Brics é tema de seminário
internacional na Unicamp

24/08/2016 - 14:48

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A primeira sessão do seminário no IE

A primeira sessão do seminário no IE

A professora Gao, do Instituto Confúcio

A professora Gao, do Instituto Confúcio

O indiano Shobhan e a chinesa Gao

O indiano Shobhan e a chinesa Gao

Público no auditório do IE

Público no auditório do IE

Público no auditório do IE

Público no auditório do IE

O International Seminar on Brics Economies, realizado nesta quarta-feira (24) no Instituto de Economia (IE) da Unicamp, se propôs a pensar o desenvolvimento econômico dos Brics (Brasil, China, Rússia, Índia e África do Sul). O evento reuniu, no auditório da unidade, alunos, professores, pesquisadores, funcionários e interessados. “Aproveitamos a oportunidade de termos aqui na Unicamp o professor da New Economic School, Moscow, Rússia, Vladimir Popov; a professora da Beijing Jiaotong University Gao Hongyan, representante do Instituto Confúcio (na Unicamp); e o docente indiano Shobhan Saxena, professor convidado da Universidade de São Paulo (USP), além de estudiosos da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) que discutem os Brics em suas instituições”, contou Walter Belik, docente do IE, um dos organizadores do evento.

Os participantes do Brics são países em desenvolvimento que estão passando por um processo de transição, diante de um mundo que está vivendo transformações intensas, acentuou ele. "Os Brics sofreram os impactos da crise econômica de 2008 (da alta dos preços agrícolas): uns mais cedo, outros um pouco mais tarde. Mas tudo leva a crer que esse momento é propício para rediscutir os processos de desenvolvimento, planejamento, inclusão social, políticas sociais", explanou ele, dando o tom dos debates. 

Em entrevista ao Portal Unicamp antes do evento, Belik revelou que, no ano passado, foi constituído formalmente o Banco dos Brics, um banco de desenvolvimento que financia diretamente projetos de desenvolvimento dos cinco países. “Discutiremos o papel do Banco do Brics, que já está constituído, quais são as suas possibilidades de alavancar projetos de desenvolvimento, como isso pode funcionar”, contou. O grande sócio desse banco é a China, cuja sede fica em Xangai. O seu vice-presidente é o brasileiro Nogueira Batista Júnior. 

A ideia do debate, relatou o professor, foi discutir esse novo ambiente financeiro. “Há uma situação de crise nas grandes economias mundiais: temos a crise no bloco do Euro, com a saída da Inglaterra; nos Estados Unidos, existe uma perspectiva da alta da taxa de juros, o que pode  dificultar a captação de recursos, de financiamento de projetos de desenvolvimento”, explicou. Essa é uma dificuldade a mais, na sua opinião, porque os países são, na verdade, interdependentes.

Hoje, o Brasil tem a China como principal mercado para os produtos de exportação e ela é o seu principal parceiro. “Então a desaceleração que aconteceu na China está ligada a nossa desaceleração da economia, as nossas exportações”, afirmou. Por outro lado, as exportações também dependem de uma taxa de câmbio e, qualquer movimento que aconteça com o dólar, afeta a taxa de câmbio do Brasil. Tem mais: a desaceleração da China também tem a ver com os problemas econômicos dos EUA. “Como os EUA vão financiar o seu desenvolvimento, se a China também não cresce e não pode investir comprando títulos americanos ou bancando a rolagem da dívida norte-americana?”, indagou. “Então existe toda uma engenharia que, talvez, com o apoio desses cinco países, possa fazer com que se tenha um desenvolvimento menos dependente desse cenário internacional.” 

Belik acredita que o mundo agora volta a ter uma perspectiva de crescimento. "Os problemas que aconteceram em 2008 foram equacionados, não solucionados. Existe uma crise de financiamento geral nessas economias. Mas não podemos dizer que aquele cenário de catástrofe que vivemos no final da década passada vai se repetir, tranquilizou. Ele lembrou que o Brasil sempre foi muito dependente do Fundo Monetário Internacional (FMI), do Banco Mundial. Então ter um organismo internacional que possa financiar ou cobrir eventuais deficits de balanço de pagamentos do Brasil ou de outros países é muito importante, mediante o qual se possa transacionar em moedas que não passem pelo dólar. "Se houver a possibilidade de criar um outro cenário, onde não haja essa hegemonia da economia norte-americana do dólar nos processos de desenvolvimento, seria muito positivo." 

Rede
A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) abriu no ano passado um edital Brics Universities. A iniciativa integra a criação da Rede de Universidades dos Brics (Brics Network University). Foram aceitos cinco projetos no Brasil como um todo. A Unicamp obteve dois projetos: um liderado pelo IE junto com a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que aborda essa discussão sobre desenvolvimento econômico nos Brics, e outro liderado pelo professor Tom Dwyer, do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH), que é sobre as mudanças nas sociedades dos Brics. Trata-se de algo totalmente inédito. “Muito em função desse edital, o IE promoveu esse seminário, porque já temos pesquisadores e professores que estão se dedicando a estudar os Brics. Queremos que esse tema seja melhor divulgado e atraia mais interessados”, ressaltou Belik. 

De acordo com o professor do IE Bruno De Conti, também um dos organizadores do seminário, já há alguns anos na cúpula dos ministérios de educação dos Brics foi definido que seria organizada uma rede de universidades dos Brics. Inicialmente, a ideia seria criar uma universidade, um campus físico, em algum desses países. Nele se construiria essa universidade multilateral internacional. Depois, decidiu-se usar universidades dos cinco países para a criação dessa rede. Isso já acontece há dois anos. Cada país utilizou suas metodologias para escolher as universidades e aqui, no Brasil, a Capes lançou esse edital pedindo candidaturas para participar da rede.   

Essa nova universidade é desenvolvida com base em seis eixos: energia, recursos hídricos, mudanças climáticas, cyber segurança (eixos considerados estratégicos), economia e Brics Studies. O IE submeteu projeto no eixo de economia. O IFCH submeteu projeto no eixo Brics Studies. O IE articulou o projeto em cima das áreas de pesquisa do instituto, que são economia do trabalho, economia internacional, economia social, economia regional e urbana.

No IFCH, a unidade já tem dois livros sobre os Brics: um de 2003 sobre Estratificação Social nos Países Brics, que fala sobre as dinâmicas de mudanças nesses países. O segundo livro deve sair no início do ano que vem, com mais de 1.000 páginas, abordando Sociologia da Juventude nos Países Brics. “Uma coisa básica é que mais de 42% da população mundial simplesmente é ignorada pelas ciências sociais ocidentais. Então vamos trabalhar esses dois livros para formar pessoas que tenham uma consciência de como os países são parecidos e diferentes ao mesmo tempo", comentou Tom Dwyer. “Temos trabalhado dentro da Sociedade Brasileira de Sociologia desde 2007, quando aconteceu a primeira discussão sobre o Brics. Esse é então o resultado de um trabalho imenso que temos feito para entender nossos parceiros. Essa sociologia, que sempre foi uma disciplina que ajuda a pensar o social, pensar o outro, pode dar contribuições ao entendimento dos desafios que vêm pela frente, que não são poucos.”

Essa rede, da qual participam 15 universidades, também visa instituir um programa de pós-graduação conjunto com universidades dos cinco países. É um único programa para alunos dos cinco países, com professores dos cinco países, e envolve intercâmbio de alunos e professores, minicursos, pesquisas coletivas e a atribuição de diploma para alunos válido para os cinco países. “Estão sendo estimuladas pesquisas sobre os Brics, pois, por mais que os seus componentes tenham diferenças, eles têm problemas comuns, como por exemplo a urbanização, que aparece no Brasil, mas também na Índia e China”, frisou Bruno De Conti.

O projeto está numa etapa inicial, de acordo com ele, em que começará a fazer as reuniões com as outras universidades dos cinco países. Isso está dentro do mesmo arcabouço de discussões desse seminário. “Isso foi fomentado para estimular debates sobre os Brics. Também é uma iniciativa da Vice-Reitoria Executiva de Relações Internacionais da Unicamp (Vreri), cujo foco é a internacionalização, mas não somente com países ocidentais. Também com países orientais. O professor Luis Cortez, o vice-reitor da Vreri, tem insistido em buscar parcerias com países do Brics. Isso tudo veio no mesmo quadro de tentar se articular com esses países do sul global”, sublinhou Bruno De Conti.