerado apenas como uma fatalidade da profissão. “Nós sentimos muito a ausência de uma disciplina de impostação vocal no currículo dos professores”, diz.

Também o modelo arquitetônico das escolas tem sua influência. As janelas das salas de aula, na maioria das vezes voltadas para o pátio, tornam o ambiente de ensino ainda mais barulhento, exigindo esforço extra da voz do professor. Mesmo quando a saúde vocal está claramente afetada, são poucos os professores que procuram auxílio ou o devido repouso. “É difícil perder tempo correndo atrás de uma licença”, observa Minervina. “O que acontece é que a gente acaba passando o trabalho para os garotos de acordo com a nossa condição. Se não temos a voz, usamos mapas ou a lousa.”

Canto – Esse tipo de preocupação não é exclusividade de professores. E que o diga a regente do Coral Municipal “Em Canto” de Morungaba, Ana Salvagni. Manter a voz em forma é praticamente uma exigência da profissão. Para isso, além das orientações tradicionais, vale seguir também uma cartilha de exercícios específicos para cantores. Eles são feitos geralmente antes dos ensaios e, como aponta a fonoaudióloga Aline Wolf, fundamentais para o aquecimento da musculatura vocal. “As pregas vocais são um músculo e devem ser aquecidas como em qualquer outra atividade física”, ensina.

“É como um aviso prévio do organismo para que o músculo entre em funcionamento”, completa, recomendando também distância de álcool, fumo e poluição. “Normalmente, se um cantor fica rouco, isso é um sinal de que ele não está usando a voz corretamente”, reconhece Ana, que também trabalha à frente do coral “Da Boca para Fora”, de Barão Geraldo.
Neste meio artístico, ela considera de primeira importância a busca pela orientação de um fonoaudiólogo, por exemplo. “Nós precisamos ter o controle da nossa voz, ter consciência do que acontece com ela”, afirma.

 

 


 
 
 

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