Historiadora da Rice University discute o conceito de “Mundo Atlântico” no IFCH

A historiadora da Rice University (EUA) Alida Metcalf, apresentou na tarde de segunda-feira (4), no auditório do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Uniucamp a palestra “Representações cartográficas do Mundo Atlântico no século XVI”. A visita da professora titular do departamento de História da universidade americana faz parte de um convênio com a Centro de Pesquisa em História Social da Cultura (Cecult), instituído em 2014. O evento, financiado pela Fapesp, integra um acordo interinstitucional que abrange, além de seminários, um programa de duplo diploma de doutorado na área de História.

Em entrevista, a pesquisadora falou sobre as representações cartográficas do século XVI que focalizaram o oceano Atlântico, estabelecendo diálogos entre esses mapas e a historiografia, e analisando seus desdobramentos históricos até a atualidade. Confira:

Além de se referir a um processo histórico, o “Mundo Atlântico” é um conceito geográfico. Como a centralidade do oceano Atlântico no trabalho dos cartógrafos na época das navegações incentivou não só a exploração desse oceano, mas também dominou a visão do mundo atual?
Na minha palestra “Representações cartográficas do Mundo Atlântico no século XVI” argumento que as primeiras cartas de marear que representavam o oceano Atlântico divulgaram a ideia de mundo Atlântico: um espaço comercial, interligado, de grandes movimentos populacionais. Em 1500, quando o Atlântico é apresentado na Carta Universal de Juan de La Cosa não como obstáculo físico, mas como espaço que pode ser atravessado por um barco, com navegador competente, o “Mundo Atlântico” nasceu. Ainda que não exista o “Mundo Atlântico” neste momento, o mapa de La Cosa mostra as possibilidades. La Carta del Cantino, com data de 1502, é ainda mais reveladora.

Feito por um mestre de carta desconhecido, mas que acho que tenha sido Pedro Reinel, La Carta del Cantino mostra uma visão do mundo completamente diferente dos mapas anteriores. De forma ainda mais predominante do que na Carta Universal de La Cosa, o Atlântico é ali representeado como um oceano fundamental no mundo. Aparece na parte central esquerda da carta, com os continentes da América no Oeste, Europa e África no Leste. A África é apresentada como o continente mais importante do mundo. Este esquema espacial, que dá ao Atlântico uma posição central no mundo, foi repetido por outros cartógrafos até chegar a ser a maneira predominante de visualizar o mundo por séculos. Eu diria que só com as primeiras fotografias feitas no espaço é que se começou a mudar a noção de como visualizar o mundo.

Por que, de acordo com o conceito de “Mundo Atlântico”, o oceano não é visto como um obstáculo físico, mas sim uma importante conexão entre América, África e Europa?
A ideia de “Mundo Atlântico” é um conceito moderno, que aparece após a Segunda Guerra Mundial, para enfatizar as ligações entre os Estados Unidos e Europa, principalmente EUA e Grã Bretanha. Os historiadores começaram a utilizar o conceito nas décadas de 1960 e 1970. No início, os estudos focalizaram principalmente a circulação de ideias e as conexões econômicas que resultaram na era das revoluções, como a independência dos Estados Unidos. Depois, com o trabalho do geógrafo William Crosby, quase desconhecido inicialmente, a importância das colônias espanholas no “Mundo Atlântico” entrou na disputa.

Crosby mostrou claramente como as ligações transatlânticas não foram feitas só de ideias ou de comércio. Nesse momento, há também grandes mudanças no ambiente, com a introdução de doenças não conhecidas nas Américas, que resultou num colapso da população nativa indígena por todo o continente. Animais, como cavalos, gado, ovelhas e porcos, e de sementes novas, invadiram e transformaram a paisagem americana.

Hoje, os historiadores brasileiros estão cada vez mais interessados no mundo Luso-atlântico, ou seja, nas ligações entre Portugal, Brasil, e África. Claro que este sempre foi um tema dos historiadores do período colonial, mas a perspectiva atlântica é um pouco diferente. Com a perspectiva atlântica, o importante não é a formação das nações independentes ou a história nacional, mas a história dos povos que circulavam e atravessavam o Atlântico. 

Muitas dessas conexões foram forçadas, como no caso da diáspora africana empreendida pelo comércio de escravos. Como um evento tão traumático pôde servir para aproximar a cultura dos africanos e seus descendentes na América e na África? O trafico transatlântico de seres humanos foi traumático em dimensões impossíveis para nós entendermos. O fato de o tráfico ter sido central no desenvolvimento da economia atlântica resultou em estudos econômicos e políticas, mas a experiência do sofrimento dos traficados foi relegada a um segundo plano.

Uma grande contribuição dos historiadores tem sido a reconstrução não só do trafico, mas da maneira pela qual os escravizados que sobreviveram à traumática “middle passage” - a viagem transatlântica - e construíram novas vidas e identidades nas Américas.  Ainda que tenham tido vidas dominados pelos seus senhores e senhoras, tenham vivido numa época em que a escravidão quase não foi questionada, e a violência tenha feito parte da vida quotidiana, os escravizados persistiram e contribuíram para a formação do “Mundo Atlântico”.

Eles foram vítimas de uma migração forcada, mas, como qualquer outro migrante, introduziram suas crenças, seus modos de vida, seus sonhos e também suas formas de resistência ao sistema escravizador.  Hoje em dia temos mais possibilidades de reconstruir as famílias dos escravizados, e até de saber de qual parte da África eles vinham. A reconstrução das histórias de indivíduos e de famílias de ascendência africana no “Mundo Atlântico” é uma importante contribuição para a nossa história.

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