Edição nº 629

Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 22 de junho de 2015 a 28 de junho de 2015 – ANO 2015 – Nº 629

Sistema de sensores monitora
galpões para frangos de corte

Dispositivo pode beneficiar pequenos produtores e incrementar produção

O ideal num sistema de produção de frangos é que os animais recebam proteção e conforto, liberdade de movimentos, água e alimento com qualidade e em quantidade suficientes, além de livre acesso a comedouros e bebedouros. Esse seria um ideal a ser perseguido nos galpões. Nem sempre isso é possível porque as condições de produção não são as mesmas, visto que também o contexto econômico dos produtores não é o mesmo.

Nesse sentido, uma tese de doutorado da Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (FEEC) acaba de dar um passo além na direção do conforto e na melhoria da produção nos aviários. O autor, Alison Zille Lopes, desenvolveu um sistema de automação Open Source (aberto), utilizando unicamente ferramentas gratuitas, para aplicação em instalações destinadas à criação de frangos de corte. Foi batizado como Poultrinux [o nome vem de frango (poultry) e Linux], por empregar rede de sensores e o sistema operacional Linux. A iniciativa já despertou interesse da Embrapa.

O uso do Linux, conforme Alison, reduz preocupações com detalhes de hardware, permitindo focar no desenvolvimento de uma interface mais amigável. Os mais beneficiados serão os pequenos produtores que trabalham com um mecanismo de acionamento manual, que requer visitas constantes aos galpões para efetuar o monitoramento das condições climáticas desses locais.

O sensor e o galpão experimental onde foram realizadas as pesquisas, na Esalq, em Piracicaba: controle do sistema de climatização

Ocorre que uma simples visita ao galpão pode colocar em risco a vida dos frangos, altamente sensíveis a esse contato. Já no sistema proposto, o nó sensor (dispositivo equipado com capacidades de sensoriamento, processamento e comunicação) faz a aquisição de variáveis do ambiente térmico sem necessidade de visitas presenciais.

Essas variáveis são empregadas por um módulo central no processo de tomada de decisão, que pode ser a definição de valores fixos de temperatura para acionamento em diferentes estágios de ventilação, resfriamento evaporativo ou através de métodos heurísticos, como a rede neural artificial (RNA), implementada no sistema Poultrinux.

De acordo com o doutorando, o equipamento que envolve esse sistema possui três módulos: primeiro, o módulo central, que é responsável pela interação com o usuário (configuração do sistema) e o controle automático (responsável pela integração com as demais partes e monitoramento e controle dos sistemas de climatização e iluminação). Segundo, o nó sensor, que é responsável pela aquisição das variáveis do ambiente térmico. Terceiro, o módulo de acionamento, que executa ações de controle da climatização e iluminação.

O conforto no galpão, explicou ele, está relacionado à temperatura, à velocidade do ar e à umidade relativa. O mais utilizado para fazer o controle no galpão – no método convencional – consiste em acionar a ventilação acima dos 25ºC. Quando passa de 29ºC, aciona-se a nebulização.

“O controle no sistema que acaba de ser desenvolvido é configurável. Dependendo da linhagem do animal ou experiência do produtor, é possível mudar as temperaturas de acionamento. Se o desejado é que a ventilação acione acima de 26ºC, é só configurá-lo”, comparou Alison.

O uso das redes de sensores sem fio também facilitou muito a instalação e a evolução do sistema, simplificando o processo de inclusão de novos incrementos (módulos).

O novo sistema demonstrou um grande potencial para evolução com a ajuda de estudantes e produtores. “E pode colaborar muito para a avicultura, agregando contribuições de diferentes instituições (de ensino ou pesquisa), seguindo uma estratégia fundamentada no mecanismo de parcerias”, acentuou o doutorando.

A sua investigação teve em vista os pequenos avicultores e conseguiu unir no mesmo projeto ensino, pesquisa e extensão. O trabalho, da linha de pesquisa de Automação, foi orientado pelo professor Gilmar Barreto e coorientado pelo professor Fabiano Fruett, ambos docentes da FEEC.  

 

Os professores Gilmar Barreto (à dir.) orientador, e Fabiano Fruett, coorientador: mudanças na cadeia produtiva avícolaEXPERIMENTO 

Alison relatou que, para dar sustentação ao trabalho, fez testes por cerca de dez dias em galpão experimental da Esalq de Piracicaba. Nos primeiros cinco dias, a sua missão foi detectar falhas que poderiam ocorrer na prática. Esse galpão mostrou-se próximo das condições encontradas pelo pequeno produtor no seu dia a dia.

Foram avaliados problemas, como por exemplo interferência eletromagnética pela baixa qualidade da linha ou pelos acionamentos de exaustores ou nebulizadores, que seriam obstáculos ao perfeito funcionamento do equipamento. Mas eles foram identificados, solucionados, e novos testes ocorreram.

Em outros cinco dias, o equipamento funcionou continuamente, acionando a ventilação e a nebulização, e coletando dados de temperatura, umidade relativa e velocidade do ar no interior do galpão. Conseguiu, a partir das variáveis ambientais, fazer o controle do sistema de climatização.

Os testes não foram feitos com animais no galpão, por correrem risco de morte. Deste modo, seria preciso ter a certeza de que o equipamento iria funcionar. Essa então seria uma outra etapa, contou o autor. 

“Com relação ao custo, é algo que fica em torno de R$1.500,00, mas esse valor pode diminuir, já que, no futuro, a tendência é que o módulo central seja um tablet, o que popularizaria o sistema. Com isso, a redução poderia ser de até R$300,00”, sublinhou ele.

Outra ideia seria aumentar a configurabilidade através da produção de módulos que pudessem ser adaptados às necessidades de cada produtor, combinando placas de circuito impresso com propósitos específicos (sensores, transceptor de rádio, bateria). Um produtor poderia escolher, por exemplo, se o nó sensor viria com carregador de bateria integrado. Isto propiciaria reduzir ainda mais os custos.  

 

INTERESSES

O professor Gilmar enfatizou, ao falar de entregar um produto de qualidade a quem não possui recursos, que o papel da universidade também é oferecer um receituário para os pequenos produtores. “Já ficamos imaginando que eles poderão dobrar a sua produção de frangos. Isso criaria uma revolução na cadeia produtiva avícola do Brasil.”

O professor Fabiano foi fundamental para o desenvolvimento dessa pesquisa, salientou Gilmar. “Contribuiu com a ideia de fazer um sistema aberto de tal forma que o pequeno produtor tivesse acesso a ele sem custos, pudesse melhorar seu nível de automação e aumentasse a sua produção.”

Por outro lado, lembrou o orientador, Fabiano teve o mérito de enxergar o potencial desse projeto na vida do produtor rural que não tem acesso às ferramentas importadas. Normalmente, os equipamentos já são racionados e não possibilitam expansão. Como o Poultrinux é Open Source, ele possibilita expansão conforme os recursos que o produtor tem às mãos.  

Alison Zille Lopes, autor da tese: “Dependendo da linhagem do animal ou experiência do produtor, é possível mudar as temperaturas de acionamento”Os orientadores do estudo já vislumbram que o projeto poderá incluir os alunos dos diversos cursos de graduação envolvidos nessa temática. Eles irão até o campo, estudarão as condições e farão o equipamento seguindo as regras do produtor, suas normas, o circuito, suas ideias, para que atenda especificamente às suas necessidades.

“Vimos que esse projeto tinha um pé na extensão e tinha tudo a ver com o momento do país, em que quase tudo é importado. Os produtos vêm com o hardware, mas e o software? Há controle 100% dessa máquina? Sempre fica essa dúvida. No nosso caso, temos controle 100% desse instrumento de automação e podemos adaptá-lo facilmente às necessidades do produtor rural, além de poder dotá-lo de mecanismos de controle sofisticados como aqueles baseados em redes neurais”, garantiu o professor Fabiano.

Para o pequeno produtor, como ele não tem grandes recursos, tudo o que puder economizar para investir num equipamento é algo que acaba impactando o seu orçamento. Então às vezes, quando as empresas têm maiores produtores associados, elas o fornecem. Ocorre que o Brasil é formado por uma grande maioria de pequenos produtores que, infelizmente, sequer tem acesso a um bom produto.

Fabiano expôs que seria propício montar um curso de férias para estudantes de engenharia, para ensinar os princípios de instrumentação e de automação. Os alunos poderiam acrescentar outras interfaces no Estado de São Paulo, de Minas Gerais, do Ceará e onde a tecnologia não é capaz de chegar.

Para fazer o projeto avançar, seriam necessários mais parceiros, opinou ele, não pessoas dominando o mercado como a única entidade que possa produzir placas ou circuitos. “Com editais na área de extensão universitária, ele certamente avançaria. Garantiria viagens, manteria equipamentos, auxiliaria no deslocamento das equipes e formaria um curso de peso. Ministraria-se a parte experimental no galpão a ser instrumentalizado.”

Alison recordou ainda que, quando começaram as discussões sobre o projeto, pensou-se em quem mais iria construir esses equipamentos. “Pensamos em fazer oficinas itinerantes para criar competências nas diferentes regiões do país”, relatou ele, acrescentando que os interessados no sistema podem procurar os idealizadores desse projeto.”

 

Publicação

Tese: “Contribuições para o desenvolvimento sustentável de um sistema de monitoramento e controle de galpões para frangos de corte”

Autor: Alison Zille Lopes

Orientador: Gilmar Barreto

Coorientador: Fabiano Fruett

Unidade: Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (FEEC)