Universidade e
escola pública
se encontram
no Química
em Ação

24/01/2014 - 11:33

Equipe organizadora

Quem circulasse pelo complexo de prédios que constituem o Instituto de Química (IQ) da Unicamp nas semanas iniciadas em 13 e 20 de janeiro, não teria notado maiores movimentações, mesmo em época de férias escolares. Mas nesse período alguns laboratórios do IQ foram preparados para receberem, primeiro, durante cinco dias, 80 alunos do ensino médio indicados por escolas públicas afetas às Diretorias de Ensino de Campinas, Região Oeste e Leste, e depois, durante mais cinco dias, 50 professores do ensino médio das mesmas regiões e também de Limeira e Piracicaba. 

Olhando através das vidraças desses laboratórios o observador curioso teria se deparado com jovenzinhos com avental branco compenetrados em seus afazeres e, na semana seguinte, com um público não tão jovem, mas igualmente muito compenetrado e silencioso. Os alunos tinham dado lugar aos seus professores.

A iniciativa resgata a crença no ser humano, particularmente em uma época de individualismo extremo. São professores, funcionários e alunos do IQ da Unicamp que interromperam suas férias, mesmo não recebendo remuneração ou reconhecimento acadêmico, para propiciar a alunos e professores da rede pública de ensino médio uma profícua interação com a Unicamp. São alunos ansiosos pelo contato com a Universidade. São professores que também interromperam espontaneamente suas férias a procura de atualização e de ideias novas que possam auxiliá-los a melhorar suas aulas e interessar e envolver mais seus alunos na disciplina que ensinam. Não é possível ignorar o entusiasmo e nem deixar de enxergar o brilho nos olhos dos organizadores do evento e a satisfação e o reconhecimento dos professores participantes. Um objetivo comum: a vontade de contribuir para a formação de um ser humano melhor e de uma sociedade mais justa e a crença no poder da educação. Emociona.

Trata-se do programa Química em Ação, criado, desenvolvido e mantido por grupos de professores do IQ da Unicamp exclusivamente para alunos e professores do ensino médio de escolas públicas. Da atual equipe coordenada pela professora Adriana Vitorino Rossi, fazem parte os professores Anita Jocelyne Marsaioli, Celso Aparecido Bertran, Fernando Galembeck e Rene Nome, a pós-doutoranda Martha Maria Andreotti Favaro e as organizadoras Acácia Adriana Salomão, farmacêutica que atua em laboratório de pesquisa, e Rita de Cássia Zacardi de Souza, funcionária com graduação em química que ocupa o cargo de gerência de ensino. Essa equipe conta ainda com o apoio de 14 monitores, alunos de graduação ou pós-graduação.
Adriana Vitorino Rossi, Celso Aparecido Bertran e Anita Jocelyne MarsaioliDa programação constam palestras, atividades práticas e teóricas e visitas pedagógicas. Todos recebem certificado de participação. A preocupação dos organizadores se revela em pequenos detalhes como o oferecimento de almoço no Restaurante Universitário, de lanches e a padronização das cores dos jalecos. Um desvelo.

A professora Adriana Vitorino Rossi esclarece que a finalidade do programa é promover a interação entre a Universidade e a escola pública: “É uma parceria que precisa ser estimulada e que constitui um caminho de duas vias, que permite que a Universidade se inteire do que acontece na escola pública e que os alunos e professores desta saibam o que a gente faz aqui.” Em relação aos estudantes secundários a coordenadora enfatiza a necessidade de desmistificar a química, mostrando-a acessível, interessante, motivando seu aprendizado e até os que no futuro pretendem adotá-la como profissão. Ela lembra que as avaliações mostram as mudanças de visão dos participantes entre a chegada na segunda e a saída na sexta: a química chata, difícil, inútil transforma-se em divertida, fácil e interessante.

O professor Bertran acrescenta ainda que o aluno secundário vê a universidade como sonho, o que explica sua grande motivação em participar do programa que lhe permite conhecer um lugar que em princípio ele não fazia ideia de como seria. Para o docente, tudo isso assume particular dimensão quando se trata de entrar em contato com a química que é vista em geral na escola como uma atividade distante e misteriosa.

Remetendo-se também a outro evento oferecido pela Unicamp, o Ciência & Arte nas Férias, também destinado a estudantes das escolas públicas, a professora Anita afirma com profunda emoção: “A sensação é que você abre para eles um mundo do qual não tinham ideia. É gratificante o tempo que dedicamos à escola pública. É compensador atingir um público carente e honestamente interessado. Se hoje 80% dos ingressantes na Universidade provêm de famílias de recursos, certamente no futuro teremos mais alunos a quem as poucas oportunidades oferecidas fazem dar valor ao que recebem."

O professor Bertran lembra de que no evento anterior, mesmo realizando experimentos simples, ele se espantou com a receptividade e encantamento dos professores. Para ele, mesmo experimentos simples, envolvendo conceitos igualmente simples, se mostrados de uma forma interessante possibilitam que os participantes os levem para suas escolas. “O professor percebe que tem condições de tornar o que ensina mais atraente e mais agradável”, constata.

A professora Adriana conta que o professor Galembeck, na palestra proferida na manhã do primeiro dia do encontro com professores, citou Madame Curie que dizia que o laboratório não deve ser considerado um espaço de trabalho, mas sim um lugar de encantamento, a exemplo do que ocorre com uma criança diante de um conto de fada. Para ela, “é esse encantamento que se busca. A expectativa dos professores é a de compartilhar as ideias aqui desenvolvidas para que, voltando à sala de aula, consigam fugir da mesmice a que a própria rotina muitas vezes conduz. Além do fetiche de entrar e trabalhar em um laboratório da Unicamp, pois poucos dos participantes foram nossos alunos.”
Professores em laboratórioEsse programa não pode parar
Essa é a preocupação recorrente que se manifesta nos professores participantes do Química em Ação. Eles são atraídos para o evento a procura de ideias novas, de troca de impressões com próprios colegas da profissão, de aprendizados teóricos e práticos que possam inserir em seus cursos para torná-los mais interessantes e motivadores.
Guiomar Siqueira Oliveira
Guiomar Siqueira Oliveira, professora na Escola Estadual Wadih Jorge Maluf, em Sumaré, diz que sempre almejou participar do Química em Ação, embora frequente o SIMPEQ, Simpósio de Profissionais do Ensino de Química, desde 2006. Esse evento, realizado anualmente, também é promovido pelo IQ da Unicamp. Para ela, quem trabalha na escola pública tem poucas oportunidades de se reciclar e chega até a perder muito do conhecimento adquirido na universidade.

“Aqui temos ainda possibilidade de interagir com colegas da mesma área, o que é raro na escola, pois trabalhando em horários diferentes os professores de química de uma mesma escola quase não se encontram. Você encontra gente que enfrenta os mesmos problemas, trabalha em situações parecidas e essa interação é muito proveitosa. Eu diria mesmo que, mais que reciclagem, vivemos uma situação de aprendizado, de troca de experiências. Estou gostando muito. Os experimentos  são relativamente simples de compreender, com pequenas adaptações podem ser transplantados para a sala de aula, mesmo sendo uma escola de Estado, com 40 alunos por turma e duas aulas de química por semana”, diz ela.
Rita de Cassia Padula
Igualmente Rita de Cassia Padula, que leciona no ETCAP, Campinas, participa pela primeira vez do Química em Ação, embora frequente o SIMPEQ há vários anos. Ela acha importante se atualizar, manter contato com novas linguagens que possam ser levadas para a escola, porque sente que os seus alunos precisam de novas abordagens. E explica: “Muitas vezes a gente, dentro do contexto em que trabalha, sempre correndo e no sufoco do dia a dia, não consegue parar para pensar. Acho que cursos como esses permitem a troca de experiências entre a Universidade e os professores do ensino médio que estão batalhando para preparar alunos para a universidade. Essa interação é importante para os dois lados. Senti que algumas coisas vistas já nos dois primeiros dias podem ser aplicadas na escola. Está sendo muito bom e a organização está joia”.
Fábio Costa
Fábio Costa é professor na Escola Estadual Carlos Gomes, em Campinas. Participa pela segunda vez do programa e o considera uma das poucas oportunidades que os professores do Estado têm para atualizar o conhecimento sem custos. Ele se depara com a possibilidade de aprender algumas técnicas que podem ser levadas para a sala de aula.

Embora considere que algumas práticas exijam laboratório, uma possibilidade que não existe na escola pública, outras são simples, fáceis de realizar e despertam o interesse do aluno, que passa a tomar contato com uma química aplicada. E exemplifica: “Na primeira edição deste programa nós recebemos um kit com vários experimentos para o desenvolvimento em sala. Foi ótimo. Eu apliquei todos eles na minha escola com resultados excelentes. Esse tipo de iniciativa aproxima o professor do ensino médio da universidade e é uma forma de estar sempre atualizado. Eu gostaria que a Unicamp nunca deixasse de realizar esse evento.”
Cheila Cristina de Oliveira
Vinda de Guaxupé, MG, e lecionando em uma escola da periferia de Campinas, a Escola Estadual Celeste Palandi de Melo, Cheila Cristina de Oliveira já participou de três SIMTEQ e está pela segunda vez no Química em Ação. Ela diz que a partir do momento que veio para Campinas, em 2010, não falta a nenhum evento para professores secundários promovido pela Unicamp. Os motivos? A excelência dos profissionais que ministram os cursos, sua ânsia de aperfeiçoamento, o gosto pelo estudo, a adoração pela profissão e a preocupação em sempre aprender o máximo para poder passar para os alunos.

Sua dedicação chega ao extremo: “Experimentos que podem ser feitos na minha escola sem laboratório eu faço todos em sala de aula. Se não tenho equipamento adapto como posso e os alunos adoram e começam a se interessar. Minha escola está na periferia de Campinas, em uma região difícil, estruturalmente complicada, e isso não deve ser motivo de exclusão, pelo contrário, acho que eles merecem. É isso que me move.”

Cheila acha que dá perfeitamente para levar o que se vê no Química em Ação para a escola. Faz sorvete em sala de aula desde que aprendeu no primeiro curso. E através dessa atividade mostra solubilidade, soluções, mudança de temperatura com a introdução de solutos diferentes, crioscopia, sabores, polaridade e uma gama enorme de outros conhecimentos relativos à química. “Gostaria que este curso não se interrompesse de forma alguma”, afirma, como se fizesse um pedido.
José Reinaldo Peres Campestrini
Lecionando na Escola Estadual Pedro Moraes Cavalcante, em Piracicaba, José Reinando Peres Campestrini está participando do Química em Ação pela segunda vez motivado sempre pela possibilidade de trocar ideias e informações com os colegas de outras cidades, o que considera muito bom. 
E acrescenta: “Aproveito bastante o que vejo aqui e muitos dos experimentos consegui realizá-los com meus alunos tanto na escola estadual como na particular. Acho muito importante que esta iniciativa seja mantida.”
Dulce Helena Peralis e João Paulo Sousa Ferreira
João Paulo Sousa Ferreira e Dulce Helena Peralis são oriundos do Colégio Estadual Alves Aranha, em Valinhos. Participam do evento procurando aprimoramento dos conhecimentos e busca de novas ideias teóricas e práticas que possam usar para melhorar a qualidade de suas aulas e motivar os alunos.