Edição nº 660

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 17 de junho de 2016 a 26 de junho de 2016 – ANO 2016 – Nº 660

Pesquisa determina impacto
de veículos pesados em rodovias

Trabalho também avaliou como as condições das estradas
interferem na suspensão de ônibus e caminhões

Uma pesquisa inédita desenvolvida na Unicamp aponta uma série de dados e números significativos do impacto que ônibus e caminhões comerciais geram sobre o pavimento de vias, principalmente em situações como frenagem, curvas e passagem sobre buracos.

O estudo também avaliou como as condições das estradas brasileiras impactam a suspensão destes veículos. Para os dois tipos de situações, considerou-se o impacto da suspensão dianteira dos veículos a partir de uma instrumentação que permitiu realizar medições em diversas condições reais.

A pesquisa conduzida pelo engenheiro mecânico Pablo Yugo Yoshiura Kubo demonstrou que o acionamento de 60% do freio de um caminhão ou ônibus comercial pode gerar uma transferência de carga para o pavimento da via de aproximadamente 10 toneladas, considerando uma carga de 6 toneladas para o veículo parado. O pesquisador explica que a carga de 6 toneladas é o limite (para um eixo isolado simples) permitido pela legislação brasileira para caminhões comerciais.

Com buracos de 80 milímetros de profundidade, a passagem do veículo sobre a pista também gera forte impacto, praticamente dobrando a transferência de carga, de 6 para 12 toneladas. Do lado do veículo, vias com pavimento em condições ruins podem gerar, pelo menos, sessenta vezes mais dano à suspensão dianteira, quando comparado a um pavimento em boas condições.

Em curvas também houve transferência de carga do veículo sobre o pavimento, mas menor do que em frenagens e buracos. Conforme a pesquisa, para cada incremento de 10 km/h (2,8 m/s) na velocidade do veículo, uma carga adicional de 110 kg é transferida para o pavimento. Considerando uma velocidade constante de 70 km/h, a transferência de carga chega a 25% (7,5 toneladas) em relação ao peso do veículo parado.  

Os resultados do estudo integram tese de doutoramento defendida por Pablo Kubo junto ao Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC) da Unicamp. O trabalho foi orientado pelo professor Cássio Eduardo Lima de Paiva, que atua no Departamento de Geotecnia e Transportes da Unidade. Pablo Kubo atua, profissionalmente, no Departamento de Engenharia Experimental da Volvo do Brasil, sendo responsável local pela durabilidade, conforto e estabilidade dos veículos.

 “A minha pesquisa, demonstrando o impacto que as situações em curvas, frenagens e buracos gera sobre o pavimento, alerta para a importância de que tais considerações sejam previstas no projeto de dimensionamento e manutenção preventiva do pavimento das rodovias. Há, como agravante, o conhecimento geral de que, em algumas rodovias, os veículos trafegam com valores de sobrecarga muito superiores àquela definida pela legislação brasileira”, alerta Pablo Yugo Yoshiura Kubo.

Ainda conforme o autor da pesquisa, os resultados, sobretudo em relação ao impacto da frenagem, poderão auxiliar no melhor entendimento e dimensionamento do pavimento de praças de pedágio, próximos a lombadas ou cruzamentos, locais onde há a necessidade obrigatória de frenagem do veículo.

“Há, por outro lado, a necessidade das montadoras de veículos comerciais considerarem a influência das condições dos pavimentos das vias sobre a suspensão dianteira dos veículos. Deste modo, a pesquisa serve como um alerta às montadoras sobre a importância do mapeamento das estradas brasileiras para um melhor projeto de seus caminhões e ônibus. Nossa sugestão é a criação de procedimentos de testes que observem os níveis de irregularidade das vias”, acrescentou.

Mais dados e metodologia
O engenheiro mecânico informa que, no caso da frenagem, a velocidade do veículo pouco influi no resultado da transferência de carga para o pavimento. “A influência não está diretamente relacionada com a velocidade inicial do veículo. Basicamente, a transferência de carga em alta velocidade será similar à baixa, desde que o veículo apresente o mesmo valor de desaceleração. Em uma frenagem de emergência, por exemplo, a transferência de carga será a mesma a 20 km/h ou 70 km/h.”

Já em relação aos buracos, a profundidade influiu diretamente na carga aplicada ao pavimento. “Por outro lado, a diferença desse parâmetro em função da velocidade é mais significativa em velocidades inferiores a 40 km/h, situação em que se atinge o pico de transferência de carga”, revela o autor da pesquisa.

Em relação à metodologia, Pablo Kubo informa que empregou nas medições um caminhão com configuração de rodas 8x2 (dois eixos direcionais, um trativo e outro ‘escravo’). A configuração desse tipo de veículo tem sido considerada tendência do mercado pela maior possibilidade de carregamento nos eixos dianteiros, justifica o pesquisador da Unicamp.

“Desenvolvemos ao longo de quatro anos uma instrumentação que transformou o caminhão em um sensor de transferência de carga ao pavimento. Desta forma, foi possível realizar as medições em diversas condições reais. Tal metodologia é muito superior a cálculos virtuais, uma vez que não há qualquer tipo de simplificação do modelo matemático”, considera.

Modal rodoviário
O autor do trabalho situa que o modal rodoviário é a base do sistema logístico brasileiro. Apesar de sua importância, conforme Pablo Kubo, ele é caracterizado, em sua maioria, por pavimentos precários, sinalização em condições ruins e problemas de geometria das vias. Ainda de acordo com o autor do estudo, outro agravante é a elevada idade média, de 13,6 anos, dos 1,5 milhão de veículos comerciais que trafegam nas rodovias brasileiras.

O autor do estudo informa, com base em dados de 2014 da Confederação Nacional dos Transportes (CNT), que 62,1% da extensão total das rodovias analisadas em estudo da CNT (98.475 km) apresentaram pavimento em estado regular, ruim ou péssimo. Em relação à sinalização, vertical e horizontal, 57,4% da extensão total foi avaliada como regular, ruim ou péssima. “Porém, o dado mais preocupante diz respeito à avaliação da geometria das vias brasileiras: 77,9% de sua totalidade foram consideradas regular, ruim ou péssima”, ressalta.

Na pesquisa da Unicamp, são citados ainda dados de 2006 da Associação Nacional de Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), apontando que a indústria automobilística brasileira nasceu apoiada fortemente na montagem de caminhões. De 1957 a 1960 os automóveis representavam uma pequena parcela da totalidade de veículos da época – dos 321,1 mil veículos comercializados no período, 49% eram caminhões, 35% utilitários e 16% automóveis.

Conforme o pesquisador da FEC, em 1960, após intenso debate sobre vantagens e desvantagens do transporte ferroviário e rodoviário, o governo brasileiro decidiu pela segunda alternativa. Assim, este foi um dos fatores de sucesso para o desenvolvimento da indústria automobilística de veículos comerciais no Brasil.

Publicação

Tese: “Análise quantitativa do carregamento vertical dinâmico aplicado ao pavimento brasileiro pela suspensão dianteira dos veículos comerciais”
Autor: Pablo Yugo Yoshiura Kubo
Orientador: Cássio Eduardo Lima de Paiva
Unidade: Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC)