Edição nº 591

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 24 de março de 2014 a 30 de março de 2014 – ANO 2014 – Nº 591

Telescópio


Ondas da inflação cósmica

A maioria das pessoas provavelmente já conhece a teoria do Big Bang, segundo a qual o Universo, ou ao menos a parte do Universo onde vivemos, passou a existir há cerca de 14 bilhões de anos, numa explosão que deu origem a espaço, tempo e matéria. O que poucas pessoas sabem é que a teoria do Big Bang tem um complemento, a teoria da inflação cósmica, segundo a qual o Universo passou por uma fase violentíssima de expansão logo após a explosão inicial, um crescimento fantástico que terminou quando o espaço-tempo tinha menos de um segundo de vida e que definiu características do cosmo que vemos até hoje.

O Big Bang já havia sido confirmado pela detecção do fundo cósmico de micro-ondas, em 1964, mas a inflação ainda carecia de evidência direta – até agora. Pesquisadores da colaboração Bicep2, que controla um observatório de micro-ondas instalado no Polo Sul, informaram na última segunda-feira, 17, ter encontrado as impressões digitais da inflação no fundo cósmico, sob a forma de ondas gravitacionais.

Se confirmados, os resultados do Bicep2 serão a primeira evidência concreta de que a inflação cósmica ocorreu como previsto na teoria. O físico Sean Carroll, do Instituto de Tecnologia da Califórnia e autor de vários livros de divulgação científica, escreveu em seu blog que “com exceção da descoberta de vida em outros planetas e da detecção direta de matéria escura, não consigo imaginar nenhuma descoberta astrofísica que possa ser feita no curto prazo que seja mais importante que esta”.

 

Surfe espacial nos oceanos de Titã

Cientistas ligados à sonda Cassini, da Nasa, que vem investigando o planeta Saturno desde 2004, disseram, numa conferência internacional realizada na semana passada, que acreditam ter observado ondas nos oceanos de Titã, uma das luas do gigante gasoso. Se confirmado, esse será o primeiro registro de ondas marítimas fora da Terra.

Os mares de Titã não contêm água salgada, no entanto, mas hidrocarbonetos. E também não são ondas onde astronautas humanos poderiam surfar: os pesquisadores estimam que elas não tenham mais de 2 centímetros de altura.

 

Musgo ressuscita após 1.500 anos

Cientistas britânicos anunciam, em artigo publicado no periódico Current Biology, que um musgo congelado na Antártida por mais de 1.500 anos pode voltar à vida. Os autores do estudo relatam ter observado a regeneração do organismo após pelo menos 1.530 anos aprisionado em solo congelado, o chamado permafrost ou pergelissolo. Anteriormente, esse tipo de capacidade de recuperação, após tanto tempo, só havia sido constatado em bactérias.

Um dos autores do estudo, Peter Convey, explicou, por meio de nota, que musgos são parte importante da ecologia das regiões polares. “Entender como eles crescem e se distribuem, principalmente numa parte do mundo que está mudando tão depressa quanto a Península Antártica, tem um grande significado”, disse.

Ele acredita que o resultado levanta, ainda, a possibilidade de formas de vida mais complexas também serem capazes de sobreviver por longos períodos no gelo ou no permafrost.

 

Sonda Messenger detecta encolhimento de Mercúrio

Mercúrio, o menor planeta do Sistema Solar e o mais próximo do Sol, contraiu-se muito mais que o estimado pelos cientistas durante seu processo de resfriamento, diz artigo publicado no periódico Nature Geoscience. Dados enviados pela sonda Messenger, da Nasa, mostram que o planeta perdeu cerca de 7 quilômetros de raio ao longo dos últimos 3,8 bilhões de anos, ante modelos teóricos antigos que previam uma contração de, no máximo, 3 quilômetros.

Diferentemente da Terra, cuja superfície repousa sobre uma série de placas tectônicas, Mercúrio tem uma camada rochosa única. Imagens da sonda Messenger revelaram as deformações sofridas por essa carapaça ao longo da história do planeta.

“Nossas descobertas lembram alguns modelos, hoje obsoletos, de como a Terra teria sofrido deformações geológicas em larga escala, da época em que a comunidade científica acreditava que a Terra tinha apenas uma placa tectônica”, disse, por meio de nota, o principal autor do estudo, o geólogo Paul Byrne. “Esses modelos surgiram no século 19 para explicar a origem das montanhas e a atividade tectônica, antes de a teoria das placas ser formulada”.

 

O parasita amigável

Um corvo que é alvo de cucos – pássaros parasitas que põem ovos no ninho de outras aves – pode, em certas circunstâncias, beneficiar-se da invasão, com a relação entre as espécies passando de parasitismo para mutualismo. De acordo com estudo publicado na revista Science, os cucos da espécie Clamator glandarius repelem predadores que atacam os ninhos do corvo Corvus corone corone, o que pode aumentar o sucesso reprodutivo dos hospedeiros.

De acordo com a equipe de cientistas espanhóis responsável pelo trabalho, embora os ninhos infestados por cucos tenham menos filhotes de corvo que chegam à idade adulta, o equilíbrio entre o afastamento de predadores e a perda de filhotes por causa do parasita pode, em alguns casos, ser benéfico para os corvos.

“O resultado desses efeitos opostos flutua entre parasitismo e mutualismo a cada temporada, dependendo da intensidade da pressão predatória”, diz o artigo. Os filhotes de cucos produzem uma secreção que afasta os inimigos do corvo. “Análise química das secreções dos cucos revelou uma mistura de componentes cáusticos e repulsivos”, escrevem os autores. “Oito de nove gatos comeram todos os dez pedaços de carne oferecidos como controle, mas apenas um de oito gatos chegou a morder a carne tratada” com a substância.

 

Aquecimento libera mais metano

O metano é um importante gás causador do efeito estufa, com 25 vezes o potencial de aquecimento global do dióxido de carbono. O metano que existe na atmosfera da Terra é, em sua maior parte, produzido por processos biológicos, e uma análise publicada na revista Nature indica que essa geração tende a aumentar com a elevação da temperatura ambiente, criando um ciclo onde mais metano produz mais calor, que por sua vez estimula a geração de ainda mais metano.

“Nossa análise demonstra que, em média, as emissões de CH4 para uma ampla gama de ecossistemas mostra uma dependência de temperatura (...) Além disso, a dependência média de temperatura é muito maior que a da respiração ou da fotossíntese, resultando numa contribuição relativa maior do CH4 nas emissões de carbono a altas temperaturas”, escrevem os autores, ligados a instituições dos EUA, Reino Unido, Austrália, Alemanha, Suécia e Canadá.

Como o CH4 é um gás do efeito estufa mais potente que o CO2, os autores alertam para o risco do aumento da participação do metano no total de carbono presente na atmosfera.

 

Noção de número em bebês recém-nascidos

Bebês de até três dias de idade já são capazes de criar expectativas de correspondência sobre tamanho, duração e número, diz estudo publicado no periódico PNAS. De acordo com os autores, o trabalho mostra que “representações de espaço, tempo e número estão sistematicamente inter-relacionadas no início da vida pós-natal, antes da aquisição de linguagem, metáforas culturais e antes da experiência ampla com as correlações naturais dessas dimensões”.

Para chegar a essa conclusão, os pesquisadores, da França e do Reino Unido, expuseram 96 bebês de até três dias a variações de tamanho (por meio da exibição de linhas coloridas curtas ou longas); tempo (duração de um sinal sonoro) e número (com linhas sonoras contendo um número variável de sílabas). Depois, as crianças foram expostas a combinações desses estímulos – por exemplo, uma linha colorida que se alongava ou se contraía à medida que o sinal sonoro se estendia, ou à medida que o número de sílabas aumentava ou diminuía. Os bebês reagiram quando os estímulos variavam na mesma direção – com número e espaço crescendo juntos, por exemplo – mas não quando as variações se deram em direções opostas.

“Demonstramos que os recém-nascidos relacionam número e duração ao comprimento no espaço quando essas dimensões variam na mesma direção”, escrevem os autores. “Ao nascer, seres humanos já são sensíveis à estrutura comum dessas magnitudes fundamentais”.

 

Fumantes de maconha forte recebem mais THC

O cultivo da Cannabis sativa, a planta da maconha, em ambientes fechados e por meio de técnicas intensivas, vem produzindo plantas com maior concentração do ingrediente ativo da droga, o THC. Há alguma discussão sobre os efeitos dessa “maconha de alta potência”, com alguns estudiosos alertando para os riscos das doses mais elevadas de THC e outros levantando a possibilidade de a planta mais forte acabar levando a uma redução no consumo.

Um estudo recente, realizado na Holanda e publicado no periódico Addiction, concluiu que os consumidores de cannabis de alta potência realmente reduzem a quantidade de maconha consumida, mas mesmo assim acabam recebendo doses mais elevadas de THC. Os autores acompanharam 98 consumidores de maconha, descritos como “experientes”, e viram que os que faziam cigarros mais fortes inalavam volumes menores de fumaça – mas, mesmo assim, acabavam recebendo mais do princípio ativo.