Músico formado
na Unicamp
dirige série de
concertos
nos EUA

21/01/2014 - 09:31

O pianista brasileiro Gabriel Rebolla vai dirigir a Four Seasons Concert Series, nos EUA

O pianista brasileiro Gabriel Rebolla, formado pelo Instituto de Artes (IA) da Unicamp, foi convidado para assumir o cargo de diretor da série de concertos Four Seasons Concert Series (FSCS), em Chester Springs, na Pensilvânia, EUA. “O FSCS tem trazido artistas importantes para um público muito bacana, que esta sempre muito interessado em musica erudita”, disse o músico ao Portal Unicamp. “O FSCS foca variedade de estilos musicais, o que e muito bom para mim, pois estou trazendo também repertório de musica brasileira para canto e piano. É muito interessante como eles recebem bem a música brasileira por aqui. Estou contente com esse projeto, e a ideia é fazer na FSCS o primeiro concerto de cada projeto de música brasileira, antes de ir para outras salas de concerto”.

Rebolla é um dos poucos brasileiros com formação em opera coaching. “O coach de ópera é um maestro no piano. O coach é aquele que conhece o estilo musical, a dicção das línguas empregadas e as características principais de cada personagem da ópera. Temos a liberdade de corrigir o cantor em muitos desses aspectos: na realidade, é para isso que somos pagos. Durante a sessão, o coach direciona os cantores para uma perfeita e precisa execução, que seja convincente, expressiva e sempre fiel as tradições de cada ópera”, disse ele.

Formado na Unicamp em 2004, Rebolla já participou, como professor e acompanhador, de importantes companhias de ópera, e atuou em festivais internacionais, como o Atlantic Coast Opera Festival (2012) no estado de New Jersey, EUA, e La Musica Lirica Internacional Opera Festival (2009), na Itália. Em 2013, foi o único brasileiro a ser convidado a participar como professor e acompanhador do FIO – Festival of International Opera of the Americas – que ocorreu na Unicamp.

Leia, abaixo, os principais trechos da entrevista que o músico concedeu ao Portal:

Como você se interessou, profissionalmente, por música em geral e ópera, em particular?

Eu cresci no meio de música. Vários familiares tocam algum instrumento ou cantam, nem todos profissionalmente, mais há um envolvimento grande de música na minha família. Nunca pensei em fazer outra coisa. Aos 15 anos, ingressei na orquestra do Conservatório Pró-Música, onde estudava piano. Inicialmente, fui percussionista da orquestra, e logo virei um dos pianistas. Daí em diante, nunca parei. Quando estava terminando a graduação em música pela Unicamp, já estava claro pra mim que queria seguir para o campo de acompanhamento vocal. Sempre tive uma paixão muito grande por ópera e canção erudita. Tive um professor que me disse, uma vez, que para ser músico ter que ter uma paixão muito grande por música, tem que gostar tanto que nada mais valeria a pena. Posso dizer que gosto muito de música clássica, mas que essa paixão, no meu caso, esta na música vocal. 

Trabalhar com ópera parece muito difícil, tanto por conta da complexidade da arte em si, quanto por questões econômicas e de interesse do público. Como foi conquistar seu espaço nesse meio?

Existe bastante espaço para esse tipo de trabalho, se você pensar que toda companhia de ópera precisa de pelo menos um acompanhador, alem de milhares de cantores que nos contratam para fazer coach e acompanhá-los, em recitais e concursos. Se olharmos dessa forma, existe bastante trabalho. Porém, é um trabalho muito difícil. Muitas vezes, temos que aprender uma ópera completa e extremamente complexa em pouquíssimas semanas. Nunca me esqueço de quando tive que aprender a ópera João e Maria de Engelbert Humperdinck em um prazo de pouquíssimos dias. Foi um desafio tremendo. E não é só aprender a parte do piano: o acompanhador de opera tem que saber o papel de cada cantor do elenco, a tradução da ópera completa, a história, as tradições de execução e muitos mais.

Então, eu diria que conquistar o espaço no meio da ópera como pianista acompanhador não e fácil, não. Mas não por falta de mercado, pelo contrário, há bastante trabalho a ser feito. Mas é muito difícil pela falta de pessoas realmente qualificadas para a execução desse trabalho.

Um dos maiores professores que tive na vida foi Lambert Orkis, um dos maiores acompanhadores do mundo hoje, sem dúvida, com quem estudei por dois anos e meio na Temple University. Foi o professor que me fez crescer como acompanhador tremendamente, me fez um músico mais completo. O acompanhador precisa passar muita segurança para os outros músicos. Segurança de que pode tocar muito bem, que sabe o que esta fazendo. Isso, sem sombra de dúvida, foi um dos segredos que me ajudou a conquistar o sucesso que estou tendo. 

O que faz um pianista acompanhador? Qual seu papel na ópera?

A carreira do opera coach exige que o pianista seja um músico completo. Primeiramente, tem que conhecer bastante repertório, tocar piano muito bem, saber como a orquestra soa para imitá-la no piano, conhecer as línguas principais mais comuns em óperas (italiano, francês e alemão), ter um conhecimento, mesmo que mínimo, em técnica vocal, estilo musical, além de tantas outras coisas. Ser um opera coach é talvez uma das carreiras musicais que mais exigem conhecimento do instrumentista, uma exigência talvez tão grande que só se compare à do maestro ou do compositor de ópera.

Tive um excelente professor na Temple University, maestro Valery Ryvkin, que sempre me falava: “Os cantores dependem de coach não apenas para acompanhá-los ao piano, mais para ser o ouvido deles”.

Quando você se interessou pela atividade de opera coaching?

Interessei-me por essa atividade desde que percebi minha paixão por ópera e repertório vocal. Comecei a me interessar por acompanhamento vocal ainda na minha graduação na Unicamp, quando tocava para as aulas de canto da professora Adriana Kayama. Quando fiz minha primeira ópera completa, A Flauta Magica, de Mozart, com a professora Kathryn Hartgrove, em um dos intercâmbios entre Georgia State University e Unicamp, logo vi que esse seria o campo que me faria completo na minha carreira musical, e sem hesitar comecei a investir em aprender o repertório.

Depois, passei cinco semanas na Itália, no festival La Musica Lirica, como acompanhador, e tive a primeira experiência de trabalhar com alguns dos maiores profissionais do campo. Tenho convicção que escolhi a carreira certa.

O que o levou aos Estados Unidos? O campo para sua atividade, no Brasil, é muito restrito?

Eu decidi vir para os Estados Unidos inicialmente por causa do tipo de pós-graduação que eles oferecem. Quando me formei na Unicamp em piano, estava determinado a fazer meu caminho para tocar o máximo possível. Naquela época não havia mestrado, no Brasil, que fosse totalmente voltado para performance musical. Então, seguindo conselhos do meu professor Mauricy Martin, me preparei para fazer meu mestrado em performance nos Estados Unidos.

Fui para a Georgia State University para um mestrado em Piano Solo, porém com uma bolsa de estudos voltada para acompanhar o programa de ópera da universidade. Logo em seguida vim para a Filadélfia, para meu mestrado em opera coaching, que terminei no ano passado.

A atividade de opera coaching no Brasil ainda é uma carreira muito difícil. Infelizmente, não temos o costume de mandar nossos cantores para coaches. No exterior, é muito comum um aluno de canto, ou mesmo um cantor profissional, além de ter o seu professor de canto, buscar um pianista-coach regularmente, para aprofundar a sua formação musical. No Brasil não temos essa tradição, nossos cantores somente vão aos professores de canto.

Porém, acredito que as coisas estejam mudando. Durante o FIO Americas, o primeiro festival Internacional de ópera que ocorreu ano passado na região de Campinas, muita gente viu a oportunidade de trabalhar com coaches norte-americanos. Essas pessoas tiveram a oportunidade de ver como é importante esse trabalho. O festival também teve alunos pianistas que se interessam por acompanhamento vocal e tiveram oportunidade de ver um pouquinho do que e o trabalho do coach, e o que precisam fazer para entrar nesse mercado.