Criar mercado também é papel do
Estado, afirma Mariana Mazzucato

02/09/2015 - 16:30

Em geral, a forma como as pessoas enxergam o papel do Estado frente ao mercado é muito limitada. A tendência é considerar que o ente público deve simplesmente atuar para corrigir alguns aspectos, quando na realidade ele também tem a missão de criar esse mercado. A afirmação foi feita na tarde desta quarta-feira (2) pela professora Mariana Mazzucato, da Universidade de Sussex (Reino Unido). A docente, que é especialista em políticas de inovação, ministrou palestra para alunos e professores do Instituto de Economia (IE) da Unicamp, durante a qual abordou este e outros temas.

De acordo com Mariana Mazzucato, se o papel do Estado fosse simplesmente ajustar um ou outro aspecto do mercado, o mundo não teria obtido avanços fundamentais, como a viagem do homem à Lua, o desenvolvimento da internet ou o sistema de saúde dos Estados Unidos, todos programas financiados por recursos públicos. “Quando me refiro ao Estado, penso em diversas organizações que estabelecem um objetivo maior e atuam conjuntamente para concretizá-lo”, explicou.

Como existe uma crise na forma como o Estado é interpretado, prosseguiu Mariana Mazzucato, várias questões importantes são atacadas de forma equivocada. Em relação ao Brasil, segundo ela, as perguntas que estão sendo feitas estão erradas. “Não se trata de perguntar se o país deve ter ou não um grande banco público, como o BNDES, mas sim de questionar como esse banco deve atuar para atingir objetivos que sejam importantes para o país”, exemplificou.

A docente da Universidade de Sussex observou que, para inovar, é preciso que todos estejam preparados para enfrentar eventuais fracassos. “Se contamos com organizações públicas, precisamos aceitar que elas falharão muitas vezes. Como temos feito as perguntas erradas, o que tem acontecido é que os resultados obtidos pelo desempenho da economia não têm sido revertidos para o Estado, de modo a refinanciar suas políticas”, disse.

Mariana Mazzucato defendeu que tanto o Brasil quanto outros países precisam repensar suas organizações públicas, no sentido de inseri-las num processo de aprendizado. Ademais, pontuou, é preciso que as nações criem um portfólio com as ferramentas necessárias para a execução de seus projetos estratégicos. Embora não seja especialista em temas brasileiros, Mariana Mazzucato afirmou que percebe a existência de um grande dogma no país.

O Brasil, de acordo com ela, era um dos poucos países que até há pouco tempo tinham uma agenda comprometida com essas questões. O BNDES, conforme a docente, vinha apresentando uma inovação organizacional interessante e financiando programas sociais importantes. “Entretanto, estou preocupada com tudo o que está acontecendo atualmente. A agenda foi tomada pelos casos de corrupção, o que pode fazer com que essa inovação se perca”, alertou.

Mariana Mazzucato disse reconhecer que a corrupção é danosa e que deve ser fortemente combatida. “Todavia, a existência da corrupção não deve servir de justificativa para que a função do Estado seja desmontada. Parece que existe um conclave formado por alguns setores que querem matar o Estado. Se é isso o que desejam, esses setores deveriam deixar isso claro para a sociedade”, finalizou.