Crise pode cortar 600 mil postos de trabalho
Marcio Pochmann avalia risco de congelamento da geração de empregos

TATIANA FÁVARO

desaceleração das atividades econômicas por conta da crise energética implicará, inicialmente, na queda de crescimento do PIB brasileiro dos 4,5% estimados para algo entre 2% e 3%, sob uma ótica otimista. De acordo com o professor do Instituto de Economia (IE) da Unicamp e pesquisador do Centro de Estudos de Economia Sindical e do Trabalho, Marcio Pochmann, isto significa dizer que o drama social pode ser agravado com o corte de 600 mil postos de trabalho, por conta do racionamento de energia.

São esperados outros dois impactos sobre o mercado de trabalho, de acordo com Pochmann, que atualmente está à frente da Coordenadoria de Projetos Sociais da Prefeitura de São Paulo e engrossa o coro com outros economistas. O primeiro é a possibilidade de postergação ou cancelamento de investimentos previstos para este ano, especialmente no segundo semestre. “Não haverá energia para suportar a ampliação da capacidade instalada no Brasil. Declarações de grandes empresários demonstram que, se porventura não se viabilizar rapidamente a questão energética no Brasil, os recursos poderão ser injetados em outros países”, afirma.
O professor alerta para a repercussão que a postergação ou ausência de investimentos pode ter sobre os postos de trabalho: a cada ano, aproximadamente 1,5 milhão de pessoas ingressam no mercado; sem novos investimentos e sem ampliação do número de postos, pode ser congelada por tempo indeterminado a política de geração de empregos no país.

O Banco Central já trabalha com a hipótese do segundo efeito aguardado por especialistas sobre a economia brasileira: a alta da inflação neste ano, devido ao choque decorrente da elevação do valor pago pela energia elétrica. Mais uma vez, quem arcará com as conseqüências é a população. “A energia elétrica é uma matriz de vários custos e, portanto, vai haver repasse desse impacto nos preços para a inflação. Certamente, quem perde são os trabalhadores, pois não há legislação que garanta o repasse automático da inflação para os salários. Se os sindicatos não conseguirem pressionar para que os salários acompanhem a inflação, os trabalhadores terão menor poder aquisitivo e isso refletirá sobre setores de alimentação e vestuário. Isso é sinônimo de impacto negativo sobre o emprego”, avisa Pochmann.

Os equívocos – O aspecto mais grave da crise energética, segundo o pesquisador, está na constatação da ausência de investimentos nos últimos anos. “Até o final da década de 70, a taxa de crescimento era de 7% ao ano. Nas duas últimas décadas, de 80 e 90, a questão energética ficou em segundo plano, a despeito dos problemas de racionamento que estavam previstos”, recorda Pochmann.
Vários equívocos foram cometidos. Um dos principais, na opinião do economista, é o governo ter optado pela privatização do patrimônio existente e não dos investimentos. “O Brasil poderia ter privatizado novas hidroelétricas e não a distribuição”, acusa o pesquisador. Inúmeros especialistas também chamaram a atenção do governo para os baixos índices de investimento na área de infra-estrutura. São fatos: o governo, algemado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), não investiu. E o país só não apagou antes porque a expansão econômica foi pífia. Basta dizer que, de 1981 até o ano 2000, o Brasil cresceu em média 2,1% ao ano. “É um crescimento muito pequeno”, avalia Pochmann.

De acordo com o professor da Unicamp, o breque do Brasil foi acionado, basicamente, pelo formato do acordo com o FMI. “Esse acordo visa à geração de superávit primário, isto é, a garantia de que o gasto operacional do poder público seja inferior às suas receitas. A repercussão imediata significou contenção do nível de investimentos. E, conjunturalmente, a escassez de água terminou afunilando para o que estamos vivendo hoje, que é um problema, a meu juízo, estrutural, para o qual não há saída imediata”, conclui.

2ª revolução – A expectativa é de que o governo passe pelo menos um ano no encalço de investidores. Para conquistá-los será preciso, sobretudo, viabilizar um cenário favorável. Difícil, diante da contradição mundana amargada pelo país e providencialmente lembrada por Marcio Pochmann: “Enquanto o mundo vive a experiência da terceira revolução tecnológica – diante dos computadores, da microeletrônica –, o Brasil tem um problema que se enquadra na segunda revolução, quando foi descoberta a energia elétrica, há mais de um século”. Para o economista, é pura demonstração de que o governo perdeu a capacidade de planejar as mais diferentes áreas da atividade econômica. Se é que um dia a teve.

 


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