Bresser defende pacote mas
critica condução econômica

16/09/2015 - 16:30

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O ex-ministro Bresser Pereira

O ex-ministro Bresser Pereira

Workshop no IE

Workshop no IE

A organizadora Daniela Prates

A organizadora Daniela Prates

O docente André Biancarelli

O docente André Biancarelli

O economista Luiz Carlos Bresser Pereira, ex-ministro da Fazenda do governo de José Sarney, defendeu o pacote de medidas para ajuste fiscal e equilíbrio das contas públicas anunciado no início da semana pelo Governo Federal para conter a crise econômica do país. Durante evento no Instituto de Economia (IE) da Unicamp, Bresser Pereira afirmou que as medidas, embora consequência de um erro anterior, são uma maneira do governo Dilma “de colocar ordem na casa”, de uma forma “muito triste e dura”. 

Em entrevista ao Portal da Unicamp, Bresser Pereira criticou a condução da política econômica dos governos Lula e Dilma, sobretudo a do final dos últimos 12 anos. De acordo com ele, a má condução aconteceu principalmente com a implementação de uma política industrial radical pelo governo de Dilma Rousseff. Ele também condenou o que chamou de populismo fiscal e cambial do governo Lula.

“A Dilma se desesperou quando viu que as políticas de câmbio e de juros não eram suficientes e que o país não tinha conseguido crescer nos dois primeiros anos. Ela resolveu recorrer a uma política industrial radical, que é uma política de desonerações. Isso custou uma fortuna para o Estado. Este foi o erro da vida dela. De um superávit fiscal, o Estado brasileiro foi a um déficit em conta corrente de 0,6% do PIB. Deste modo, a Dilma perdeu a confiança dos empresários nacionais e do mercado externo. E quando veio a recessão, que não foi causada por isso, o Estado brasileiro não podia fazer a expansão fiscal”, criticou. 

Bresser Pereira, que atua como docente da Fundação Getúlio Vargas (FVG), esteve na Unicamp por ocasião do Workshop Internacional New Concepts of Developmentalism: what relevance for the developing world?, organizado pelo IE em parceria com as Universidade de Ciências Aplicadas (Hochschule für Technik und Wirtschaft) e Universidade Livre (Freie Universität Berlin), ambas de Berlim. O evento foi coordenado pela docente Daniela Prates, do IE, e também contou com a apresentação do professor André Martins Biancarelli (Leia mais após a entrevista). 

Portal da Unicamp - Gostaria que abordasse o tema da sua palestra no Instituto de Economia, sobre a questão do novo desenvolvimentismo. 
Luiz Carlos Bresser Gonçalves Pereira - Trata-se de uma abordagem teórica que eu e um grupo de outros professores estamos desenvolvendo nos últimos 15 anos. É um sistema teórico que visa substituir o desenvolvimentismo clássico. A macroeconomia, que não estava prevista neste desenvolvimentismo clássico, é o que está mais presente nesta nossa abordagem. Portanto, nós temos uma macroeconomia desenvolvimentista baseada na taxa de câmbio e no déficit em conta corrente, ao invés de o foco ser, como na macroeconomia dos países ricos, no déficit público e na taxa. 

Esta é uma teoria para países de renda média ou em desenvolvimento. Ela mostra que um país como o Brasil absolutamente não precisa de capital estrangeiro. Para crescer mais rapidamente, o país precisa ter uma taxa de câmbio mais competitiva de modo a manter o equilíbrio industrial. E tendo esta taxa de câmbio, isso dá um pequeno superávit em conta corrente. 

Portal da Unicamp - Como o senhor analisa essa sua teoria diante dos últimos 12 anos dos governos do PT, de Lula e Dilma, no contexto da crise econômica no país?
Bresser Pereira - Há um forte conflito. Nestes últimos 12 anos tentou-se fazer um desenvolvimentismo. Mas esse desenvolvimentismo foi populista no plano fiscal, sobretudo no final dos 12 anos do governo do PT. O populismo fiscal acontece quando o Estado gasta mais do que arrecada. O populismo cambial é o estado-nação, o país como um todo, que gasta mais do que arrecada de forma irresponsável. E entra em déficit em conta corrente. Isso foi feito violentamente nos 8 anos do governo Lula e foi feito no último ano da Dilma. O Lula deixou para a Dilma uma missão impossível. Ela não tinha a menor condição em desvalorizar o real mais de 50% para que as industrias e empresas voltassem a ser competitivas e o país voltasse a crescer. Portanto, este populismo acha que se a população gastar, as empresas investem. Mas não é simples assim. Se você gasta, mas deixa o câmbio apreciado, as empresas não investem, não podem investir. O empresário só investe se tem uma expectativa de lucro razoável. 

Portal da Unicamp - Qual a sua opinião sobre o pacote de ajuste fiscal e nas contas públicas anunciado no início da semana pelo Governo Federal como tentativa de conter a crise no país?
Bresser Pereira – O que o Keynes propõe é que na recessão o estado expanda o gasto e não aumente. Entretanto, eu sou a favor do ajuste que está sendo feito porque o que o Keynes também supunha é que o estado, neste caso, estaria com suas contas perfeitamente equilibradas. E quando viesse a recessão, o estado entraria em déficit, mas por pouco tempo e depois voltaria à normalidade. Foi o que aconteceu no Brasil quando veio a crise de 2008. O Estado brasileiro estava saudável; e o Lula e o Mantega fizeram uma expansão fiscal. Ninguém reclamou porque tinha que fazer isso mesmo; e o Estado se reequilibrou. 

Agora, a Dilma se desesperou quando viu que as políticas de câmbio e de juros não eram suficientes e que o país não tinha conseguido crescer nos dois primeiros anos. Ela resolveu recorrer a uma política industrial radical, que é uma política de desonerações. Isso custou uma fortuna para o Estado. Este foi o erro da vida dela. De um superávit fiscal, o Estado brasileiro foi a um déficit em conta corrente de 0,6% do PIB. Deste modo, a Dilma perdeu a confiança dos empresários nacionais e do mercado externo. E quando veio a recessão, que não foi causada por isso, o Estado brasileiro não podia fazer a expansão fiscal. Portanto, a Dilma teve que colocar ‘ordem na casa’, mas é uma forma muito triste e dura. Não é razoável, mas é consequência de um erro anterior. 

Sobre o Workshop
A professora Daniela Prates explicou que o Workshop, que acontece deste o dia 14, é o primeiro de uma série que serão realizados anualmente em países em desenvolvimento. A iniciativa é financiada pelo governo alemão. O objetivo, de acordo com ela, é discutir a questão do desenvolvimento econômico nos países emergentes, contando, inclusive com a participação de universidades destes países. Os próximos seminários previstos devem acontecer na China, em 2017; na Índia, em 2018; e na África do Sul, em 2019. 

Sobre a questão desenvolvimentismo, o professor André Biancarelli, que participou de palestra junto com Bresser Pereira, ressaltou que há uma diferença entre as duas correntes atualmente: o novo desenvolvimentismo e o social-desenvolvimentismo. 

“Com o avanço do pensamento sobre o desenvolvimento brasileiro acabou se configurando dois grupos de ideias. As diferenças principais seriam no próprio papel do estado e particularmente na questão social, daí o nome. A distribuição de renda é vista nessa vertente mais social como um motor importante dinâmico e não um empecilho ao crescimento”, explicou.