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26/08/2014 - 14:00


O mundo na ciência é movido pelo grandioso, pelo belo, pelo espetacular, pelo monumental, pelas descobertas... As informações chegam facilmente ao leitor que, muitas vezes, deixa passar despercebidos fatos do dia a dia. Muitos deles têm dificuldade de perguntar, por achar suas dúvidas sem importância, deixando de lado fatos que poderiam ser inclusive de interesse público. São questões que as pessoas até gostariam de saber: a mulher pode engravidar depois da menopausa?, a cor do céu é azul?, os batons são prejudiciais à saúde? O Portal Unicamp ouviu sete especialistas da própria instituição, de diferentes áreas, acerca de algumas perguntas simples, porém que escondem o saber ao qual as pessoas comuns nem sempre têm acesso. As respostas podem até colaborar para que sejam mais curiosas e reflitam como e por que as coisas acontecem. Leia as respostas dos especialistas: 

Portal Unicamp – É possível uma mulher engravidar já tendo passado pela menopausa? 
A menopausa é a última menstruação fisiológica da vida da mulher. Uma mulher é considerada menopausada quando permanece sem menstruações por pelo menos 12 meses. A última menstruação normalmente ocorre por volta dos 50 anos mas é considerada normal quando ocorre entre os 40 e 55 anos. A mulher deixa de menstruar porque há um esgotamento dos folículos (células germinativas ovarianas) e, dessa maneira, perde a capacidade de ter filhos. Entretanto, nos últimos anos, com o avanço das técnicas de fertilização in vitro, algumas mulheres na pós-menopausa têm engravidado através da utilização de óvulos de doadoras. Porém, é necessário cautela nesses casos, pois não é toda mulher que pode engravidar na pós-menopausa: se for portadora de alguma doença, os riscos podem superar o benefício.  
Aarão Mendes Pinto Neto é ginecologista e chefe do Departamento de Tocoginecologia da Faculdade de Ciências Médicas (FCM). 

Portal Unicamp – O céu é de fato azul?
A radiação solar, que atinge a Terra, é composta por uma luz branca, que é uma mistura de cores visíveis (que observamos no arco-íris), e as do infravermelho e ultravioleta, que estão além da nossa capacidade visual. Cada radiação tem um comprimento de onda específico, ou seja, uma frequência com que a luz incide sobre a terra. A luz solar, ao encontrar com moléculas gasosas, bem como partículas de poeira em suspensão da atmosfera, espalha luz em diversas direções. Moléculas gasosas e partículas em suspensão são muito pequenas e, por isso, irão espalhar radiação de maior frequência, que corresponde à cor com comprimento de onda azul. O céu não é de fato azul. Apenas o enxergamos azul porque, se não houvesse atmosfera, o céu nos pareceria preto.
Vanessa Guersoni é pesquisadora do Centro de Estudos do Petróleo (Cepetro).  

Portal Unicamp – O consumo de shakes emagrecedores são saudáveis em longo prazo?
Diante da atual epidemia de sobrepeso e obesidade e o aumento da prevalência de doenças secundárias à obesidade, como o diabetes tipo2, o gerenciamento de peso torna-se imperativo. A obesidade deve ser entendida como uma condição neuroquímica, crônica e recidivante. Ela é neuroquímica, pois existe um desbalanço involuntário em sinais hormonais provindos do tecido adiposo e do tubo digestivo que alcançam os centros de controle da fome e da saciedade no cérebro. Além disso, na obesidade de longo prazo a região cerebral que controla o peso, o hipotálamo, pode estar com o funcionamento alterado em definitivo. A doença é crônica e recidivante, pois a obesidade não aparece de forma repentina e, quando instalada, mantém-se por longo prazo e tem uma tendência natural e incontestável de reaparecer após perdas voluntárias de peso (=recidivante). Diante deste cenário, todos os tratamentos devem respeitar este princípio. Dietas radicais que produzem perda de peso são quase sempre fadadas ao fracasso, por não poderem ser mantidas por toda a vida, ou seja, não se adequam ao caráter crônico e recidivante da obesidade. Os suplementos alimentares como substitutos de refeições, dentre os quais os shakes emagrecedores, são uma alternativa para o início de um programa de manejo crônico e contínuo do peso. Estes substitutos de refeição, em geral, buscam uma adequação balanceada de nutrientes e podem ser eficazes no curto prazo, para dar uma dose de empolgação às pessoas que terão como desafio: mudar a forma de comer e de gastar energias para toda a vida. No longo prazo, meses e anos, a questão se transforma. A manutenção de longo prazo dos substitutos de refeição tem sido demonstrada como ineficaz. Os resultados de perda sustentada de peso são inconsistentes nos estudos bem-conduzidos, variando muito em seus resultados na dependência da implementação de medidas complementares como a reeducação alimentar e a prática de exercícios. Em última instância, substituir refeições somente será eficaz na condição de coadjuvante a uma mudança dietética-comportamental mais ampla e duradoura, e bem-feita. Sob o ponto de vista econômico, estudos científicos com substitutos de refeição em longo prazo falharam em demonstrar uma relação de custo-efetividade que justifiquem a sua preconização ampla para a população obesa. Não há evidências de redução dos elevados custos decorrentes da obesidade com o uso, em larga escala, dos substitutos industrializados de refeições. Neste caso, o lucro fica apenas para as empresas produtoras e seus comerciantes. Por fim, lembremos que os substitutos de refeição raramente irão atender aos anseios hedônicos da alimentação. Sentir prazer de comer em companhia de outras pessoas e degustar sabores são condições humanas avançadas e continuamente almejadas. Saúde depende de ausência ou controle de doenças, acompanhada do prazer de bem viver.
Bruno Geloneze, endocrinologista e coordenador do Laboratório de Investigação em Metabolismo e Diabetes do Gastrocentro.

Portal Unicamp – Como o feto respira intra-útero?
O feto não respira intra-útero da forma como nós conhecemos, ou seja, encher os pulmões com ar. Os pulmões iniciam o seu desenvolvimento na terceira semana de gravidez e são completamente preenchidos por um líquido produzido pelo próprio pulmão, que é eliminado pela via aérea e boca para constituir o líquido amniótico – líquido que preenche a bolsa que reveste o bebê. Muito embora se saiba que existem movimentações do tórax fetal na vida intra-uterina, em especial em situações de redução do oxigenação ou da circulação, essas movimentações não tem função respiratória. Desta forma, o feto recebe pela placenta o oxigênio e os nutrientes de que precisa para crescer. Da placenta, o sangue oxigenado flui pela veia umbilical, que faz parte do cordão umbilical e atinge a circulação sanguínea do feto. Em seguida, chega ao coração e, a partir daí, é distribuído para todo o corpo do bebê. Existem situações nas quais o fluxo sanguíneo placentário pode estar comprometido, como nas doenças maternas, hipertensão, diabetes ou o uso de cigarro. Nessas circunstâncias, o feto poderá receber menor quantidade de sangue da placenta, e portanto menor teor de oxigênio, o que pode acarretar défices de crescimento e desenvolvimento.   
Maria Aparecida Mezzacappa – Neonatologista e membro efetivo da Comissão de Pesquisa do Departamento de Tocoginecologia da Faculdade de Ciências Médicas (FCM).

Portal Unicamp – Produtos de beleza como os batons podem ser cancerígenos? 
Certos produtos de beleza podem apresentar potencial de risco à saúde, por ficar em contato direto e prolongado com a pele e mucosas. No caso dos batons, uma pequena quantidade do produto ainda pode ser ingerida e absorvida pelo trato gastrointestinal. No entanto, para expor o organismo a risco, os cosméticos devem conter compostos ou elementos prejudiciais em sua composição. Um caso clássico é a presença de chumbo em batons, que motivou uma crença sobre a possibilidade de induzir o câncer. A exposição prolongada ao metal pesado, que existe naturalmente no meio ambiente, pode causar a doença. Porém, as concentrações do metal nos batons são muito pequenas, sendo insuficientes para gerar um dano ao indivíduo. Isso é garantido em produtos com boa procedência e, nessas situações, batons não são considerados prováveis cancerígenos.
José Augusto da Col é pós-doutorando do Departamento de Química Analítica do Instituto de Química (IQ).

Portal Unicamp – Por que café mancha os dentes?
Bebidas e alimentos como o vinho, o chá preto, a coca-cola e o açaí podem causar manchas nos dentes, pelo acúmulo de pigmentações que os mesmos possuem, e assim caracterizam manchas extrínsecas, ou seja, alteram a coloração dos dentes apenas por fora, na superfície dentária. O café e os chás (pretos principalmente) têm um alto potencial de colorir os dentes porque têm pigmentação escura e pH mais ácido. Além das propriedades dos alimentos, de bebidas, também conta, no processo de manchamento, as proteínas que estão na nossa saliva para permitir a adesão do pigmento ou não. Uma dica para evitar este manchamento pelo café, mesmo para os amantes dessa bebida, é reduzir o consumo às principais refeições, quando geralmente fazemos as escovações dentárias diárias. Alguns estudos demonstraram que o leite adicionado ao café ou chá pode reduzir a potencialidade de causar manchas extrínsecas por causa da caseína. Para remover as manchas já existentes, aconselhamos uma profilaxia profissional.
Marília Batista é dentista e doutora pela Faculdade de Odontologia de Piracicaba (FOP). 

Portal Unicamp – No Brasil, as células-troncos de fato já estão sendo testadas em humanos?
O tratamento com células-tronco inclui até transplante de células tronco-hematopoéticas. O transplante destas células, utilizando a medula óssea como fonte, é realizado há mais de 40 anos. Podemos dividir as indicações de uso das células-tronco como terapêutica de reconstituição da linhagem hematopoética (transplante de medula óssea, de células progenitoras periféricas, onde as células-tronco da medula óssea são mobilizadas por GCSf para a periferia, transplante de sangue de cordão umbilical humano) e medicina regenerativa, ainda experimental, onde se empregam células-tronco de várias fontes, para se diferenciarem em outros tipos celulares, com o intuito de regenerar tecido ou órgãos. Ela é multidisciplinar, interagindo com a engenharia e a física. Como disse, há vários estudos em andamento na fase visita, pré-clínica em animais e alguns estudos clínicos. Estão evoluindo rapidamente, mas ainda deve ir uns dez anos no mínimo para virar terapia.
Ângela Luzo é hematologista e diretora médica do Serviço de Transfusão e do Banco de Sangue de Cordão Umbilical e Placentário do Hemocentro.