Deficiências no registro e tratamento de
casos de suicídio e tentativa de suicídio

04/02/2015 - 14:56

O suicídio está entre as três principais causas de morte de pessoas entre os 15 e 44 anos de idade. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) ocorrem por ano cerca de um milhão de mortes por suicídio, o que equivale a 1,4% do total de óbitos, sendo que as tentativas são de 10 a 20 vezes mais frequentes. Com a necessidade de mais estudos e atenção sobre as causas e tratamentos desse problema de saúde, a revista Psicologia USP,  do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, preparou para sua nova edição, que será publicada este mês, um dossiê sobre o tema “Suicídio”. Entre os artigos selecionados para o periódico está “Comportamento suicida: epidemiologia”, de Neury José Botega, psiquiatra, doutor em saúde mental e professor da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp.

Em seu ensaio, Botega defende que apesar do Brasil possuir um coeficiente de mortalidade por suicídio, ao longo de um ano, consideravelmente baixo ao ser comparado com outros países, o assunto não pode ser menosprezado. Dados recentes do Ministério da Saúde destacaram que no Brasil 1% do total de óbitos decorre de suicídios, sendo que entre jovens de 15 a 29 anos o motivo da morte representa 4%. O artigo discute que esse número pode ser maior, pois a maioria das mortes por causas externas não se registra a intenção, além de 9% dos casos que são registrados estão como intenção de morte indeterminada.

Outro fator que pode mascarar a problemática dos suicídios é o sub-registro e subnotificações; o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) estima que 15,6% das mortes não foram registradas em cartório e que 13,7% das mortes ocorridas em hospitais, no mesmo ano, podem não ter sido notificadas. Outra deficiência para a prevenção do suicídio é a ausência dos meios utilizados em casos de suicídio nos registros de óbitos, já que uma das estratégias de prevenção recomendadas pela OMS é a redução de acesso aos métodos letais, por exemplo, dos dados que se tem, no Brasil os principais meios são enforcamento (47%), armas de fogo (19%) e envenenamento (14%).

Em estudo desenvolvido por pesquisadores da Unicamp, no qual 515 pessoas foram sorteadas de uma listagem de domicílios do IBGE e entrevistadas, observou-se que: “ao longo da vida, 17,1% das pessoas ‘pensaram seriamente em por fim à vida’, 4,8% chegaram a elaborar um plano para tanto, e 2,8% efetivamente tentaram o suicídio.De cada três pes­soas que tentaram se suicidar, apenas uma foi, logo depois, atendida em um pronto-socorro”. Assim, Botega apresenta que dos dados registrados, apenas uma pequena proporção do “comportamento suicida” chega ao conhecimento para um possível tratamento.

O autor destaca as deficiências brasileiras para a prevenção e análises sobre os casos de morte, mas também apresenta os dados do Estudo Multicêntrico de Intervenção no Comportamento Suicida da OMS no qual oito países participaram, sendo o Brasil um desses com aplicação no município de Campinas/SP; no total, 2238 pessoas que deram entrada em pronto-socorro por tentativa de suicídio foram divididas aleatoriamente em dois grupos: um de intervenção psicossocial com entrevista motivacional e telefonemas regulares e o outro para o tratamento usual, apenas um encaminhamento para um serviço da rede pública. Ao final de 18 meses, a porcentagem de suicídio no grupo de tratamento usual foi dez vezes maior. Esses dados demonstram a necessidade de uma reestruturação na administração e tratamento do suicídio no Brasil