Edição nº 635

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 31 de agosto de 2015 a 06 de setembro de 2015 – ANO 2015 – Nº 635

Telescópio


Checando a validade 
da pesquisa

Menos de 50% de uma lista de 100 estudos de psicologia publicados em três importantes periódicos da área, ao longo do ano de 2008, tiveram seus resultados reproduzidos num esforço coletivo de checagem científica, relatado na edição mais recente da revista Science. Nas reproduções, o tamanho do efeito – uma medida da correlação entre as variáveis estudadas – observado caiu 50%, em média, em relação aos trabalhos originais, e apenas 36% das replicações atingiram significância estatística, ante 97% dos estudos originais. Detalhes do projeto estão disponíveis online, em https://osf.io/ezcuj/ , e o artigo final foi disponibilizado gratuitamente no site da Science, https://www.sciencemag.org/ .

Reprodutibilidade é uma das marcas do processo científico: em teoria, todo resultado publicado por um pesquisador deveria ser passível de reprodução por outros cientistas dispostos a aplicar os mesmos métodos e a usar materiais equivalentes. A reprodutibilidade reduz o risco de um determinado resultado ser inválido – fruto de erro do pesquisador ou de mero acaso – e, do ponto de vista prático, é o que torna possível a transformação da produção acadêmica em tecnologia e inovação.

Há tempos, no entanto, que críticos apontam que a estrutura de incentivos da ciência atual, baseada em número de artigos e de citações, desfavorece os esforços de reprodução e leva à disseminação de falsos positivos: os periódicos de alto impacto privilegiam resultados originais e impressionantes, o que não só torna o esforço de empreender reproduções desinteressante para o cientista, como ainda estimula a “inflação” dos tamanhos de efeito e índices de significância estatística publicados.

A despeito do resultado, os autores do artigo concluem sua exposição com otimismo: “Qualquer tentação de interpretar estes resultados como uma derrota da psicologia, ou da ciência em geral, terá de lidar com o fato de que este projeto demonstra a ciência trabalhando como deveria. Há uma abundância de hipóteses sobre como a atual cultura da ciência pode afetar negativamente a reprodutibilidade das descobertas. Uma resposta ideológica seria relevar esses argumentos, desacreditar suas fontes e seguir despreocupadamente. O processo científico não é ideológico. A ciência nem sempre traz o conforto do que gostaríamos que fosse; confronta-nos com o que é”, escrevem.


Knut, o urso polar que fez sucesso em BerlimEncefalite de 
urso polar

O urso polar Knut, que de 2006 a 2011 foi a principal atração do Jardim Zoológico de Berlim, e que morreu afogado na lagoa de seu cercado depois de sofrer uma convulsão epilética, foi vítima de uma forma autoimune de encefalite que nunca antes havia sido observada em animais não humanos, informa artigo publicado no periódico online Scientific Reports, ligado ao grupo Nature.  

Ao realizar a autópsia do urso, os autores detectaram uma alta concentração de anticorpos específicos no líquido cefalorraquidiano do animal. Testes mostraram que esses anticorpos atacam partes do cérebro de ratos de um modo quase idêntico ao observado na encefalite autoimune humana. O resultado sugere que problemas autoimunes mediados por anticorpos também podem atacar outros mamíferos, para além da espécie humana.

 

Seca causada 
pelo homem

Em comentário publicado na edição mais recente da revista Nature, um grupo de hidrologistas baseados no Estado norte-americano da Califórnia, que passa por uma situação crítica de falta d’água, alerta para a necessidade de as autoridades reconhecerem o papel da ação humana na criação do que chamam de “secas antropogênicas”. Desde 2012 que a Califórnia bate recordes de temperatura e experimenta a pior seca do século. 

“Observações e projeções climáticas indicam que o clima da Califórnia está aquecendo”, diz o artigo. “Secas futuras serão agravadas por ondas de calor mais intensas e mais incêndios florestais (...) aumentará a demanda por energia bem no momento em que a água para geração e refrigeração estará escassa (...) aumentarão as tensões entre prioridades humanas e a parcela devida à natureza”.

“À medida que aumentam os efeitos antropogênicos, as lições das secas passadas não podem simplesmente ser aplicadas a eventos futuros”, advertem os autores, pedindo mais pesquisa. “A resiliência da Califórnia a tais eventos futuros não foi investigada. Cientistas de clima e hidrologia focalizam fenômenos de larga escala e dão pouca atenção às condições e aos impactos locais, como a queda na atividade econômica e a redução dos estoques locais de água”.

 

O pai dos 
babuínos

Artigo de pesquisadores dos Estados Unidos e África do Sul, publicado no periódico PLoS ONE, descreve o mais antigo crânio de babuíno já descoberto. Com mais de 2 milhões de anos, o fóssil foi encontrado na caverna de Malapa, na África do Sul, parte do sítio conhecido como Berço da Humanidade, de onde já foram desenterrados vários fósseis de ancestrais humanos.

O babuíno, da espécie extinta Papio angusticeps, é o primeiro fóssil não-hominino encontrado em Malapa – os cientistas envolvidos na escavação buscavam vestígios do hominino Australopithecus sediba quando deram com os restos do animal. A descoberta reforça a hipótese de que o P. angusticeps tem parentesco próximo com os babuínos modernos, principalmente com a espécie Papio hamadryas, conhecida como babuíno-sagrado. 

 

Redefinindo o 
gênero Homo

A definição das características que delimitam o gênero Homo, ao qual pertence a espécie humana atual (Homo sapiens), continua “imprecisa como sempre”, porque “novos fósseis foram sendo atribuídos, de modo pouco sistemático, a espécies de Homo, sem um mínimo de preocupação com os detalhes da morfologia”, queixam-se dois antropólogos americanos na edição mais recente da revista Science. Ambos pedem, em artigo conjunto, uma redefinição do gênero e da espécie a que pertencemos, e a partir do zero: “Se quisermos ser objetivos, quase com certeza teremos de apagar a lista emblemática de nomes em que o registro fóssil hominino se encontra historicamente aprisionado, e começar do começo”.

O artigo traça uma breve história das classificações dos fósseis humanos e ancestrais, começando por Lineu, que a 300 anos definiu o gênero Homo com a frase “conhece-te a ti mesmo”, passando pela polêmica que se seguiu à descoberta dos primeiros neandertais no século 19 e o debate no século 20 sobre a posição dos australopitecos na família humana. “Talvez seja hora de esquecer os hábitos provincianos e adotar uma abordagem da sistemática hominina do mesmo modo que os estudantes de outros organismos procedem, especialmente por meio de comparações morfológicas mais amplas e detalhadas”, propõe o texto. 


Zero 
chimpanzés

O governo dos Estados Unidos não recebeu nenhum pedido de autorização para a realização de pesquisas científicas invasivas em chimpanzés, o que sugere que não existem mais estudos biomédicos sendo conduzidos nesses animais, informa o serviço noticioso Science Insider, da revista Science. Esse tipo de estudo tem estado em declínio desde 2013, quando órgãos de fomento dos Estados Unidos passaram a restringir o apoio ao uso de chimpanzés para fins biomédicos. A exigência de permissão federal passou a vigorar neste ano. 

Ouvido pelo Insider, Robert Lanford, diretor do Southwest National Primate Research Center, disse que nenhum grupo de pesquisas quer ser o primeiro a solicitar autorização – o que chamaria a atenção de ativistas de direitos dos animais e da opinião pública em geral. Lanford diz que o chimpanzé representa um modelo de pesquisa inestimável para a área médica. “A questão é, optaremos por usá-los, ou não?”


Cientista 
virtual

Um software capaz de assimilar grandes quantidades de dados sobre sistemas dinâmicos e deduzir equações capazes de prever a evolução desses sistemas – basicamente, um “cientista robô” que infere “leis da natureza” a partir de dados observacionais – é descrito no periódico online Nature Communications por pesquisadores dos Estados Unidos. O programa foi batizado de “Sir Isaac”, em homenagem a Isaac Newton.

“Nosso algoritmo é um pequeno passo”, disse, por meio de nota, o biofísico Ilya Nemenman, da Universidade Emory, principal autor do artigo. “Ele pode ser descrito como um robô cientista de brinquedo, mas mesmo assim pode ter aplicações práticas. Pela primeira vez, ensinamos um computador a buscar, de modo eficiente, pelas leis subjacentes a sistemas dinâmicos naturais arbitrários, incluindo complexos sistemas biológicos não-lineares”.

De acordo com o artigo publicado, usando dados simulados o sistema se mostrou capaz de deduzir corretamente a evolução do movimento dos planetas e produziu previsões precisas do consumo de açúcar por leveduras “a partir de dezenas de pontos de dados, e com mais metade das espécies da interação não tendo sido observadas”.

 

Noite astronômica
na Casa Branca

A Casa Branca, residência oficial do presidente e sede do governo dos Estados Unidos, sediará uma nova “Noite Astronômica” em 19 de outubro. Na oportunidade, o Gramado Sul da Casa Branca – de onde parte o helicóptero oficial da Presidência americana – será tomado por cientistas, professores e estudantes para uma sessão de observação das estrelas. A chamada Noite Astronômica da Casa Branca foi instituída pelo presidente Barack Obama me 2009, como parte do esforço para chamar a atenção dos jovens para temas científicos e envolvê-los em atividades educacionais e de pesquisa.