Edição nº 587

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 16 de dezembro de 2013 a 31 de dezembro de 2013 – ANO 2013 – Nº 587

De Jardim Alegre à flora do campus

A trajetória do funcionário que ingressou na Universidade como jardineiro e hoje é tecnólogo em gestão ambiental

Quase todo mundo, cristão ou não, espera um “agrado” ao se aproximarem os últimos dias do ano. Abraços se prolongam, sorrisos se escancaram. Todos querem abrir seu pacote simbólico, espiritual, físico, virtual, em espécie, em recibo de depósito. O moço nascido em Jardim Alegre precisava somente do sorriso escancarado de uma das flores mais importantes de sua vida, mas enquanto este presente não chega, ele se dedica a tratar, desde a muda, as flores da cobertura vegetal do campus de Barão Geraldo. Já que as mudas florescem sem que Lauro tenha de implorar muito, dedica-se a elas com alegria e muita gratidão, pois a dinâmica desses seres vivos na natureza lhe ofereceu entusiasmo para retomar os estudos, já na fase adulta, até se graduar em gestão ambiental.

Os sorrisos escancarados para Lauro dos Santos vêm da inflorescência, da sombra, da fauna que brinca o dia todo entre as copas que ele acompanhou desde que eram mudas, quando chegou à Unicamp para ocupar o cargo de jardineiro do Parque Ecológico - este é o nome carinhoso que a “velha guarda” da Unicamp ainda dá à Divisão de Meio Ambiente. Trabalhar no campo, e agora com fundamento teórico, observando a dinâmica da natureza é um presente da vida para quem chegou à Universidade em 1985 para ser jardineiro, de acordo com o tecnólogo em gestão ambiental. 

– Conhecer a parte científica agregou muito em minha vida. Quando obtive conhecimento da área, comecei a ser mais feliz do que já era com a jardinagem. Acredito que o profissional para ser feliz tem de gostar do que faz e estar com quem gosta. Isso é importante para o ser humano. Passamos um terço de nossa vida no trabalho e, se a pessoa não é feliz com o que executa, acaba prejudicada. Não tenho o que falar dessa área de cobertura vegetal. Não é simplesmente plantar, porque somos estimulados a pensar na beleza estética do campus, analisar a adequação das plantas para determinado local. E ainda buscar o olhar de quem gosta de admirar a natureza. Somos induzidos, por meio da paisagem, a pensar em deixar as pessoas mais felizes. Não sei o que seria de minha vida fora da Unicamp; ela foi importante tanto para meu desenvolvimento profissional quanto pessoal. Sou feliz e pretendo aposentar aqui, se Deus me der vida até lá. Faltam menos de dez anos.

Quando deixou Jardim Alegre, no norte do Paraná, aos 11 anos de idade, Lauro não sabia bem o que encontraria no interior paulista. Com a educação formal interrompida na metade do ensino fundamental, foi trabalhar como jardineiro na Floricultura Campineira, no distrito de Barão Geraldo, em Campinas. Em 1985, prestou concurso para o cargo de jardineiro na Unicamp e foi direto para um viveiro de produção de mudas. Ali, já começava, sem perceber, a ampliar seus conhecimentos sobre o comportamento daqueles seres inicialmente tão indefesos que um dia se agigantariam para dar sombra, flores e qualidade de vida as pessoas que circulam pelo campus. 

– Já adorava o nome de minha cidade, Jardim Alegre, mas não imaginava que um dia fosse aprofundar conhecimentos no desenvolvimento das plantas. Jardim tem de ser alegre, não é? Tem de promover a sensação de bem-estar às pessoas. Viemos de lá em busca de melhoria de vida. Não ficou nenhum parente. Também adorava trabalhar na floricultura, mas foi na Unicamp que aprendi muito sobre esta área.

Aprendia enquanto trabalhava, ao observar as conversas e o trabalho de outros pesquisadores, como o biólogo Adriano Grandinette Amarante, o saudoso professor Hermógenes de Freitas Leitão (fundador do Parque Ecológico), a engenheira agrônoma Sandra Erbolato e outros profissionais. Assim foi instigado a saber mais e, por consequência, induzido a buscar tal aprofundamento teórico e técnico para seu dia a dia.

A sala de aula, abandonada no meio do ensino fundamental na adolescência, foi retomada então com esse propósito de ampliação de conhecimentos, em uma turma de supletivo, por incentivo de pesquisadores e amigos da Divisão de Meio Ambiente. Um deles, segundo Lauro, foi Osvaldo Pereira, funcionário do antigo Parque Ecológico que sempre incentivou os colegas a buscarem mais conhecimento. E Lauro sabia que para falar sobre as plantas com mais propriedade, como aquelas pessoas todas que admirava, teria de começar de onde parou. E sem parar. 

– Na Divisão, trabalhamos sempre para que as pessoas não caiam no esquecimento. Osvaldo foi um espelho para eu voltar a estudar. Chegou a passar na primeira fase do vestibular. Foi um dos guerreiros na busca de conhecimento. Foi uma das pessoas nas quais me espelhei. Uma pessoa que faz falta. Ele queria estudar, mas não queria largar o campo.

Palavras que Lauro jamais esqueceu e levou a sério.

– Quando prestei concurso, não foi exigido aprofundamento na área em que iria atuar, mas acabei me apaixonando por ela, além de sentir de perto o quanto a natureza é importante na vida das pessoas. Percebi que para conhecer mais, teria de voltar para a escola. Não consegui mais parar. Nessa fase, já não me interessava somente reconhecimento financeiro, mas a ampliação de conhecimentos sobre aquelas espécies que me encantavam cada vez mais. Voltei para concluir o ensino médio e depois decidi pelo curso superior em gestão ambiental. Foi o melhor que fiz. 

Sim. Foi. E as áreas ajardinadas comuns do campus sorriem, pois no momento, Lauro é responsável por elas. Aqueles enfileiramentos de árvores e, eventualmente, de flores em avenidas assim estão porque têm o olhar do tecnólogo e de seu coordenador sobre eles.

– Hoje, a implantação e a manutenção são feitas por uma empresa terceirizada de jardinagem, e eu tenho de acompanhar cada vez que eles vêm.

 

Análises e orientação 

Ao lado do biólogo Grandinette, Lauro também presta orientação técnica em projetos submetidos à análise da Divisão de Meio Ambiente por várias unidades e órgãos da Universidade.

– Não temos condições de atender projetos muito arrojados, mas sentamos juntos para dar orientação sobre as plantas adequadas e que combinem com o local. Isso nas áreas que não são comuns. Os projetos para as áreas comuns são feitos aqui pela equipe, que, aliás, tem um vasto conhecimento nesta área. Também orientamos as equipes da Divisão na área de manutenção e formação de árvores.

O livro de professor Jorge Tamashiro, “As árvores do campus”, lançado pela Editora da Unicamp, chegou a emocionar o tecnólogo, que mais uma vez pode ver registrado o resultado de seu trabalho e dos amigos da Divisão de Meio Ambiente.

– Meu grande orgulho ao ver o livro do professor Jorge é saber que a maioria das sementes passou pela Divisão de Meio Ambiente. Foram coletadas, semeadas, formadas e depois saíram para o plantio no campus. Cerca de 70% das árvores existentes no campus saíram desta divisão. Isso é gratificante.

Os projetos da Divisão de Meio Ambiente, que visam multiplicação de espécies, tendem a diversificar para que a paisagem não se repita na vastidão do campus. E melhor ainda, Lauro e seus colegas procuram implementar de forma a garantir a sustentabilidade também da flora e da fauna. 

– Quer trabalho mais bonito?

Uma troca, pode-se dizer. Enquanto se doa à natureza, o homem recebe os recursos que precisa para sobreviver. No ambiente mais restrito de trabalho, no antigo Parque Ecológico, Lauro é presenteado com a rota da fauna da Mata Santa Genebra. Querer mais o que para o dia a dia, Lauro? Até a gravação da entrevista tem música de fundo, afinal, a conversa acontece debaixo da rota das aves. Cheiro e som de infância, quando Campinas era muito mais verde. Os visitantes mais ilustres formam um casal de tucanos. 

– Faz dez ou 15 anos que eles aparecem por aqui.

Se a ideia de Hermógenes ao instalar o Parque Ecológico bem próximo da rota foi estratégica não dá para saber, pois o idealizador faleceu em 1994, mas, como diz Lauro: “Se encaixou perfeitamente, pois agora podemos contemplar essas maravilhas”.

Durante muito tempo, o Parque Ecológico foi o “xodó” da Universidade, onde funcionários antigos como Benedito de Paula, Mercedes Bueno Costa Leite, Alcinda Valok, Sofia Helena, Wilma Rodrigues e muitos outros iam buscar mudas de plantas. Talvez Lauro nem saiba identificar os servidores pelo nome porque o interesse da comunidade universitária pelas mudas de plantas do viveiro era grande.

As crianças (escolares) também sempre foram contempladas com o projeto de trilha ecológica, que Lauro deseja ver retomado em breve. 

– Temos de trabalhar para trazer este público de volta.

 

Resíduos 

Interessam a Lauro, porém, não somente as mudas que crescem, mas também os resíduos que caem ao chão. Parece que eles cumpriram a missão no mundo, mas podem servir nutrientes a plantas novas. Um projeto interrompido por questões de espaço, do qual é um dos autores, prevê o reaproveitamento de resíduos vegetais gerados no campus. Segundo Lauro, hoje, em torno de 7 mil metros cúbicos do material são gerados no serviço de manutenção, que compreende cortes de grama e podas de árvores. Os galhos das podas são triturados por um equipamento, e o volume é reduzido. Em seguida, o material chega à degradação e vira adubo orgânico. Antes de devolver ao campo como adubo, os técnicos enriquecem com alguns insumos. 

– Precisamos melhorar, mas o processo já oferece nutrientes para que as plantas se desenvolvam melhor. Queremos dar continuidade e completar este projeto. Tudo que recolhemos de resíduos vegetais volta para o campus em forma de adubo e, com isso, reduziríamos o impacto nos aterros sanitários. Além disso, o reaproveitamento minimiza custos relacionados à compra de adubos no mercado e reduz o impacto no meio ambiente. Temos o produto aqui. Esse adubo vegetal oferece todos os nutrientes para a planta se desenvolver. Pediram o espaço, mas estamos reivindicando nova área.

Outra troca importante no dia a dia dos profissionais da área é o convite para participar de eventos em unidades e órgãos da Unicamp. Um que chamou a atenção de Lauro foi o dedicado à Semana do Idoso, organizado pelo Hospital de Clínicas da Unicamp, onde foi plantada uma muda de ipê-amarelo. 

– Um dos mais lindos e que mais me emocionaram. Foi muito gratificante. As plantas ensinam o amor, a felicidade. Difícil conhecer uma mulher que não gosta de uma flor, não é? Elas trazem muita inspiração. Tudo é comemorado com flores: a atuação do cantor, da bailarina, as decorações de festas e de Natal... Fico triste ao encontrar alguém que diz não gostar de plantas. Elas estão presentes na vida e na pós-vida.

Depois desse brinde, fica o desejo da coluna “Perfil” para que, além da esposa e da filha mais nova, Lauro receba um sorriso da flor que falta para que sua casa seja, ainda mais, um Jardim Alegre. O nome da flor ficará em segredo no coração de Lauro.

Comentários

Comentário: 

Êta Lauro!!!
Vc merece!!!
Pessoas como fazem, fazem diferença em nosso espaço.
Continue assim.
valeria

Comentário: 

O Lauro é a mostra que quem lida com a terra é abençoado. A Unicamp tem sorte de ter um funcionário tão dedicado e amante das plantas. Contar com o Lauro para qualquer dúvida com plantas em nossos projetos é sempre uma benção!

Comentário: 

É, quando a gente vê funcionários exemplares como o Lauro sentimos orgulho de sermos funcionários públicos. Grande abraço Lauro, e obrigado por estar sempre disposto a nos emprestar seu conhecimento.
Cacá (CPO).

Comentário: 

Lauro, continue sempre assim, cuidando dessa natureza, quando eu ando pelo campos e ouço o canto dos pássaros me sinto feliz como eles.
Um dos seus segredos estão no jardim da minha residência, as plantinhas que você plantou estão sempre florida
Alaíde do IA

Comentário: 

Parabéns Lauro você é muito bom com a natureza, alias quando servimos o exercito Brasileiro em 1982, você já trabalha com as plantas lá.
Abraço.
Nascimento

Comentário: 

O Lauro é uma pessoa sempre acessível, todas as vezes que o Cecom precisou estava lá...orientando sobre as nossas plantinhas internas... continue assim... atencioso com as pessoas e com as plantas. Deus lhe abençoe! Abraço.
Meire - Cecom

meire@unicamp.br